Direito Administrativo

Concessão de Direito Real de Uso e sua Utilidade no Município de Gurupi/TO

Autores: TRINDADE, Amanda Batista. Bacharel em Direito pela Universidade UnirG – Gurupi/TO. (e-mail: amanda-trindadegpi@hotmail.com)

CASTRO, Jefferson Afonso. Bacharel em Direito pela Universidade UnirG – Gurupi/TO. (e-mail: jefecastro32@hotmail.com)

COSTA, Leandro Rodrigues. Advogado. Pós-Graduando em Direito Processual Civil pela Ipemig. Bacharel em Direito pela Universidade UnirG – Gurupi/TO; (e-mail: rodriguescostaleo@gmail.com)

Orientador: MOREIRA, Adriano Fernandes. Doutor em Direito Privado e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília (2017). Mestre em Direito Privado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2008). Especialista em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2005). Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho (2012). Especialista em Direito Imobiliário pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (2015). Bacharel em Direito pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas de Gurupi (1999). Advogado especializado em Direito do Consumidor (2008). Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON). Professor Adjunto Universidade UnirG – Gurupi/TO. (email: afmafmafm@hotmail.com)

Resumo: O presente trabalho versa sobre a concessão de direito real de uso implantada através do direito real introduzido no Código Civil com o advento da Lei 11.481/07, e a aplicabilidade desta modalidade no Direito Urbanístico. O artigo discorre sobre o instituto segundo a sua definição, natureza jurídica, extremando a diferença entre uso, habitação, direito de superfície, concessão de uso e concessão de direito real de uso. Por conseguinte, aborta o estudo da base legal da concessão de direito real de uso e a analise deste como instrumento para políticas urbanas, abortando a sua utilização, seu procedimento e importância no Município de Gurupi-TO

Palavras-chave: Direito real; Concessão de direito real de uso; Política Urbana.

 

Abstract: The present work deals with the granting of real use right through the real right introduced in the Civil Code with the advent of Law 11.481 / 07 and the applicability of this modality in Urban Law. The article discusses the institute according to its definition, legal nature, extending the difference between use, housing, surface right, concession of use and concession of real right of use. Therefore, it aborts the study of its legal basis and the granting of real right of use as an instrument for urban policies, as well as its use, procedure and importance in the Municipality of Gurupi-TO.

Keywords: Real Right; Concession of real right of use; Urbane Politics

 

Sumário: Introdução. 1. Conceito. 1.1. Natureza Jurídica. 1.2. Direitos Reais: diferença entre uso, habitação, direito de superfície, concessão de uso e concessão de direito real de uso. 1.3. Legislação. 2. A Concessão de Direito Real de Uso como Instrumento para Políticas Urbanas. 3. A Utilização, os Procedimentos e a Importância da Concessão de Direito Real de Uso no Município de Gurupi/TO. Considerações Finais. Referências.

  

Introdução

Presente no âmbito administrativo, elencado como direito real no Código Civil, a Concessão de direito real de uso (CDRU) tem sido vantajosa em diversos municípios brasileiros.

O objetivo deste trabalho é abordar a importância desse instituto como instrumento para políticas urbanas, principalmente no Município de Gurupi – TO. A lei regulamentadora determina que seja instituída a concessão de uso em terrenos públicos ou particulares, remuneradamente ou gratuitamente, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel quando houver interesse social, interesses esses que serão mencionados no decorrer do trabalho.

Instituto do uso, habitação, superfície e concessão de uso merecem atenção, visto que há algumas semelhanças.

No uso, o usuário usa a coisa (jus utendi), restando-lhe somente os frutos necessários a sua manutenção e de sua. Na habitação, o habitador irá apenas ter um imóvel a disposição sua e de sua família, para fins de moradia. No direito de superfície, o superficiário constrói ou planta em terreno concedido por outrem. Na concessão de direito real de uso as finalidades específicas atendem o interesse social. Na concessão de uso, a administração concede a um particular a utilização de um bem de seu domínio.

Com a concessão de direito real de uso, é possível garantir desenvolvimento para a região, incentivo para que empresas explorem a área destinada, resultando em economia.

Em Gurupi, a CDRU é aplicada em grande maioria para entidades filantrópicas, mediante autorização legislativa. De acordo com o Prefeito, as concessões são importantes para fomentar a economia, sendo assim, terrenos dos municípios são preferencialmente concedidos a empresas, indústrias, limitando-se às igrejas.

 

1. Conceito

            Concessão de direito real de uso (CDRU), instituto já previsto no âmbito administrativo, faz correlação com o direito de superfície, foi introduzido ao rol de Direitos Reais no Código Civil, através da Lei 11.481/2007. O professor Hely Lopes Meirelles[1]assim conceitua:

 

“Concessão de direito real de uso é o contrato pelo qual a Administração transfere o uso remunerado ou gratuito de terreno público a particular, como direito real resolúvel, para que dele se utilize para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social.” (apud VENOSA, 2013, p. 623)

 

No mesmo sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello[2], também define:

 

“É o contrato pelo qual a Administração transfere, como direito real resolúvel, o uso remunerado ou gratuito de terreno público ou do espaço aéreo que o recobre, para que seja utilizado com fins específicos por tempo certo ou por prazo indeterminado.” (MELLO, 1995, p. 535)

 

Acerca do objeto, a concessão é admitida somente aos bens imóveis, públicos (contrato administrativo) ou privados (contrato de direito privado).  Não havendo, portanto, possibilidade da outorga alcançar bens móveis.

Para esse tipo de concessão, é importante ressaltar que os objetivos do instituto é atender fins específicos, através de modalidades que estejam voltadas para o interesse social em áreas urbanas, entre eles, urbanização, cultivo de terra, industrialização, seja contratada gratuitamente ou onerosamente, por instrumento público ou particular, ou por simples termo administrativo.

Contudo, na falta do seguimento desses pressupostos, a concessão poderá ser nula, tendo em vista o desvio de finalidade no uso do bem. Diógenes Gasparini[3] nos traz a inteligência o que vem a ser o desvio de finalidade:

 

“O ato administrativo desinformado de um fim público e por certo informado por um fim de interesse privado é nulo por desvio de finalidade (passa – se de uma finalidade de interesse público para outro interesse privado, a exemplo do ato de desapropriação praticado para prejudicar o proprietário). É o que se chama de desvio de finalidade genérico.” (GASPARINI, 2010, p. 115)

 

Destaca-se ainda que diferentemente da concessão de uso, a concessão do direito real de uso é vitalícia e intuitu personae. 

 

1.1 Natureza Jurídica

No tocante a natureza jurídica, não há o que se questionar, não há divergência na doutrina, os fins da concessão de direito real de uso, são expressamente previstos em lei.

O real motivo para que uma concessão seja realizada é o benefício social.  A corrente majoritária atribui a esse instituto a característica de direito real resolúvel, ou seja, o concessionário para ser beneficiado, fica sujeito à condição resolutiva da destinação à finalidade pública.

 

1.2 Direitos Reais: diferença entre uso, habitação, direito de superfície, concessão de uso e concessão de direito real de uso

Esse tópico visa apresentar as diferenças entre os institutos, ambos elencados no rol taxativo de direitos reais.  Em um conceito clássico, Clovis Beviláqua[4], define direito das coisas da seguinte maneira, o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. Tais coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é possível exercer o poder de domínio”.

 

Luís da Cunha Gonçalves, [5]na mesma linha, nos esclarece sobre conceito de direito real:

 

“É relação jurídica que permite e atribui a uma pessoa singular ou coletiva, ora o gozo completo de certa coisa, corpórea ou incorpórea, incluindo a faculdade de alienar, consumir ou destruir (domínio), ora o gozo limitado de uma coisa, que é propriedade conjunta e indivisa daquela e de outras pessoas (co-propriedade) ou que é propriedade de outrem (propriedade imperfeita, com exclusão de todas as demais pessoas, as quais têm o dever correlativo de abstenção de perturbar, violar ou lesar, ou do respeito dos mesmos direitos.” (GONÇALVES, 1952)

 

Nesse sentido, passaremos a conhecer a diferença de cada um desses direitos reais. Regulado pelos os artigos 1.412 e 1.413 do Código Civil, o direito de uso permite que o usuário use a coisa (jus utendi), porém os frutos advindos pertencem ao proprietário legítimo, restando-lhe somente os frutos necessários a sua manutenção e de sua família.

Carlos Roberto Gonçalves[6] conceitua:

“O uso é considerado um usufruto restrito, porque ostenta as mesmas características de direito real, temporário e resultante do desmembramento da propriedade, distinguindo-se, entretanto, pelo fato de o usufrutuário auferir o uso e a fruição da coisa, enquanto ao usuário não é concedida senão a utilização restrita aos limites das necessidades suas e de sua família. (GONÇALVES, 2012)”

 

Na habitação, o uso também é limitado, este instituto é regulado pelo os artigos 1.414 a 1416, ambos do Código Civil. O habitador desse direito irá apenas ter um imóvel a disposição sua e de sua família, não podendo fazer nada com a casa/prédio alheio, nem mesmo receber aluguéis ou outras rendas originárias deste imóvel.

Com propriedade, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald[7], afirma:

 

“Seria um direito de uso limitado à habitação, pois, além de incessível, não admite qualquer forma de fruição. Como o próprio nome descreve, circunscreve-se à faculdade de seu titular residir gratuita e temporariamente em um prédio, com sua família”. (CHAVES E ROSENVALD, 2011)

 

No direito de superfície, o proprietário do terreno concede a outrem durante um determinado tempo, o direito de construir ou plantar em seu terreno. Todos os encargos e tributos referentes a esse imóvel são de responsabilidade do superficiário.

Hely Lopes Meirelles[8] ao diferenciar concessão de uso e concessão de direito real, posiciona da seguinte maneira:

 

            “Concessão de uso – é o contrato administrativo pelo qual o Poder Público atribui a utilização exclusiva de um bem de seu domínio a particular, para que o explore segundo sua destinação específica.

            Concessão de direito real de uso- é o contrato pelo qual a Administração transfere o uso remunerado ou gratuito de terreno público a particular, como direito real resolúvel, para que dele se utilize em fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social. ”(MEIRELLES, 2001)

 

A concessão de direito real de uso diferencia-se da concessão de uso, por abranger finalidades específicas que atendem o interesse social. Por outro lado, na concessão de uso, a administração concede a um particular a utilização de um bem de seu domínio. Há de citar outro traço diferenciador entre os dois institutos: a CDRU incide tanto em terrenos públicos quanto em terrenos particulares, enquanto, a concessão de uso incide somente em imóveis públicos.

 

1.3 Legislação

A concessão de direito real de uso está disciplinada pelo decreto-lei nº271/67, que dispõe sobre loteamento urbano, responsabilidade do Ioteador, concessão de uso e espaço aéreo e dá outras providências. Segundo Toshio Mukai[9], sobre a criação da concessão de direto real de uso:

 

“Ela foi instituída pelos art.7º e 8º do decreto-lei n.271, de 28-2-1967 e é expressamente recomendada, preferentemente à venda ou doação de bens públicos, pelo art. 19, § 1, da Lei estadual n.89, de 27-12-1972 e pelo art.63 do Decreto-lei Complementar estadual (São Paulo). N.9, de 31-12-1968 (Lei Orgânica dos Municípios). Pelo art.8º do Decreto-lei n.271/67 ela abrange o espaço aéreo.” (MUKAI, 1988, p.147)

 

Nesta seara, no seu art. 7º do decreto-lei nº271/67, trata sobre a concessão de direito real de uso, na seguinte forma:

 

“Art. 7o É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares, remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas.” (BRASIL, 1967)

 

Logo na leitura deste artigo, podemos extrair algumas características da concessão tais como: a) A concessão será destinada tanto para terrenos públicos como para terrenos particulares; b) A concessão do terreno poderá ser remunerada ou gratuita; c) Haverá tempo certo ou indeterminado e por fim a concessão será utilizada para fins de interesse social, urbanístico, industriais e seguintes como prescreve o artigo 7º do decreto nº271/67.

Ademais, temos, por conseguinte os parágrafos do artigo 7º do decreto/lei nº271/67, que assim dispõem:

 

Art.7.

[…]

  • 1º. A concessão de uso poderá ser contratada por instrumento público ou particular, ou por simples termo administrativo, e será inscrita e cancelada em livro especial.
  • 2º. Desde a inscrição da concessão de uso, o concessionário fruirá plenamente do terreno para os fins estabelecidos no contrato e responderá por todos os encargos civis, administrativos e tributários que venham a incidir sobre o imóvel e suas rendas.
  • 3º. Resolve-se a concessão antes de seu termo, desde que o concessionário dê ao imóvel destinação diversa da estabelecida no contrato ou termo, ou descumpra cláusula resolutória do ajuste, perdendo, neste caso, as benfeitorias de qualquer natureza.
  • 4º. A concessão de uso, salvo disposição contratual em contrário, transfere-se por ato inter vivos, ou por sucessão legítima ou testamentária, como os demais direitos reais sobre coisas alheias, registrando-se a transferência.
  • 5º Para efeito de aplicação do disposto no caput deste artigo, deverá ser observada a anuência prévia:

I – do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, quando se tratar de imóveis que estejam sob sua administração; e.

II – do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência de República, observados os termos do inciso III do § 1º do art. 91 da Constituição Federal. (BRASIL, 1967)

 

Sendo assim, ao analisarmos os parágrafos do artigo 7º do decreto-lei nº271/67, percebe-se que a concessão de direito real de uso não se trata apenas de uma mera doação de um terreno (livre de qualquer ônus), mas em sentido contrário, uma vez sendo instituída a concessão, a mesma traz ao concessionário a responsabilidade de dar uma destinação/fim aquele terreno que lhe foi dado o uso, correndo o risco de o mesmo perder o terreno, caso não cumpra com os fins estabelecidos, sejam estes sociais, urbanísticos, industriais, dentre outros.

Nota-se, que a base legal principal que trata sobre a concessão de direito real de uso foi publicada e sancionada no ano de 1967. Logo, com o advento do novo Código Civil, algumas alterações legislativas foram feitas. A lei 11.481/2007 trouxe novações para o instituto. Primeiramente a Lei 11.481/2007 alterou o art.7º do Decreto-Lei, uma vez que na redação anterior não havia descritos tantos usos na concessão de Direito Real de Uso.

Para Tauã Lima Verdan Rangel[10], esta modificação, “possibilitou a regularização fundiária de interesse social e do aproveitamento sustentável de várzeas”. Rangel afirma que o objetivo do legislador, “foi inserir a concessão de uso no rol dos instrumentos hábeis à legitimação de posse sobre bens públicos ocupados, de maneira informal, por populações de baixa renda”.

Além desta modificação a Lei 11.481/2007, elencou entre as espécies de direitos reais no art. 1.225 do Código Civil, a concessão de direito real de uso, como também acrescentado no art. 1473, IX a previsão da CRDU ser objeto de hipoteca. Vejamos:

 

Art. 10.  Os arts. 1.225 e 1.473 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1.225…………………………………………………..

“XII – a concessão de direito real de uso.” (NR).

“Art. 1.473…………………………………………………….                        

VIII – o direito de uso especial para fins de moradia;

IX – o direito real de uso;                                                                               

X – a propriedade superficiária.

  • “2o  Os direitos de garantia instituídos nas hipóteses dos incisos IX e X do caput deste artigo ficam limitados à duração da concessão ou direito de superfície, caso tenham sido transferidos por período determinado.” (NR) (BRASIL, 2007).

 

2. A Concessão de Direito Real de Uso como Instrumento para Políticas Urbanas

 A Constituição Federal no art.182, sobre política urbana, assim dispõe:

 

“A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretriz geral fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.” (BRASIL, 1988)

 

Desde a década de 1930, houve um grande crescimento das cidades brasileiras, acarretando mudanças significativas na ordem socioeconômica brasileira. Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, não havia uma regulamentação constitucional acerca das questões ambientais e urbanas. Segundo Edésio Fernandes, com o advento da Constituição brasileira de 1988, houve uma inovação no ordenamento jurídico brasileiro. De acordo com os ensinamentos de Edésio Fernandes[11],

 

“A Constituição brasileira de 1988 inova o ordenamento jurídico brasileiro ao estabelecer pela primeira vez um capitulo específico da política urbana, que contém um conjunto de princípios, responsabilidades e obrigações do Poder Público e de instrumentos jurídicos e urbanísticos para serem aplicados e respeitados com o objetivo de reverter o quadro de degradação ambiental e das desigualdades sociais nas cidades, possibilitando uma condição digna de vida para a população urbana.” (FERNANDES, 2000, p.101)

 

Assim, o Capítulo de política urbana incluído pela Constituição de 1988 trouxe a exigência da criação do Plano Diretor para os municípios com mais de 20 mil habitantes, além da criação de instrumentos para a organização do espaço urbano, tais como tributação progressiva, edificação urbana e o usucapião especial urbano. A partir de então, vários municípios têm produzido diversos instrumentos legais para a regulamentação de suas áreas urbanas e ambientais, como a elaboração de seus Planos Diretores, Códigos de Posturas, Códigos de Obras, dentre outros.

Nesta seara, a concessão de direito real vem sido usada por diversos municípios como instrumento jurídico para seu planejamento urbano e regularização fundiária. Segundo Vladimir da Rocha Franca[12], a respeito da instituição do direito real como instrumento para a política urbana,

 

“A concessão de direito real de uso podem ser empregadas de modo vinculado a um projeto governamental de urbanização e progresso econômico de uma determinada região. Por meio desses contratos, o Poder Público procura atrair investimentos da iniciativa privada em troca da outorga de benefícios estatais, mediante a criação, por exemplo, de uma área destinada à exploração de hotelaria, turismo e lazer”. (FRANÇA, 2008, p.6)

 

A partir desta grande lição dada por Vladimir da Rocha, podemos verificar como tão vantajoso pode ser a concessão de direito real de uso para os municípios brasileiros, pois além de servir como um mecanismo em que o Poder Público resguarda seu patrimônio, a concessão serve como um incentivo para que empresas, indústrias e hotéis instalem seus empreendimentos nas cidades, fomentando assim a economia e o desenvolvimento urbano da mesma.

Outro ponto importante é a respeito da concessão de uso de direito real na regularização fundiária. Como é sabida, grande parte das cidades brasileiras foram construídas sem planejamento, com assentamentos irregulares e invasões, conhecidas também como favelas. Neste sentido, o Estatuto das Cidades (Lei 10.257/01) no artigo. 2, inciso XIV dispõem,

 

“Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

[…]                                                                                                         

XIV. Regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação.” (BRASIL, 2001)

 

Ademais, o Estatuto das Cidades no artigo. 4, inciso V, alínea g, elenca a concessão real de uso dentre os instrumentos jurídicos para política urbana, na regulamentação fundiária é totalmente possível o uso da concessão para fins de habitação. Para Vitor Fernandes, “os cidadãos pobres podem ser beneficiados, em programas habitacionais sociais criados especificamente para esse fim, conferindo-se lhes um verdadeiro direito à habitação, como realização da função social da propriedade”. Além disto, Vitor Fernandes[13] defende que,

 

“[…] para os cidadãos que se tornarem concessionários, as vantagens serão imensas, pois terão reconhecido, no cartório do Registro de Imóveis, o seu direito a terra onde fixarem sua residência, diminuindo seus problemas creditícios, mercê da possibilidade de transmissão intervimos do direito real recebido, e resolvendo igualmente os problemas hoje existentes nas hipóteses de dissolução das famílias, por meio de divórcio ou dissolução de união estável, e também as questões sucessórias, pois o direito real é transmissível aos herdeiros e também por instrumento causa mortis.” (FERNANDES, 2011, p.28)

 

Na obra “O estatuto da cidade comentado” de Celso Santos Carvalho[14] e Ana Claudia Rossbach, os autores ao tecerem comentários relativos ao artigo 4º, afirma que, “o Estatuto da Cidade define um extenso conjunto de instrumentos para que o Município tenha condições de construir uma política urbana que concretize, de fato, a função social da propriedade urbana e o direito de todos à cidade”. Destarte, como um dentre estes instrumentos, a concessão de direito real de uso, seja para fins industriais ou para fins de habitação na regularização fundiária, tem trazido experiências bem sucedidas na sua aplicação em diversos municípios brasileiros.

 

3. A Utilização, os Procedimentos e a Importância da Concessão de Direito Real de Uso no Município de Gurupi-TO

 

No Município de Gurupi-TO, a concessão de direito real de uso é totalmente aplicável.A respeito, a Lei Orgânica do Município de Gurupi, na Seção III-Dos Bens Municipais, dispõe o art. 19, § 1 dispõe:

 

“Art. 19.

(…)

  • 1º O Município, preferentemente à venda ou doação de seus bens imóveis, outorgará concessão de direito real de uso mediante prévia autorização legislativa e concorrência; a concorrência poderá ser dispensada por lei quando o uso de destinar á concessionária de serviços públicos, a entidades assistenciais ou quando houver relevante interesse público, devidamente justificado.” (Brasil, 1990)

 

A preocupação do legislador, ao estabelecer neste parágrafo é justamente o que já abordamos em tópicos anteriores, o de manter o bem público em seu domínio. Como já frisa José dos Santos Carvalho Filho[15]para a Administração Pública, a concessão de direito real de uso,

 

“(…) salvaguarda o patrimônio da Administração e evita a alienação de bens públicos, autorizada às vezes sem qualquer vantagem para ela. Além do mais, o concessionário não fica livre para dar ao uso a destinação que lhe convier, mas, ao contrário, será obrigado a destiná-lo ao fim estabelecido em lei, o que mantém resguardado o interesse público que originou a concessão real de uso”. (CARVALHO, 2009, p.1221)

 

Neste prisma, a partir de pesquisas no site da Câmara Legislativa de Gurupi, verificamos no que diz respeito ao histórico da utilização da concessão de direito real de uso no Município, utilizada para fins de interesse social, em grande maioria, para entidades filantrópicas por meio de autorização legislativa.  Como prova, temos os seguintes exemplos,

  1. Associação Nacional dos Servidores da FUNAI. Concessão instituída pela Lei Municipal n 1.174/1996 de 27 de dezembro de 1996.
  2. Casa de Maria. Concessão instituída pela Lei Municipal nº. 1.9991, de 22 de dezembro de 2010.
  3. Igreja Batista Filadélfia, instituída pela Lei Municipal nº. 1.894, de outubro de 2010.
  4. Paróquia São Judas Tadeu. Concessão instituída pela Lei Municipal nº. 1.915, de dezembro de 2010.
  5. Igreja Assembléia de Deus, Ministério Missão. Concessão instituída pela Lei Municipal nº 1925, de 31 de março de 2011.

Importante ressaltar, que em todas estas leis municipais, fica estipulado o prazo de 2(dois) anos para que o concessionário edifique seu imóvel, cumprindo com o seu fim que lhe foi destinado, uma vez findado o prazo e não cumpridas as obrigações, a área será devolvida automaticamente ao Patrimônio Público.

Já relativo aos procedimentos para estabelecer a concessão de direito real de uso, verifica-se que o município de Gurupi não utiliza a modalidade de licitação concorrência para aplicá-la, sendo que em sua maioria, a concessão é instituída mediante processo de autorização pela câmara legislativa. Neste passo, os procedimentos a serem seguidos para concessão de direito real de uso no município por meio de autorização legislativa, são estes:

 

  1. Requerimento a Secretária de Administração da Prefeitura de Gurupi (por parte do concessionário do qual dever ser descrito a área que pretende constituir sua empresa, indústria, igreja ou associações, dentre outros). Através deste requerimento, o Chefe do Executivo (Prefeito) analisará as condições e se viáveis autorizará o protocolo a ser remetido para a Câmera Municipal.
  2. Com prévia autorização do Chefe do Executivo, a Secretária de Administração remeterá por meio de protocolo, o requerimento do concessionário.
  3. Na Câmera Legislativa, o requerimento será transformado em Projeto de Lei, este Projeto de Lei passará pelas 2 comissões da Casa.
  4. Após comissões, o projeto será colocado no plenário para votação, sendo necessária votação favorável de dois terços dos membros da Câmera para sua aprovação, conforme prevê art. 54 da Lei orgânica de Gurupi.
  5. Com aprovação, já agora transformado em lei, a Câmera Legislativa remeterá para o Prefeito para a sanção, sendo a concessão de direito real de uso finalmente autorizada. .
  6. Após autorização, o concessionário terá até 2 anos para edificar sobre a área que lhe foi concedida.
  7. Edificado o imóvel, após 2(dois) anos, o concessionário poderá registrar a escritura pública no Cartório de registro de imóveis do município de Gurupi.

 

Considerando que o Município de Gurupi localiza-se em posição estratégica, no Centro do Brasil, com a presença da BR-153 e Ferrovia Norte-Sul, sobre nossa perspectiva, a concessão de direito real de uso demonstra-se de suma importância, principalmente se for utilizada para fins industriais.

Para Otocar José (Fiscal de posturas e edificações e ex-diretor de fiscalização do Município de Gurupi) [16], que tem grande experiência relativa à política urbana no Município, a concessão de direito real de uso é bastante vantajosa, pois através dela, indústrias poderão instalar suas filiais ou sedes. Todavia, o mesmo considera que o processo é muito burocrático e deve haver mais incentivos de leis, devendo tanto o prefeito como o presidente da câmara estar em consonância com vontade política de ambos. Além disto, Otocar considera que antes do Município utilizar-se da concessão de direito real de uso, o mesmo deve estruturar seu Parque Industrial.

Já para Kleber Alves Barros[17] (Coordenador de Regularização Fundiária de Gurupi), a utilização da concessão de direito real de uso é importante, pois atende aos fins de interesse social quando concedida para creches e escolas, mas em contrapartida o mesmo considera que em relação às igrejas a concessão deveria ser limitada.

Por fim, para o atual Prefeito de Gurupi, Laurez Moreira[18], as concessões de direito real de uso são importantes, principalmente para fins indústrias. Neste sentido o mesmo ressalta que a atual gestão tem trabalhado no sentido de empreender o Parque Industrial de Gurupi, incentivando que empresários se instalem na cidade.  Ressalta o mesmo que tem evitado conceder áreas do município para igrejas por considerar que estas não tragam nenhum benefício de renda ao Município. Neste sentido, considera Laurez que os terrenos dos municípios devem ser concedidos para empresas que possam fomentar a economia de Gurupi.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Direito real, no seu conceito mais genérico é o poder jurídico da pessoa sobre uma coisa. Uma relação direta e imediata entre seu titular e a coisa. Neste passo, o Código Civil estabeleceu no Livro III, Titulo II, vários direitos reais, dentre estes, a concessão de direito real de uso, estudado neste presente artigo.

Introduzido pelo rol de Direitos Reais no Código Civil pela Lei 11.481/2007 e tendo como sua base legal principal o Decreto-Lei nº 271 de 28 de fevereiro de 1967, a concessão de direito real de uso, tornou um dos instrumentos jurídicos para utilização dos bens públicos.

Conforme abordado, verifica-se que a concessão de direito real de uso trata-se de um instrumento por meio do qual a Administração pública pode conceder seus terrenos públicos a particulares, de maneira onerosa ou gratuita por tempo determinado ou indeterminado, a fim de que este seja utilizado para fins específicos de urbanização, industrialização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social.

Sob este prisma, a partir deste conceito pode-se diferenciar o uso, a habitação, o direito de superfície, a concessão de uso e concessão de direito real de uso. Ademais, ao aprofundarmos no tema, analisamos as legislações que regulam o instituto e principalmente as inovações trazidas pela Lei 11.481/2007.

Neste passo, pondera-se que concessão de direito real de uso como um instrumento para as políticas urbanas vem demonstrando-se eficaz relativo ao planejamento urbano e a regulamentação fundiária dos municípios brasileiros.

Sob a ótica do Município de Gurupi, demonstrou-se que a concessão de direito real de uso foi utilizada, na sua maioria para fins de interesse social, sendo as áreas públicas do Município, doadas para igrejas, entidades filantrópicas e associações.

Destarte, considera-se que a concessão de direito real de uso é um instrumento vantajoso para a Administração Pública dispor de seus bens, pois além de resguardar seu patrimônio, não livra o concessionário de seus encargos e obrigações, além disto, quanto a sua importância para município de Gurupi, verifica-seque ao considerar a localização geográfica do mesmo, a concessão poderá ser utilizada para fins industriais, incentivando que indústrias se instalem na cidade. Assim, com mais incentivos do Poder executivo, através da concessão de direito real de uso para fins industriais, poderemos quem sabe, em tempos vindouros, ver uma Gurupi totalmente desenvolvida e fomentada em sua economia.

 

Referências

BEVILAQUA, Clovis. Direito das coisas, 2. ed. Brasília: Conselho Editorial, 2003. P.10.

 

BRASIL. Constituição da república federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Brasília, 5 de outubro de 1988. Disponível em: <httpl://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15.11.2017

 

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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 13ª Ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2013.p. 623.

 

Entrevistas

BARROS, Kleber Alves. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29. nov.2017.

 

NETO. Otocar José Moreira Neto. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29. nov.2017.

 

MOREIRA. Laurez. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29. nov.2017.

 

[1]VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 13ª Ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2013.p. 623.

[2]MELLO, Celso Antônio Bandeira de Curso de direito administrativo. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 535.

[3]GASPARINI, Diógenes, Direito administrativo, 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 115.

[4]BEVILAQUA, Clovis. Direito das coisas, 2. ed. Brasília: Conselho Editorial, 2003. p. 10.

[5] GONÇALVES, Luís da Cunha. Da propriedade e da posse. Lisboa: Ática, 1952.

[6]GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das doisas. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

[7]FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos reais, 7ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.

[8]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 26 ed., Atualizada, São Paulo, Malheiros, 2001, p. 485/490.

[9] MUKAI, Toshio. Direito e legislação urbanística no Brasil: história, teoria, prática – São Paulo: Saraiva.1988.p.147

 

[10] RANGEL. Tauã Lima Verdan. O instituto do uso em análise: comentários ao direito real limitado de gozo ou fruição.2012.Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-instituto-do-uso-em-analise-comentarios-ao-direito-real-limitado-de-gozo-ou-fruicao.html. Acesso em 13.11.2017

[11]FERNANDES, Edésio. Direito urbanístico e política urbana no brasil. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.101.

 

[12]FRANÇA, Vladimir da Rocha. Temas diversos sobre a concessão de direito real de uso celebrada por sociedade de economia mista. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE),Salvador, Instituto de Direito Público, nº14, maio/junho/julho,2008.p.6 Disponível em: http://www.direitodoestado.com.br/redae.asp. Acesso em: 13.11.2017.

[13]GONÇALVES, Vitor Fernandes. A concessão de direito real de uso na regularização fundiária do distrito federal. Revista do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, Brasília, v. 1, n. 5, p. 9-32, 2011. Anual.p.28. Disponível em:<https://www.mpdft.mp.br/revistas>. Acesso em 13.11.2017.

[14]CARVALHO, Celso Santos; ROSSBACH, Ana Claudia. O estatuto da cidade: comentado. São Paulo. Ministério das Cidades: Aliança das Cidades, 2010.p.95.

[15]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 21. Ed. rev. amp. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

 

[16]NETO. OTOCAR José Moreira Neto. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29.11.2017.

[17] BARROS, Kleber Alves. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29.11.2017.

[18] MOREIRA. Laurez. Entrevista concedida a Leandro Rodrigues. Gurupi. 29.11.2017

Âmbito Jurídico

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