Concessão de salário paternidade pelo mesmo período do salário maternidade em nascimento de múltiplos aos segurados do Regime Geral da Previdência Social

Resumo: O presente trabalho trata do recente acórdão do processo 5009679-59.2016.4.04.7200/SC da Terceira Turma Recursal da 4ª Região, de relatoria do Juiz Federal João Batista Lazzari, publicado no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) em 27 de abril de 2017, o qual abriu precedente para que nos casos de nascimentos de múltiplos haja a concessão tanto do salário maternidade quanto do salário paternidade pelo mesmo período. Dessa forma, o artigo discorre sobre os aspectos legais tanto do salário maternidade, como da licença paternidade, sendo que neste último irá também aborda os casos previstos em lei e os entendimentos jurisprudenciais de ampliação do período do benefício – também conhecido como salário paternidade. Por último, é feita a análise do acórdão objeto do presente trabalho, com o seu estudo, com o intuito de verificar se há a possibilidade de se aplicar também, por equiparação, nos casos dos segurados/pais de múltiplos do Regime Geral da Previdência Social.

Palavras-chave: Salário Maternidade. Salário Paternidade. Princípios.

Abstract: The present work deals with the recent judgment of the case 5009679-59.2016.4.04.7200 / SC of the Third Class of the Fourth Region, Federal Judge João Batista Lazzari, published in the Electronic Justice Diary (EJD) on April 27 of 2017, which set a precedent that in cases of multiple births, maternity pay and paternity pay should be granted for the same period. Thus, the article discusses the legal aspects of both, maternity wage and paternity leave, the last one also will deal with the cases provided by law and the jurisprudential understandings of the benefit period's extension – also known as paternity pay. Finally, the analysis of the judgment is done, which is the subject of the present study, with the purpose of verifying whether it is possible to apply also, by equality, in the cases of insured persons / parents of multiple births of the General Regime of Social Security.

Keywords: Maternity pay. Paternity pay. Principles

Sumário: Introdução. 1 Aspectos legais do salário maternidade. 2 O salário paternidade. 3 Das recentes decisões de gestação de múltiplos no Regime Próprio. Considerações Finais.

Introdução

Recentemente o acórdão no processo 5009679-59.2016.4.04.7200/SC de relatoria do Juiz Federal João Batista Lazzari, publicado em 27 de abril de 2017, trouxe decisão inédita, no Brasil, sobre a concessão da licença paternidade para servidor público federal com a mesma duração da licença maternidade em decorrência do nascimento de múltiplos (TRF4, 2017).

Não há, em nosso ordenamento, quaisquer regramentos que visam a proteção específica em caso de gêmeos recém-nascidos, apenas há, em tramitação, o Projeto de Lei 2932/2008 que visa ampliar o período de salário-maternidade e, como citado no corpo do acórdão mencionado, algumas decisões judiciais com a prorrogação de sua duração (TRF4, 2017).

Tendo em vista o explicitado, o objetivo do presente trabalho será definir se há a possibilidade de se aplicar, também aos segurados do regime geral da Previdência Social, que se assegure o atendimento simultâneo a gêmeos recém-nascidos por ambos os pais, nos mesmos moldes do acórdão objeto do presente estudo.

Salienta-se que a Previdência Social é formada pelo Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e pelo Regime Próprio da Previdência Social, ambos de filiação obrigatória (HIAGO, 2016).

Para Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari (2016, p. 243): “Entende-se por regime previdenciário aquele que abarca, mediante normas disciplinares da relação jurídica previdenciária, uma coletividade de indivíduos que têm vinculação entre si em virtude da relação de trabalho ou categoria profissional a que é submetida, garantindo a esta coletividade, no mínimo, os benefícios essencialmente observados em todo sistema de seguro social – aposentadoria e pensão por falecimento do segurado”.

O Regime Geral abrange obrigatoriamente todos os trabalhadores da iniciativa privada e, nos termos do artigo 201 da Constituição Federal de 1988, tem caráter contributivo e é de filiação obrigatória. Já o Regime Próprio é regido pelo artigo 40 do mesmo diploma legal, sendo segurado exclusivamente aos servidores públicos de cargos efetivos, podendo ser mantido pela União, os Estados ou os Municípios (CASTRO; LAZZARI, 2016): “Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. […]. Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º”.

A seguir, analisam-se os benefícios de salário maternidade e salário paternidade, para que se possa entender os aspectos que nortearam o acórdão prolatado e, por fim, verificar a sua eficácia para os segurados do Regime Geral da Previdência Social.

1 Aspectos legais do salário maternidade

Salário Maternidade “é o benefício devido em função do parto, inclusive nos casos de natimorto, de aborto não criminoso, da adoção ou da guarda judicial obtida para fins de adoção de criança pelo período estabelecido em lei, conforme o motivo da licença.” (GOES, 2016, p. 299).

O benefício tem o objetivo substituir a remuneração da mulher que necessita se afastar do trabalho para se dedicar aos cuidados especiais necessários da criança recém ingressada na família (TORRES, 2017).

O benefício é previsto na legislação nos artigos 71 a 73 da Lei 8213/91 e nos artigos 93 a 103 do Decreto 3048/99, sendo devido à segurada, tanto para a empregada, trabalhadora avulsa, contribuinte individual, a facultativa e a especial, pelo período em regra de 120 dias (IBRAHIM, 2016).

A Constituição Federal, além de seu artigo 201, II, também trata sobre o tema no artigo 7°, VIII: “Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […]; VIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 dias.

Dessa forma, a nossa Constituição Federal vislumbra a proteção à gestante “como um direito social à trabalhadora gestante em razão do nascimento do seu filho ou da adoção de uma criança, em razão dos cuidados e da atenção que deve ser voltada ao infante” (TORRES, 2017).

O salário maternidade possui finalidade social, buscando propiciar, além do descanso da mulher trabalhadora, que se garanta o contato da mãe com a criança nos primeiros meses de vida, visando a proteção tanto da mãe como a do filho. (HORVATH JÚNIOR, 2008).

Em casos de adoção e guarda provisória também é possível à segurada o benefício. Conforme trata o artigo 71 da Lei 8213/91 sobre a duração do benefício: “Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade”.

Aos casos de adoção ou guarda judicial, aplica-se o artigo 71-A do mesmo dispositivo: “Art. 71-A.  Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias. § 1º O salário-maternidade de que trata este artigo será pago diretamente pela Previdência Social. § 2º Ressalvado o pagamento do salário-maternidade à mãe biológica e o disposto no art. 71-B, não poderá ser concedido o benefício a mais de um segurado, decorrente do mesmo processo de adoção ou guarda, ainda que os cônjuges ou companheiros estejam submetidos a Regime Próprio de Previdência Social”.

Quanto à carência do benefício para as seguradas empregadas, para as trabalhadoras avulsas ou empregadas domésticas, independe do número de contribuições pagas. Já para as contribuintes individuais, as facultativas e as especiais o prazo de carência é de dez contribuições mensais. No caso da segurada especial há a necessidade da comprovação do exercício da atividade rural nos últimos dez meses anteriores ao parto/adoção (CASTRO; LAZZARI, 2016).

O período de carência pode ser reduzido no caso de parto antecipado, em que, de acordo com o parágrafo único do artigo 25 da lei 8213/91, o período será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que o parto foi antecipado (SANTOS, 2016).

Segundo Castro e Lazzari (2016, p. 997), relativo a renda mensal: “O salário maternidade consistirá numa renda igual à remuneração integral da segurada empregada e da avulsa. Para as demais seguradas consistirá: – em valor correspondente ao do seu último salário de contribuição, para a empregada doméstica; – em um salário mínimo, para a segurada especial; – em um doze avos da soma dos doze últimos salários de contribuição, apurados em período não superior a quinze meses, para as seguradas  enquadradas nas categorias de contribuição individual, facultativa e para as que mantenham a qualidade de segurada durante o período de graça”.

No caso da segurada empregada com remuneração variável, o valor destes será apurado pela médica aritmética corrigida dos últimos seis salários de contribuição. Salientando que em qualquer caso, não pode ser o benefício inferior a um salário mínimo (CASTRO; LAZZARI, 2015).

Com os novos conceitos de família evocados pela Constituição braileira, tornou-se necessário se reinterpretar o salário maternidade tendo em vista os “princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da isonomia, da proteção integral à criança e da proteção à família”. Essa reinterpretação é utilizada em casos como os de falecimento ou abandono pela mãe da criança logo após o parto e de adoção por homem solteiro ou por casal de homossexuais, por exemplo (TORRES, 2017).

2 O salário paternidade

Quando do nascimento da criança ou quando esta for adotada nasce o direito do pai à licença paternidade de 5 dias, conforme os artigo 7º, XIX da Constituição Federal de 1988 (CF/88) e art. 10, § 1º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT-CF/88): “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […] XIX – licença-paternidade, nos termos fixados em lei; […] Art. 10 § 1º Até que a lei venha a disciplinar o disposto no art. 7º, XIX, da Constituição, o prazo da licença-paternidade a que se refere o inciso é de cinco dias”.

A licença paternidade tem como função principal o incentivo ao registro civil do recém-nascido. “Isto é, considerando a fragilidade da mãe após o parto possibilita ao pai a ausência no trabalho para providenciar o registro” (ALBUQUERQUE, 2015).

Difere do salário maternidade justamente por não ter caráter previdenciário, não assegurando garantia de emprego, sendo mera interrupção do trabalho, não podendo o empregador descontar pelos dias não trabalhados (ALBUQUERQUE, 2015).

Haja vista que a mulher, cada vez mais, está ganhando espaço no mercado de trabalho e os homens, por sua vez, estão participando mais na criação dos filhos e nas atividades domésticas, “não cabe a diferenciação quanto a importância do pai e/ou da mãe no desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social do infante” (TORRES, 2017).

Como retrata Albuquerque (2015), tendo em vista a existência mais crescente de famílias não convencionais, muitas vezes sem a figura materna, se teve a necessidade da adequação do benefício previdenciário: “Foi de extrema necessidade a adequação dos direitos de licença maternidade e salário maternidade à realidade das famílias atuais o que ampliou os direitos aos trabalhadores do sexo masculino quando necessários para a proteção, cuidado e adaptação da criança sob sua tutela”.

Desta forma, aos homens tem sido concedido o recebimento do benefício em casos como os de guarda ou adoção e nos casos de abandono ou falecimento da mãe da criança, situação em que será pago o benefício ao cônjuge ou companheiro sobrevivente (CASTRO; LAZZARI, 2015).

De acordo com Fernandes Torres (2017), foi com o advento da Constituição Federal, com o reconhecimento das novas estruturas familiares e com o trabalho hermenêutico de ajustamento que foi alterada a Lei 8213/1991 pela Lei 12.873/2013 “reconhecendo ao segurado do sexo masculino o direito à licença-paternidade e ao salário-paternidade, no caso de adoção e nos casos de falecimento da mãe, nos mesmos moldes do concedido à mulher”.

Justifica-se, portanto, essa crescente concessão do benefício à figura paterna, tendo em vista a proteção à criança, necessitando ser este o responsável pelos primeiros cuidados, o que demandaria tempo disponível e afastamento de suas atividades laborais e, caso não concedesse, correria risco alimentar para o pai e o filho (ALBUQUERQUE, 2015).

3 Das recentes decisões de gestação de múltiplos no Regime Próprio

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) recentemente trouxe decisão inédita referente ao caso de recebimento concomitante de ambos os pais de salário maternidade e salário paternidade no caso de gestação de múltiplos, de relatoria do Juiz Federal João Batista Lazzari: “ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. NASCIMENTO DE MÚLTIPLOS. CONCESSÃO DA LICENÇA-PATERNIDADE COM A MESMA DURAÇÃO DA LICENÇA-MATERNIDADE. VALOR DO AUXÍLIO-NATALIDADE DEVIDO POR CADA FILHO. APLICAÇÃO DA EQUIDADE. FINS SOCIAIS E EXIGÊNCIAS DO BEM COMUM. PRINCÍPIOS DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DA PRIORIDADE ABSOLUTA. PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS FILHOS. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DA FAMÍLIA E DA CRIANÇA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS. 1. A Constituição Federal, em seu art. 226, garante proteção especial do Estado à família e à criança. O art. 227, prevê como dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde, bem como à convivência familiar. O art. 229, por sua vez, estabelece o dever dos pais de assistir, criar e educar os filhos menores. 2. O nascimento de múltiplos, no caso em julgamento de gêmeos, requer o acompanhamento de mais de uma pessoa para o atendimento das necessidades básicas dos recém-nascidos. 3. A presença do pai e sua participação na rotina dos bebês são fundamentais no desenvolvimento da relação de convivência e de afeto entre pais e filhos autorizando a concessão da licença-paternidade com a mesma duração da licença-maternidade. 4. Em caso de parto múltiplo, o valor do auxílio-natalidade deve ser multiplicado pelo número de filhos. Inconstitucionalidade incidental do § 1º, do art. 196, da Lei nº 8.112/1990. 5. A utilização da equidade, especialmente nos casos em que a lei não oferece decisão adequada, encontra respaldo na Lei dos Juizados Especiais. 6. Parcial provimento para que a atualização monetária e juros seja em conformidade com o art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com a redação da Lei n. 11.960/2009, incluindo a taxa referencial e os juros de forma simples, conjuntamente, desde quando devidos os valores em atraso.” (RECURSO CÍVEL Nº 5009679-59.2016.4.04.7200/SC; RELATOR: JOÃO BATISTA LAZZARI).

O entendimento da decisão se embasou no Princípio Constitucional do Melhor interesse da Criança e da Prioridade Absoluta, em que na CF em seus artigos 226, 227 e 229 garantem a proteção ao menor: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. […]. Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. (CF/88).

Segundo Sarlet (2017, p. 707), a proteção à infância e maternidade mencionada no artigo 227 da CF/88 há como “atrelar medidas normativas e fáticas vinculadas a concretização de tal direito ao direito-garantia ao mínimo existencial”, em que a sobreposição parcial desses direito com outros, desde que bem compreendida e dogmaticamente consistente constituiu eficaz e efetivo para a proteção aos direitos à infância e à maternidade.

Conforme observado no Acórdão do Recurso de Apelação, há a necessidade de mais de uma pessoa para o atendimento básico de gêmeos recém-nascidos, em que a decisão trata “de reconhecer a importância da participação do progenitor paterno na constituição da família, não apenas como provedor material, mas também sentimental” (TRF4, RC 5009679-59.2016.4.04.7200/SC, 2017).

Na decisão, o relator também levou em consideração que o desenvolvimento das crianças será simultâneo, bem como os cuidados que demandam, em que ao ser cuidado por apenas um dos pais, poderá se perder a proteção integral dos menores recém-nascidos. Reforça a decisão (TRF4, RC 5009679-59.2016.4.04.7200/SC, 2017): “Resta evidente que, a formação de um ser humano psicologicamente saudável tem intrínsica relação com os laços afetivos formados em sua infância. Daí, a importância de se proteger e valorizar, constitucionalmente e infraconstitucionalmente, a instituição familiar, base da sociedade”.

Desta forma, o acórdão teve por base o princípio da equidade em que o “juiz pode adotar em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais das leis e às exigências do bem comum”, concluindo que o salário paternidade seja concedido em período equivalente ao salário maternidade, dando melhores condições ao exercício da paternidade, possibilitando pleno atendimento aos recém-nascidos, tutelando o direito das crianças e o desenvolvimento da relação de convivência e afeto familiar (TRF4, RC 5009679-59.2016.4.04.7200/SC, 2017).

Salienta-se que no ordenamento jurídico brasileiro não há nenhum regramento relacionado à gravidez de gêmeos, tramitando apenas na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) n° 2932/2008, que busca aumentar por mais 60 dias o salário-maternidade nos casos (TRF4, 2017): Art. 2º A Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 71-B: ‘Art. 71-B. O salário-maternidade é devido por mais 60 (sessenta) dias em caso de: I – nascimento múltiplo; II – nascimento prematuro; III – nascimento de criança portadora de doença ou malformação grave, que demande, em conseqüência, maior atenção que a normalmente dispensada ao recém-nascido em circunstâncias normais’.”

Para o Juiz João Batista Lazzari cabem as palavras da magistrada sentenciante, Juíza Simone Barbisan Fortes (TRF4, RC 5009679-59.2016.4.04.7200/SC, 2017): “Apesar de os estudos caminharem no sentido de ampliação da licença-maternidade com a prorrogação de sua duração destinada às mães, tenho que, no caso de nascimento de múltiplos, em princípio, essa possível extensão não assegurará o que se busca: assegurar o direito dos menores a sua proteção integral, minimizando eventual negligência propiciada pela impossibilidade de atenção e cuidado simultâneos pela mesma pessoa”.

Com base na decisão inédita acima, tem-se dado nova interpretação jurisprudencial ao caso, aparecendo novas decisões sobre a mesma matéria, como a de tutela antecipada concedida no processo que tramita no Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Alvorada no Rio Grande do Sul, processo n° 9002599-89.2017.8.21.0003, que concedeu o mesmo benefício a servidor público estadual, por também considerar necessário o acompanhamento do genitor durante o período de 180 dias, favorecendo o suporte necessário durante o desenvolvimento dos gêmeos em suas necessidades básicas (TRF4, 2017).

A decisão teve, inclusive, embasamento no estudo de hermenêutica de Eros Grau (2006, p. 120): “Embora o intérprete esteja vinculado pelos textos, especialmente pelos textos dos princípios, o fato de a interpretação consubstanciar uma prudência importa que possa variar, ainda em determinado e específico espaço de tempo, o entendimento que diversas autoridades judiciárias atribuam a um mesmo texto, ao decidir questões idênticas entre si. Mencionei anteriormente, a impossibilidade de atribuirmos a qualquer decisão interpretativa a qualidade de verdadeira ou falsa (concebida a verdade, aí, como “adequatio reiet intelectus”). Poder-se-á quando muito, afirmar que estas ou aquelas, entre elas, logicamente verdadeiras, na medida em que se relacionam logicamente os argumentos usados para justificá-las e elas próprias (isso, contudo, não atesta senão a sua correção). Além de tudo, as decisões interpretativas são sempre tomadas em função e em razão de um problema. E as soluções atribuíveis aos problemas jurídicos não são definíveis, exclusivamente, a partir de atribuição de um ou outro significado a determinado texto, porém desde a ponderação de variáveis múltiplas”.

Salienta-se também, o entendimento do STJ sobre o tema, segundo as palavras de Castro e Lazzari (2016, p. 194): “Segundo orientação do STJ, é de ser observada a vetusta regra de hermenêutica, segundo a qual “onde a lei não restringe, não cabe ao interprete restringir”. Portanto, inexistindo dentre as normas que regem a matéria restrição à prestação postulada, não subsiste o óbice imposto ao direito perseguido pelos beneficiários. Nesse sentido: Resp 1.082.631/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, Dje de 26.03.2013”.

Então, tem-se que o entendimento jurisprudencial ao conceder o benefício simultaneamente ao genitor servidor público e à genitora, traz a proteção ao bem estar dos recém-nascidos, repercutindo a sua adoção também em outras esferas de servidores públicos, como os estaduais.

Considerações Finais

O recente julgado do TRF4 inovou ao permitir que ambos os pais possam estar presentes nos primeiros meses de vida de filhos múltiplos, entendendo as necessidades especiais que essas situações geram na criação dos filhos.

Analisando o acórdão prolatado, vê-se que a decisão se embasou nos princípios constitucionais do Melhor Interesse da Criança e da Prioridade Absoluta dos artigos 226, 227 e 229 da CF/88, igualmente aplicáveis a qualquer cidadão (TRF4, 2017).

A questão do presente artigo seria justamente de questionar sobre a viabilidade de se ter idêntica decisão nos casos de segurados do Regime Geral da Previdência Social.  Se tem que o artigo 71-A em seu § 2° da Lei 8213/1991 veda o benefício a mais de um segurado, nos casos do mesmo processo de adoção ou guarda, mas não há qualquer vedação aos casos de nascimento de múltiplos: § 2º Ressalvado o pagamento do salário-maternidade à mãe biológica e o disposto no art. 71-B, não poderá ser concedido o benefício a mais de um segurado, decorrente do mesmo processo de adoção ou guarda, ainda que os cônjuges ou companheiros estejam submetidos a Regime Próprio de Previdência Social.” (grifo nosso).

Nesse sentido, o próprio relator do acórdão, em obra doutrinária conjunta afirma que “em caso de múltiplas adoções ou guardas judiciais de crianças, pela mesma segurada, na mesma data. Somente será devido o valor de um salário-maternidade, a exemplo do que ocorre quando a segurada, mãe biológica, dá a luz a gêmeos”. (CASTRO; LAZZARI, 2016).

Resta questionar é se o relator modificou a sua posição anterior ou não entenda que o caso se aplicaria aos segurados do Regime Geral da Previdência Social.

Como bem observa o acórdão, o nascimento de gêmeos requer a presença de mais de uma pessoa para as necessidades básicas, assegurando a proteção integral dos recém-nascidos, que requerem atenção simultânea. Sendo a presença paterna essencial para o desenvolvimento do menor, tendo em vista os novos conceitos de família em que o pai tem papel mais ativo na criação dos filhos, tem-se que este virá a auxiliar na formação de seus filhos, visando serem psicologicamente mais saudáveis (TRF4, 2017).

Portanto, nesses casos, deve-se se utilizar do princípio da equidade, adotando a decisão mais justa e equânime para atender os fins sociais, principalmente quanto à proteção constitucional da família e a absoluta prioridade no atendimento à criança.

 

Referências
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Informações Sobre os Autores

Luciana Guaragni Zanin

Advogada MBA em Direito da Economia e da Empresa pela FGV Pós-graduada em Direito da Seguridade Social pela UCAM em Prática Previdenciária pela UCAM em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário pela FACEL membro do núcleo de pesquisa e escrita científica da Faculdade Legale

Rodrigo Moreira Sodero Victório

Advogado, com especialização em Direito Previdenciário e em Direito do Trabalho. Coordenador e Professor de Direito Previdenciário da especialização e cursos de extensão da Faculdade Legale, do Legale Cursos Jurídicos


Equipe Âmbito Jurídico

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