Resumo: O presente artigo científico tem por finalidade fazer uma análise concisa acerca dos principais aspectos hermenêuticos acerca do teor dos artigos 774 e 801, ambos do Código Civil.
Palavras-chave: aspectos. hermenêuticos.código.civil.
Abstract. This research paper aims to make a concise analysis on the key hermeneutical issues on the content of articles 774 and 801, both of the Civil Code.
Keywords: hermeneutical.issues.civil.code.
Sumário: Introdução. 1. Considerações iniciais. 2. Da irretroatividade da lei. 3. Da correta interpretação do art. 774 do Código Civil. 4. Do cotejo hermenêutico entre o art. 774 e o § 2º do art. 801, ambos do Código Civil. Conclusão.
Introdução
O presente artigo visa apontar as principais controvérsias hermenêuticas acerca do teor do art. 774 e o § 2º do art. 801, ambos do Código Civil.
1. Considerações iniciais
O § 2º do art. 801 do Código Civil determina que:
“Art. 801. O seguro de pessoas pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito de grupo que a ela, de qualquer modo, se vincule.
§ 1o O estipulante não representa o segurador perante o grupo segurado, e é o único responsável, para com o segurador, pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais.
§ 2o A modificação da apólice em vigor dependerá da anuência expressa de segurados que representem três quartos do grupo.”
Interpretando o preceito acima transcrito, Maria Helena Diniz [1] aduz:
“O seguro de pessoa pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em favor de grupo a que pertence. O estipulante, que não é representante do segurador perante o grupo segurável, responsabiliza-se pelo adimplemento dos deveres contratuais assumidos pelo grupo, inclusive pela arrecadação do prêmio a ser entregue ao segurador. O grupo segurado deverá, havendo o descumprimento contratual, agir diretamente contra o segurador. O estipulante apenas tem a função de firmar o contrato entre o segurador e o grupo. (…) Para se alterar a apólice dessa modalidade de seguro será preciso o consenso expresso de segurados que representem ¾ do grupo beneficiado pelo contrato, retirando-se, assim, do estipulante o poder de modificá-lo, sem o consenso da maioria dos segurados.”
Da análise do preceito legal acima nominado, podemos extrair as seguintes conclusões preliminares:
-Pode ser celebrado seguro de pessoas em favor de grupo por meio de pessoa física ou jurídica (estipulante);
-O estipulante deverá possuir algum vínculo (jurídico, trabalhista, etc) em relação ao grupo que será segurado;
-Em relação ao grupo segurado, o estipulante não representa o segurador; e
-Em relação ao segurador, o estipulante é o único que responde pelas obrigações decorrentes do contrato de seguro.
No que concerne à modificação da apólice, verifica-se que:
– Para que a modificação da apólice ocorra, ela deverá ser efetivada durante a sua vigência, ou seja, até o último dia fixado no contrato como termo final de vigência da apólice;
– Para que a modificação da apólice seja válida, é necessária a aquiescência prévia e expressa de ¾ do grupo segurado;
– Interpretando o § 2º do art. 801 do Código Civil à luz do Princípio da Razoabilidade, conclui-se que somente as modificações na apólice que tragam qualquer forma de ônus a qualquer membro do grupo segurado dependerão de aquiescência prévia e expressa de ¾ do grupo segurado;
– O teor do § 2º do art. 801 do Código Civil contém uma norma de tutela que não pode ser afastada por qualquer modalidade de hermenêutica, porquanto a ratio legis foi evitar que um grupo considerável de pessoas, que não integram diretamente a relação contratual, seja lesado por meio de modificações na apólice que tragam qualquer forma de ônus a qualquer membro do grupo segurado; e
– Por se tratar de norma de tutela de um grupo de pessoas que não são parte no contrato e por se tratar de seguro de pessoas, a hermenêutica aplicável ao caso é a gramatical.
Ante o exposto, as modificações ocorridas em apólice, durante a sua vigência, que acarretem qualquer tipo de ônus a qualquer integrante do grupo segurado, dependerão da aquiescência prévia e expressa de ¾ do grupo retro nominado.
2. Da irretroatividade da lei
Segundo o Princípio da Irretroatividade das Leis, qualquer lei em sentido formal não retroage seus efeitos para antes de sua publicação ou início de vigência (neste último caso, se houver vacatio legis), excetuando a lei penal que beneficia o réu.
Nesse diapasão, a análise quanto à validade dos endossos sob a ótica do § 2º do art. 801 do Código Civil se refere aos endossos efetuados após o início da vigência do novo Código Civil, ou seja, 11.01.2003.
Assim sendo, conclui-se que a regra de que as modificações ocorridas em apólice, durante a sua vigência, que acarretem qualquer tipo de ônus a qualquer integrante do grupo segurado, dependerão da aquiescência prévia e expressa de ¾ do grupo retro nominado se aplica aos endossos nas apólices de seguro coletivo realizados após 11.01.2003. No caso de endosso nas apólices de seguro coletivo realizado antes da vigência do novo Código Civil, aplica-se o art. 21 do Decreto-Lei nº 73/66.
3. Da correta interpretação do art. 774 do Código Civil
O art. 774 do Código Civil dispõe que:
“Art. 774. A recondução tácita do contrato pelo mesmo prazo, mediante expressa cláusula contratual, não poderá operar mais de uma vez.”
Interpretando o preceito acima transcrito, Maria Helena Diniz [2] afirma que:
“A protelação negocial deduzida do comportamento dos contratantes, que continuam o contrato mediante expressa cláusula contratual, após o seu vencimento, pelo mesmo prazo, mantendo as mesmas condições, não poderá dar-se mais de uma vez. A recondução automática do contrato só poderá operar-se uma única vez, sendo vedada a reiterada sucessividade, ante a necessidade de nova avaliação de riscos ou a possibilidade de ter havido, com o passar do tempo, alguma mudança no objeto segurado.” (Código Civil Anotado – Maria Helena Diniz – Ed. Saraiva)
A recondução do contrato mencionada no art. 774 do Código Civil equivale à renovação ou prorrogação contratual, podendo ser definida como a alteração ou aditivo contratual referente à sua vigência, ou seja, a prorrogação contratual implica na alteração no termo final de vigência do contrato, podendo ocorrer de forma expressa ou tácita.
Nesse diapasão, a alteração/postergação do termo final da avença poderá ocorrer por mútuo acordo entre as partes (recondução expressa) ou por meio de atos ou condutas das quais se depreendam a vontade de permanecer vigente o contrato além do termo final inicialmente estipulado (recondução tácita).
No caso dos contratos de seguro, foram fixadas diversas condições para a recondução tácita contratual, “ante a necessidade de nova avaliação de riscos ou a possibilidade de ter havido, com o passar do tempo, alguma mudança no objeto segurado” [3] (Código Civil Anotado – Maria Helena Diniz – Ed. Saraiva).
Com efeito, para que ocorra a recondução tácita dos contratos de seguro é necessário:
● Que outra recondução tácita ainda não tenha ocorrido, tendo em vista que ela só pode ocorrer uma única vez;
● Que a alteração do prazo de vigência ocorra de modo que o novo prazo seja idêntico ao anterior; e
● Que haja expressa cláusula contratual prevendo a possibilidade de recondução tácita do contrato de seguro.
4. Do cotejo hermenêutico entre o art. 774 e o § 2º do art. 801, ambos do Código Civil
A distinção feita pelo Código Civil entre a renovação expressa e a renovação tácita nos contratos de seguro teve como objetivo restringir a ocorrência da prorrogação tácita, de modo que a prorrogação expressa se tornasse a regra.
Logo, é conveniente que a prorrogação ou renovação nos contratos de seguro seja feita de forma expressa, por mútuo acordo entre as partes, os quais poderão reavaliar os riscos contratualmente cobertos, bem como o estado atual do próprio objeto do seguro. Por outro lado, o legislador não quis vedar a prorrogação tácita, apenas condicionou a sua ocorrência, com o objetivo de facilitar e dinamizar o processo de renovação dos contratos de seguro.
Assim sendo, entendo que a regra do art. 774 do Código Civil não conflita, em nenhum momento, com a norma de tutela prevista no § 2º do art. 801 do Código Civil.
Com efeito, para fins de aplicação do § 2º do art. 801 do Código Civil, é irrelevante que a renovação tenha ocorrido de forma expressa ou tácita. O que é relevante é a ocorrência de alteração na apólice que implique em ônus a qualquer integrante do grupo segurado.
Assim, a renovação do contrato não representa um novo contrato, mas apenas uma alteração ou aditivo do contrato original, no sentido de alterar o termo final de vigência da avença.
Assim sendo, a alteração ou aditivo do termo final de vigência do contrato original poderá ser expressa ou tácita, conforme seja decorrente de mútuo acordo entre as partes ou decorrente de atos ou condutas das quais se depreendam a vontade de permanecer vigente o contrato além do termo final inicialmente estipulado.
Nesse diapasão, qualquer assertiva no sentido de que se exaure a vigência da apólice quando se pactua a renovação do contrato não se coaduna com os ditames do Direito Civil, porquanto a renovação, repactuação ou prorrogação consiste, apenas, no prolongamento do interregno de vigência do contrato, não representando, destarte, situações distintas que requeiram tratamentos díspares. Portanto, é irrelevante, para fins de incidência do § 2º do art. 801 do Código Civil, que a alteração na apólice ocorra durante o prazo de vigência original ou durante o novo prazo de vigência alterado por meio de aditivo contratual.
Ante ao Princípio da Facultatividade inerente a todas as relações contratuais, ninguém (pessoa física ou jurídica) é obrigado a manter-se em relação contratual além da vigência previamente fixada.
Ocorre, porém, que a renovação tácita automática prevista no art. 774 do Código Civil é decorrente de cláusula expressa anterior que faculta ambas as partes à renovação automática tácita por uma única vez CASO não ocorra a renovação expressa. Em outras palavras, se, no término da vigência do contrato, as partes contratuais (seguradora e segurado) não prorrogarem expressamente o contrato, a renovação tácita poderá ocorrer, uma única vez, em função de cláusula expressa anterior.
O Princípio da Facultatividade dos contratos ocorre no momento da celebração da avença e nas renovações.
No caso dos contratos de seguro, não haveria a manutenção ad eternum dos mesmos valores e condições fixados no pacto inicial, porquanto a renovação tácita automática poderá ocorrer uma única vez. Da mesma forma, a prorrogação expressa não obriga qualquer das partes a manter-se na avença, podendo qualquer delas se retirar caso entendam que as condições do contrato deixaram de ser satisfatórias.
Considerando que no dia seguinte ao termo final da vigência do contrato não prorrogado o contrato original deixa de existir juridicamente, conclui-se que a prorrogação ou renovação contratual deverá ocorrer até o último dia em que o contrato estiver em vigor. A prorrogação de contrato já extinto, ou seja, a partir do dia seguinte ao termo final de vigência do contrato não é válida, razão pela qual a prorrogação contratual efetuada após o termo final do contrato representa um novo contrato. Nesses casos, não incidirá a regra contida no § 2º do art. 801 do Código Civil.
Conclusão
A regra de que as modificações ocorridas em apólice, durante a sua vigência, que acarretem qualquer tipo de ônus a qualquer integrante do grupo segurado, dependerão da aquiescência prévia e expressa de ¾ do grupo retro nominado se aplica aos endossos nas apólices de seguro coletivo realizados após 11.01.2003. No caso de endosso nas apólices de seguro coletivo realizado antes da vigência do novo Código Civil, aplica-se o art. 21 do Decreto-Lei nº73/66.
A alteração ou aditivo do termo final de vigência do contrato original poderá ser expressa ou tácita, conforme seja decorrente de mútuo acordo entre as partes ou decorrente de atos ou condutas das quais se depreendam a vontade de permanecer vigente o contrato além do termo final inicialmente estipulado.
Para que ocorra a recondução tácita dos contratos de seguro é necessário:
● Que outra recondução tácita ainda não tenha ocorrido, tendo em vista que ela só pode ocorrer uma única vez;
● Que a alteração do prazo de vigência ocorra de modo que o novo prazo seja idêntico ao anterior;
● Que haja expressa cláusula contratual prevendo a possibilidade de recondução tácita do contrato de seguro.
Para fins de aplicação do § 2º do art. 801 do Código Civil, é irrelevante que a renovação tenha ocorrido de forma expressa ou tácita.
A renovação do contrato não representa um novo contrato, mas apenas uma alteração ou aditivo do contrato original, no sentido de alterar o termo final de vigência da avença. Portanto, é irrelevante, para fins de incidência do § 2º do art. 801 do Código Civil, que a alteração na apólice ocorra durante o prazo de vigência original ou durante o novo prazo de vigência alterado por meio de aditivo contratual.
Ante ao Princípio da Facultatividade inerente a todas as relações contratuais, ninguém (pessoa física ou jurídica) é obrigado a manter-se na relação contratual além da vigência previamente fixada. Outrossim, o Princípio da Facultatividade dos contratos ocorre no momento da celebração da avença e nas renovações.
A renovação tácita automática prevista no art. 774 do Código Civil é decorrente de cláusula expressa anterior que faculta ambas as partes à renovação automática tácita por uma única vez CASO não ocorra a renovação expressa.
Considerando que no dia seguinte ao termo final da vigência do contrato não prorrogado o contrato original deixa de existir juridicamente, conclui-se que a prorrogação ou renovação contratual deverá ocorrer até o último dia em que o contrato estiver em vigor. A prorrogação de contrato já extinto, ou seja, a partir do dia seguinte ao termo final de vigência do contrato não é válida, razão pela qual a prorrogação contratual efetuada após o termo final do contrato representa um novo contrato. Nesses casos, não incidirá a regra contida no § 2º do art. 801 do Código Civil.
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