Da confusão: conceito, requisitos, fontes, espécies e seus efeitos

Resumo: O instituto da confusão está previsto no artigo 381 e seguintes do nosso Código Civil. Consiste na reunião, em uma única pessoa, nas qualidades de credor e devedor, sendo necessário alguns requisitos para que haja a confusão. Esta confusão pode ser total ou parcial e tem um objetivo específico que é a extinção da obrigação. Pode também cessar a confusão e se restabelecer a obrigação. O conceito, requisitos, fontes, espécies e efeitos estão detalhados de tal forma que possa possibilitar uma melhor clareza na interpretação deste assunto.[*]

Palavras-chave: confusão, extinção, credor e devedor, .


Sumário: Introdução, 1. Conceito, 2. Requisitos, 3 Fontes, 4. Espécies, 5. Efeitos, Conclusão, Referências Bibliográficas


INTRODUÇÃO


Para entendermos melhor a “confusão” no direito civil brasileiro, precisamos entender seu significado. O termo confusão advém da palavra latina confusio, onis, significando mistura, mescla, desordem, fusão, dentre outras acepções. A palavra confusio descende do verbo latino confundo, is, confudi, confusum, ere,indicando misturar, reunir, confundir, ajuntar, sendo formado pela união da preposição cum (com) e do verbo fundo,(derramar, verter, fundir, derreter, etc). Sendo assim, confusão apresenta o sentido de fundir com, misturar, reunir.


Em termos jurídicos encontramos o termo confusão em três concepções diferenciadas: A primeira representa a mescla de várias matérias líquidas pertencentes a pessoa diversa, de tal forma que seria impossível separá-las. Na segunda acepção, indica a reunião, numa mesma pessoa, de diversos direitos sobre bem corpóreo ou incorpóreo, os quais anteriormente se encontravam separados e na terceira encontramos a confusão a qual estudaremos a seguir, onde designa o concurso, na mesma pessoa, das qualidades de credor e devedor de uma obrigação.


Enfim, em termos jurídicos, a confusão na primeira e segunda concepção encontram-se no direito das coisas e a terceira no direito das obrigações.


A confusão é, no direito das obrigações, uma forma de extinção de obrigação, e consiste em confundir-se, na mesma pessoa, as qualidades de credor e devedor. Ocorre quando o crédito e o débito se unem em uma só pessoa, extinguindo a obrigação. Esta podendo ser total, onde toda a dívida é extinta ou podendo ser parcial extinguindo-se somente uma parte da dívida.


1  CONCEITO


Como sabemos no direito das obrigações são necessários dois pólos: um credor do lado ativo e um devedor do lado passivo. Se essas duas qualidades (credor e devedor) encontrarem-se em uma só pessoa, dá-se a confusão. Portanto:


“Confusão é a aglutinação, em uma única pessoa e relativamente à mesma relação jurídica, das qualidades de credor e devedor, por ato inter vivos ou causa mortis, operando a extinção do crédito. Em razão do impedimentum prestandi, ou seja, da impossibilidade do exercício simultâneo da prestação e da ação creditória, ter-se-á a extinção da obrigação.” (DINIZ, 2007, p. 350)


Em razão disso, dispõe o artigo 381 do Código Civil: Extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor. Assim, se reunindo na mesma pessoa, as qualidades de credor e devedor, dá-se a confusão e a obrigação se extingue.


Neste sentido, Gonçalves (2002, p.97) se essas duas qualidades, por alguma circunstância, encontram-se em uma só pessoa, extingue-se a obrigação, porque ninguém pode ser juridicamente obrigado para consigo mesmo ou propor demanda conta si próprio.


2 REQUISITOS


Para caracterizar a confusão, são necessários os seguintes requisitos:


2.1 Unidade da relação obrigacional


Esta unidade pressupõe, portanto, a existência do mesmo crédito ou da mesma obrigação;


2.2 União, na mesma pessoa, das qualidades de credor e devedor


Pois apenas quando a pretensão e a obrigação concorrerem no mesmo titular é que se terá a confusão;


2.3 Ausência de separação dos patrimônios


De modo que, por exemplo, aberta a sucessão, não se verificará a confusão enquanto os patrimônios do de cujus e do herdeiro permanecerem distintos, não incorporando o herdeiro, em definitivo, o crédito ao seu próprio patrimônio.


Neste sentido Venosa (2003, p. 322), o caso de herança, existindo sempre o benefício do inventário (art. 1792; antigo, art. 1587), temos que ver que enquanto houver separação de patrimônios entre credor e devedor, isto é, enquanto não houver partilha, não se opera a confusão.


3  FONTES


A confusão pode se originar de uma transmissão universal de patrimônio, o mais comum é a causa mortis. Pode ocorrer por ato entre vivos quando, por exemplo, uma empresa, credora de outra, vem a receber todo o patrimônio da outra. Pode também, o fenômeno derivar de cessão de crédito, de sub-rogação.


“O casamento sob o regime da comunhão universal poderá acarretar confusão, quando marido e mulher, antes das núpcias, eram credor e devedor, dando-se, então, a comunicação dos matrimônios e conseqüentemente a extinção da relação obrigacional.” (DINIZ, 2007, p. 350)


A confusão ocorre com mais freqüência nas heranças onde o caso mais comum é o do filho que deve ao pai e é sucessor deste. Morto o credor, o crédito transfere ao filho, que é exatamente o devedor (GONÇALVES, 2004, P. 339).


Também pode ocorrer a confusão quando o Estado é condenado a pagar as custas judiciais no processo. São claras as jurisprudências no sentido de:


“APELAÇÃO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DA CUSTAS PROCESSUAIS. CARTÓRIO JUDICIAL ESTATIZADO. DESCABIMENTO. Tratando-se de Cartório Judicial estatizado, o Estado do Rio Grande do Sul está isento do recolhimento de custas processuais, observada a existência de confusão entre credor e devedor.” (Apelação Cível nº 70036278687, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em: 28/05/2010).


No caso de Cartório judicial privatizado, diz a jurisprudência o seguinte:


“APELAÇÃO CÍVEL. HONORÁRIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. CONFUSÃO. CUSTAS. CARTÓRIO PRIVATIZADO. PAGAMENTO PELA METADE. PARCIAL PROVIMENTO LIMINAR. Colhe-se do site do TJ na internet que o Cartório da 1ª Vara Cível da Comarca de Pelotas é privatizado. Portanto, o Estado deve pagar emolumentos pela metade, conforme dispõe a alínea a do art. 11 do Regimento de Custas do Estado.” (Apelação cível nº 70022194781, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS. Relator: Des. Irineu Mariani. Julgado em 13/12/2007)


4  ESPÉCIES


Dispões o artigo 382 do Código Civil: A confusão pode verificar-se a respeito de toda a dívida, ou só de parte dela.


Pela redação dada a este artigo fica claro que a confusão pode extinguir a dívida em sua totalidade ou apenas parte dela. Pode ser, portanto, total ou parcial.


“Pode ser, portanto, total ou parcial. Na última, o credor não recebe a totalidade da dívida, por não ser o único herdeiro do devedor. Por exemplo, os sucessores do credor são dois filhos e o valor da quota recebida pelo descendente devedor é menos do que a sua dívida.” (GONÇALVES, 2002, p. 98)


5  EFEITOS


No direito das obrigações, a confusão tem como efeito primordial a extinção da obrigação. Para GONÇALVES (2004, p. 340), “A confusão extingue não só a principal mas também os acessórios, como a fiança e o penhor, por exemplo, pois cessa para o fiador e outros garantes o direito de regresso, incompatível com os efeitos da confusão.”


Para Maria Helena Diniz (2007, p.352):


“Claro está, pelo art. 381 do Código Civil, que um dos efeitos da confusão é operar a extinção da obrigação, desde que na mesma pessoa se aglutinem as qualidades de credor e devedor. Se acarretar a extinção da obrigação principal, ipso facto extinguir-se-á a relação acessória, já que accessorium sequitur principale;”


Por outro lado, a recíproca não é verdadeira. A obrigação principal que foi contraída pelo devedor permanecerá, se a confusão ocorrer nas pessoas do credor e fiador ou fiador e devedor. No primeiro caso (credor e fiador), extingue-se a fiança, porque ninguem pode ser fiador de si próprio. Já no segundo (fiador e devedor), desaparece a garantia porque deixa de oferecer qualquer vantagem para o credor.


CONCLUSÃO


Como vimos, o vínculo obrigacional é formado por dois pólos, credor e devedor, sendo que havendo a confusão entre ambos caracterizar-se-á confusão, de tal forma, que não há como a dívida vir a ser cobrada. Por isso a confusão é tida como uma forma extintiva da obrigação, podendo extinguir toda ( confusão total ou própria) ou somente parte dela (parcial ou imprópria). Porém, podem as dívidas serem restauradas, no casso da cessação da confusão.


 


Referências bibliográficas

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral das obrigações. 22. ed. rev. e atual, de acordo com a Reforma do CPC — São Paulo: Saraiva, 2007.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70036278687. Estado do Rio Grande do Sul (apelante) x Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul (apelado). Relator: Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, 28/05/2010. DJ 08/06/2010.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70022194781. Estado do Rio Grande do Sul (apelante) x  Tatiana Lobeira da Fonseca (apelado). Relator: Des. Irineu Mariani, 13/12/2007. DJ 14/01/2008.

GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, vol. II: obrigações. 9 ed. Rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol 2: teoria geral das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2004.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações (parte geral), vol 5: sinopses jurídicas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil – vol.2: teoria geral das obrigações. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil.: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003.


Nota:

[*] Artigo orientado pela professora MsC. Rossana de Lima Machado.

Informações Sobre o Autor

Rafael de Oliveira Jaques Jardim

Acadêmico do Curso de Direito da Universidade da Região da Campanha – Campus Universitario de Alegrete


Equipe Âmbito Jurídico

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