Direito à vida: uma breve análise sob a ótica do direito ambiental constitucional

Resumo: O presente trabalho objetiva esclarecer que a pessoa humana, sujeito central dos direitos humanos internacionais, é objeto de proteção sob os vários enfoques, daí busca-se enquadrar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um dos fatores de existência digna. Para tanto, percorre uma breve construção histórica do direito à vida, dos conceitos de dignidade da pessoa humano e direitos humanos. A preocupação expõe-se em confirmar, sobretudo, na preservação do princípio da dignidade da pessoa humana, considerar que mais importante assegurar o direito à vida é assegurar o direito à vida com dignidade, subordinando-se o alcance à ampla efetivação dos direitos fundamentais, bem como desfrutar do meio ambiente saudável.

Palavras-chave: direito à vida; direitos fundamentais; dignidade da pessoa humana; meio ambiente.

Abstract: This work aims clarify that the human person, the central subject of international human rights is the subject of protection under the various approaches, then seeks to frame the right to an ecologically balanced environment as one of the dignified existence of factors. For this, walk through a brief historical construction of the right to life, the dignity of the human person concepts and human rights. Concern is exposed to confirm, especially in preserving the principle of human dignity, consider that more important to ensure the right to life is to ensure the right to life with dignity, the scope is subordinate to the wide enforcement of fundamental rights and enjoy a healthy environment.

Keywords: right to life; fundamental rights; human dignity; environment.

1. INTRODUÇÃO

A preocupação motivada pela vasta ocorrência de catástrofes ambientais, geralmente tendo como causa principal o aquecimento global e suas consequências no ecossistema, gerado pelo efeito estufa, está fazendo com que a humanidade volte a atenção para as questões que concerna à sobrevivência humana, seja ela atual ou futura, no planeta terra.

Com o acelerado crescimento da indústria global, no desenvolvimento de grandes tecnologias, a fim de tornar a vida humana mais confortável e moderna, a grande massa humana depende de tudo que provém da natureza, e para não entrar em conflito com ele, basta apenas preservá-la: valorizando o meio ambiente, utilizando-o e protegendo-o da melhor forma, garantindo a sobrevivência das presentes e futuras gerações.

Objetivando adentrar na exposição do necessário respeito ao ser humano, tornam-se necessários os apontamentos iniciais, abordando as linhas envolventes do começo da existência: a vida.

2. CONCEITUAÇÃO E ASPECTOS HISTÓRICOS DO DIREITO À VIDA

É tão difícil conceituar a palavra vida, pois é uma concepção totalmente contrária. O termo vida, segundo o dicionário[1] é a “atividade interna substancial por meio da qual atua o ser onde ela existe; estado de atividade imanente dos seres organizados”.

Para Jhering “viver é respirar incessantemente: receber do ambiente e a ele devolver. Isto vale tanto para a vida física quanto para a espiritual” (2002, p. 66). Em outras palavras, Jhering traz o conceito de vida, de forma diferenciada, isto é, toda relação humana se perfaz através do “existir-um-para-o-outro”, como meio de se completarem.

Na Bíblia há uma abordagem expressa do início da vida, especificadamente, no livro de Gênesis, capítulo 1, versículo 27, que mostra Deus, ser supremo, concedendo a existência, ou seja, dando vida para o homem e a mulher, representando um ato divino.

Num contexto jurídico, analisar-se-ão alguns pontos importantes do início da vida, no ordenamento jurídico pátrio.

2.1 No direito romano

Desde o direito romano já vinha sendo consagrado tal direito, vez que, em virtude da incomensurável influência deste em nosso ordenamento pátrio, ao abordar o tema do nascituro em seus textos, compondo-se de forma bastante contraditória, demonstrando tendências doutrinárias do direito romano, absolutamente divergentes, não tratando dos direitos da personalidade, consoante a acepção que é hoje conhecida, deixando de valorizar a pessoa humana enquanto tal, deslocando a tutela jurídica, para a seara patrimonial, o que é hodiernamente concebido.

Com propriedade, José Cretella Júnior (1997, p. 91-92), salientou que se chegava à situação de escravo desde o nascimento, de onde imperava o princípio: “filho de escrava, escravo é”. Entretanto, adquiria-se mencionada condição, por fatos posteriores ao nascimento, nos dizeres do autor:

“Chega-se à escravidão pelo cativeiro (inimigos aprisionados ficam escravos do Estado romano, sendo vendidos aos particulares); pela deserção (o soldado desertor fica escravo); pela negligência ao não inscrever-se nos registros do censo (o incensus, isto é, pessoa que esquece inscrever-se no censo, é vendido pelo Estado romano, como escravo); pela insolvência (quem deixa de pagar as dívidas e é condenado – addictus -, cai nas mãos do credor que pode vendê-lo); pela prisão em flagrante (o fur manifestus é vendido pela vítima do furto) (1997, p. 92)”.

Essa divergência é bem clara, quando ora afirmam que o nascituro não é um homem, sendo apenas parte do corpo de uma futura genitora e, em outros escritos, traz o nascituro de forma equiparada a uma criança nascida.

De acordo com Semião (2000, p. 46), pode-se extrair do trecho abaixo, a divergência nítida existente no Direito Romano, que pode ser adiante explicitado:

“Manifesta-se assim vacilante, o Direito Romano, quanto ao início da existência da pessoa e da personalidade. Em algumas vezes era reconhecida personalidade ao nascituro; em outras, se estabelecia uma personalidade condicional, colocando-se a salvo os seus direitos, sob a condição de que nascesse viável, consoante o brocardo: “Nasciturus pro jam nato habetur Quoties de ejus commodis agitur”. Em outras ainda, considerava-se criança não viável como despida de personalidade e finamente, às vezes, negava-se personalidade aos monstros ou crianças nascidas sem forma humana”.

Para o reconhecimento da pessoa física, por parte dos romanos, era necessário o preenchimento de duas condições: o nascimento perfeito e o “status” – condição natural e civil, respectivamente. Ainda, para os romanos, aqueles que não tivessem a forma de humano quando nascessem não eram considerados pessoas, entretanto, não descreviam o que seria a “forma humana”.

2.2. No direito civil brasileiro

No direito brasileiro, a vida nasce da concepção e enquanto esta estiver em processo de gestação, no útero materno (nascituro), visto que são considerados sujeitos de direitos, embora não sejam, ainda, pessoas.

Com espeque no artigo 2º, do Código Civil Brasileiro vigente, é disposto que: “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Destarte, basta que a pessoa viva por alguns minutos (poucos que sejam) para a aquisição da personalidade jurídica, bastando assim, uma breve respiração do recém-nascido, para que seja caracterizado como pessoa.

No Brasil, o requisito da viabilidade tornou-se dispensável e irrelevante, afastando do seu art. 2º (CC/2002), todas as hipóteses de dúvida e incerteza, como se disse, quando da breve respiração, o torna titular de direitos. Diferentemente do que ocorre na França[2], por exemplo, que utiliza a viabilidade como meio de conceder a titularidade de direitos ao nascituro, não bastando apenas o nascimento com vida, mas que este seja viável, isto é, apto para viver.

A Resolução n. 1/88 do Conselho Nacional de Saúde define o nascimento com vida como:

“Expulsão ou extração completa do produto da concepção quando, após a separação, respire e tenha batimentos cardíacos, tendo sido ou não cortado o cordão, esteja ou não desprendida a placenta”.

Segundo Maria Helena Diniz (1999), citada por Pablo Stolze Gagliano (2009, p. 83), em capítulo sobre os direitos do nascimento leciona que:

“Na vida intrauterina tem o nascituro personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos personalíssimos e aos da personalidade, passando a ter a personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais”.

No sistema jurídico civilista, dentre as três teorias existentes: a natalista, a da personalidade racional e a concepcionista, o Brasil adotou a teoria concepcionista que admite adquirir a personalidade antes do nascimento, isto é, desde a concepção no ventre materno.

2.3. Na Constituição Federal de 1988

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, garante que todas as pessoas são iguais perante a lei, não existindo distinção de qualquer natureza, de modo a garantir aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Nesse sentir, vale transcrever o seguinte acórdão do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Especial, trazendo em seu texto a importância da preservação, não só do direito à vida, mas também, da responsabilidade ambiental, que segue transcrito:

Meio ambiente e direito à vida: STJ – “A obrigatoriedade de registro no Ministério da Agricultura dos agrotóxicos para sua distribuição e comercialização não veda o registro nos Departamentos das Secretarias Estaduais de Saúde e Meio Ambiente. A competência da União não exclui a dos Estados, que utiliza seu poder de polícia e o princípio federativo em proteção à população. Os Estados têm o dever de preservar a saúde e a vida das pessoas” (Ementário STJ nº 7/302 – REsp nº 19.274-0 – RS. rel. Min. Garcia Vieira. 1ª T. Unânime. DJ 5-4-93) (grifei).

É cediço que há conexão entre a defesa do direito à vida para com a preservação do meio ambiente, pois se este último não impuser limites para o seu uso, abruptamente a existência humana poderá sofrer os prejuízos futuros.

3. DO DIREITO À VIDA COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL

É de se ver que o direito à vida é o mais fundamental dos demais direitos preconizados na Lei Maior, pois o seu asseguramento se impõe, já que, sem ele não poderia existir os demais direitos, tampouco, o exercício destes. Além do que se deve compreendê-lo com uma visão global, incluindo em sua interpretação, outros valores superiores, os quais abordar-se-á brevemente, que deságuam na dignidade da pessoa humana, consubstanciando-se, pois, além de alicerce, em vetor interpretativo obrigatório.

Assegurando, portanto, o direito à vida, sabe-se que cabe ao Estado, assegurá-lo em dois aspectos extremamente importantes, sejam eles: o direito de viver (continuar vivo) e o de ter uma vida digna (quanto à subsistência), diante das possibilidades que o Estado proporciona, sendo um direito apontado, como inviolável, na Constituição Federal.

Pode-se nominar, tal direito, como um direito fundamental, um direito humano.

Pois bem. Direitos fundamentais consistem em instrumentos de proteção do indivíduo frente à atuação do Estado, as quais estão elencados no artigo 5º da Constituição Federal, como direitos individuais e coletivos. É eminentemente complexo definir direitos fundamentais, sendo esta uma das principais problemáticas ao buscar um fundamento absoluto.

Tal conceito é entendido por Vladimir Brega Filho, como “o mínimo necessário para a existência da vida humana”. (2002, p. 66).

No que tange aos “Direitos Humanos”, estes são direitos essenciais à manutenção de uma vida humana sustentada pelo princípio basilar da dignidade da pessoa humana. Para tanto, Vladimir Brega Filho (2002), faz diferenciação, entendendo que direitos fundamentais são aqueles positivados na Constituição, enquanto os direitos humanos aqueles que possuem normatização de caráter internacional.

E, direito humano fundamental, conforme menciona Alexandre de Moraes, deve ser entendido como direito a um nível de vida adequado com a condição humana, isto é, todos os demais direitos (direito à alimentação, vestimenta, lazer, educação, cultura, saúde etc.) devem garantir ao ser humano, uma vida digna de existência.

4. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A Constituição da República de 1988, norteada por valores ético-jurídicos, previu a dignidade da pessoa, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito pátrio, a teor de seu art. 1º, inciso III. Em razão disso, engendrou considerável rol de direitos fundamentais, em seu título II (arts. 5º a 17) e, dentre eles, destacam-se os direitos e garantias individuais e coletivos, também chamados de direitos fundamentais de defesa ou, meramente, liberdades públicas, previstos no artigo 5º, da Carta Magna.

A dignidade é qualidade moral que, possuída por alguém, serve de base ao próprio respeito em que é tida.

A ideia de dignidade da pessoa humana teve três momentos de contribuição essencial para a sua concepção atual: o Cristianismo, o Kantismo e a Segunda Guerra Mundial, conforme avalia Nelson Rosenvald (2005, p. 1).

Pondera-se que, antes da chegada de Jesus Cristo, no Livro de Gênesis, o homem já era declarado como imagem e semelhança de Deus, em se capítulo 1, do mencionado livro, Deus, após ter criado, pelo poder da palavra, mediante ordens dadas ao vácuo, a luz (versículo 3), o firmamento (versículo 7), os “luzeiros” (versículo 14) e os seres viventes (versículos 20, 24 e 25), o Criador, em um indicativo da existência da Santíssima Trindade, estabeleceu, valendo-se da terceira pessoa do plural: “Agora vamos fazer os seres humanos, que serão como nós, que se parecerão conosco. Eles terão poder sobre os peixes, sobre as aves, sobre os animais domésticos e selvagens e sobre os animais que se arrastam pelo chão” (versículo 26). Fala-se, pois, em pecado, justamente quando o homem não corresponde aos anseios do Criador, renegando a dignidade que lhe foi atribuída.

Por sua vez, Immanuel Kant, ao ditar as fórmulas de imperativo categórico: “age de tal forma que a máxima de teu agir possa ser elevada a uma lei universal de conduta” e “age de tal forma que trates a humanidade tanta na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como um fim e nunca unicamente como um meio”, também assinala (2000, p. 134):

“No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas, quando uma coisa está acima de todo o preço e, portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade”.

Celso Lafer, na esteira do pensamento de Hannah Arendt, menciona (2006, p. 133):

“A tese de que os indivíduos não têm direitos mas apenas deveres em relação à coletividade, na medida em que estes deveres são estipulados ex parte populis, sem um controle e uma participação de cunho democrático, levou, no totalitarismo, à negação do valor da pessoa humana enquanto “valor-fonte” da ordem jurídica”.

Com precisão, Nelson Rosenvald (2005, p. 6) sustenta não ter sido por acaso, pois, a concepção presente da dignidade humana fundou-se na Alemanha, pondera o autor, que, com inspiração em Kant, a Lei Fundamental de Bonn, de 1949, imposta pelas grandes potências do Estado alemão após a Segunda Guerra Mundial, estabelece, em seu art. 1º, parágrafo 1º, frase 1, que “a dignidade do homem é intangível. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todos os poderes estatais”.

4.1. Direito à vida sob a égide do direito ambiental

O direito à vida é objeto do Direito Ambiental, sendo certo que sua correta interpretação não se restringe simplesmente ao direito à vida, tão somente, enquanto vida humana, e sim à sadia qualidade de vida, em todas as suas formas. Na lição de Paulo Affonso Leme Machado (2002, p. 46): “Não basta viver ou consagrar a vida. É justo buscar e conseguir a ‘qualidade de vida”.

Partindo desta constatação, é possível enumerar algumas situações nas quais há atentado à dignidade da pessoa humana, facilitando a fixação do conteúdo deste princípio fundamental. Neste tocante, doutrina Ingo Wolfgang Sarlet:

“O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e a identidade do indivíduo forme objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente aos demais não for garantida, bem como onde não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças”. (2004, p. 118).

Nas palavras de Alexandre de Moraes:

“O Estado deverá garantir esse direito a um nível de vida adequado com a condição humana e valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e, ainda, os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, garantindo o desenvolvimento nacional e erradicando-se a pobreza e a marginalização, reduzindo, portanto, as desigualdades sociais e regionais” (2011, p. 80).

Dessa forma, percebe-se que não pode existir limitação do direito à vida, tal direito, que é o primeiro da pessoa humana, tem de ser protegido pelo Estado, tendo em vista que o direito fundamental à vida está intrinsicamente ligado à dignidade da pessoa humana.

Igualmente, Ingo W. Sarlet (2001, p.28) assevera:

“A íntima e indissociável vinculação entre a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, constitui, atualmente, um dos postulados nos quais se assenta o direito constitucional, o que vale inclusive nas ordens constitucionais onde a dignidade ainda não foi expressamente reconhecida no âmbito do direito positivo. Todavia, mesmo que virtualmente incontroverso o liame entre a dignidade da pessoa e os direitos fundamentais, o consenso, por sua vez – como logo teremos oportunidade de demonstrar -, praticamente se limita ao reconhecimento da existência e da importância desta vinculação. Quanto ao mais – inclusive no que diz com a própria compreensão do conteúdo e significado da dignidade da pessoa humana na (e para a) ordem jurídica – registra-se farta discussão em nível doutrinário e até mesmo jurisprudencial. Assim, definindo o objeto do presente ensaio, é precisamente sobre as relações entre a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, que pretendemos tecer algumas considerações, destacando pelo menos parte dos inúmeros aspectos que poderiam ser colacionados a respeito do tema, com o objetivo de explorar, mesmo que sumariamente, algumas possíveis aplicações concretas da dignidade da pessoa no âmbito da sua conexão com os direitos fundamentais”.

Nesta senda, Nelson Rosenvald arremata (2005, p. 32):

“Nesse momento, constatamos a íntima vinculação entre a dignidade do ser humano e os direitos da personalidade. São valores umbilicalmente atrelados, indissociáveis. Com efeito, a dignidade é o coração dos direitos da personalidade e o elemento capaz de justificar a existência de uma teoria que os unifique. Há que se enfatizar que a dignidade da pessoa humana é fonte simultânea de direitos humanos e de direitos da personalidade. Fechando o ciclo evolutivo, ambos, quando positivados, convertem-se em direitos fundamentais de igual conteúdo. Com modo e intensidade variáveis, serão eles de alguma maneira reconduzidos à idéia primária de dignidade, como última instância de proteção a todo ser humano”.

Constata-se, pois, estreita ligação entre a dignidade da pessoa humana e os direitos da personalidade, também chamados pela doutrina, conforme observa Roberto Senise Lisboa, de “direitos essenciais, direitos fundamentais, direitos personalíssimos, direitos naturais da pessoa, e assim por diante” (2004, p. 246).

Pode-se concluir que foi atribuído ao Poder Público o dever de garantir à sociedade, o direito a uma qualidade de vida digna, controlando o atual modelo capitalista, desprovido de preocupações com os valores sociais, com os ditames de justiça e de solidariedade, que comportem risco para a vida e o meio ambiente.

Urge, por fim, atentar que esse dever não deve ser cobrado apenas do Poder Público, mas de toda a coletividade. Entretanto, há tempo de proteger o meio ambiente e de preservar o direito à vida, pois não basta manter-se vivo, é preciso que se viva com qualidade.

4.2. Meio ambiente sob o prisma dos direitos humanos

Traçadas tais considerações, quanto às reflexões do direito à vida no que diz respeito à dignidade da pessoa humana, importante ressaltar a existência dos direitos humanos, quanto ao presente tema.

Os direitos humanos apresentam múltiplos conceitos, sendo a maioria deles desenvolvidos e constituídos, a partir de diferentes concepções e preconceitos.

De acordo com Perez Luño (1990, p. 48), um dos poucos a analisar, refletir e desenvolver sobre um conceito mais sintetizado, entende que os direitos humanos são um conjunto de faculdades e instituições, que em suas dimensões históricas e axiológicas, buscam os valores da dignidade da pessoa humana sob o acréscimo de fraternidade e solidariedade, as quais devem ser reconhecidas positivamente, em todos os níveis.

A definição acima exposta não é absoluta nem única, em relação aos direitos humanos; todavia, traz em seu cerne, a indicação de um aspecto extremamente relevante, o qual consiste em incluir os direitos humanos na dignidade da pessoa humana.

O Brasil antes mesmo de promulgar a sua atual Constituição (1998), já havia ratificado os mais importantes tratados internacionais inerentes ao direito internacional do meio ambiente, o que intensificou ainda mais o texto constitucional em vigor.

Foi no plano internacional da Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, adotada pela Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972, que o direito fundamental do meio ambiente foi reconhecido, cujos 26 princípios têm por objetivo a preservação do meio ambiente para garantir a vida as gerações presentes e futuras.

Vem bem a calhar, o “Princípio 1” da Declaração de Estocolmo, promovendo o direito ao meio ambiente ao “status” do direito humano fundamental:

“[…] o homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras”. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1972b).

Assim, a consideração da proteção ao meio ambiente, como um direito humano fundamental, significa um progresso na discussão da proteção internacional do meio ambiente e da proteção internacional dos direitos humanos.

5. CONCLUSÃO

A percepção de questões ligadas à ideia de proteção ambiental não se limita meramente em poluição da industrialização, mas abrange uma problemática mais extensa e complexa, que envolve todo o planeta e que pode colocar em risco a sobrevivência do homem, desse modo, foi determinante a inserção de questões ambientais na esfera da proteção internacional dos direitos humanos, sendo esta a resposta ao questionamento preliminarmente lançado neste trabalho, ou seja, a vida humana é igualmente protegida, quando se assenta respeito ao preceito constitucional da preservação ambiental, sendo isto viabilizado com a interpretação do significado dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais, nos dias atuais.

Por óbvio, verifica-se que é impossível o exercício dos direitos humanos sem a proteção ao meio ambiente, no que tange às questões ambientais, pela forma como são vistas. Todavia, basta lembrar que a primeira importância de todos os direitos humanos se perfaz num só, o “direito à vida”, com dignidade e qualidade, tornando-se inócuo lutar por um meio ambiente totalmente equilibrado e protegido, se o bem maior e o mais fundamental de todos, não for assegurado.

 

Referências
______. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. – 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
______. Lei Nº 6.938 de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 1 de Setembro de 1981.
BRASIL. Código civil, 2002. Código civil. 53.ed. São Paulo: Saraiva; 2002.
BREGA FILHO, Vladimir. Direitos fundamentais na Constituição de 1988: conteúdo jurídico das expressões. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.
CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Romano. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil. – 26. ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009.
LAFER, Celso. A reconstrução dos Direitos Humanos. 6. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. – 9. ed. – São Paulo: Atlas, 2011.
PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, estado de derecho y Constitución. 3ª ed. Madri: Teccnos, 1990.
ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005.
SEMIÃO, Sérgio Abdalla. Os direitos do nascituro: aspectos cíveis, criminais e do biodireito.
STF (Supremo Tribunal Federal). A Constituição e o Supremo. Acesso em: 06/06/2015. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp>.
VON JHERING, Rudolf. A finalidade do direito. 2º vol. Campinas: Bookseller, 2002.

Notas:
[1] Dicionário Michaelis; 2009.
[2] Cf. artigo 3º, do Código de Direito Civil Francês.

Informações Sobre o Autor

Jairo Eliin Gomes

Advogado


Equipe Âmbito Jurídico

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