Resumo: Breve análise acerca das posições doutrinárias em relação ao cumprimento de sentença e principalmente quanto a necessidade de intimação do devedor.
O artigo 475 J que entrou em vigor com a Lei 11.232/05, promoveu importantes alterações em relação ao cumprimento de sentença, principalmente no tocante a não formar um novo processo de execução, e sim, seguir no mesmo processo de conhecimento, já com o trânsito em julgado da decisão. Esse dispositivo prevê: “Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”.
O artigo supramencionado não explicitou o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias, tampouco previu a intimação pessoal do devedor para cumprir a sentença.
Discute-se na doutrina qual seria o termo inicial para o cumprimento de sentença em razão da omissão legislativa quanto à contagem do prazo de quinze dias.
Neste sentido, alguns juristas entendem que o marco inicial para o cumprimento de sentença se daria automaticamente com o trânsito em julgado, outros defendem a intimação do devedor na pessoa do seu advogado, para o início do prazo de 15 dias.
A corrente doutrinária conservadora afirma que na ausência de especificação da lei, o prazo de 15 dias para a incidência da multa do artigo 475-J do CPC deverá se contar a partir do momento em que o devedor for intimado de condenação transitada em julgado, através de seu advogado, por publicação no diário oficial.
Nomes expressivos deste seguimento assim se manifestam:
Para Nelson Nery Jr. e Rosa Maria Nery[1], é clara a necessidade de intimação da parte para o cumprimento do estabelecido:
“Multa de 10%. Intimado o devedor, na pessoa de seu advogado, pode cumprir (pagar) ou não cumprir o julgado (não pagar). O descumprimento desse dever de cumprir voluntariamente o julgado acarreta ao devedor faltoso a pena prevista no caput do CPC 475-J: acresce-se ao valor do título 10% (dez por cento), sob a rubrica de multa.”
Para o ilustre Carreira Alvim[2], de mesmo modo, estabelece que o prazo inicial se dê da intimação do devedor para cumprir a obrigação:
“Se a sentença for líquida, o devedor deverá cumpri-la no prazo de quinze dias -, contado também da intimação ao seu advogado -, e, caso não o faça, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento…”
No âmbito jurisprudencial, encontram-se decisões do Superior Tribunal de Justiça no sentido da necessidade intimar a parte devedora para cumprimento da obrigação, sob pena de aplicação do art. 475-J:
“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. BRASIL AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. BRASIL TELECOM. SUBSCRIÇÃO DE AÇÕES. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. TERMO INICIAL DO PRAZO DE 15 DIAS. INTIMAÇÃO NA PESSOA DO ADVOGADO PELA PUBLICAÇÃO NA IMPRENSA OFICIAL. ART. 475-J DO CPC. MULTA. INCIDÊNCIA. DEVEDOR QUE INTIMADO NÃO EFETUOU O CUMPRIMENTO ESPONTÂNEO DO JULGADO.PRECEDENTE. RECURSO NÃO PROVIDO COM APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 557, § 2º, DO CPC.” (AgRg no Ag 1236031/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 23/06/2010)TELECOM.
“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – ARTIGO 475-J DO CPC – MULTA DE 10 % – INTIMAÇÃO DA PARTE VENCIDA – NECESSIDADE CONFORME ENTENDIMENTO DA CORTE ESPECIAL – RECURSO PROVIDO.” (AgRg no Ag 1284435/RS, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 29/06/2010).
As objeções levantadas contra aqueles que defendem o início da contagem do prazo com o mero trânsito em julgado, independentemente de certidão ou intimação, baseiam-se entre outras coisas na impossibilidade por parte do devedor de cumprir a sentença em primeiro grau se os autos estivessem em instância superior. Neste sentido esta corrente afirma que por uma questão de segurança jurídica, se deveria intimar pessoalmente o réu para cumprir a sentença (tal como ocorre com as sentenças mandamentais referentes a obrigações de fazer), não podendo aquele se sujeitar à multa por eventual falta de comunicação de seu advogado.
Ademais, outra linha argumentativa funda-se na premissa que na maioria dos casos não há no processo de conhecimento, valor líquido a ser executado, sendo que a redação do artigo em comento é clara ao dizer que somente incidirá a multa se o devedor for “condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação”.
Neste sentido, sustenta o doutrinador Fredie Didier Jr.:
“No julgamento do REsp n. 954.859/RS, a 3ª T. do STJ, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, entendeu que a o prazo para cumprimento espontâneo previsto no art. 475-J começa a correr independentemente de intimação das partes. Ou seja, o prazo começa a correr do trânsito em julgado da decisão. Adotou-se, neste julgamento, a orientação de ARAKEN DE ASSIS. Assim, passado o prazo, independentemente de nova intimação do advogado ou do devedor para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação.
Não é esse o posicionamento que adotei no v. 2 do meu Curso. Defendo que o prazo para cumprimento espontâneo deve começar a correr da data da intimação ao advogado da parte.
Sinceramente, acho que, do ponto de vista operacional, será muito difícil aplicar o entendimento do STJ, notadamente pelas até hoje não resolvidas questões sobre a data do trânsito em julgado em certas situações e ainda, que na maioria das vezes a sentença só poderá ser liquidada após o trânsito em julgado da decisão.
A decisão, frise-se, é de apenas uma das turmas. Ainda não se pode dizer que a jurisprudência do STJ está uniformizada. A Turma agiria de maneira mais correta se, ao invés de julgar o recurso especial, remetesse a questão à Seção a que pertence, prevenindo, portanto, eventual divergência jurisprudencial com a turma. (Fredie Didier Jr., Editorial n.º 24, de 20/08/2007).
Portanto, amparada pelos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa essa corrente tradicional defende a necessidade de intimação da parte vencida, para o cumprimento voluntário da obrigação líquida, sob pena, daí sim, de acrescer a multa descrita no art. 475-J, do CPC.
A segunda corrente a qual me filio vai ao encontro do atual posicionamento dominante do STJ que entende que transitada em julgado à sentença condenatória, não é necessário que a parte vencida, pessoalmente ou por seu advogado, seja intimada para cumpri-la, conforme segue:
“(AgRg no Ag 1188566/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 10/08/2010, DJe 18/08/2010) AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. VALOR PATRIMONIAL DA AÇÃO.
DECISÃO ACOBERTADA PELO MANTO DA COISA JULGADA MATERIAL. ARTIGOS 475-L, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; 6º, § 1º, DA LEI Nº 8.021/90 E 1º DA LEI Nº 8.033/90. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. OFENSA AO ART. 475-J DO CPC. INEXISTÊNCIA. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. MATÉRIA DE FATO. SÚMULA 7. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO.
I. A superveniente mudança de posicionamento desta Corte no tocante ao valor patrimonial da ação não tem o condão de alterar o parâmetro definido no processo de conhecimento, sob pena de afronta ao instituto da coisa julgada material.
II. A matéria inserta nos arts. 475-L, V, do Código de Processo Civil, 6º, § 1º, da Lei nº 8.021/90 e 1º da Lei nº 8.033/90, não foi objeto de debate no v. Acórdão recorrido, carecendo, portanto, do necessário prequestionamento viabilizador do Recurso Especial.
Desatendido, portanto, o requisito do prequestionamento, nos termos da Súmula 211 desta Corte.
III. No tocante à revogação da multa imposta em face da condenação por prática de ato atentatório à dignidade da justiça, o pleito não merece prosperar. É pacífica a orientação da Corte no sentido de que tal providência judicial demanda a incursão no conjunto fático-probatório dos autos, o que não se admite por força da Súmula 7 desta Corte.
IV. No cumprimento de sentença, não há necessidade de ser o devedor intimado para, então, se iniciar a contagem dos 15 (quinze) dias para o pagamento, tendo em vista que o prazo flui do trânsito em julgado da sentença na qual o devedor já foi intimado, quando de sua publicação, na pessoa de seu advogado. Isso é o que determina o art.
475-J do CPC, para caso em que se trata de quantia certa, que não requer liquidação de sentença, perícia ou outro trabalho técnico de elevada complexidade. (REsp 1136370/RS, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/02/2010, DJe 03/03/2010).
V. A agravante não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos.
VI. Agravo Regimental improvido. (AgRg no Ag 1265900/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 07/05/2010)
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. REFORMA DE QUESTÃO DECIDIDA NO PROCESSO DE CONHECIMENTO. TRÂNSITO EM JULGADO. COISA JULGADA. 475-J, DO CPC. INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR.
DESNECESSIDADE. MULTA.
1. É inviável a reforma de decisão já acobertada pelo manto da coisa julgada, ainda que proferida em desacordo com entendimento superveniente do STJ.
2. O STJ pacificou o entendimento de que é desnecessária a intimação pessoal do devedor para o cumprimento da sentença, assim como para aplicação da multa prevista no art. 475-J, do CPC.
3. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no Ag 1188566/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 10/08/2010, DJe 18/08/2010)
Entendimento igual é o do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDÊNCIA PRIVADA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA. ART. 475-J DO CPC. INTIMAÇÃO DO DEVEDOR. DESNECESSIDADE. 1. A multa prevista no art. 475-J do CPC incide logo após o trânsito em julgado da condenação, pois a parte teve ciência inequívoca do resultado do feito, mediante seu procurador legalmente habilitado. 2. Assim, ao não adimplir voluntariamente a obrigação, a parte opta por atentar aos princípios da celeridade e efetividade da prestação jurisdicional, devendo arcar com aquele ônus processual. 3. Não merece prosperar o prequestionamento postulado objetivando a interposição de recurso à Superior Instância, visto que o julgador não está obrigado a se manifestar sobre todos os artigos de lei invocados pelas partes, bastando que aqueles referidos no corpo da decisão sejam suficientes para a resolução do caso submetido à apreciação. Negado seguimento ao agravo de instrumento.” (Agravo de Instrumento Nº 70034386284, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 29/01/2010)
Neste sentido há manifestação doutrinária:
Tesheiner[3] refere que:
“A incidência da multa é incondicionada. Não se trata, no caso de astreinte, ou seja, de multa para coagir o devedor, mas de pena, à semelhança da multa contratual. Sendo líquido o valor da condenação, ou apurável mediante cálculo, o prazo para pagamento voluntário começa a correr do trânsito em julgado da condenação. Não há, pois, intimação para pagar, nem mesmo para o revel, muito menos do defensor público, no caso de réu a que se concedeu o benefício da assistência judiciária gratuita.”
Na mesma linha, Amaral[4] sustenta que:
“Transitada em julgado a sentença (ou acórdão), cremos ser desnecessária a intimação do devedor para cumpri-la, bastando a simples ocorrência do trânsito em julgado para que se inicie o prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento voluntário”.
A intimação – dirigida ao advogado – foi prevista no § 1º do Art. 475-J do CPC, relativamente ao auto de penhora e avaliação. Nesse momento, não pode haver dúvidas, a multa de 10% já incidiu (se foi necessário penhorar, não houve o cumprimento espontâneo da obrigação em quinze dias).
O excesso de formalidades estranhas à lei não se compatibiliza com o escopo da reforma do processo de execução. Quem está em juízo sabe que, depois de condenado a pagar, tem quinze dias para cumprir a obrigação e que, se não o fizer tempestivamente, pagará com acréscimo de 10%.
Para fulminar dúvidas, não se pode exigir da parte que cumpra a sentença condenatória antes do trânsito em julgado (ou, pelo menos, enquanto houver a possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo).
O termo inicial dos quinze dias previstos no Art. 475-J do CPC deve ser o trânsito em julgado da sentença. Passado o prazo da Lei, independente de nova intimação do advogado ou da parte para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação.
Se o credor precisar pedir ao juízo o cumprimento da sentença, já apresentará o cálculo, acrescido da multa.
Esse o procedimento esta estabelecido na Lei, em coerência com o escopo de tornar as decisões judiciais mais eficazes e confiáveis. Complicá-lo com filigranas é reduzir à inutilidade a reforma processual.
Assim se posicionou também Araken de Assis[5]:
“É omissa a disciplina do ’cumprimento de sentença’ acerca do cabimento dos honorários advocatícios. No entanto, harmoniza-se com o espírito da reforma, e, principalmente, com a onerosidade superveniente do processo para o condenado que não solve a dívida no prazo de espera de quinze dias – razão pela qual suportará, a título de pena, a multa de 10% (art. 475-J, caput) –, a fixação de honorários em favor do exeqüente, senão no ato que deferir a execução, no mínimo na oportunidade do levantamento do dinheiro penhorado ou do produto da alienação dos bens. (…) Do contrário, embora seja prematuro apontar o beneficiado com a reforma, já se poderia localizar o notório perdedor: o advogado do exeqüente, às voltas com difícil processo e incidentes, a exemplo da impugnação do art. 475-L, sem a devida contraprestação.’
Acertada, também, a opinião de Cássio Scarpinella Bueno[6]:
Não cumprido o julgado tal qual constante da ‘condenação’ (o título executivo judicial), o devedor, já executado, pagará o total daquele valor acrescido da multa de 10% (…) e honorários de advogado que serão devidos, sem prejuízo de outros, já arbitrados pelo trabalho desempenhado pelo profissional na “fase” ou “etapa” de conhecimento, pelas atividades que serão, a partir daquele instante, necessárias ao cumprimento forçado ou, simplesmente, execução, do julgado.
Assim, conclui o moderno processualista:
São devidos honorários advocatícios para a “fase” ou “etapa” de execução – assim entendidas as atividades executivas que terão início, a pedido do exeqüente, esgotado in albis o prazo a que se refere o caput do art. 475-J.
Portanto, como visto merecem ser rechaçados os argumentos no sentido da necessidade de intimação do devedor, pois já tendo sido o devedor intimado da sentença já se cumpriu o requisito para início da contagem do prazo de quinze dias para pagamento voluntário. Da mesma forma o apego a necessidade de liquidez da condenação (em que pese à lei mencione) pode ser resolvido facilmente com a apresentação de mero cálculo aritmético.
Enfim muitas são as alternativas para o devedor que pretende pagar o débito espontaneamente e economizar o valor da multa de 10% e os honorários advocatícios do cumprimento de sentença, dentre eles o pagamento direto ao credor mediante recibo na existência de dificuldade de depósito judicial. E em caso de impossibilidade no pagamento dentro do prazo cabe ao devedor o ônus de provar para que não incida a multa.
Neste sentido, mostra-se descabida a comparação feita pelos já mencionados “conservadores” entre a condenação ao pagamento de quantia certa e o cumprimento de obrigação de fazer, pois o descumprimento desta gera mais conseqüências prejudiciais para o transgressor (tal como imposição de multa periódica e até a configuração de crime de desobediência) que a multa limitada a 10% do artigo 475-J.
Conforme demonstrado, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido em muitas decisões que os 15 dias para o pagamento fluem do trânsito em julgado da sentença na qual o devedor já foi intimado, quando de sua publicação, na pessoa de seu advogado.
Dessa forma para que o mecanismo legislativo cumpra seu papel de forma eficiente e ofereça a necessária segurança jurídica, é essencial garantir agilidade e celeridade no procedimento, tornando a prestação jurisdicional menos onerosa para o vitorioso.
Pós graduada em Direito Empresarial pelo Instituto de Desenvolvimento Cultural – IDC e Advogada em Porto Alegre/RS
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