Nome do autor: Guilherme Barros da Silva Ribeiro. Acadêmico de Direito da UNIFACISA/PB. E-mail: guilhermegbsr@gmail.com
Nome do orientador: Marcelo D’Angelo Lara. Mestre em Direito e Professor da UNIFACISA/PB. E-mail: marcelodlara@gmail.com
RESUMO
A família é a base da sociedade e sua constituição é diversa, podendo seus laços serem biológicos, legais ou afetivos. Antigamente, o aspecto biológico era tido como principal elemento de união familiar, porém, de acordo com os princípios que regem a Lei Suprema, hoje a adoção é tida como um processo de filiação legítimo que, sendo efetivado, não permite a existência de diferenças no trato legal ente filhos biológicos e adotivos. Outrora, a adoção tinha por finalidade proporcionar filhos a casais estéreis; hoje, o interesse do menor é visto como prioridade no processo, garantindo, dessa forma, a proteção integral à criança e ao adolescente. Neste trabalho, procura-se analisar a evolução do processo de adoção, desde o Código de Hamurabi, entre 1728-1686 a.C. até a recente reforma da lei da adoção (Lei 13.509/2017). De acordo com a literatura pesquisada, pôde-se concluir que as mudanças que ocorreram na legislação do processo de adoção buscaram torná-lo mais ágil e garantir a efetividade dos princípios constitucionais que asseguram o direito do menor à convivência familiar.
Palavras-chave: Adoção. Constituição e Estatutos. Menores de idade.
ABSTRACT
The family is the basis of a society, its constitution comes in many ways and its ties may built through biology, law or affection. In the past, the biological aspect was considered as the main element of family union, but, according to the principles included in the Constitution, adoption is considered nowadays as a process of legitimate parenthood that, being completed, does not allow the existence of difference in the legal treatment between biological and adoptive children. Formerly, the purpose of adoption was to provide children to sterile couples; however, today, the well-being of the child is seen as a priority in the judicial process, guaranteeing, in this way, the integral protection of the child and the adolescent. In this paper, we analyze the evolution of the judicial adoption process, from the Hamurabi Code, between 1728-1686 b.C, until the recent reform of the adoption law (Law 13.509 / 2017). According to the researched literature, it was possible to conclude that the changes occurred in the legislation of the adoption process sought to make it more fast and guarantee the effectiveness of the constitutional principles that ensure the right of the child to a familiar environment.
Keywords: Adoption. Constitution and Statutes. Child law.
Sumário: Introdução. 1. A Evolução da finalidade do processo de adoção. 2. A Evolução do processo de adoção no mundo. 3. A Evolução do processo de adoção no Brasil. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A adoção é um instituto do Direito de Família, que objetiva a formação de uma família adotiva com as mesmas características de uma família natural. Tal instituto passou por várias modificações desde a antiguidade até os dias atuais, que variaram desde sua finalidade até o processo para sua efetivação, tornando-se um meio seguro de colocação da criança e do adolescente no seio de uma família substituta (CUNHA, 2011).
De acordo com o superior interesse do menor, algumas mudanças foram feitas no processo de adoção, visando trazer mais efetividade ao procedimento legal, de maneira que as crianças diminuam o tempo em que ficam longe do seio familiar, inclusive, trazendo novas possibilidades de convivência mesmo antes da conclusão do processo, como no instituto do apadrinhamento, que é a principal novidade trazida pela Lei 13.509/2017.
O objetivo deste trabalho foi fazer uma análise dos aspectos fundamentais da adoção, apresentar a evolução histórica do instituto quanto ao processo e à finalidade, e analisar, também, as mudanças que ocorreram no que diz respeito ao procedimento de adoção, da suspensão e destituição do poder familiar.
Para o desenvolvimento deste artigo foi utilizado o método de pesquisa bibliográfica, através de análise documental, utilizando artigos publicados em revistas, documentos impressos e livros. O critério de exclusão baseou-se em artigos cujas informações não respondiam às necessidades da pesquisa.
Quanto a finalidade do processo, observou-se que inicialmente a adoção era um ato que tinha como objetivo suprir as necessidades da parte adotante, hoje o interesse do adotado é posto como prioridade dentro do processo.
Quanto ao procedimento, viu-se que a adoção passou de um ato meramente formal, passível de revogação, para um ato jurídico de natureza irrevogável, tendo como o princípio máximo o superior interesse do adotado, que busca garantir o direito à filiação com todas as suas implicações, de acordo com o Estatuto da criança e do Adolescente.
1 A EVOLUÇÃO DA FINALIDADE DO PROCESSO DE ADOÇÃO
O instituto da adoção é um dos mais antigos existentes, tendo sido registrado desde o Código de Hamurabi, entre 1728-1686 a.C. A prática também está presente na narrativa Bíblica de Moisés, datada em meados de 1526 a.C, chegando até os dias atuais, sendo reconhecida por muitos países (VICENTE, 2018).
Mendonça (2008) mostra que os códigos de Manu e de Hamurabi foram os primeiros a versar sobre o instituto da Adoção, tendo sua origem nas Cidades Estado da Grécia antiga. Naquele tempo, a adoção acontecia da seguinte forma: “aquele que desse seu nome, criasse e o designasse filho, não poderia ser reclamado por outra pessoa”. Nesse contexto histórico, o adotando tinha o dever velar pelos interesses dos adotantes firmados em interesses religiosos e para fins de sucessão, sendo o interesse do adotado colocado em segundo plano.
No Direito Romano, a adoção visava resolver problemas de ordem patrimonial, também atendendo aos interesses do adotante e não do adotado. Geralmente, o herdeiro escolhido era um adulto, visando dar continuidade à família (MENDONÇA, 2008).
Rizzardo (2014), de forma semelhante, afirma que, na antiguidade, o intuito da adoção era, primordialmente, o de beneficiar os adotantes, dando filhos a quem, por natureza, estavam impossibilitados de concebê-los, com a finalidade de perpetuação da família após a morte dos pais.
Na Idade média, o interesse pela adoção diminuiu, não havendo, portanto, grandes avanços nas relações jurídicas relacionadas ao Instituto. Isto se deu pelo desinteresse em transmitir as posses e riquezas da família para alguém dito estranho, sem laços sanguíneos (SILVA, 2017; VICENTE, 2018).
No ano de 1804, Napoleão Bonaparte voltou a dar importância a esse tema. Na França, o Código Napoleônico permitiu a adoção por pessoas com mais de 50 anos que não tivesse filhos naturais, entretanto, o interesse do adotante continuava em primeiro lugar (VICENTE, 2018).
Com o advento do Princípio da dignidade da pessoa humana, que passou a ser o núcleo do constitucionalismo contemporâneo, o interesse do adotado começou a ser tratado como primordial. Tal princípio estabelece o valor constitucional supremo que informa a criação, a interpretação e a aplicação de toda a ordem normativa constitucional, sobretudo, o sistema de direitos fundamentais (CUNHA e NOVELINO, 2012).
Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Artigo 15, versa sobre a previsão legal do princípio alhures, afirmando que: “A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e a dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis”.
Por sua vez, o artigo 227 da Constituição Federal afirma que a família, a sociedade e o Estado são juntamente responsáveis por esta garantia, in verbis: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Nos dias atuais, portanto, tem-se como princípio máximo o superior interesse da criança e do adolescente. Partindo dessa premissa, hoje, o papel da adoção não é o de conceder uma criança a uma família, mas uma família para uma criança. Nesta relação, a família tem o dever de prover educação e afeto, assegurando dignidade ao adotado. (OST, 2009).
2 A EVOLUÇÃO DO PROCESSO DE ADOÇÃO NO MUNDO
Conforme Weber (2004), o Código de Hamurabi (1728-1686 a.C.) é considerado o documento mais antigo que inclui um conjunto de leis referentes ao processo de adoção, sendo o mesmo criado na Mesopotâmia no II milênio a.C. Nele, já era possível encontrar uma normatização a respeito da adoção, trazendo as normas do procedimento, além das punições caso o procedimento legal não fosse respeitado.
A “adoção” citada no contexto do código de Hamurabi não era um instituto de estabelecimento de direitos através do reconhecimento de uma relação jurídica de filiação, mas algo considerado como a “adoção de fato”, visto que, originalmente, não se exigia um procedimento judicial prévio.
Shappo (2011) analisa que o código de Hamurabi possui nove artigos, dentre os 282 que os compõem, dedicados a regulamentar a adoção de fato. Os artigos que versam a respeito do instituto vão do artigo 185 ao artigo 193. O código regula as hipóteses em que um filho pode ser retomado da adoção, dando ao adotado a liberdade de procurar sua família natural, e encontrando-a, unir-se a ela. Dentre as obrigações do adotante, está o de instruir o adotado quanto ao seu ofício. O adotado, como filho, tem direito à herança, por ter se tornado membro legítimo da família. A lei também traz em seu escopo, penalidade ao adotado quando este afirma que os adotantes não são seus pais, de forma que terá a língua decepada. Na hipótese de abandono de sua família, o adotado terá os olhos arrancados.
Na Grécia antiga a adoção era um instrumento de domínio familiar. Aqueles que não tivessem filhos poderiam adotar, de modo que o adotado tornava-se um filho legítimo, com o único intuito de perpetuação do legado da família, pois a herança só podia ser deixada para um descendente direto. Portanto, a adoção naquele contexto era uma maneira de oferecer ao chefe de família a possibilidade de eleger um sucessor, de forma que a família escape da extinção e perpetue sua linhagem (Abreu, 2002).
Nas palavras de Cunha (2011), na Grécia Antiga, a filiação por parte de uma família não biológica poderia ser vista como um ato muito protocolar, de caráter religioso, onde o direito de adotar pertencia somente aos cidadãos, homens, maiores de 18 anos e que detinham posse. Por não serem consideradas cidadãs as mulheres não tinham o direito de adotar, entretanto poderiam ser adotadas, da mesma foram que os homens. Traziam também a hipótese de revogação da adoção por ingratidão.
Schappo (2011) relata que foi no Direito Romano Antigo que a adoção foi mais desenvolvida e seu uso mais ampliado. De maneira que também se preocupava em “assegurar a continuidade do culto doméstico, ameaçada pela falta de descendente masculino”. Porém também era utilizada como meio de “transformar latinos em cidadãos, plebeus em patrícios ou patrícios em plebeus.”
Para que a adoção fosse realizada no Direito Romano, fazia-se necessário a existência um acordo entre os dois pais, o novo e o antigo. Além disso, houve um período da história romana em que a adoção não apartaria o adotado de seu núcleo familiar natural, o que dava ao adotado novos direitos sem que ele perdesse os antigos. Também proibiu-se a adoção de pessoas que outrora, já tivessem sido adotadas (SCHAPPO, 2011).
O direito romano antigo trazia três formas de adoção: ad- rogação, a adoção e a adoção por testamento. Na primeira um “chefe familiar” era adotado por outro chefe familiar, junto com o seu patrimônio, de forma que o adotado se tornava um incapaz, pois tinha seus bens transmitidos para a família do adotante. Este precisaria ter mais de sessenta anos e ter uma diferença de idade com relação ao adotado superior a dezoito anos. Na segunda, que era a adoção propriamente dita, o adotando era transferido de uma família para outra, da mesma forma, o adotante tinha que ser homem, com diferença de 18 anos em relação ao adotando e não possuir filhos naturais ou adotados. A terceira modalidade de adoção no direito romano advém do culto aos mortos. Era chamada de adoção por testamento, nessa modalidade de adoção os efeitos ocorriam após a morte do testamenteiro, deixando assim, herança ao nome, bens e os deuses ao adotado (CUNHA, 2011).
A adoção por testamento era tão comum naquele contexto que o próprio imperador Júlio Cesar utilizou-se de tal instituto ao adotar seu sobrinho-neto, Caio Júlio César Otávio, que mais tarde passaria a ser conhecido como Augusto.
Silva (2005) destaca que, na Idade Média, a Igreja não a aceitava o processo de adoção, pois os direitos canônicos consideravam essas práticas como uma probabilidade de adultério.
Na Idade Moderna, algumas modificações foram feitas no processo de adoção. Devido à esterilidade da esposa de Napoleão Bonaparte, imperador almejava adotar um de seus sobrinhos. Nesse contexto foi instituído o Código de Napoleão de 1804 e, de forma rígida, permitia apenas ser adotantes pessoas acima de 50 anos e que não tivessem filhos naturais e que fossem 15 anos mais velhas que o adotando. Os adotando, por sua vez, teria que ter idade igual ou superior a 23 anos (SILVA, 2005). Acredita-se que a adoção tardia surgiu nesta conjuntura (CORDEIRO, 2016).
Wald (199, p.188) ao falar sobre a adoção na França, no período de Napoleão, leciona: “Coube à França ressuscitar o instituto, dando-lhe novos fundamentos e regulamentando-o no Código Napoleão, no início do século XIX, com interesse do próprio Imperador, que pensava adotar um dos seus sobrinhos. A lei francesa da época só conheceu a adoção em relação a maiores, exigindo por parte do adotante que tenha alcançado a idade de cinqüenta anos e tornando a adoção tão complexa e as normas a respeito tão rigorosas que pouca utilidade passou a ter, sendo de rara aplicação. Leis posteriores baixaram a idade exigida e facilitaram a adoção, permitindo que melhor desenvolva o seu papel na sociedade moderna.”
O instituto da adoção tem origem religiosa, emergindo para que a “religião familiar” não deixasse de existir, para garantir a continuidade do culto aos deuses familiares. Porém, com o transcorrer dos anos, a adoção passa a ter outro sentido. Passando assim, a considerar o adotando como alguém que carece de um núcleo familiar, e de cuidados oriundos da posição de filho (SCHAPPO, 2011).
A História mostra que, apesar de a adoção ter sido uma prática antiga, com o passar do tempo, as formas de filiação a uma família não biológica foram passando por diversas modificações, mas apenas no período pós Primeira Guerra Mundial, nos países anglo-saxônicos, devido às crianças órfãs dos heróis de guerra serem inseridas em novos lares, a adoção foi legalizada (CAMARGO, 2005).
De acordo com Cunha (2011), é importante fazer referência ao instituto da adoção no direito português, por causa da grande influência sobre o instituto aplicado posteriormente no Brasil. Em Portugal, após a adoção, o adotante não adquiria o poder familiar e no que diz respeito à sucessão, era necessário previa autorização do Príncipe para que o adotando tivesse direito à herança da nova família. De maneira mais prática, a adoção em Portugal funcionava como uma forma de pedir alimentos e só adquiria as características do direito romano com o assentimento do príncipe.
Vincente (2018) conclui que nos dias atuais, no mundo, a adoção é um instrumento muito utilizado, e não tem mais a finalidade remota de acolher somente à necessidade daqueles que desejam adotar, mas, principalmente dos adotados.
O Direito moderno vem dando grande atenção ao direito de filiação, de forma a reconhecê-lo como um derivativo do direito à identidade; demonstrar que não se trata, apenas de ter um pai ou uma mãe, mas sim de um processo de identificação social, que ultrapassa o fator biológico e aprofunda-se na identificação no vínculo afetivo.
Segundo Pereira, Rafael (2008) a relevância da afetividade dentro da relação entre pais e filhos passa a ser tão grande que já houve decisões judiciais no sentido de conceder indenização ao filho que foi vítima de abandono afetivo, em razão da ausência do pai, independente da discussão acerca de alimentos.
Para o exercício do poder familiar de modo responsável ou cuidadoso, nos dias de hoje, é preciso ofertar amor e carinho, não somente a simples obrigação financeira.
Faz-se necessária a diferenciação entre direito de Filiação e Direito a identidade genética, o primeiro caracterizado como direito de família e o segundo direito de personalidade. Nas palavras de Lôbo (2004): “O estado de filiação, que decorre da estabilidade dos laços afetivos construídos no cotidiano de pai e filho, constitui fundamento essencial da atribuição de paternidade ou maternidade. Nada tem a ver com o direito de cada pessoa ao conhecimento de sua origem genética. São duas situações distintas, tendo a primeira natureza de direito de família e a segunda de direito da personalidade. As normas de regência e os efeitos jurídicos não se confundem nem se interpenetram.”
Albuquerque Júnior (2006) relata que a afetividade como regra foi estabelecida com o intuito de evitar instabilidade nas relações familiares, garantindo os direitos dos filhos de criação. Entretanto, tal atenção dada à afetividade não exclui a relevância jurídica da ascendência genética, nem sendo hierarquicamente superior a segunda.
Araújo (2017) conclui que é de suma importância compreender que, na filiação biológica ou na jurídica, o instituto da afetividade não é dispensado, mas sim presumido.
3 A EVOLUÇÃO DO PROCESSO DE ADOÇÃO NO BRASIL
Marone (2016) relata que o processo de adoção no Brasil foi introduzido por meio das Ordenações Filipinas e da promulgação em 1828 de uma lei que tratava do assunto com características do direito português. A adoção tinha um procedimento todo judicial, com audiência a ser realizada para a expedição da carta de recebimento do filho.
Nas palavras de Gonçalves (2012) , embora houvesse sido introduzido, não havia um ordenamento particular, de maneira ase ter uma junção de normas, consolidando um referencial possível de ser observado: “No Brasil, o direito pré-codificado, embora não tivesse sistematizado o instituto da adoção, fazia-lhe, no entanto, especialmente as Ordenações Filipinas, numerosas referências, permitindo, assim, a sua utilização. A falta de regulamentação obrigava, porém os juízes a suprir a lacuna com o direito romano, interpretado e modificado pelo uso moderno” (p.379).
Cunha (2011) conta que mais adiante, outros ordenamentos se dedicaram a tratar do instituto, como o Decreto nº 181, de 24 de janeiro de 1890, a Consolidação das Leis Civis de Teixeira Freitas e a nova Consolidação das Leis Civis de Carlos de Carvalho, publicada em 1915.Porém foi o Código Civil de 1916 o primeiro dispositivo legal brasileiro a versar de forma sistematizada sobre o instituto da adoção, dedicando onze artigos (368 a 378) para disciplinar sobre o tema.
Silva, Fernanda (2017) afirma que o Código Civil de 1916 tratava a adoção como um negócio jurídico entre duas partes e formal, por se dar através de consentimento entre as partes, sendo lavrado em escritura pública. Podendo o adotando representar-se na audiência para efetivação da adoção, caso fosse maior de 18 anos. Caso contrário seria representado por um de seus progenitores, tutor ou curador. Também se observa que por tratar-se de ato jurídico, o acordo poderia ser dissolvido nos casos em que as partes fossem maiores de 18 anos, e expressa manifestação da vontade de ambos em fazê-lo. Os adotantes tinham de ser casados, e com a adoção ocorria a passagem do poder familiar aos que adotaram. Com a intenção de perpetuação da família, o Código de 1916 possibilitava a adoção exclusivamente a casais com idade superior a 50 anos e que não tivessem nenhum filho natural ou adotado, posto que nessa idade os casais eram considerados incapazes de terem filhos de forma natural.
Marone (2016) observa que não havia no código Civil de 1916 uma preocupação relativa aos interesses do adotando, priorizando a conveniência ao adotante. Afirmando até mesmo que não havia uma interrupção de direitos e deveres com os pais biológicos, com exceção do poder familiar, de maneira que, mesmo após a efetivação da adoção, o adotado continuava obrigado com sua família natural, tendo direito, inclusive de receber herança por parte dessa. De maneira que não havia vínculo real entre o adotado e a família adotiva.
A lei n. 3.133/57 apresentou mudanças relevantes ao instituto da adoção concedendo-lhe mais importância perante o fato de que ela poderia ser outorgada às pessoas que manifestassem o desejo de adotar, ainda que não fossem incapazes de concebê-los naturalmente; Silva, Fernanda (2017) relata que a lei também vislumbrou o menor abandonado, possibilitando seu ingresso em uma nova família, mas a este adotado não era equiparado a um filho, pois não tinha direto a sucessão hereditária;
Na referida também houveram mudança quando a idades daqueles que poderiam adotar. A idade dos possíveis adotantes passou de 50 anos para 30 anos de idade, sendo a diferença de idade obrigatoriamente de 16 anos entre adotante e adotado; os adotantes deveriam ter, no mínimo, 5 anos de casados; a adoção ainda era realizada mediante escritura pública; deu-se o direito dos tutores e curadores adotarem seus tutorados e culatrados, após a prestação de contas; era permitida a adoção por estrangeiros, mas não trazia restrições; o adotado tinha que ser maior de idade;
Vale observar que a Lei n. 3.133/57 trouxe um avanço no que diz respeito a finalidade da adoção, sendo considerada, pela primeira vez um meio de melhorar as condições de vida do adotado. Nas palavras de Rodrigues (2007, p. 336 e 337): “A primeira importante modificação trazida pelo legislador, no campo da adoção, ocorreu com a Lei n. 3.133, de 8 de maio de 1957. Tal lei, reestruturando o instituto, trouxe transformações tão profundas à matéria que se pode afirmar sem receio de exagero, que o próprio conceito de adoção ficou, de certo modo, alterado. Isso porque, enquanto, dentro de sua estrutura tradicional, o escopo da adoção era atender ao justo interesse do adotante, de trazer para a sua família e na condição de filho uma pessoa estranha, a adoção (cuja difusão o legislador almejava) passou a ater, na forma que lhe deu a lei de 1957, uma finalidade assistencial, ou seja, a de ser, principalmente, um meio de melhorar a condição do adotado.”
Em seu corpo a referida lei também concede a possibilidade de o adotado poder acrescentar ao seu registro o nome dos pais adotivos, permanecendo o nome dos pais consanguíneos e adotantes conjuntamente. Podendo também optar por utilizar apenas o nome dos pais adotantes, de forma a eliminar os apelidos de sangue. De acordo com Cunha (2011) essa inovação trazida pela lei n. 3.133/57contribuiu para diminuir o preconceito que rondava os filhos adotados, ao demonstrar aos terceiros que a filiação era legítima.
Todavia não havia aqui, assim como no código civil de 1916, o desligamento do adotado da família natural, havendo somente a passagem do poder familiar do pai biológico para o adotante. (SILVA, Fernanda, 2017)
A Lei nº 4.655 de 02 de junho de 1965 que dispôs sobre a legitimidade adotiva foi considerada por muitos doutrinadores como um divisor de águas na legislação brasileira no que diz respeito à efetivação do adotado no seio familiar e sua devida integralização.
Vilela (2016) constata que surgiram muitas novidades na referida lei, algumas foram de grande importância, pois tiveram o intuito de mudar o instituto de forma que a adoção obtivera ampla relevância social com o principal interesse de integralização e igualdade.
A legitimação adotiva foi incluída pela lei 4.655/65, tinha como finalidade o amparo ao menor de idade abandonado, desconsiderando os laços sanguíneos com a família anterior, pela homologação da sentença concessiva da legitimação. Esta que ocorria por mandato, no registro Civil, e constituía um vínculo de 1º grau, entre o adotante e o adotado. Segundo Azevedo (2014) na legitimação havia a possibilidade de adoção de menores cujo pais fossem desconhecidos ou que manifestassem, por escrito, o desejo de entregar seus filhos à adoção ou aqueles cujos pais fossem destituídos do poder paterno.
Embora esta lei tenha inovado em alguns aspectos, trazendo um olhar mais atento ao interesse do adotado, neste ordenamento não houveram grandes melhorias em face de direito de sucessão, havendo ainda, algum tipo de discriminação com o menor adotado.
A Lei nº 4.655/65 foi expressamente revogada em 1979 com a instituição do Código de Menores, através da Lei nº 6.697.Tal código passou a reconhecer dois tipos de adoção na lei brasileira, os quais são a adoção simples e a adoção plena.
Coelho (2011) versa que a adoção simples ou restrita, era aplicada ao menor e disciplinada pelo código civil. Aqueles que se encontravam na menor idade cível precediam da autorização dos pais ou responsáveis na manifestação de sua vontade.
Os efeitos dessa adoção eram aplicados estabelecendo um vínculo entre adotado e adotante, fazendo com que a família biológica perdesse o poder familiar em relação ao adotado. Porém os impedimentos relativos ao casamento continuavam, no que diz respeito à família anterior. Os pais naturais se desvinculavam totalmente do filho que fora entregue a adoção, podendo inclusive, ser alvo de ação de alimentos caso a nova família do adotado esteja impedida de provê-lo.
Coelho (2011) constata que o código civil de 1916 não foi revogado pelo código de menores, mantendo as modalidades e efeitos do instituto da adoção. Porém, tal instituto ainda era carente de segurança jurídica, pois embora tivesse evoluído em relação aos direitos dos adotados, por ter natureza jurídica de contrato, se enquadrava nas hipóteses de extinção existente no código civil, podendo ser desfeito por simples manifestação de vontade das partes, o que consequentemente gerava uma insegurança no que diz respeito ao adotado.
A Lei nº 6.697/79 trouxe uma participação mais ativa do estado no processo de adoção, o que ocorria por meio da autoridade judicial, sem a qual os requisitos necessários não eram preenchidos e inviabilizando assim, o processo. Tal participação foi essencial para o desenvolvimento da proteção aos interesses e bem estar do adotado.
Ferreira, Souza e Cruz (2018) relata que foi neste código que foi introduzido o conceito de adoção conforme conhecendo hoje, que é a adoção plena. Entretanto, diferentemente da atualidade, a lei permitia apenas que cônjuges casados a mais de 5 anos e com mais de 30 anos fossem habilitados a postular essa modalidade de adoção, o adotado teria que ser menor de 7 anos. Neste tipo de adoção todo vínculo com a família natural era desfeita, tornando irrevogável o processo adotivo.
A Constituição Federal de 1988 trouxe uma relevante mudança na perspectiva em que a adoção passou a ser observada.
No caput do art. 227 da CF/88 temos a seguinte declaração: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Vemos uma grande evolução no que diz respeito à preocupação do Estado em garantir os direitos fundamentais para os menores, incluindo o princípio da proteção integral da Criança e do Adolescente, que deve ser garantida pela família, sociedade e Estado.
Em seu parágrafo 5º a constituição fixa que adoção deverá ser assistida pelo poder público, na forma da lei, que estabelecerão casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros. Nas palavras de Pereira (2014, p. 455): “Neste simples enunciado, destacam-se desde logo três aspectos predominantes no instituto. O primeiro é que a adoção não mais comporta o caráter contratualista que foi assinalado anteriormente, como ato praticado entre o adotante e o adota. Em consonância com o preceito constitucional, com caráter impositivo, deve ser assistida pelo Poder Público, na forma da lei, isto é, o legislador ordinário deve ditar regras segundo as quais o Poder Público dará assistência aos atos de adoção”.
A CF/88 em seu parágrafo 6º trouxe o que se conhece por igualdade de filiação, protegendo, de forma a consolidar o princípio do superior interesse do menor. Desta forma, qualquer diferenciação entre filhos legítimos e ilegítimos foi eliminada (FARIAS, 2007, p. 13).
O estatuto da criança e do adolescente surgiu em 1990 trazendo grandes mudanças ao instituto da adoção. Tal lei trouxe um olhar diferenciado para os menores, que se evidenciou até na substituição do termo “menor” para os termos “Criança” e “adolescente”, o primeiro se referia a pessoas com idade até 12 anos, o segundo a pessoas de idade entre 12 e 18 anos. Silva, Fernanda (2017) consta que o texto do estatuto consolidava a aplicação da adoção plena, porém priorizando a conservação da família natural, empregando esforços para que a criança ou adolescente permanecesse em seu seio familiar natural. Nos casos em que tal manutenção fosse impossível, o menor teria direito adoção, na qual teria todos os direitos e deveres dos filhos legítimos, como na adoção plena.
A redação do ECA se dedicou a diferenciar o instituto da adoção de um negócio jurídico qualquer, passando a não ser mais efetivada a partir de escritura pública e sim por determinação judicial. Silva, Fernanda (2017) observa que o artigo 1º da Lei 8069/90, passa a considerar o menor adotado como uma pessoa que era desejada, e não apenas parte de uma relação jurídica.
É importante mencionar que depois que o Estatuto da Criança e do adolescente entrou em vigor, existiam simultaneamente dois tipos de adoção, uma advinda do Estatuto que, como citado, excluía a natureza contratual da adoção, de forma que o menor de 18 anos era integrado de maneira plena na família adotiva, restando a exceção dos impedimentos matrimoniais; e a outra que tinha natureza civil, que matinha a ligação do adotado com a família biologia, transferindo apenas o poder familiar para os pais adotivos (GONÇALVES, p. 381. 2012).
O código civil de 2002 determina que a competência regimentar da adoção de menores é do ECA, como podemos ver no texto legal: “Art. 1.618. A adoção de crianças e adolescentes será deferida na forma prevista pela Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente”.
Marone (2016), conclui que foi com a implementação da Lei Nacional da Adoção – nº12.010/09 que todas as modalidades de adoção passaram a ser regidas pelo Estatuto da Criança de do Adolescente, com algumas exceções no que diz respeito a adoção de pessoas na fase adulta.
Durante esses aproximadamente 30 anos da criação do ECA, houveram diversas mudanças na legislação. Entretanto, no que se refere à adoção propriamente dita e a inserção da criança e adolescente em família substituta, a modificação mais atual foi a advinda da Lei nº 13.509/2017.
Alei de 2017 encurtou alguns prazos do processo de adoção, visando atender a demanda dos postulantes, com o objetivo de trazer mais segurança jurídica e a filiação efetiva do menor.
Nas palavras Cardoso (2018): “Como o processo instituído era longo e demorado, muitas vezes havendo a guarda e a ligação afetiva, mas não a adoção, isso gerava graves danos às famílias, como problemas relativos à educação, inserção de dependentes nos planos de saúde, entre outros aspectos práticos que não deveriam existir diante do princípio do Estatuto da Criança e do adolescente e da constituição, que estabelecem a afetividade como vínculo principal de constituição da família e da relação de filiação.”
Houve alterações no prazo de acolhimento institucional, reduzindo o tempo em que o menor pode permanecer em uma casa de acolhimento (abrigo). O acolhimento institucional tem caráter protetivo e só pode ser aplicada quando a criança encontra-se em situação de risco, devendo ser aplicada mediante ordem judicial.
Essa alteração processual visa diminuir o tempo em que a criança fica longe da convivência familiar, que é um dos pilares do Direito da Criança e do Adolescente. Foram acrescentados também outros dois parágrafos ao art. 19 do ECA que trata sobre o acolhimento institucional, preservando assim a garantia de convivência familiar durante o perídio em que o menor se encontra acolhido. Também traz a obrigatoriedade de tratamento especializado a mãe adolescente.
Existiram também mudanças no processo de adoção reforçando a preferência que a criança fique com o pai ou com alguma representante da família extensa. Se a mãe indicar quem é o pai da criança, deve-se tentar fazer com que este assuma a guarda e suas responsabilidades como genitor. Se não houver indicação de quem é o pai ou se este não manifestar interesse na criança, deve-se tentar acolher a criança em sua “família extensa”. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade (art. 25, parágrafo único do ECA). Essa busca à família extensa não pode ser feita de forma indefinida e, por isso, deverá durar, a lei prevê no máximo, 90 dias, prorrogável por igual período.
Prazo para a ação de adoção: quem receber a guarda da criança terá o prazo de 15 dias para propor a ação de adoção, contado do dia seguinte à data do término do estágio de convivência.
Porém, a principal novidade trazida pela Lei 13.509/17 é o instituto do apadrinhamento (Art. 19-B/§ 1º). O Programa de apadrinhamento consiste em proporcionar que a criança e ao adolescente que estejam em acolhimento institucional ou em acolhimento familiar possam formar vínculos afetivos com pessoas de fora da instituição ou da família acolhedora onde vivem e que se dispõem a ser “padrinhos”. As crianças ou adolescentes têm encontros com seus “padrinhos”, saem, passeiam, frequentam a casa, participam de aniversários, datas especiais. Tal apadrinhamento pode ser de caráter afetivo ou financeiro. Apesar de ser um avanço, o instituto é muito novo e ainda está em fase de adaptação.
CONCLUSÃO
De acordo com a literatura pesquisada pode-se concluir, quanto a finalidade do processo de adoção que, nos primórdios da civilização, a adoção era realizada para suprir as necessidades do adotante, na maioria das vezes em questões sucessórias. Com o passar do tempo o interesse do adotado foi sendo colocado como prioridade nos ordenamentos jurídicos, de modo que hoje, o papel da adoção não é mais o de conceder uma criança a uma família, mas uma família para uma criança.
Em relação ao procedimento, a adoção passou por mudanças significativas no decorrer dos anos. Nos primeiros códigos que temos conhecimento, a adoção era um ato meramente formal, que poderia ser revogado por interesse da parte adotante, de maneira a deixar a parte adotada vulnerável dentro do processo.
Com o passar dos anos algumas estabeleceram-se novas leis que traziam novas diretrizes quanto a forma de adotar e as implicações jurídicas do ato. Essa evolução percorreu vários ordenamentos jurídicos no brasil e no mundo, sendo o mais importante para o nosso estudo, a criação do Estatuto da Criança e do adolescente, que se dedicou a distinguir a adoção de um negócio jurídico qualquer, passando a ser efetivada por meio de determinação judicial.
Os princípios estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do adolescente serviram de base para ordenamentos posteriores que se dedicaram a legislar sobre o instituto da adoção, entre eles temos a Lei Nacional da Adoção – nº12.010/09, que determinou que o ECA seria aplicado a todas as modalidades de adoção, com algumas exceções no que diz respeito a adoção de pessoas na fase adulta, e a criação da Lei nº 13.509/2017 ,que traz as alterações mais atuais a respeito da adoção propriamente dita e a inserção da criança e adolescente em família substituta.
Tais alterações serviram para trazer mais segurança jurídica as partes do processo, mas o princípio máximo que rege o procedimento de adoção é o do superior interesse do adotado, que busca garantir direito a uma filiação provida de cuidado e afeto.
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