Justiça restaurativa e mediação penal – um novo caminho na Justiça criminal

Resumo: O sistema criminal atual não consegue dar uma resposta satisfatória à sociedade, bem como não consegue cumprir com as funções da pena, principalmente a reinserção social daquele que delinquiu. Nesse painel, surge a Justiça Restaurativa, através na mediação penal, reconstruindo de um “novo” paradigma de justiça penal. O presente artigo traz conceitos introdutórios sobre a Justiça Restaurativa, algumas justificativas para sua implementação no Brasil e alguns objetivos.

Palavras chave: Justiça Restaurativa; Mediação Penal; Humanização da Justiça Penal.

Sumário: 1) Introdução. 2) Implantação da Justiça Restaurativa no Brasil. 3) Objetivos da Justiça Restaurativa. 4) Conclusão.

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1. Introdução

Há muito se fala em crise do Poder Judiciário, aumento da violência, falência da pena de prisão, menor idade penal etc. Nos últimos anos, há a tentativa de simplificar as razões das crises, principalmente a do Poder Judiciário, argumentando a falta de juízes, de promotores, defensores públicos, funcionários, estrutura física etc. Enquanto isso, a sociedade espera do Estado que este a proteja das constantes ameaças e da violência.

Entretanto, a análise deve ser feita de forma mais ampla, alcançando razões de ordem histórica, sociológica e cultural para que melhor se posicione diante do quadro que ora se vive.

Nesse contexto, a Justiça Restaurativa, através na mediação penal, surge para a construção de um novo paradigma de justiça penal efetivando o Estado Democrático de Direito através da dignidade da pessoa humana, do acesso à justiça, do exercício da cidadania e da concretização de outros princípios constitucionais.

“Justiça Restaurativa é uma abordagem do crime focada em curar as relações e reparar o dano causado pelo crime aos indivíduos e às comunidades” [1]. (definição dada pelo Departamento de Justiça do Ministério da Justiça do Canadá)

O foco da justiça restaurativa são as consequências do crime e as relações sociais afetadas pela conduta.

Várias são as práticas da Justiça Restaurativa, dentre elas encontra-se a mediação penal, que consiste no processo informal e flexível, onde se insere a figura de um terceiro imparcial – mediador – que age com a finalidade de recompor um conflito originado de um ato delituoso. O mediador desenvolve seu trabalho de uma posição neutra, tentando obter o melhor das partes, promovendo a aproximação destas sem impor soluções. Mas, conduzindo o processo na tentativa de ajudar as pessoas envolvidas a restabelecer o diálogo e lhes sugerindo que encontrem uma solução satisfatória para todos.

As experiências de justiça restaurativa existentes no Canadá, Austrália, Japão, África do Sul, Itália, Espanha, Portugal, México, Argentina e Nova Zelândia (este considerado país pioneiro na implementação de práticas restaurativas), bem como no Brasil, demonstram que é possível restaurar no lugar de punir.

2. Implantação da Justiça Restaurativa no Brasil

A implementação da mediação penal serve como reação penal alternativa, atingindo finalidades político criminais. Vejamos algumas justificativas[2] para incluir, como resposta penal, as ferramentas da justiça restaurativa:

1) A Justiça Restaurativa é um instrumento de pacificação social;

2) A Justiça Restaurativa, através da mediação penal, serve como instrumento preventivo, pois busca preservar as relações viabilizando o diálogo entre os envolvidos, conferindo-lhes a autoria das soluções;

3) Dentre as características da Mediação Penal, encontra-se a interdisciplinariedade, que permite solucionar os conflitos na sua integralidade (aspectos legal, psicológico, social e financeiro).

4) As práticas restaurativas vão de encontro com o Estado Democrático de Direito;

5) Através da Mediação Penal tem-se a efetivação de princípios fundamentais como o exercício da cidadania, o acesso à justiça, a dignidade da pessoa humana, dentre outros;

6) A Organização das Nações Unidas – ONU recomendou, desde o ano de 1999, a adoção da Justiça Restaurativa pelos Estados Membros. Suas deliberações foram tomadas através do Conselho Econômico e Social, sendo formalizadas através de Resoluções: Resolução 1999/26 (de 26/07/1999), Resolução 2000/14 (de 27/07/2000) e a Resolução 2002/12 (24/07/2002);

7) O governo português apresentou, para discussão pública, um anteprojeto de proposta de lei sobre Mediação Penal com vista ao cumprimento de uma decisão do Conselho da União Européia, que impõe aos Estados-Membros o dever de pôr em vigor as disposições normativas necessárias para promover “(…) a mediação penal nos processos penais relativos a infrações que considere adequadas para este tipo de medidas (…) assegurando que possam ser tidos em conta quaisquer acordos entre a vítima e o autor da infração, obtidos através da mediação em processos penais”.[3]

8) A implantação de práticas restaurativas vai de encontro com o Projeto “Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro” de iniciativa da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça do Brasil em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD;

9) O princípio fundamental da Lei 9.099/95 é a busca da aplicação de medidas alternativas, mediante o consenso entre as partes envolvidas (autor do fato e vítima). E a Justiça Restaurativa, tendo como instrumento a mediação penal, nada mais é que uma forma alternativa de resolução de conflitos;

3. Objetivos da Justiça Restaurativa

São objetivos da justiça restaurativa, dentre outros:

1) A prática da justiça restaurativa objetiva viabilizar uma política pública que gere celeridade, efetividade e acesso à Justiça, através de uma metodologia de mediação penal interdisciplinar, especialmente desenvolvida para a atuação em relações afetivas continuadas;

2) Tendo em vista que os mediados (vítima e ofensor) muitas vezes possuem laços familiares, convivem no mesmo ambiente doméstico ou na mesma comunidade, a Mediação Penal trabalha para que as partes envolvidas na demanda restabeleçam o diálogo, o respeito mútuo, a paz, podendo, os mesmos, evitar novos conflitos.

3) Contribuir para inclusão e pacificação social.

4) Diminuição dos custos inerentes à solução de conflitos.

5) A mediação penal, como meio alternativo de solução de conflitos, serve como instrumento para acelerar o Judiciário.

6) A mediação penal busca a obtenção de acordos setorizados nos juízos criminais, bem como, proporcionar, aos envolvidos no conflito, instrumentos aptos a produzir a transformação do padrão comunicativo e do relacional.

4. Conclusão

O modelo restaurativo destaca a necessidade de um empowerment “como fundamento de uma nova subjetividade que atribua aos indivíduos um papel ativo, um papel de redefinição dos problemas, de reafirmação da própria esfera de autonomia e poder, seja em termos culturais, políticos, psicológicos (…)”. (Leonardo Sica, 2007; p. 19)

É sabido que o sistema criminal atual é ineficaz, não conseguindo dar uma resposta satisfatória à sociedade, bem como não consegue cumprir com as funções da pena, principalmente a reinserção social daquele que delinqüiu. A Mediação Penal, como instrumento da Justiça Restaurativa, surge como “novo” paradigma contribuindo para a humanização do sistema penal.

É importante ressaltar que a justiça restaurativa “não é um modelo substitutivo ao atual: os modelos punitivos e restaurativos devem coexistir e complementar-se, (…).” [4] (SICA, 2007. p.34)

 

Referências bibliográficas
CAVALIERI Filho, Sérgio. Programa de Sociologia Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
JUNIOR, Walsir Edson Rodrigues Júnior. A prática da mediação e o acesso à justiça. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006.
MORAIS, José Luis Bolzan; SPENGER, Fabiana Marion. Mediação e Arbitragem: alternativa à jurisdição. 2ª ed. rev. atualizada. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2008.
SICA, Leonardo. Justiça Restaurativa e Mediação Penal: O Novo Modelo de Justiça Criminal e de Gestão de Crime. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
Notas:
[1] SICA, Leonardo. Justiça Restaurativa e Mediação Penal – O Novo Modelo de Justiça Criminal e de Gestão do Crime. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris. Ed., 2007. p. 12.
[2] O rol de justificativas, aqui apresentado, é apenas exemplificativo.
[3] Fonte: site www.institutodenegociacao.com.br.
[4] SICA, Leonardo. Justiça Restaurativa e Mediação Penal: O Novo Modelo de Justiça Criminal e de Gestão do Crime. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007.

Informações Sobre o Autor

Ana Paula Faria

Advogada. Mediadora de Conflitos. Professora de Direito Penal. Membro da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB/MG. Mestranda no Programa DDMRC – Master em Resolución de Conflictos y Mediación. Universidad de Léon/Espanha. Aluna no Mestrado Interdisciplinar do Programa de Pós Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF/Rio de Janeiro). Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade de Itaúna – MG. Graduada em Direito pela Universidade FUMEC/FCH


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Equipe Âmbito Jurídico

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