Direito Administrativo

Legalidade da dispensa de licitação nas contratações públicas para enfrentamento da pandemia do COVID-19

Autor: Airton Gabriel Salviano de Jesus – Bacharelando em Direito pela Faculdade São Francisco da Paraíba – FASP. (e-mail: airtongabriels99@gmail.com); Orientador: Neuribertson Monteiro Leite. Mestre em Sistemas Agroindustriais pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade São Francisco da Paraíba – FASP. Bel. em Direito pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB. (e-mail: neuribertson1972@gmail.com).

Resumo: O presente artigo na área do Direito Administrativo tem como objetivo analisar a dispensa de licitação e as principais inovações introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro no ano de 2020 no enfrentamento à pandemia de COVID-19, bem como seus desdobramentos nos contratos públicos. A intenção do trabalho é responder como e até que ponto as contratações públicas estão dentro da legalidade no caráter de dispensa de licitação para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus? Desse modo, no que tange ao procedimento metodológico, trata-se de uma pesquisa do tipo exploratória. Quanto a natureza é qualitativa, na qual foram utilizados os métodos dedutivos e as técnicas de pesquisa da revisão bibliográfica. A análise do material coletado será realizada utilizando os métodos interpretativos com os resultados pautados na legislação brasileira, valendo-se das obras de diversos autores renomados como referência e realizando exposições acerca da temática abordada. O objetivo é compreender o tema de estudo, entendendo seus conceitos, possibilidades e formas de aplicação no contexto atual. Chegando à conclusão da legalidade acerca do correto procedimento de dispensa de licitação e dos riscos envolvidos em razão das condutas tomadas pelos Agentes Públicos e pelos interessados no certame licitatório.

Palavras-chave: COVID-19. Calamidade Pública. Licitação. Dispensa. Legalidade.

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Abstract: This article in the field of Administrative Law aims to analyze the waiver of bidding and the main innovations introduced in the Brazilian legal system in the year 2020 to conduct about the pandemic of COVID-19, as well as its consequences in public contracts. The intention of this paper is to answer how and to what extent public procurement is within the legal framework in the character of waiving bidding to deal with the pandemic of the new coronavirus.  Thus, with regard to the methodological procedure, it is an exploratory search.  As for its nature, it is qualitative, in which the deductive methods and research techniques of bibliographic review were used.  An analysis of the collected material will be performed using the interpretative methods with the results based on the Brazilian legislation, Using of the works of several renowned authors as a reference and conducting research on the subject addressed.  The objective is to understand the theme of studies, their concepts, possibilities and ways of application in the current context. Also coming to the conclusion of the legality about the correct procedure for waiving bidding and the risks attributed due to the conduct obtained by the Public Agents and by those interested in the bidding process.

Keywords: COVID-19.  Public Calamity.  Waiving Bidding.  Legality.

 

Sumário: Introdução. 1 Obrigatoriedade de licitação pública para contratações da Administração Pública. 1.1 Conceito de Licitação. 1.2 Fases da Licitação. 1.3 Modalidades de Licitação. 1.4 Tipos de Licitação. 2 Dispensa de licitação e principais inovações legislativas de 2020 para enfrentamento da emergência de saúde pública. 2.1 Dispensa de licitação nos moldes da Lei 8.666/93. 2.1.1 Inovações legislativas no procedimento licitatório em 2020, em face da emergência de saúde pública. 2.1.2 Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) em tempos de pandemia. Considerações Finais. Referências.

 

Introdução

A Constituição Federal de 1988 foi um marco histórico e de grande relevância na proteção de Direitos para garantias fundamentais dos cidadãos. A União, Estados, Municípios e o Distrito Federal dentro das especificações e ressalvas legais possuem em regra competência concorrente para atuarem na proteção e promoção dessas garantias.

Recentemente com a pandemia ocasionada pela COVID-19[1] ficou em evidência a necessidade de cooperação dos Entes para garantia do Direito à Saúde estampado no art. 196 da CF/88[2]. Ao mesmo tempo em que se constatou um Sistema Único de Saúde (SUS) e os hospitais da Rede Privada completamente deficitários de insumos e suprimentos médicos que garantissem não só o Direito à Saúde, mas também o Direito à Vida. Um sistema público que já se encontrava fragilizado e caótico, afogado em corrupção em grande parte do Brasil, deparou-se diante da pandemia com a incapacidade de garantir o mínimo para profissionais e pacientes.

Em razão da necessidade e urgência na tomada de medidas para enfrentamento do COVID-19, principalmente no tocante a aquisição de bens e serviços, houve diversas inovações legislativas para viabilizar as contratações públicas dentro da legalidade no qual dispõe o art. 24, IV da Lei 8.666/93 ampliada pela Lei 13.979/2020 e alterada pelas Medidas Provisórias 926/2020, 951/2020 e 961/2020, bem como regulamentando a aplicação da Lei 12.462/2011.

A presente pesquisa tem como objetivo geral analisar diante do cenário pandêmico atual, como e até que ponto é possível dispensa de licitação dentro da legalidade nas contrações públicas para enfrentamento do COVID-19, em decorrência da edição dos institutos legislativos que flexibilizaram as contratações da Administração Pública durante a emergência de saúde pública.

Como objetivos específicos, buscará analisar a imposição constitucional de licitar, compreender o conceito, as fases, as modalidades e os tipos de licitação, destacar a possibilidade de dispensa de licitação, evidenciar as principais inovações de 2020 tratando sobre o tema e analisar a legalidade da dispensa de licitação.

A principal relevância é compreender o caráter de dispensa de licitação como ferramenta essencial, pautado na legislação e sua implicância nas contratações diretas no atendimento ao interesse público para enfrentamento da pandemia ocasionada pela COVID-19, bem como sua correta aplicação pelos Agentes Públicos no atendimento da sociedade.

Dessa forma, tem-se como finalidade através de pesquisas bibliográficas, legislações e princípios norteadores, responder à seguinte pergunta problema: como e até que ponto as contratações públicas estão dentro da legalidade no caráter de dispensa de licitação para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus?

 

1 Obrigatoriedade de licitação pública para contratações da Administração Pública

As contratações públicas por exigência Constitucional e nos termos especificados na Lei 8.666/93 devem como regra geral serem realizadas mediante procedimento licitatório para aquisição de obras, serviços compras e alienações sendo resguardadas a concorrência e participação dos interessados mediante escolha do vencedor com base em critérios objetivos previstos no certame licitatório. Nesse sentido dispõe imperativamente o art. 37, XXI da CF/88, vejamos:

“XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.” (BRASIL, 1988).

A Administração Pública por força do artigo supracitado para realizar a formalização do contrato deverá obrigatoriamente possibilitar dentro dos princípios gerais e específicos igualdade entre os licitantes, garantindo lisura e legalidade ao processo licitatório objetivando sempre o negócio mais vantajoso ao percorrer às várias etapas do procedimento licitatório.

“Com efeito, a obrigação de licitar abrange todos os órgãos administrativos dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, dos Tribunais de Contas e do Ministério Público, o que foi objeto de expressa menção pelo art. 117 da Lei nº 8.666/1993.” (AMORIM, 2018).

Outrossim, todos os Entes da Administração Indireta e outros órgãos que recebam orçamento público tem a obrigação de licitar. Por tratar de dinheiro público e garantir sua correta destinação nos moldes do orçamento púbico previamente definido pelo Poder Legislativo. Conforme o valor do contrato será realizado dentre as modalidades de concorrência, tomada de preços, convite, concurso, leilão ou pregão, ressalvados os casos de dispensa previstos na Lei 8.666/93 que será apreciado mais adiante.

 

1.1 Conceito de Licitação

A licitação é o instrumento e a ferramenta que antecede formalmente a assinatura do contrato. Dentre suas várias etapas regidas na forma da lei é que se observa fortemente o principal objetivo de escolher a proposta mais vantajosa ao final do procedimento, sendo assim corolário do princípio da eficiência. Carvalho Filho conceitua licitação como:

“[…] procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração de contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico.” (CARVALHO FILHO, 2019).

Diante desse conceito bastante amplo e enriquecedor é necessário compreender alguns pontos. O procedimento é vinculado no que se refere que caso a Administração Pública venha contratar, deve ser contratado o vencedor da licitação. Não há vinculação no sentido de obrigar o Ente Público a contratar prontamente com o vencedor, haja vista, o orçamento destinado e urgente necessidade da contratação. Nesse sentido a vinculação é uma garantia do vencedor que caso a Administração necessite contratar dentro do prazo previsto, será com ele a efetivação formal do contrato.

Outro ponto que merece destaque é a escolha da proposta mais vantajosa, dessa forma o interessado dentro de sua margem de lucro participará de forma competitiva com base em critérios objetivos e atributos necessários de seleção previstos no certame antecedendo de forma sequenciada as etapas para formalização do contrato de maior vantagem para a Administração.

“Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse, inclusive o da promoção do desenvolvimento econômico sustentável e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos.” (MEIRELLES; FILHO, 2016).

A visão dos autores parte do ponto de um processo isonômico, conferindo a todos os interessados condições e oportunidades iguais para participação além de ressaltar o disposto no art. 3º da Lei 8.666/93 da importância no desenvolvimento sustentável nacional, fortalecendo e apoiando a aquisição nacional de bens e serviços objeto do contrato.

Observa-se a intenção legislativa de além de fomentar a economia nacional e estimular a criação e implementação de bens e serviços nacionais de cunho sustentável para injeção na economia do país de mais recursos para o fortalecimento das cadeias produtivas e consequentemente do desenvolvimento nacional o ambiental, econômico, cultural e social por meio da inserção da Lei 12.349/2010.

 

1.2 Fases da Licitação

Entendido o conceito, passaremos a analisar as fases do instrumento licitatório, didaticamente divididos em três fases, são elas: fase interna, fase externa e a fase contratual como objetivo final. Antes é necessário salientar que para existir licitação deve necessariamente existir concorrência de licitantes de forma plural e variedade de objetos ofertados com interesse da Administração Pública no objeto a ser licitado. A fase interna segundo Meirelles (2016), tem sua origem no bojo da repartição pública, com a determinação da autoridade competente, com viabilidade orçamentária e objeto a ser contratado com a iniciativa da abertura do processo.

“Nessa fase a Administração Pública planejará o que licitar, como licitar, quais os riscos que a licitação poderá implicar, quais serão as condições do edital e a quantidade de recursos financeiros para realização do certame.” (ROSSI, 2019).

A fase interna é a fase do planejamento para preparação da licitação, é um estudo de viabilidade orçamentária com previsão de recursos diante da necessidade do objeto, estabelecimento dos requisitos objetivos onde atuarão na forma eliminatória no julgamento dos licitantes, além do estudo das consequências que poderão implicar. Essa fase, portanto, condiciona o certame nos moldes seguidos pelas demais fases para concretização dentro da legalidade e contratação pública.

“Enfim, a etapa interna do procedimento desenvolve-se de acordo com esta sequência: a) requisição da área/unidade interessada; b) estimativa do valor (pesquisa de preços); c) autorização da despesa; d) elaboração do instrumento convocatório e seus anexos; e) análise da minuta do ato convocatório pela assessoria jurídica; f) publicação do aviso de licitação e divulgação do edital.” (AMORIM, 2018).

Ocorre também, a composição na forma do art. 51 da Lei 8.666/93 da comissão licitante por ao menos três servidores públicos de caráter permanente ou temporário. É elaborado o edital nos termos do art. 40 da Lei 8.666/93, com requisitos objetivos vinculando a Administração Pública e encaminhado para parecer jurídico, onde doravante deverá ser formalmente autorizado pelo chefe da repartição com posterior publicação, respeitados os prazos de antecedência mínima prevista na lei conforme a modalidade.

A fase externa, por sua vez, é composta por várias etapas. Conforme o art.  21 da Lei 8.666/93 com a devida publicação do ato convocatório, é iniciada a etapa de instauração, vinculando o ente licitante, oportunizando a quem interessar a impugnação do edital nos termos do art. 41 da Lei 8.666/93, sem efeito suspensivo, onde a comissão verificando a existência de vício poderá fazer aditamento e publicará nos mesmos moldes do edital impugnado para ciência de todos.

Seguindo para etapa de qualificação, é o momento de verificação por parte da Administração quanto a inidoneidade e capacidade dos licitantes para definir se é apto para execução do contrato por meio da abertura dos envelopes e análise dos documentos. Nesse sentido vejamos o art. 27 da Lei 8.666/93:

“Art. 27.  Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a: I – habilitação jurídica; II – qualificação técnica; III – qualificação econômico-financeira; IV – regularidade fiscal e trabalhista; (Redação dada pela Lei nº 12.440, de 2011)  (Vigência) V – cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal.  (Incluído pela Lei nº 9.854, de 1999).” (BRASIL, 1993).

Preenchendo os requisitos exigidos o licitante qualificado estará considerado apto a continuar para próxima etapa e os desqualificados serão oportunizados no prazo de cinco dias para apresentar o recurso na forma do art. 109, I, a, da Lei 8.666/93. Na etapa de classificação das propostas a comissão observará se o licitante está seguindo o valor praticado no mercado, bem como se cumpriu todos os requisitos objetivos exigidos no edital. Não cumprindo as exigências será desclassificado nos moldes do art. 48 da Lei 8.666/93.

Após a classificação, o licitante seguirá para a etapa de julgamento das propostas, onde diante os critérios de julgamento previstos no edital, quais sejam: menor preço, melhor técnica, técnica e preço, ou maior lance ou oferta. A proposta vencedora mais vantajosa para a Administração Pública passará para a etapa de homologação para verificação da regularidade do procedimento por parte da autoridade que nomeou na forma da lei a comissão de licitação para apreciação das propostas.

Concluindo a fase externa, a etapa de adjudicação, onde conferirá ao licitante de melhor proposta como o vencedor da licitação, resguardando que em caso de assinatura de contrato será com ele, que formalmente acontecerá. Vale ressaltar, que com o advento da Lei 10.520/2002 que instituiu a modalidade de pregão, visando uma maior celeridade passou-se a adotar nessa modalidade a apreciação de propostas seguido de habilitação e adjudicação para posteriormente homologar o vencedor do processo licitatório.

A última fase é chamada de fase contratual, resultado das fases anteriores como uma obrigação consensual celebrado entre a Administração Pública diante do interesse público com o particular para aquisição de bens ou para prestação de serviços. Para Carvalho Filho (2019), contrato administrativo pode ser conceituado como “[…] ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma forma, traduza interesse público”. Nessa óptica, é a relação bilateral para concretização de finalidades de interesse público, mediante instrumento formal por meio de requisitos objetivos e gerador de obrigações recíprocas de caráter oneroso, regido pelo direito público.

“Contrato administrativo é o ajuste que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, firma com particular ou com outra entidade administrativa para a consecução de objetivos de interesse público, nas condições estabelecidas pela própria Administração (cap. V, item 1). É sempre bilateral, no sentido de que há duas partes com objetivos diversos: uma, a Administração, que pretende o objeto contratado (obra, serviço etc.); outra, que almeja receber a contraprestação (preço ou qualquer outra vantagem correspondente).” (MEIRELLES; FILHO, 2016).

Sendo assim, o contrato administrativo é a formalização do conjunto de atos que declarou o licitante vencedor da licitação para o estreitamento da relação obrigacional e consequente execução voluntária do objeto do contrato, seja ela a entrega de bens ou a prestação de serviços do interesse público.

 

1.3 Modalidades de Licitação

As modalidades de licitação estão relacionadas a estrutura procedimental nas formas de realização do procedimento licitatório, tendo como critério diferenciador o valor e o objeto envolvido que se moldam na modalidade a ser definida com base nesses critérios. A Constituição Federal estabeleceu em seu art. 22, XXVII, a competência privativa da União para legislar sobre as modalidades licitatórias, dessa forma, somente por lei federal é que o legislador poderá definir.

“O art. 22, § 8º, da Lei n. 8.666/93 proíbe a criação de outras modalidades de licitação ou a combinação das existentes. A vedação é di​rigida à Administração Pública, mas não impede que o legislador crie novas modalidades (grifos do autor).” (MAZZA, 2019).

Nesse entendimento, a Administração Pública por vedação legal não poderá criar ou por meio de junção instituir uma nova modalidade, haja vista, a competência ser de lei federal. Percebe-se que a Lei 8.666/93 e a Constituição Federal visou resguardar contra medidas arbitrárias dos gestores o interesse público, como bem maior tutelado, evitando dessa forma, possíveis fraudes.

As modalidades de licitação concorrência, tomada de preço, convite concurso e leilão estão dispostas em rol taxativo respectivamente nos incisos I, II, III, IV e V do art. 22 da Lei 8.666/93. Já a modalidade pregão foi instituído pela Lei 10.520/2002 para aquisição de bens e serviços comuns.

Como abordado sucintamente anteriormente, as modalidades são definidas em critérios baseados no valor e no objeto. Quanto ao valor teremos concorrência, tomada de preços ou convite. Quanto ao objeto teremos concurso, leilão ou pregão. Diante dessas noções iniciais passaremos a apreciar cada uma delas.

A modalidade concorrência formada por comissão mínima de três membros é destinada principalmente em razão do grande vulto envolvido para aquisições da futura contratação, com maior rigor formal, ampliando e possibilitando a todos os interessados que preencham os requisitos comprovados na habilitação, a participação na licitação, bem como uma ampla publicidade. Na forma do art. 22, I, c, da Lei 8.666/93 para obras e serviços de engenharia com valor acima de R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais) e para compras e serviços acima de R$ 1.430.000,00 (um milhão quatrocentos e trinta mil reais) conforme art. 22, II, c, da Lei 8.666/93. A modalidade concorrência também será obrigatória quando a parte contratante for Consórcio Público, uma vez que, a contratação futura envolve uma grande destinação de recursos.

“Se contratante for um consórcio público, as faixas de valor serão alteradas: o dobro, em se tratando de consórcio formado por até três entidades federativas, e o triplo, no caso de número superior de pactuantes. Não custa relembrar, contudo, que o art. 120 do Estatuto admite atualização dos valores pelo Poder Executivo, para adequação aos novos preços praticados no mercado. Por certo, o ato adequado é o decreto (grifos do autor).” (CARVALHO FILHO, 2019).

O Consórcio Público, com regulamentação na Lei 11.107/2005[3], na qual acrescentou o art. 23, § 8º, à Lei 8.666/93, definindo valores em dobro para até três entes e o triplo para mais de três entes em Consórcio, constituído por associação pública ou pessoa jurídica de direito privado. Em caso de área de saúde, deverá atuar com observância aos princípios, diretrizes e normas que regulam o Sistema Único de Saúde (SUS), conforme disposto no art. 1º, § 3º, da Lei 11.107/2005. O Consórcio Público dependerá de protocolo de intenções ratificado por lei, onde também será formalizado um contrato de rateio para os recursos financeiros formalizado em cada exercício financeiro.

Em razão da natureza da contratação futura, a concorrência será também obrigatória nas licitações internacionais, concessões de serviços públicos, concessões de direito real de uso de bem público e nos contratos de empreitada integral.

A tomada de preços, formada por comissão mínima de três membros, será a modalidade quando os interessados já estiverem previamente cadastrados ou fizer até o terceiro dia útil que antecede a data marcada para o recebimento das propostas, com convocação pública e devidas informações dispostas para realização da licitação. Na forma do art. 23, I, b, da Lei 8.666/93, o montante de até R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais) para obras e serviços de engenharia e até R$ 1.430.000,00 (um milhão, quatrocentos e trinta mil reais) para compras e serviços nos moldes do art. 23, II, b, da Lei 8.666/93.

“O que a caracteriza e distingue da concorrência é a existência da habilitação prévia dos licitantes através dos registros cadastrais, de modo que a habilitação preliminar se resume na verificação dos dados constantes dos certificados de registro dos interessados e, se for o caso, se estes possuem a real capacidade operativa e financeira exigida no edital (grifos do autor).” (MEIRELLES; FILHO, 2016).

A tomada de preços com a habilitação prévia dos licitantes tem a tendência de ser mais célere e ágil para a concretização do objeto licitado para contratação. Os licitantes por já estarem cadastrados e de conhecimento da Administração Pública, elimina a necessidade de verificar todos os documentos exigidos nos arts. 28 a 31 da Lei 8.666/93, pois previamente já verificados, onde os interessados apenas apresentarão o Certificado de Registro Cadastral (CRC) na comprovação dos documentos exigidos para habilitação.

O convite é a modalidade voltada para as contratações de pequeno valor, não exigindo publicação, uma vez que se dará por carta-convite no mínimo à três licitantes registrados ou não para que apresentem as respectivas propostas no prazo de cinco dias. O § 3º do art. 22 da Lei 8.666/93, determina a fixação da cópia do instrumento convocatório no átrio da repartição, oportunizando a todos os interessados, onde deverão apresentar interesse no prazo de até 24 (vinte e quatro) horas das apresentações das propostas.

Para contratação de obras e serviços de engenharia o art. 23, I, a, da Lei 8.666/93 determina para o convite o importe em até R$ 330.000,00 (trezentos e trinta mil reais) e para compras e serviços em até R$ 176.000,00 (cento e setenta e seis mil reais) conforme estabelece o art. 23, II, a, da Lei 8.666/93.

A modalidade concurso prevista no art. 22, § 4º, da Lei 8.666/93, encontra-se pautada na escolha de trabalho técnico, científico ou artístico mediante uma contrapartida por parte da Administração Pública, por meio do estabelecimento de diretrizes, condições e requisitos objetivos de escolha do vencedor previstos no regulamento do certame.

“Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.” (BRASIL, 1993).

Ressalte-se ainda que nessa modalidade não há necessidade da comissão ser composta por agentes públicos, haja vista, que a modalidade concurso tem o condão de escolha baseado em características técnicas e personalíssimas, e por isso a comissão julgadora aplica-se de forma técnica por meio dos profissionais ali formados.

“Pode-se citar como exemplo, um concurso para escolha do melhor projeto arquitetônico para revitalização do centro de uma cidade, ou concurso de monografias em determinada área do conhecimento de interesse do órgão público. Em ambos os casos, a Administração Pública escolherá um trabalho a ser premiado conforme estipulado no edital.” (CARVALHO, 2017).

Nesse sentido, a contratação é apenas fundamentada na premiação previamente fixada pelo trabalho de cunho intelectual e subjetivo do autor da obra técnica, científica ou artística. A modalidade leilão por sua vez, é destinada para alienações de bens móveis ou imóveis com intervalo de quinze dias corridos contados entre o instrumento convocatório e entrega de envelopes. Dessa forma, é destinada para venda por meio lances, maior ou igual a avaliação de bens móveis inservíveis, apreendidos ou penhorados, bem como bens imóveis provenientes de dação em pagamento ou decisão judicial.

O procedimento será realizado por leiloeiro, não necessitará de habilitação prévia dos licitantes e em cumprimento ao art. 17, § 6º, da Lei 8.666/93 a quantia dos bens móveis avaliados, isolada ou globalmente não será superior a R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais).

A modalidade pregão foi instituída pela Lei 10.520/2002 para aquisição de bens e serviços comuns, complementando a Lei 8.666/93 com a finalidade de abarcar outras situações. Nesse cenário é importante compreender acerca da expressão bens e serviços comuns.

“[…] O que caracteriza os bens e serviços comuns é sua padronização, ou seja, a possibilidade de substituição de uns por outros com o mesmo padrão de qualidade e eficiência.

[…] O essencial é que o objeto licitado possa ser definido por meio de especificações usuais no mercado, o que não impede a exigência de requisitos mínimos de qualidade, como acontece, por exemplo, com o denominado material de escritório (grifos do autor). (MEIRELLES; FILHO, 2016).

A Administração Pública utiliza-se da licitação por versar sobre aquisição de bens e serviços que envolvem contratação do objeto licitado definido por expressões usais de mercado independente do valor estimado com padrões de desempenho e qualidade previstas no edital, na qual o pregoeiro como sendo o servidor público com o curso, buscará sempre o menor preço entre os licitantes para a contratação.

Portanto, o que denomina bens e serviços comuns é padronização com possibilidade de substituir por outro de mesmo padrão conforme a definição do edital que estabeleceu a qualidade e eficiência como pressuposto. Visando celeridade no procedimento para ulterior contratação, após percorrido a fase preparatória seguirá para a fase externa, com publicação do edital de aviso em diário oficial ou não existindo, em jornal de circulação local, facultado a publicação em meios eletrônicos, com prazo fixado no mínimo em oito dias úteis para apresentação das propostas, conforme arts. 3º e 4º da Lei 10.520/2002. Após classificação das propostas por meio de lances verbais e mínimo de três licitantes, seguirão para fase de habilitação, adjudicação e por fim a homologação do vencedor.

 

1.4 Tipos de Licitação

Os tipos de licitação de menor preço, de melhor técnica, de técnica e preço e a de
maior lance ou oferta atuam dentro dos critérios objetivos previstos no edital como critérios de julgamento fundamentado no art. 45 da Lei 8.666/93, onde estabelece a forma de aferição para escolha do vencedor do procedimento licitatório.

O tipo menor preço, pauta-se na seleção de propostas mais vantajosas economicamente para a Administração Pública em função da proposta de menor valor apresentada nas exigências e cumprimento dos demais requisitos do edital ou convite, não requerendo caraterísticas especiais.

No tocante a melhor técnica, esta fundamenta-se na qualidade do bem ou prestação do serviço e por força do art. 46 da Lei 8.666/93 é exclusivamente destinada para licitações para serviços de natureza intelectual ou para serviços de informática. Técnica e preço por sua vez é utilizada para serviços de natureza intelectual, onde levará em consideração a análise e ponderação dos atributos de qualidade do bem ou serviço, bem como o valor agregado refletido nas necessidades do Estado.

Por fim, o tipo de maior lance ou oferta, é voltado para as alienações na modalidade leilão, definindo como vencedor o licitante com maior lance ou igual a avaliação realizada pelo órgão público. Do mesmo modo a de menor lance ou oferta como critério para a modalidade pregão. Ressalte-se que o art. 45, § 5º, da Lei 8.666/93 veda a utilização de outros tipos não previstos como critério de julgamento para seleção das propostas.

 

2. Dispensa de licitação e principais inovações legislativas de 2020 para enfrentamento da emergência de saúde pública

Inicialmente, o caput do art. 37 da CF/88 expressamente elenca alguns dos princípios norteadores submetido pela Administração Pública Direta e Indireta, bem como também aplicados ao procedimento de licitação, são eles: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência, também conhecidos pela sigla LIMPE, onde dentre outros princípios gerais de suma importância serão abordados a seguir.

Pautado na Supremacia do Interesse Público, o princípio da legalidade trata-se da permissão legislativa para atuação do agente público que atua em nome do Estado, atuando mediante subordinação à lei, no melhor interesse da coletividade sobre o particular. Dentro da licitação é um procedimento vinculado à lei e ao instrumento convocatório, respeitando o devido processo legal, sendo o meio para alcançar o objetivo público.

A impessoalidade parte da noção de tratamento igualitário, tratando todos os interessados sem nenhum privilégio e sem discriminação. Segundo Carvalho Filho (2019) “[…] oferecendo igual oportunidade a todos os interessados, a Administração lhes estará oferecendo também tratamento impessoal”. Portanto, a atuação da Administração Pública buscará a figura de neutralidade não abarcando a pessoa do licitante e da mesma forma para o Estado, representado pelo agente que atua em nome da Administração, sob pena de incorrer em Improbidade Administrativa[4].

Ressalte-se que no caráter de impessoalidade a Constituição Federal e a Lei 8.666/93 apresentam algumas ressalvas. O art. 170, IX, da CF/88 prevê tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, o art. 3º, § 2º, da Lei 8.666/93 estabelece critérios de preferência para desempate nos casos de contratação de produtos manufaturados e serviços produzidos de origem nacional e na forma do art. 3º, § 2º, V , da Lei 8.666/93 que confere preferência às empresas que cumprem a reserva de cargos na forma da lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social na contratação de bens ou serviços.

O princípio da moralidade tem sua atuação centrada nos valores morais, boa-fé, honestidade e lealdade de forma impositiva para que o agente público e licitantes estejam em conformidade com os princípios éticos. Dessa forma, mesmo diante da falta de dispositivo legal regulamentando a conduta, deve ser tomada baseando-se nos ditames da ética.

A publicidade incorre como condição para eficácia do procedimento licitatório e do contrato em si. Sendo assim, a garantia de transparência à população acerca dos atos originários da conduta legal oportunizando mecanismos de controle e fiscalização no acompanhamento e prestação de contas à sociedade. O sigilo, por sua vez, é exceção nos casos ressalvados na forma da lei.

O princípio da eficiência parte da finalidade de fazer mais ações com menos dispêndio de recursos, otimizando a gestão de recursos, alcançando a melhor vantagem em termos de qualidade e finalidade pública, atendendo aos anseios da sociedade.

“O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público” (grifos do autor). (DI PIETRO, 2019).

Segundo a visão de Di Pietro, ao mesmo passo que se procura gerir da melhor forma os recursos e sua correta destinação, também se busca o mais alto desempenho do agente público, traduzido em resultado positivo para a administração. Com efeito, acarreta otimização do serviço público do órgão, concretizando-se no resultado almejado e obtido pela licitação, haja vista, a constante busca pela proposta mais vantajosa diante do burocrático procedimento licitatório.

 

2.1 Dispensa de licitação nos moldes da Lei 8.666/93

Em face do abordado acerca da obrigatoriedade de licitação como regra para contratações públicas, a Lei 8.666/93 em seu art. 24, traz ressalvas para a dispensa de licitação e em seu inciso IV prevê que diante da urgência em virtude da calamidade pública e necessário atendimento emergencial, poderá haver a dispensa de licitação.

“Nesse sentido, conforme a legislação ora vigente, a dispensa e a inexigibilidade de licitação configuram situações que a administração pode contratar sem a necessidade de realização do procedimento licitatório. São situações de contratação direta” (grifos do autor). (CARVALHO, 2017).

A dispensa de licitação é caracterizada pela possibilidade de licitar, entretanto diante do interesse público e da necessidade do objeto da contratação e permissão legal para dispensa, torna-se inviável, uma vez que, o procedimento licitatório é complexo e burocrático, não sendo compatível com a urgente necessidade de contratar, sendo, portanto, dispensável. Sendo assim, é prudente ao administrador optar pela contratação direta, observando os preceitos legais.

“Há, porém, dois aspectos preliminares que merecem ser considerados. O primeiro diz respeito à excepcionalidade, no sentido de que as hipóteses previstas no art. 24 traduzem situações que fogem à regra geral, e só por essa razão se abriu a fenda no princípio da obrigatoriedade. O outro diz respeito à taxatividade das hipóteses. Daí a justa advertência de que os casos enumerados pelo legislador são taxativos, não podendo, via de consequência, ser ampliados pelo administrador” (grifos do autor). (CARVALHO FILHO, 2019).

O entendimento de Carvalho Filho e a análise ao dispositivo em apreço, percebe-se que a exceção à obrigatoriedade de licitar parte da característica de enquadramento da situação excepcional. Nesse sentido, é a emergência de saúde pública, confirmada pelo Decreto Legislativo nº 6 de 2020, reconhecendo o estado de calamidade pública no Brasil.

A efetivação da dispensa depende do processo de justificação da necessidade de dispensa da licitação por emergência em observância ao princípio da motivação, onde deverá ser fundamentada e encaminhada para a autoridade superior para ratificação no prazo de três dias e posteriormente seguindo para a devida publicação.

“A emergência caracteriza-se pela urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízos ou comprometer a incolumidade ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, exigindo rápidas providências da Administração para debelar ou minorar suas consequências lesivas à coletividade” (grifos do autor). (MEIRELLES; FILHO, 2016).

Nesse sentido, a necessidade do atendimento é elemento caracterizador. Com a pandemia ocasionada pelo COVID-19 e juntamente com a carência de profissionais, aliada a falta de equipamentos e de estrutura das unidades hospitalares brasileiras para acolher os pacientes infectados e realizar o correto tratamento para salvar vidas, o país se deparou diante de um sistema caótico e em colapso, impossibilitado de ofertar os devidos tratamentos adequado.

O Sistema Único de Saúde (SUS), refletiu o desabastecimento enfrentado no comércio de máscaras, luvas, entre outros equipamentos de proteção individual, bem como a urgência na aquisição de respiradores. O que se observou nesse cenário atual foi a elevada procura nos bens e aliado à escassez verificou-se um aumento gigantesco no valor e ao mesmo tempo de valor imensurável, comparado com o tamanho da real necessidade.

A falta desses suprimentos acarreta consequências irreversíveis, comprometendo o adequado tratamento dos pacientes e a exposição dos profissionais da saúde que atuam na linha de frente no enfrentamento da pandemia, existindo, dessa forma, um risco para segurança de toda a sociedade. Sendo assim, resta clara a necessidade e urgência para aquisição dos bens e serviços, atuando a dispensa de licitação como um dos mecanismos, onde não se pode aguardar todos os trâmites legais para as contratações públicas, além de que a licitação envolve um alto custo para a ocorrência do procedimento.

A dispensa de licitação emergencial não condiciona limite de valor, uma vez que no momento pandêmico os preços praticados no mercado tornaram-se completamente variáveis, sendo um procedimento menos burocrático e com isso célere diante da necessidade, fixando o objeto do contrato em bens e serviços relacionados a situação de emergência ou calamidade pública no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, vedado a prorrogação.

Em observância ao art. 7º, § 9º da Lei 8.666/93, será elaborado o projeto com destinação de recursos orçamentários, com especificação das características do objeto da contratação em termos de qualidade e quantidade, devendo haver pesquisa de preço detalhadamente e no mínimo três propostas segundo o art. 8º, parágrafo único da Portaria-TCU nº 318/2008, entretanto, poderá inclusive diante da dificuldade em pesquisar os valores ser sanado mediante justificativa, em virtude da necessidade requerida.

Avançando no procedimento, após autorização da despesa por parte da autoridade competente, seguirá para emissão da nota de empenho, onde deverá ser encaminhada para o fornecedor para contratação direta. Ressalte-se ainda que os órgãos competentes como o Tribunal de Contas da União (TCU), farão um rigoroso controle fiscalizatório para descobertas de possíveis fraudes ou irregularidades no procedimento.

“[…] É importante frisar que o próprio texto da lei estabelece que a ausência de contratação direta é possível em situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa.” (CARVALHO, 2017).

Portanto, o fator principal que propicia a contratação direta mediante a dispensa de licitação, encontra-se respaldo fundamentado na necessidade extremamente urgentes, com observância a legislação para a aquisição de bens e serviços de caráter exclusivo relacionado ao objeto central, sendo assim, no cenário atual, para enfrentamento da pandemia da COVID-19, como situação de emergência de saúde pública de relevância internacional.

Dessa forma, a finalidade primordial que deve ser posta em primeiro plano é evitar maiores danos, como o óbito de pacientes contaminados em função da falta de respiradores mecânicos, de medicamentos, de profissionais capacitados e principalmente a garantia da segurança de todos diante da exposição constantes à contaminação, diante do que se vivenciou como a falta de máscaras como item básico e essencial na diminuição de riscos ao contágio.

 

2.1.1 Inovações legislativas no procedimento licitatório em 2020, em face da emergência de saúde pública

Diante das considerações gerais, ora feitas, é importante destacar as principais inovações introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro ocasionadas em detrimento do surto pandêmico da COVID-19, auxiliando no enfrentamento e desenvolvendo papel primordial no cenário atual. Inicialmente, a Lei 13.979/2020 traçou medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública como de relevância internacional. Em seu art. 3º inciso VIII, elencou a importação diante do caráter excepcional de produtos sujeitos à vigilância sanitária não registrado na anvisa, mediante evidências cientificas com base no ato do Ministério da Saúde.

“Fica dispensada a licitação para aquisição de bens, serviços e insumos de saúde destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus de que trata esta Lei.” (BRASIL, 2020).

O caput do art. 4º da Lei 13.979/2020 supracitado, motivado pela necessidade de bens e serviços para atuarem no enfrentamento da pandemia, trouxe em caráter de excepcionalidade a dispensa de licitação em caráter temporário com a imposição de corolário do princípio da publicidade em caráter imediato em portal eletrônico oficial, em cumprimento à Lei 12.527/2011[5].

Com a edição da Medida Provisória 926/2020 que trouxe importantes alterações à Lei 13.979/2020, no tocante ao procedimento para as aquisições públicas. Com efeito o art. 4º-C, tratou da elaboração de estudos preliminares, como não sendo mais exigido para as contratações relacionadas as necessidades ou enfrentamento da emergência de saúde pública.

“Art. 4º-B Nas dispensas de licitação decorrentes do disposto nesta Lei, presumem-se atendidas as condições de: I – ocorrência de situação de emergência; II – necessidade de pronto atendimento da situação de emergência; III – existência de risco a segurança de pessoas, obras, prestação de serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares; e IV – limitação da contratação à parcela necessária ao atendimento da situação de emergência.” (BRASIL, 2020).

Outra importante alteração foi o disposto no artigo supracitado, elencando condições de aplicabilidade da legislação. Disciplinando sua destinação e finalidade para autorização da dispensa de licitação, tratando como requisitos obrigatórios exigidos que justifiquem e moldem-se ao caso atual.

A Medida Provisória 926/2020 alterou positivamente em função da urgência em possibilitar a participação de empresas idoneamente declaradas, não limitando o objeto à produtos novos, além do mais, trouxe a simplificação do procedimento e documentação exigida. Simplificou também o termo de referência ou o projeto básico, dispensou a estimativa de preço em caráter excepcional e mediante justificação. Dispensou também em casos excepcionais a apresentação de documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista ou alguns requisitos da habilitação. O art. 4º-G, por sua vez, tratou sobre a modalidade pregão, reduzindo pela metade os prazos e dispensou a realização de audiência pública prevista no art. 39 da Lei no 8.666/93.

Importantes alterações na Lei 13.979/2020, foram trazidas pela Medida Provisória 951/2020, que ressaltou a adoção ao sistema de registro de preços quando a contração ocorrer por mais de um órgão ou ente, na forma do § 4º do art. 4º. O disposto do § 6º, estipulou o prazo entre 2 (dois) a 4 (quatro) dias úteis para que os demais órgãos interessados pudessem participar do registro de preço. O art. 6º-D suspendeu o prazo prescricional para aplicação de sanções de cunho administrativo, envolvendo as legislações de licitação, pregão e as contratações públicas diferenciadas.

A Medida Provisória 961/2020, por sua vez, autorizou o pagamento de forma antecipada com a finalidade de garantir o bem ou resguardar a prestação do serviço, além do mais previu a aplicação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) instituído pela Lei 12.462/2011 voltada para contratações aplicadas na Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol de 2013 e da Copa do Mundo de 2014, nos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016 e agora para licitações e contratações de quaisquer obras, serviços, compras, alienações e locações de enfrentamento à pandemia.

 

2.1.2 Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) em tempos de pandemia

A Lei 12.462/2011 instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) voltado para viabilizar as contratações necessárias relacionadas aos eventos esportivos abordados no tópico anterior, onde alterou alguns regramentos nas licitações e contratos púbicos.

“O RDC tem por objetivos: I – ampliar a eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes; II – promover a troca de experiências e tecnologias em busca da melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; III – incentivar a inovação tecnológica; e IV – assegurar tratamento isonômico entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública”. (BRASIL, 2011).

O RDC viabilizou a seleção da proposta mais vantajosa para contratação em tempo hábil, para as realizações de grandes obras, estimulando o crescimento tecnológico e resguardando a garantia de todos os interessados em participar do procedimento de forma igualitária e gerando o crescimento e ampliação de infraestrutura do país capaz de receber os grandes eventos.

Conforme o art. 11 da Lei 12.462/2011, poderá ocorrer contratação de mais de uma empresa para executar o mesmo objeto. O art. 12 da Lei 12.462/2011, alterou as fases, julgando as propostas para posteriormente realizar a habilitação. A realização preferencial de meios eletrônicos veio disposto no art. 13 da Lei 12.462/2011. As propostas poderão ser apresentadas por meio da oferta de lances púbicas, chamado de modo de disputa aberto ou mediante apresentação sigilosa, chamado de modo de disputa fechado, conforme disposição do regulamento, previsto nos arts. 16 e 17 da Lei 12.462/2011. Ressalte-se ainda, que até o final do procedimento o orçamento estimado será mantido em sigilo, salvo disposição no instrumento convocatório, na forma do art. 6º, § 3º, estimulando a competitividade dos licitantes e objetivando alcançar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.

Sendo assim, com a alteração implementa pela MP 961/2020 ao ordenamento jurídico, o RDC passou a ser praticado nos procedimentos licitatórios viabilizando as contratações públicas no enfrentamento ao COVID-19, uma vez que trata-se de procedimento mais célere na escolha do vencedor e execução do contrato, pois em virtude de permitir o desmembramento do objeto alcança o resultado almejado em uma escala de tempo menor. E por sua vez, poderá atuar promovendo a reestruturação das unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) e hospitais privados requisitados pelo Estado para correta e adequada prestação de serviço necessário a manutenção e garantia do direito fundamental à saúde e primordialmente à vida como bem maior resguardado pela Constituição Federal de 1988.

 

Considerações Finais

O presente artigo proporcionou um estudo de forma objetiva na compreensão da licitação, da obrigatoriedade de licitar e a possibilidade de dispensa. De forma simples e prática procurou-se entender seus conceitos, possibilidades e formas de aplicação no contexto atual.

O art. 37, XXI da CF/88 com regulamentação pela Lei nº 8.666/93 de forma impositiva instituiu o procedimento licitatório como instrumento obrigatório para contratações da Administração Pública, para aquisição de obras, serviços, compras e alienações, assegurando a todos os interessados o direito de participar do procedimento em condições igualitárias e com base em critérios objetivos de seleção a escolha da proposta mais vantajosa no interesse público, ressalvando os casos admitidos para dispensa de licitação.

O cumprimento da legalidade é a confirmação jurídica que o resultado foi obtido conforme o seguimento rigoroso de cada passo do conjunto de atos percorrido e que não há nenhuma objeção que desconfigure a legalidade do procedimento e que impeça a contratação do vencedor.

Dessa forma, todo o procedimento está intimamente interligado formando uma base sólida. A escolha da proposta mais vantajosa iniciou-se desde a necessidade pública pelo objeto, passando pelo planejamento com estimativa de orçamento e construção dos requisitos objetivos de escolha, formação da comissão, delimitação da modalidade e do tipo de licitação adequada à aquisição do objeto pretendido, passando por cada fase eliminatória e resultando principalmente na concretização da proposta mais vantajosa vencedora do procedimento.

A legalidade, por sua vez, é o resultado e causa da burocracia, é o fator condicionante que todo o procedimento seguiu rigorosamente os preceitos legais e que o objeto pretendido alcançado está prestes a atender o seu principal objetivo, o interesse público. Em razão dessa morosidade o legislador dispôs sobre a dispensa de licitação, voltada para situações em que a licitação seria possível, porém diante da excepcionalidade, torna-se inviável a concorrência dos licitantes e/ou do objeto.

Com efeito, analisou-se também diante do cenário caótico brasileiro a falta de insumos básicos necessários ao aparato médico-hospitalar e a real necessidade de contratações públicas urgentes a garantia do Direito à Saúde e ao Direito à Vida. Nesse sentido, a edição da Lei 13.979/2020 e as alterações implementadas pelas Medidas Provisórias 926/2020, 951/2020 e 961/2020, bem como adequação da Lei nº 12.462/2011 a essa nova realidade, trouxeram ao ordenamento jurídico brasileiro mudanças significativas e positivas para auxiliar no enfrentamento da pandemia, desenvolvendo papel fundamental nas contratações públicas pela dispensa de licitação.

Sendo assim, estes institutos normativos ampliaram a oportunidade dos Entes Administrativos em contratarem diretamente para aquisição de bens e serviços voltados exclusivamente a pandemia, dentro do regular procedimento de dispensa adequado e principalmente nos moldes da legalidade, atendendo a finalidade do interesse público.

Desse modo, em resposta ao problema de pesquisa: “como e até que ponto as contratações públicas estão dentro da legalidade no caráter de dispensa de licitação para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus?”, conclui-se que a contratação direta mediante o procedimento de dispensa de licitação regido pela Lei 13.979/2020, está dentro da legalidade e garante a correta destinação do orçamento público, alcançando o interesse público mediante a seleção da proposta mais vantajosa. Portanto, o ponto alvo de discussão do procedimento de dispensa de licitação é a conduta dos agentes públicos e dos licitantes participantes do certame. Todo procedimento regular corre o sério risco de ser prejudicado e ser declarado inválido em função das ações tomadas pelos participantes envolvidos, e não pela flexibilização legislativa introduzida para enfrentamento da pandemia ao permitir a dispensa de licitação.

 

Referências

AMORIM, Victor Aguiar Jardim de, 1986- Licitações e contratos administrativos : teoria e jurisprudência – 2. ed. – Brasília : Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2018.

 

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Decreto legislativo nº 6, de 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm. Acesso em: 18 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11107.htm. Acesso em: 26 de setembro de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12349.htm. Acesso em: 26 de setembro de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm. Acesso em: 26 de setembro de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-13.979-de-6-de-fevereiro-de-2020-242078735. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Lei no 10.520, de 17 de julho de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10520.htm. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Medida provisória nº 926, de 20 de março de 2020. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv926.htm. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Medida provisória nº 951, de 15 de abril de 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-951-de-15-de-abril-de-2020-252563718. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Medida provisória nº 961, de 6 de maio de 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-961-de-6-de-maio-de-2020-255615815. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

BRASIL. Portaria-TCU nº 318, de 26 de dezembro de 2008. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/redireciona/ato-normativo/%22ATO-NORMATIVO-75270%22. Acesso em: 20 de agosto de 2020.

 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo – 33. ed. – São Paulo: Atlas, 2019. Disponível em: https://docero.com.br/doc/n0csn88. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

CARVALHO, Matheus. Manual de direlto administrativo – 4. ed. rev. ampl. e atual. – Salvador: JusPODIVM, 2017. Disponível em: https://docero.com.br/doc/x5v0v1. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo – 32. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. Disponível em: https://docero.com.br/doc/v08n5n. Acesso em: 13 de agosto de 2020.

 

MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo – 9. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. Disponível em: https://docero.com.br/doc/nn8s8v0. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

MEIRELLES, H. L.; FILHO, J. E. B. Direito administrativo brasileiro  – 42. ed. / atual. até a Emenda Constitucional 90, de 15.9.2015. – São Paulo : Malheiros, 2016. Disponível em: https://docero.com.br/doc/e8xx05. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

ROSSI, Licínia. Manual de direito administrativo – 5. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. Disponível em: https://docero.com.br/doc/nscnxvx. Acesso em: 10 de agosto de 2020.

 

[1] Sigla utilizada para fazer menção ao Novo Coronavírus (SARS-CoV-2) e a partir daqui usaremos a sigla corrente: COVID-19.

[2] Expressão utilizada para Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

[3] Vide Lei 11.107/2005, na qual dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos.

[4] Vide Lei de Improbidade, Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992.

[5] Vide Lei de acesso à informações, que regulamentou o inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal.

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