Resumo: Observadas
estritamente as propostas de cada um dos, digamos, “litigantes”, EUA e UE,
concluir-se-á que, se não forem feitas modificações e adaptações condizentes
com os interesses dos integrantes do MERCOSUL, tanto um quanto o outro projeto
será severamente prejudicial à compleição do desenvolvimento sul-americano como
um todo.”
Não é de fácil compreensão as previsões acerca do futuro dos
blocos econômicos. Estes são, por si só, objetos de
estudo árduo e profundo e custosa análise estrutural. Entretanto, se tomarmos
como pauta de análise as diretrizes que vêm sendo incorporadas ao MERCOSUL,
ver-se-á, com nítida clareza, que o bloco não mais desfruta de estabilidade e
tampouco o propagado “alargamento” da estrutura aduaneira tem como se
desenvolver sem que antes o MERCOSUL tenha todo o seu bojo estrutural absorvido
ou malogrado por blocos mais fortes e de maior relevância, tais como a União
Européia e o NAFTA.
A vertente que justifica a argumentação acima incorre na lógica de que
as pressões norte-americanas para a implementação da Área de Livre Comércio das
Américas (ALCA) têm como finalidade a gradual incorporação da parca estrutura
aduaneira criada pelos países-membros do MERCOSUL à astronômica infra-estrutura
de livre comércio proposta pela ALCA. Logo, observa-se que, por mais válidos
que sejam os esforços perpetrados no intuito da manutenção do bloco, o mesmo
não tem como fazer frente às forças político-econômico-científico-argumentativas
descomunalmente mais poderosas.
Está, pois, o MERCOSUL no cerne de um embate velado, que mais se
assemelha à uma guerra fria comercial. De um lado, a
facção de Washington, árdua defensora da implementação da ALCA; do outro, a
facção de Bruxelas, que arqueia a tese de que o Cone Sul deve intensificar seu
intercâmbio comercial com sua metrópole de séculos remotos: a velha e sagaz
Europa. Observadas estritamente as propostas de cada um dos, digamos,
“litigantes”, EUA e UE, concluir-se-á que, se não forem feitas modificações e
adaptações condizentes com os interesses dos integrantes do MERCOSUL, tanto um
quanto o outro projeto será severamente prejudicial à compleição do
desenvolvimento sul-americano como um todo. Vejamos o porque.
Precavido que é, este que vos escreve insiste
em deixar patente o fato de que sua experiência acerca dos meandros tanto de
economia quanto de política é, de certa forma, irrisória, de modo a não estar
descartada a hipótese de se incorrer em lugares-comuns e em clichês
político-econômicos.
Retomando a argumentação, far-se-á observado o fato explícito de que a
União Européia sofre de uma incurável patologia protecionista-xiita.
Conclui-se, por conseguinte, que o logro das negociações entre MERCOSUL e UE
pode ser comprometido em virtude de tal prática político-econômica. Ao
contrário do que vulgarmente se pensa, não se encontra
somente subordinação e passividade ao sul dos trópicos. Observa-se o gradual
amadurecimento da política diplomática de países como Brasil e Argentina, de
modo que estes não pretendem prescindir de seus interesses quando sentarem-se à
mesa de negociações.
Também os europeus acreditam ter do que se queixar em relação à
política econômica externa brasileira. Isso faz-se
verdadeiro quando se contempla belgas e franceses moverem ações contra o Brasil
na OMC. Entretanto, a qualquer economista, analista ou cientista político fica
nítido o fato de que a parcela mais substancial da má fé advém do outro lado do
Atlântico.
Conclui-se, pois, que, no que concerne ao binômio MERCOSUL-UE, haverão
de ser feitas concessões de ambos os lados, frisando, por óbvio, que a grande
maioria das mesmas compete à facção européia. Enquanto houver na Europa
agricultores sindicalistas gordos, rosados e baderneiros (vide José Bové) cujas aspirações protecionistas têm amplo respaldo
por parte do governo, não haverá como entabular negociações frutíferas e
concisas para com os colegas que vivem ao sudoeste do Atlântico. Que se
corrijam, pois, as anomalias político-culturais do Velho Mundo, antes que
venhamos a interagir no âmbito econômico.
Observa-se, não obstante, os desdobrados e discretíssimos esforços da
UE no intuito de ver malogradas as negociações para a implementação da ALCA.
Não constitui de forma alguma um fato inédito, visto que, uma vez implementada,
a ALCA será um bloco sólido e poderoso, que terá plenitude para impor condições
equânimes de negociação à UE, de modo a reduzir as possíveis vantagens que esta
poderia vir a ter se negociasse com um bloco econômico menos poderoso e com
menor poder de dissuasão.
Washington, por sua vez, enxerga no MERCOSUL o tumor que atravanca a
consolidação da ALCA e não concebe outra solução senão a absorção da
infra-estrutura do bloco pela majestosa proposta da Área de Livre Comércio. É
bem verdade também que o proporcional gigantismo da economia brasileira representa
um outro obstáculo às aspirações norte-americanas, muito embora os magos
ianques do liberalismo já tenham descoberto meios de fazer com que até mesmo a
magnitude da economia brasileira possa ser convertida em vantagens e lucros
para a terra do Tio Sam.
Numa
análise mais criteriosa, todavia, ver-se-á mais vantagens em proceder
uma negociação com os Estados Unidos, visto que estes – principalmente sob a
auspiciosa filosofia econômica dos republicanos -, são menos afeitos ao
protecionismo do que os famigerados europeus. Entretanto, a concepção
capitalista selvagem norte-americana (sem os “requintes” e bravatas humanistas
européias) deve também ser computada no complexo bojo de cálculos que se
afigura diante das perspectivas econômicas. Os ianques, e isso já é mais do que
sabido, são dotados da fenomenal e insensata capacidade de atropelar todo e
qualquer princípio em benefício do sucesso econômico, numa linha de pensamento
muito mais inconseqüente do que a dos relativamente cautelosos europeus.
Trocando em miúdos, equivale a dizer que os EUA são capazes de fazer valer
qualquer medida que melhor lhes convier para que se consume a hegemonia e a
plenitude de sua dinâmica econômica.
Não
seria de todo malévolo que o Brasil consumasse sua adesão ao projeto da ALCA, de
modo que isso se justifica por razões diversas e muitíssimo bem fundamentadas.
Tome-se o México como exemplo para análise comparativa – em 1993, um ano antes
da implementação do NAFTA, os mexicanos dispunham de
uma pauta de exportações correspondente a prosaicos cinqüenta bilhões de
dólares anuais. Sete anos mais tarde, contempla-se um verdadeiro milagre
operado no comércio exterior mexicano – suas exportações atingiram, em 2000, o
patamar de duzentos bilhões de dólares! Em matematiquês
básico, quadruplicaram suas exportações. E, veja você, em sete anos! Estarão os
guerrilheiros zapatistas de Chiapas realmente certos ao chafurdarem a política
liberal do governo central mexicano?
Erradicadas
as vicissitudes e reparados os pontos do projeto de implementação que são
irremediavelmente desfavoráveis à economia brasileira, concordar-se-á que a
ALCA constitui uma alternativa viável para que se atinja um patamar de
maturidade político-econômica compatível com o da nona economia do globo. O
projeto da ALCA, uma vez tendo sido reparadas suas falhas, não é de forma
alguma prejudicial à economia brasileira. Talvez o seja o MERCOSUL e as já
famosas ranhetices argentinas, uruguaias e paraguaias
para com a colossal envergadura da infra-estrutura econômica do Brasil. E quem
sabe não seja mesmo melhor integrar um bloco econômico de dimensões colossais e capaz de entabular negociações em pé de
igualdade com potências do naipe do Japão e da União Européia.
Destarte as questões que urgem soluções, designemos, pois, um cast competente e
capaz de fazer valer os propósitos e objetivos do Brasil quando na iminência
das negociações para a implementação da ALCA, de uma negociação direta para com
os Estados Unidos ou com a UE ou até mesmo no relativamente utópico
“alargamento” do MERCOSUL, se tal hipótese afigurar-se como a mais viável e
vantajosa. Aliás, uma vez que já foi feita a menção do termo
“alargamento”, porque não canalizar os esforços no intuito de “alargar” a pauta
de exportações brasileira, a qual encontra-se no
ridículo patamar de sessenta bilhões de dólares anuais?
Logremos,
pois, nossos propósitos, de modo a converter os benefícios em vantagens para a
sociedade como um todo. Não prescindamos jamais de nossas posições e
aspirações; não subordinemo-nos perante a lâmina da espada político-econômico
estrangeira que venha a brandir sobre nossas cabeças. E,
magna-prioridade, continuemos a perpetrar esforços desdobrados no intuito de
consolidar nossa posição na comunidade internacional, a qual é, sem dúvida, de
importância majoritária e imprescindível.
Acadêmico de Direito na Universidade Federal de Goiás e colunista da Revista Autor (www.revistaautor.com.br), do Mídia Sem Máscara (www.midiasemmascara.org), d’O Debatedouro (www.odebatedouro.com.br), do DupliPensar (www.duplipensar.net) e do Jornal Opção.
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