Thiago de Oliveira*
No âmbito da aferição da dosimetria das sanções administrativas, um aspecto relevante da nova Lei de licitações e contratos administrativos (Lei nº14. 133/21) refere-se ao estímulo direcionado às empresas, interessadas em contratar com o Poder Público, para a criação, a implementação e o aperfeiçoamento de programas de integridade corporativa, ética empresarial destinados ao combate da corrupção no ambiente das relações público-privadas.
As políticas internas e programas de compliance realmente efetivos também atenuariam ou até mesmo afastariam a aplicação de sanções administrativas, na forma do inciso V do parágrafo 1º do art. 156 da nova Lei.
Certamente, a normatividade deste tratamento, no âmbito da Lei nº 14.133/21, sofreu influência da legislação nacional anticorrupção, notadamente da Lei nº 12.846/2013 e do Decreto 8.420/2015 referentes à responsabilização, administrativa e civil, de pessoas jurídicas pela prática de atos contrários à administração pública. Note-se inclusive que os critérios para reconhecimento da efetividade de tais programas decorrem do parágrafo 4º do art. 5º c/c 42 do referido Decreto:
Art. 5º (…) 4º Caso a pessoa jurídica apresente em sua defesa informações e documentos referentes à existência e ao funcionamento de programa de integridade a comissão processante deverá examiná-lo segundo os parâmetros indicados no Capítulo IV, para a dosimetria das sanções a serem aplicadas.
(…)
Art. 42. Para fins do disposto no § 4º do art. 5º, o programa de integridade será avaliado, quanto a sua existência e aplicação, de acordo com os seguintes parâmetros:
(…) II – padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos;
III – padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;
IV – treinamentos periódicos sobre o programa de integridade;
(…)
I – a quantidade de funcionários, empregados e colaboradores;
II – a complexidade da hierarquia interna e a quantidade de departamentos, diretorias ou setores;
III – a utilização de agentes intermediários como consultores ou representantes comerciais;
IV – o setor do mercado em que atua;
V – os países em que atua, direta ou indiretamente;
VI – o grau de interação com o setor público e a importância de autorizações, licenças e permissões governamentais em suas operações;
VII – a quantidade e a localização das pessoas jurídicas que integram o grupo econômico;
VIII – o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte.
O incentivo e o estímulo à criação de programas de integridade pelas empresas particulares, interessadas em contratar com o Poder Público, são inegáveis no âmbito da nova legislação.
Contudo, há entendimento no sentido de que a União Federal, no uso de sua competência legislativa em matéria de normas gerais na área de licitação e contratação pública1, deveria ter ido além, disciplinando a obrigatoriedade de que tais empresas apresentassem tais políticas de conformidade como requisito obrigatório de habilitação, tal como legislações estaduais e municipais pretendiam mas tiveram sua inconstitucionalidade formal reconhecida.
Inobstante isto, vale esclarecer que Estados e Municípios têm competência assegurada para estabelecer a obrigatoriedade de apresentação de programas de integridade pelo particular contratado2, ou seja, na fase pós-licitação e a fim de assegurar os interesses do Poder Público, afastando riscos de danos ao erário e à sociedade.
A importância do incentivo à criação de programas de integridade ético-corporativa é evidente. O custo econômico e social decorrentes da prática de atos de corrupção contrários aos interesses da Administração Pública e da coletividade comprometem ações, políticas e programas de políticas públicas. Medidas legislativas, administrativas e da sociedade civil voltadas a proteger os recursos públicos e garantir sua aplicabilidade efetiva em prol do interesse público são imprescindíveis.
A propósito, a respeito do “custo da corrupção” e da necessidade de “medidas de combate inovadoras” cabe observar os indicadores e levantamentos realizados pela organização “Transparência Internacional-Brasil”3.
Thiago de Oliveira – Advogado e Professor universitário. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Doutorando em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa (FDUL). Professor efetivo na área de Direito Público da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Membro da Comissão de Direito Administrativo da OABRJ (CODA). Palestrante, autor de livros e artigos na área de direito público. Membro do Grupo de Estudos e de Direito Administrativo (GDA). Sócio Coordenador do Setor de Direito Público, Regulatório e Infraestrutura da Siqueira Castro Advogados no Rio de Janeiro/RJ – contato: thiago@siqueiracastro.com.br .
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