Resumo: Ainda que em fase embrionária, há um número expressivo de orientações jurisprudenciais que versam sobre o assédio processual no âmbito trabalhista, seja relacionando-o com o assédio moral, com a litigância de má-fé, ou apenas o caracterizando. O assédio processual é considerado na jurisprudência como espécie que decorre do assédio moral, entretanto possui características próprias, fazendo com que a mesma não seja confundida com seu gênero. O presente artigo presta reflexões acerca do assédio processual na esfera trabalhista elencando seu conceito, aplicabilidade no âmbito da justiça laboral com base nos princípios constitucionais da razoabilidade da duração do processo e do contraditório e da ampla defesa. Ademais, oferece esclarecimentos quanto a diferenciação e as similitudes entre o assédio processual e a litigância de má-fé, demonstrando a possibilidade jurídica da aplicação de sanções concomitante das figuras.
Palavras-chave: Direito Processual do Trabalho. Assédio Processual. Justiça Trabalhista. Litigância de má-fé.
Abstract: Although in its infancy, there are a significant number of jurisprudential guidelines that deal with the procedural harassment in the workplace, whether it relates to bullying, with the litigation in bad faith, or just featuring. Harassment is considered procedural jurisprudence as a kind of bullying taking place, however has its own characteristics, making it not be confused with their gender. This article provides reflections about the harassment in labor part listed procedural concept, applicability in the labor justice based on the principles of constitutional reasonableness of the duration of the process and the adversarial and defense. It also offers clarification on the difference and similarities between the procedural harassment and litigation in bad faith, demonstrating the possibility of legal sanctions accompanying.
Keywords: Labour Procedural Law. Harassment Procedure. Labor Justice. Litigation in bad faith.
Sumário: 1. Considerações Preliminares; 2. O assédio processual; 3. O principio da razoável duração do processo e os princípios do contraditório e da ampla defesa; 4. Litigância de má-fé e o assédio processual; 5. Considerações finais; 6. Referências bibliográficas; 7. Notas.
1. Considerações preliminares
Para que possamos entender o assédio processual é necessário breves esclarecimentos quanto o assédio moral que este está ligado diretamente a nossa estrutura emocional e sentimental, ao que representa o nosso caráter. Existem diversas definições acerca do assédio moral, entretanto podemos considerá-lo como um abuso de cunho emocional situado em momento laboral que se funda de maneira maliciosa com o fim de afastar o empregado das relações profissionais, sem a conotação racial ou sexual, podendo ser estabelecido por meio de intimidações, humilhações, boatos, descrédito e/ou isolamento. Conceitua HEINZ LEYMANN o assédio moral como a:
“… deliberada degradação das condições de trabalho, por meio do estabelecimento de comunicações anti-éticas (abusivas), que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um superior ou colega(s) desenvolve(m) contra um indivíduo que apresenta, com reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura”[1].
Deste modo o assédio moral se caracteriza pelo o abuso de poder de forma repetida e sistematizada, tendo como finalidade principal tornar a relação de direito material insuportável, ocasionando a rescisão do contrato de trabalho, ou mesmo, humilhar, desqualificar, ou submeter o trabalhador a situações vexatórias perante os colegas de trabalho, e tem como seus elementos caracterizadores: a intensidade da violência psicológica; o prolongamento no tempo; a intenção de ocasionar o dano; e a produção de danos psíquicos.
2. O assédio processual
O assedio processual é a dilatação do andamento processual provocada por uma das partes, em qualquer fase processual, objetivando o retardamento da decisão judicial, neste sentido estabelece os autores NILTON RANGEL BARRETO PAIM e JAIME HILLESHEIM quanto o conceito de assédio processual:
“O assédio processual podemos definir como a procrastinação do andamento do processo, por uma das partes, em qualquer uma de suas fases, negando-se ou retardando o cumprimento de decisões judiciais, respaldando-se ou não em norma processual, provocando incidentes manifestamente infundados, interpondo recursos, agravos, embargos, requerimentos de provas, contraditas despropositadas de testemunhas, petições inócuas, ou quaisquer outros expedientes com fito protelatório, inclusive no decorrer da fase executória, procedendo de modo temerário e provocando reiteradas apreciações estéreis pelo juiz condutor do processo, tudo objetivando obstacularizar a entrega da prestação jurisdicional à parte contrária”[2]
Ainda compreende os referidos autores que o assédio processual é espécie do gênero assédio moral, e por sua vez os elementos caracterizadores do assédio processual podem ser equiparado aos do assedio moral. Ainda que o assédio processual seja gênero-espécie do assedio moral entre os institutos há grandes diferenças quanto à modalidade e a violência, especialmente no que se refere ao local em que se perpetua a ação antijurídica e o rol de protagonistas do dano. Quanto ó local de perpetuação da violência no assédio moral ocorre no ambiente de desenvolvimento laboral, enquanto o assédio processual ocorre no âmbito forense durante a perpetuação da demanda trabalhista. Quanto o rol de protagonistas a diferença está que no assédio processual os protagonistas são os sujeitos da relação processual, enquanto no assédio moral são os protagonistas o empregado e empregador em sentido lato sensu e os companheiros de labuta, quando o empregado é humilhado frente eles.[3]
Assim, compreendemos o assedio processual como uma série de condutas antijurídicas que são praticadas no decurso de um processo judicial por uma das partes litigante com o exclusivo propósito de se evitar que a outra parte receba a tutela jurisdicional efetiva, desestimulando-a a prosseguir com a ação, fazendo-a desacreditar na realização de justiça, e, muitas vezes, forçando-a a celebrar acordos claramente prejudiciais aos seus direitos, mesmo após a sua certificação no processo de conhecimento tendo em vista que na execução é amplamente possível obstacular a prestação jurisdicional.
A violência empregada no assédio processual pode ser dimensionada a partir dos meios protelatórios empregados pela assediadora com a finalidade de impedir o regular andamento processual não se discutindo teses jurídicas, a exemplo: apresentação de embargos de declaração opostos, alegações infundadas de nulidade, recursos manifestamente inaptos, incidentes processuais na fase de execução, nomeação à penhora de bens inexistentes, etc. Em relação ao prolongamento no tempo dos ataques é necessário observar o tempo de ganho do assediador com os incidentes processuais e recursos que este manejou, podendo este ganho se estender por décadas.[4] A intenção de ocasionar o dano é verificável diante da utilização de meios procrastinatórios pelo assediador. A produção de danos psíquicos ao assediado é identificada diante da ausência de crença na tutela do poder judiciário, ou no mínimo a infelicidade pessoal e angústia e reduziria a expectativa de uma vida mais feliz.[5]
3. O principio da razoável duração do processo e os princípios do contraditório e da ampla defesa.
A ocorrência do assédio processual representa um atentado à dignidade do assediado enquanto trabalhador e cidadão se constituindo com uma dupla violência aos direitos fundamentais diante do art. 5º incs. XXXV e LXXVIII da CF. Para DALMO DE ABREU DALLARI o poder judiciário nacional ficou estagnado, com metodologias de trabalho em que pouco se produz, não se resolvendo rapidamente e com equidade os conflitos de direitos.[6] Concluindo JOSÉ RENATO NALINI que a “sociedade precisa de uma justiça mais eficiente. Menos morosa… produzir mais e com rapidez é o que se espera do juiz”[7].
Tal é relevante a celeridade processual garantidora da razoável duração do processo que os legisladores ordinários inseriram na Consolidação das Leis do Trabalho o art. 765 que confere aos Juízos e Tribunais a ampla liberdade na direção do processo e o dever de velar pelo seu andamento rápido, podendo ainda determinar qualquer diligência necessária ao seu esclarecimento. Com efeito, esta responsabilidade dirigida aos magistrados deve ser desempenhada de maneira ponderada para que não se faça sucumbir outros princípios de base constitucional. AMADOR PAIS DE ALMEIDA aponta a razão da importância da celeridade no processo do trabalho está diante da natureza da problemática essencialmente salarial, estabelecendo que o salário constitui o único meio de sobrevivência do trabalhador e de sua família.[8]
Dentre os princípios que devem ser observados no ato da aplicação do principio a celeridade processual está o do contraditório e da ampla defesa apresentado na Carta Magna em seu art. 5º, inc. LV, pelo qual garante aos acusados o direito de contradizer e se defender com os meios e recursos a eles inerentes. Portanto deve o magistrado assegurar igualdade entre as partes aplicando o principio necessário a realidade do momento procedimental.
4. Litigância de má-fé e o assédio processual
Diante da proximidade entre as figuras da litigância de má-fé e do assédio processual, faz-se necessário descrever suas distinções. O primeiro contém suas hipóteses de caracterização bem delineadas no art. 17 do CPC, in verbis:
“Reputa-se litigante de má-fé aquele que: I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II – alterar a verdade dos fatos; III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV – opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; Vl – provocar incidentes manifestamente infundados.
Encontram-se inclusive no Código de Ritos em seu art. 18, caput e parágrafo único os valores da multa a ser aplicada em caso de caracterização da litigância de má-fé, do qual não poderá exceder a um por cento, e a indenização não poderá superar vinte por cento, ambos calculados sobre o valor da causa, não prejudicando a fixação de outras sanções de natureza processual, material ou indenizatória.
O assédio processual, ainda que seja uma litigância maliciosa seu conceito é mais amplo sendo necessário o prolongamento e a sucessão intensa de atos processuais que visem retardar a prestação jurisdicional, diferente da litigância de má-fé que se trata de uma conduta isolada que gera um dano processual[9], inexistindo multas no assédio processual, sob pena de ofensa a ordem constitucional do art. 5º, inc. XXXIX. Assim o assédio processual para ser caracterizado é necessário que tenha sito praticado pelo assediador diversas condutas tais como a inobservância dos deveres das partes, a pratica de atos atentatórios a dignidade da justiça e a própria litigância de má-fé. Importante observar ainda quanto o assédio processual não há delimitação quanto o valor de sua indenização devendo ser arbitrada pelo juiz levando em consideração o sofrimento causado, o tempo que tramitou a causa, o patrimônio do assediador, as repercussões e efeitos processuais na vida do assediado, e a intensidade do dolo.
5. Considerações finais
Antes mesmo da EC n. 45/2004 o STF deixou assentado à competência da justiça trabalhista para processar e julgar ações de indenização por dano moral, nisto entendemos que o assédio processual enseja um dano moral durante a relação processual jurídica gerada por insatisfações na relação de trabalho, recaindo sobre o assediador, praticante de ato ilícito e causador de dano, o dever de indenizar que se encontra insculpido no art. 927 do CC.
Embora alguns autores[10] defendam que a condenação por assédio processual possa ser decretada ex officio diante de sua relevância em manifesto interesse público ou por considerarem que a imposição da obrigação de reparar os danos causados pelo assediador tem por escopo preservar e defender o exercício da jurisdição e a autoridade que deve ser decretada às decisões judiciais, não entendemos, em consenso com MARCELO RIBEIRO UCHÔA ser possível a decretação ex officio da condenação em assédio processual, mesmo porque a legislação não autoriza a atuação ex officio na condenação em assédio moral. Lembra-se que não há de se questionar quanto a condenação por litigância de má-fé que poderá ser ex officio, pois nesta o Código de Ritos autoriza ao juiz assim agir expressamente. Ademais o que poderá fazer o magistrado é alertar a parte que busca a procrastinação do feito, sobre pena de declaração de assédio processual por obstaculizar a prestação jurisdicional tempestiva em caso de permanência de sua conduta.
Devemos entender que o assédio processual não se trata de ficção jurídica ou fruto da criatividade intelectual de estudiosos, mas um fenômeno que está mais presente no cotidiano forense em que pese ao magistrado manter-se alerta para impedi-lo, e em acontecendo que seja devidamente imputada a sanção ao agente assediador sobre a exegese dos princípios constitucionais.
Graduado em Direito pela Associação Caruaruense de Ensino Superior – ASCES, Extensão em Direito Tributário pela Fundação Getulio Vargas – FGV.
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