O atual fenômeno jurídico brasileiro do superendividamento

Resumo: O presente trabalho buscou respostas para saber o que é o fenômeno do superendividamento e sua origem, bem como suas vertentes, principais causas e tratamento, tentando encontrar subsídios de esclarecimentos de como este fenômeno afeta o cotidiano das pessoas. Este artigo preocupou-se ainda, em perquirir situações que ajudam na prevenção contra o superendividamento. O artigo foi fruto de uma pesquisa exploratória, uma vez que se objetivou buscar elementos fáticos de um ramo do direito em franca expansão, conhecido como Superendividamento, ou ainda em alguns países como Sobreendividamento. Tem o propósito de buscar evidencias para a aplicabilidade de um tratamento jurídico para o superendividamento. A pesquisa visa à busca de informações qualificadas que permitam asseverar com segurança a eficácia de um tratamento para o superendividamento que possa evitar assim, longas demandas judiciais em que historicamente alguns consumidores, com o objetivo de quitar suas pendências financeiras, recorrem à justiça objetivando reduzir juros que acarretam em uma dívida que não para de crescer.[1]

Palavras-chave: Superendividamento. Direito do Consumidor. Tratamento do Superendividamento. Causas e prevenção.

Abstract  This work aims to clarify what is the phenomenon of over-indebtedness, its origin and its branches, main causes and treatment, showing how this phenomenon affects the daily lives of people. This article concerns itself still in show situations that help in preventing the over-indebtedness. The article was the result of an exploratory research, once the objective was to search factual elements of a branch of law booming, known as overindebtedness, or even in some countries such as over-indebtedness. It aims to demonstrate the applicability of a legal treatment for indebtedness, because if this debate does not start right, certainly will not know to handle a crisis. The research aims to find information that allow qualified safely assert the effectiveness of an effective treatment for the over-indebtedness, thereby avoiding, lengthy lawsuits that historically some consumers, with the objective to repay their debts recourse to justice to decrease interest entailing a debt that just keeps growing.

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Keywords: over-indebtedness. consumer law. Treatment of indebtedness. Causes and prevention.

Sumário: 1.Introdução. 2. O que é o superendividamento? 3. O superendividamento afetando o cotidiano das pessoas. 4. Prevenção contra o superendividamento. 4.1. O uso da planilha. 4.2. Negociar a dívida. 5. As principais causas do superendividamento. 6. Tratamento do superendividamento. Considerações finais. Referências

1 INTRODUÇÃO

Este estudo visou saber o que é o fenômeno jurídico do superendividamento, suas principais causas e efeitos, além de buscar levantar quais atitudes que previnem o consumidor desinformado contra o superendividamento.

Hoje no Brasil, já existem projetos de lei, de reforma do Código de Defesa do Consumidor, que regulamentam a situação do superendividado. O presente artigo também se preocupou em reunir algumas sugestões de tratamento para o superendividamento.

O presente trabalho teve como objetivo geral responder se o superendividamento é um fenômeno jurídico que merece atenção dos operadores do direito, visto que seus efeitos são devastadores e recaem sobre todas as classes sociais. E como objetivos específicos, buscou-se verificar a veracidade das  hipóteses levantadas como de prevenção e de tratamento deste fenômeno que a cada dia vem crescendo e com isso atingindo cada vez mais consumidores, analisando o  trabalho que já é feito em alguns estados brasileiros, através da Defensoria Pública e do Procon. O objetivo, portanto, é também de ser um artigo útil, com uma linguagem acessível para todos, inclusive para aqueles que não são da área jurídica, e que sirva de alguma maneira aqueles consumidores que precisarem de esclarecimento sobre o assunto.

Para o alcance dos objetivos citados, este estudo abordará primeiramente a fundamentação teórica sobre o Superendividamento; como surgiu, sua definição e vertentes. O segundo item mostra como este fenômeno afeta o cotidiano das pessoas e alguns de seus efeitos. Já o terceiro item versa sobre a prevenção do superendividamento; a utilidade de uma planilha de gastos, e ainda,  a vantagem de negociar a dívida. Em seguida abordar-se-á, no item quatro, as principais causas do superendividamento. Já no item cinco mostrar-se-á como pode ser feito o tratamento deste fenômeno, mostrando o trabalho que já é realizado em alguns estados brasileiros, para, em sequência, apresentar-se as considerações finais.

2      O QUE É O SUPERENDIVIDAMENTO ?

É inegável o crescimento no número de pessoas superendividadas no país. O Brasil está vivendo um tempo em que a economia está passando por um ótimo período, e com esse avanço veio o crédito fácil. Este crédito fácil chega causando nas pessoas um certo receio, pois antes de tomar qualquer decisão o consumidor deve refletir sobre as consequências que este crédito causará em suas vidas. Partindo do pressuposto de que o consumidor é a parte hipossuficiente na relação de consumo, é certo que ele deve ser alertado acerca dos perigos que o crédito fácil acarreta. O crédito ao consumo, para Geraldo de Faria Martins da Costa: “promove um colossal crescimento da produção, mas gera o flagelo social do superendividamento.” (2006, p 231.)

Nos últimos anos o Brasil tem vivido um momento de crescimento econômico que é notado e reconhecido pela comunidade internacional. Isso reflete internamente, a situação atual dos brasileiros permite ter um poder aquisitivo muito maior do que há dez anos, por exemplo. A atual situação econômica do país permite que as pessoas possam comprar com mais facilidades para pagar, o que não ocorria no passado, hoje o crédito está fácil. No passado não era possível comprar com tantas facilidades como temos hoje, facilidades como o cartão de crédito, cheque pré-datado, carnê, entre outras. Isso tudo somado à uma forte pressão que as propagandas causam nos consumidores, ao descontrole que alguns possuem, e à falta de discernimento para pensar no que é realmente necessário comprar são alguns dos fatores que podem causar o chamado superendividamento.

“O mercado financeiro atual, em virtude especialmente do avanço da integração global, das evoluções tecnológicas e da criação de novos canais de distribuição de bens, serviços e informação, caracteriza-se pela crescente variedade e sofisticação de seus instrumentos de atuação. A oferta de produtos e serviços financeiros tem-se ampliado progressivamente, e os fornecedores vêm adotando práticas comerciais cada vez mais agressivas, recorrendo à publicidade maciça e a novos artifícios para vincular operações de crédito a toda espécie de transação de consumo diariamente empreendida pela população.” (MARQUES; LIMA; BERTONCELLO, 2010, p.7)

Superendividamento é uma situação, um estado, em que o indivíduo se encontra onde não consegue pagar suas contas mesmo que não tivesse gastos com comida, é quando o consumidor está endividado ao ponto de não conseguir quitar suas dívidas mesmo se dedicasse todo o seu rendimento mensal. O superendividamento é condição exclusiva de pessoa física, não havendo, portanto, superendividamento de pessoa jurídica porque para estas o ordenamento jurídico já prevê a hipótese de falência. Segundo a lei especial francesa, de 31 de dezembro de 1989, no artigo L330-1, a situação de superendividamento é “caracterizada pela impossibilidade manifesta pelo devedor de boa-fé de fazer face ao conjunto de suas dívidas não profissionais exigíveis e não pagas”. (COSTA, 2002, p 10). No entendimento Marques et al o superendividamento é:

“Designado por falência ou insolvência de consumidores, refere-se às situações em que o devedor se vê impossibilitado, de uma forma durável ou estrutural, de pagar o conjunto das suas dívidas, ou mesmo quando existe uma ameaça séria de que não possa fazer no momento em que elas se tornem exigíveis”. (2000, p. 2)

O superendividamento é mais que uma situação que afeta somente um indivíduo ou alguns, trata-se de um fenômeno que afeta toda uma coletividade, por isso merece ser tratado. A professora Cláudia Marques Lima também entende que o superenvididamento ultrapassa a esfera de fato individual, e, segundo ela trata-se de um fato inerente à vida em sociedade:

“O endividamento é um fato inerente à vida em sociedade, ainda mais comum na atual sociedade de consumo. Para consumir produtos e serviços, essenciais ou não, os consumidores estão – quase todos – constantemente se endividando. A nossa economia de mercado seria, pois, por natureza, uma economia do endividamento. Consumo e crédito são duas faces de uma mesma moeda, vinculados que estão no sistema econômico e jurídico de países desenvolvidos e de países emergentes como o Brasil. O superendividamento pode ser definido como a impossibilidade global de o devedor pessoa física, consumidor, leigo e de boa-fé, pagar todas as suas dívidas atuais e futuras de consumo (excluídas as dívidas com o fisco, oriundas de delitos e de alimentos)”. (MARQUES, 2006, p. 45).

Alguns autores, entendem que existe uma subdivisão do tema, pois segundo esta corrente, existem dois tipos de situações em que os consumidores se encontram endividados. A primeira delas é o superendividamento ativo, caracterizado quando o consumidor age sem refletir e consome acima da sua capacidade de pagamento, ou seja, quando o consumidor abusa do crédito fácil. O superendividamento passivo, por sua vez, é caracterizado não por uma ação própria do consumidor, mas sim por uma condição que se impõe alheia à sua vontade, trata-se do consumidor que de boa-fé, consome dentro da sua capacidade orçamentária, mas que devido a uma situação imprevista se vê obrigado a não pagar suas dívidas face a situação imprevista.

“superendividamento passivo, se o consumidor não contribuiu ativamente para o aparecimento desta crise de solvência e de liquidez, e superendividamento ativo, quando o consumidor abusa do crédito e “consome” demasiadamente acima das possibilidades de seu orçamento”. (MARQUES, 2010, p. 21)

Como exemplo de situação que pode causar o superendividamento passivo, podemos citar a morte de um membro da família, uma doença grave, o desemprego, nascimento de um filho, divórcio, entre outras.

O fenômeno do superendividamento, como ficou conhecido no Brasil,  recebe o nome de sobreendividamento, em Portugal; sobreendeudamento, na Espanha e demais países hispânicos; over-indebtedness nos Estados Unidos, Reino Unido e Canadá; surendettement na França.

Nada mais justo do que uma relação de consumo sadia, onde ambas as partes sabem dos riscos e vantagens que ela pode acarretar.  No Brasil existem órgãos que podem orientar os consumidores para prevenção do superendividamento, e também para ajudar aqueles consumidores que já estão nesta situação.

3 O SUPERENDIVIDAMENTO AFETANDO O COTIDIANO DAS PESSOAS.

O maior acesso e a facilidade do crédito é bom para a economia nacional, embora essa facilidade enseje uma análise – que geralmente não é feita – por parte dos consumidores, que devem observar se isto é mesmo uma necessidade ou uma simples tentação. O consumo sem planejamento é perigoso, e pode levar o consumidor à uma situação de superendividamento, e assim comprometer toda a sua renda mensal. Quando o consumo não é planejado, ele também pode trazer consigo uma má administração das finanças pessoais, ademais, o consumidor superendividado por mais que procure fazer novas compras dificilmente ele terá crédito, causando assim uma espécie de isolamento econômico daquele consumidor.

Esse fenômeno, que assola inúmeros consumidores, traz consigo péssimos efeitos para a vida da família dessas pessoas. Muitas vezes as pessoas tentam conseguir crédito para quitar suas dívidas e não conseguem de maneira lícita, tendo que recorrer aos agiotas, muitos acabam ficando com depressão, ou criando outros tipos de doenças.

“Sob uma ou outra forma, o superendividamento é gerador de situações nefastas que não se pode deixar prosperar. Constitui, com efeito, fonte de tensões no seio da célula familiar que muitas vezes acarretam um divórcio, agravando a situação de endividamento. Ele pode conduzir as pessoas superendividadas a evitar despesas de tratamentos, mesmo essenciais, ou ainda a negligenciar a educação dos filhos. E, na medida em que a situação é tal, que a moradia não pode ser assegurada, é dado um passo na direção da exclusão social. O superendividamento é fonte de isolamento, de marginalização; ele contribui para o aniquilamento social do indivíduo”. (PAISANT, 2010, p. 10)

Endividamento é a impossibilidade do consumidor, de boa fé, pagar as suas contas. O consumidor de boa fé é aquele que faz a dívida e que quer pagar, mas que em algum momento se vê impossibilitado de quitar seus débitos. Este problema do superendividamento não um problema que é encontrado somente no Brasil, é um problema mundial. Na verdade, hoje, vive-se um capitalismo muito mais financeiro, um capitalismo que envolve o crédito, do que aquele capitalismo que envolve puramente a troca. Veja, por exemplo, o caso dos Estados Unidos, o que gerou a grande crise financeira no final de 2008. O que acarretou toda essa crise econômica financeira que o mundo vive hoje, foi justamente o fato do consumidor endividado, daqueles consumidores que hipotecaram a casa e depois não tiveram como pagar suas dívidas. Isso é um problema muito sério, pois ele compromete a estrutura psicológica da pessoa, ninguém gosta de ficar endividado, ninguém gosta de ter alguém cobrando suas dívidas, isso é extremamente complicado. Todo mundo gosta, evidentemente, de ter suas contas pagas. O endividamento acaba gerando, sem dúvida nenhuma, um problema para a pessoa que deseja viver honestamente e pagar as suas contas.

Pode-se dizer que no Brasil, em relação a oferta de crédito, o endividamento do consumidor passou a existir com uma maior frequência a partir de 1995. Antes do plano real, o brasileiro tinha dificuldade de conseguir crédito no  mercado financeiro, devido, principalmente, aos altos processos inflacionários, baixo número de trabalhadores com carteira assinada, elevado número de desempregados, dentre outras. Como o acesso ao crédito era restrito, o consumo financiado era menor, consequentemente o nível de endividamento acabava sendo mais setorizados. E uma das âncoras do plano real foi exatamente isto, fazer com que as pessoas consumissem mais, para gerar mais emprego e melhorar a economia. Portanto a concessão do crédito hoje é extremamente importante para a manutenção da economia.  A teoria econômica monetarista demonstra que quando a taxa de juros está muito alta provoca a redução do consumo porque as pessoas irão pagar mais caro pelo dinheiro que usar através do uso de cartão de crédito, cheque especial etc. No, entanto, se a redução da taxa de juros influenciar a elevação do consumo, por meio da concessão de crédito, provocando o aumento da produção, do nível de emprego e consequentemente o crescimento econômico tão perseguido por todas as nações, tem-se por outro lado a questão do superendividamento que pode levar às empresas, que movimentam a economia neste crescimento econômico, a redução da produção, do emprego, da geração de renda, chegando, muitas vezes à falêcia  a concessão de crédito é importante, por outro lado, pagar como foi o caso, em 1997 e 1998, quando várias redes de lojas – como Mappin, G. Aronson e Mesbla – quebraram após expandirem fortemente o crediário, com o lançamento de cartões próprios.

4 PREVENÇÃO CONTRA O SUPERENDIVIDAMENTO.

O problema do superendividamento pode ser evitado, se o consumidor observar alguns princípios antes de cair na cilada de algumas propagandas tentadoras,como afirma Marques: “o maior instrumento de prevenção do superendividamento dos consumidores é a informação(2010, p.26).

4.1O USO DA PLANILHA

Uma das causas do endividamento é justamente a falta de planejamento para comprar e quitar suas dívidas, os consumidores deveriam fazer um planejamento, do que realmente é necessário, e como ele vai fazer para pagar aquela aquisição. Existem sites que oferecem planilhas, para os consumidores fazerem um planejamento do seu orçamento e assim se prevenir do endividamento. Com a planilha, o consumidor pode ver onde ele pode economizar, pode controlar quais sãos seus recursos e gastos, além de identificar e cortar os exageros. Com o tempo o consumidor poderá ainda, havendo a possibilidade, reservar parte de seus rendimentos para um fundo de reserva. Este fundo de reserva será muito útil, caso o indivíduo tenha algum imprevisto e precise de dinheiro com urgência, assim ele não precisará recorrer aos empréstimos. Os empréstimos só devem ser usados em ultimo caso, quando não houver outra saída, além de que o consumidor deve evitar os empréstimos desnecessários.

4.2 NEGOCIAR A DÍVIDA

O consumidor endividado não deve ter vergonha de estar em tal situação, principalmente naqueles casos em que o endividamento foi decorrência de um fato alheio a sua vontade. Portanto, ele deve assumir a situação de em que se encontra e procurar negociar a dívida, talvez com a negociação o consumidor obtenha um desconto.

“O ajuste amigável dos débitos apresenta consideráveis vantagens, pois evita o estigma pessoal e social do consumidor, bem como o registro de seu nome em cadastros de superendividados. Além disso, a conciliação costuma ter custos mais baixos que o processo judicial, o que incentiva devedores e credores a apresentarem melhores ofertas para a composição dos débitos”. ( MARQUES; LIMA; BERTONCELLO, 2010, p. 87).

Os Tribunais de Justiça de estados como Rio Grande do Sul, Paraná, Pernambuco, e São Paulo são pioneiros na realização de conciliação para consumidores superendividados, com núcleos especializados que atuam na prevenção e tratamento do superendividamento. Para Geraldo de Faria, o órgão de proteção “deve se esforçar para conciliar o consumidor superendividado com os seus principais credores, conduzindo-os a concluir um plano convencional de recuperação(2002, p.115). Atitudes como estas são muito importantes para o superendividado, pois na mesa da conciliação o devedor expõe a sua situação econômica e o credor expõe suas condições com o propósito que ambos entrem em comum acordo. Algo parecido também já acontece há algum tempo na Defensoria Pública do Rio de Janeiro e na Fundação Procon de São Paulo, neste caso o procedimento de conciliação é feito através de audiências globais entre devedores e credores.

Isso tudo serviu de inspiração para a criação de três projetos de atualização do Código de Defesa do Consumidor que estão tramitando no Senado Federal, o PLS 281/2012, PLS 282/2012 e PLS 283/2012. Esses projetos preveem normas ainda mais protetivas em relação aos consumidores.

O primeiro dos projetos, o PLS 281/2012, propõe a criação de uma nova seção no Código de Defesa do Consumidor, lei 8.076/90, para tratar do comércio eletrônico, inserindo regras para a divulgação de dados do fornecedor, a vedação de spams além da criação do chamado direito de arrependimento, que evita a contratação irrefletida. Por outro lado, o PLS 282/2012, traz regras para as ações coletivas, que asseguram a agilidade do seu andamento perante o judiciário, prevendo até a prioridade para o seu julgamento.

“No Brasil, o direito de retratação do consumidor de boa-fé poderia ser de 3 dias, sempre que o crédito fosse maior que 6 meses e neste caso, devolveria somente o principal, sem juros, podendo haver um juro pro rata até a data do efetivo pagamento, já fixado na parte destacável do contrato de crédito que informaria sobre este novo direito de reflexão do consumidor.” (MARQUES, 2010, p.29)

O PLS 283/2012 estabelece normas que regulamentam a oferta de crédito e de prevenção ao superendividamento. O projeto destaca a criação de um procedimento intitulado “da conciliação em caso de superendividamento”, que será uma tentativa de negociação da dívida entre o devedor e o credor com a elaboração de um plano de pagamento, onde o endividado poderá quitar suas dívida em até cinco anos, sem prejuízo de reserva de recursos para o mínimo existencial da sua família. Este projeto prevê, ainda, no parágrafo 4º do artigo 54-B, a vedação do uso de expressões do tipo “crédito gratuito”, “sem juros” ou “sem acréscimo”, além da criação do “assédio de consumo”.

“Parágrafo 4 º – É vedado, expressa ou implicitamente, na oferta de crédito ao consumidor, publicitária ou não:

II- fazer referência a crédito “sem juros”, “gratuito”, “sem acréscimo”, com “taxa zero” ou expressão de sentido ou entendimento semelhante”.

Os fornecedores estarão proibidos de promover a publicidade de crédito utilizando estes artifícios, sendo defeso o chamado assédio de consumo, que é identificado quando o fornecedor faz uma pressão para que o consumidor obtenha o crédito oferecido.

5 AS PRINCIPAIS CAUSAS DO SUPERENDIVIDAMENTO.

Podem ser apontadas como causas de superendividamento: o crédito fácil; abuso de crédito;a propaganda enganosa e abusiva; falta de informação; realização de empréstimos a juros altos para saldar outras dívidas; bem como os acidentes da vida – desemprego, diminuição de renda, morte ou doença na família, divórcio, separação, acidentes, redução de carga horária ou de salário, nascimento de filhos, volta de filhos para a casa dos pais e etc. Para a professora Amélia Soares da Rocha e a advogada Fernanda Paula Costa de Freitas, autoras do artigo “O Superendividamento, o consumidor e a análise econômica do direito” o fenômeno do superendividamento se agravou com a explosão de oferta de crédito e principalmente após a Lei 10.820/2003, que permitiu o empréstimo descontado em folha.

“O objetivo público de inserção social, em que a população de baixa renda passou a ter acesso a eletrodomésticos, veículos, telefonia e outros bens e serviços que antes eram inacessíveis desconsiderou a análise e prevenção do risco do endividamento pernicioso; vem desacompanhada da preocupação com a educação para o consumo”. (2010, p.7)

Em outros países que já começaram a enfrentar o superendividamento  existem leis que visam proteger esses consumidores que entraram na situação do superendividamento devido a um fato alheio à sua vontade, o chamado superendividado passivo, onde há a boa-fé.

“A estes que sofrem um “acidente da vida” (divórcio, separação, morte na família, doença, acidentes, desemprego, redução de carga horária ou de salário, nascimento de filhos, volta de filhos para a casa dos pais, etc.) chamamos de superendividados passivos, pois seu estado nada tem a ver com “culpa”, pobreza ou falta de capacidade de lidar com a sociedade de consumo e o crédito fácil.” (MARQUES, 2010, p.20)

6 TRATAMENTO DO SUPERENDIVIDAMENTO.

O fenômeno do superendividamento não é apenas individual, mas trata-se de um fenômeno social e jurídico, que a cada dia vem crescendo e não só no Brasil, mas em todo o mundo. Por esta razão que ele merece um tratamento jurídico, o Estado precisa intervir para efetivar a política nacional de relações de consumo.

“A política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo p atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.” (Artigo 4º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor)

O consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo, e por isso deve receber proteção, é este o objetivo maior do CDC e não é por acaso que o código leva o nome de Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Contudo é necessário que se faça jus ao nome que leva, é preciso que realmente o CDC traga normas que assegurem o consumidor de que ele está protegido.

“Seja o parcelamento, os prazos de graça, a redução dos montantes, dos juros, das taxas, e todas as demais soluções possíveis para que possa pagar ou adimplir todas ou quase todas as suas dívidas, frente a todos os credores, fortes e fracos, com garantias, privilégios, créditos consignados ou não. Em resumo, necessitamos de uma lei que tente prevenir o superendividamento dos consumidores e preveja algum “tratamento” ou remédios caso o consumidor (e sua família, pois acaba sempre sendo um problema familiar) caia em superendividamento.” (MARQUES, 2010,p. 34)

Já está tramitando no Senado Federal, o Projeto de Lei do Senado nº 283/2012, que juntamente com outros dois projetos já citados (PLS nº281/2012 e PLS nº282/2012) integram o que ficou conhecido como a “Reforma do CDC”, que nada mais que que uma atualização do atual Código de Proteção e Defesa do Consumidor. O PLS 283 surge como esperança para os consumidores superendividados, e dispõe sobre a prevenção do superendividadento. Contudo, para a professora Claudia Lima Marques,a nova lei só vai ajudar a prevenir o superendividamento se tiver 'dentes', logo deve incluir uma sanção.” (2010, p.29)     Pois o fornecedor descumprir a norma e sofrer sanções ela terá mais eficácia. O consumidor deve ter ao menos de maneira mais facilitada a renegociação da sua dívida, sempre preservando o seu mínimo existencial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da análise realizada no presente trabalho, verificou-se que o tema do superendividamento ainda é um tema considerado novo no ordenamento jurídico brasileiro e que diante da importância que o crédito ocupa nos dias atuais, é certo que ele merece receber uma atenção maior dos operadores do direito.

Após uma análise das decisões acerca do tema nos tribunais pátrios, constata-se que o um tratamento para o superendividamento vem sendo aceito e aplicado pela jurisprudência brasileira, contudo, de forma tímida, haja vista a ausência de sua aplicação em alguns estados. Em alguns casos os magistrados resolvem dividir o valor da dívida em parcelas que cabem no bolso do consumidor, através da redução dos juros, outros casos os magistrados atuam até perdoando a dívida. Raros foram os casos em que foram utilizados critérios específicos, entendidos pela doutrina como sendo pertinentes ao instituto, até porque este ainda é um tema muito pouco abordado em livros de doutrina.

Mister se faz a distinção do superendividamento e de outros institutos como o endividamento, pois este possui características e critérios próprios, diferenciando-se daquele.

Outro aspecto importante que deve ser lembrado em relação à distinção entre os institutos já citados, é o fato de que no endividamento o consumidor pode efetivamente quitar a dívida, sem comprometimento de sua renda mensal para resguardar o mínimo existencial de sobrevivência.  Já no superendividamento o consumidor não tem nenhuma possibilidade de pagar suas dívidas, sequer se destinar todo o seu rendimento mensal para o pagamento de seus débitos.

O tema já recebeu atenção dos legisladores brasileiros, tendo em vista que entre os três projetos de reforma do Código de Defesa do Consumidor, um deles estabelece normas que regulamentam a oferta de crédito e de prevenção ao superendividamento. Este fato é considerado um avanço jamais visto nas normas consumeristas brasileiras. O projeto destaca ainda, a criação de um procedimento especial, que será uma tentativa de negociação da dívida entre o devedor e o credor com a elaboração de um plano de pagamento, sem prejuízo de reserva de recursos para o mínimo existencial da sua família.

 Conclui-se que ainda há muito o que avançar nesta área do conhecimento jurídico, sendo preciso respeitas princípios estabelecidos na Constituição Federal Brasileira. Princípios que fundamentam o tratamento adequado para esta situação, mesmo com a ausência de tratamento legal, isto não prejudica o início dessa tutela, tendo em vista a Constituição Federal ter consagrado o princípio da dignidade da pessoa humana como vetor de interpretação e aplicação de todo o sistema jurídico pátrio, exigindo-se do operador do Direito o compromisso com a a defesa do bem estar do homem, garantindo-se as condições mínimas da sobrevivência digna do consumidor..

 

Referências
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Notas:
[1] Artigo Científico apresentado ao curso de Direito, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito da Faculdade Estácio de Sergipe – FASE, sob a orientação da Prof. M. SC. Betânia da Costa Leite

Informações Sobre o Autor

Gidelzo Fontes de Oliveira Júnior

Advogado graduado em Direito pela Faculdade Estácio de Sergipe


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Equipe Âmbito Jurídico

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