Resumo: O direito adquirido de revisão ao benefício de aposentadoria em face do preenchimento dos requisitos em outra ocasião mais favorável ao segurado contempla duas correntes opostas. A primeira lhe sendo contrária, defendida pela Administração Previdenciária, utilizando como fundamento a segurança jurídica e o ato jurídico perfeito. A segunda vencedora no Supremo Tribunal Federal fez prevalecer o direito adquirido, garantir a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial (RMI) possível no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior.
O direito adquirido ao melhor benefício previdenciário contempla duas correntes doutrinárias diametralmente opostas acerca de seu entendimento. O direito ao melhor benefício ao segurado (preenchidos os requisitos em outra ocasião mais favorável ao segurado) em detrimento do ato jurídico perfeito no momento da concessão do benefício nos termos da legislação em vigor.
Para a Previdência Social, através de seu órgão executor e regulador o Instituto Nacional do Seguro Social, a quem não compete o controle de constitucionalidade, mas apenas o estrito cumprimento da legislação previdenciária, cumpre à risca o dispositivo insculpido no artigo 29, incisos I e II, da Lei 8.213/91, que não conferem qualquer discricionariedade na ocasião do cálculo do salário-de-benefício, do benefício pretendido, in verbis:
“Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
I – para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário; (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
II – para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo. (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)”
Assim, em regra o benefício previdenciário será calculado manejando os 80% maiores salários de contribuição a partir de julho de 1994, mesmo aqueles gerados após o direito adquirido ao benefício não requerido, posto que não há tal ressalva expressa na legislação.
Logo, tormentoso tema teve de ser enfrentado pelos diversos tribunais pátrios na definição se é cabível direito adquirido ao melhor benefício previdenciário, sob a vigência da mesma lei, consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem assentada jurisprudência segundo a qual a previdência social, no período entre o preenchimento das condições para a percepção do benefício e a data de sua concessão, encontra-se regida por um único regramento legal.
Ademais, tem-se assentado na jurisprudência que o não exercício do direito à aposentação no momento da implementação de todos os requisitos necessários a sua fruição não pode constituir obstáculo a que o cálculo do benefício seja feito da maneira mais vantajosa possível.
No entanto, tem-se consolidado que o momento de opção para que seja verificado qual a data de início de benefício (DIB) deve ser o momento do requerimento da aposentadoria.
Uma vez fixada a DIB, pelo requerimento e deferimento da aposentadoria, tem-se o marco inicial do seus cálculos, a fim de que se promova o melhor benefício ao segurado, constituindo-se assim um ato jurídico perfeito que não poderia ser modificado ao argumento de que reajustes posteriores tornariam mais benéfica a aposentação calculada a partir de data diversa.
Contrariamente à tese que resguarda o direito adquirido, tem-se o ato jurídico perfeito e a segurança jurídica do sistema previdenciário que caminham em sentido contrário.
Nesse sentido, dispõe a doutrina de Fabio Zambite:
“A concessão da aposentadoria é materializada por meio de um ato administrativo, pois consiste em ato jurídico emanado pelo Estado, no exercício de suas funções, tendo por finalidade reconhecer uma situação jurídica subjetiva. É ato administrativo na medida em que emana do Poder Público em função típica (no contexto do Estado Social) e de modo vinculado, reconhecendo o direito do beneficiário em receber sua prestação.” (…)
“o ato jurídico perfeito resulta muitas vezes da concretização de algum direito, seja pelo desejo das partes interessadas, seja por força de lei. Daí a salvaguarda do ato perfeito e acabado, pois evidentemente é meio indireto de proteção ao próprio direito adquirido”. [1]
Assim, a Previdência Social, na sustentação de seu ato administrativo, nos estritos ditames legais, argumenta que o direito adquirido a aposentadoria é materializado por um ato jurídico perfeito (a aposentação) e a Constituição o resguarda contra futuras alterações em prestígio à segurança jurídica.
No enfrentamento do tema, a Procuradoria-Geral da República, na espécie vertente, afirmou que:
“não há situação de maior vantagem, uma vez que o período entre o preenchimento das condições para a percepção do beneficio e a data de sua instituição perante o INSS encontra-se regido por um único regramento legal, enquanto a jurisprudência do [Supremo Tribunal] funda-se na sucessividade de leis no tempo. E, por consectário lógico, inexiste direito adquirido correlato”.[2]
Ademais, para a corrente contrária do direito adquirido, a Administração Previdenciária, em homenagem a segurança jurídica, deve conferir e conceder a aposentadoria da maneira mais vantajosa analisando-se a situação do segurado à época do requerimento, uma vez que não poderá prever que reajustes posteriores à data da aposentação possam tornar mais benéfico o cálculo a partir de outra data.
Assim, além de contrariar ato jurídico perfeito, a tese que defende o direito adquirido de revisão do benefício atenta contra a previsibilidade das relações entre a previdência social e o segurado, pois a qualquer tempo pode o segurado requerer a revisão de sua aposentação, ainda que tenha sido concedida de forma regular e mais favorável à época.
Não obstante todos os argumentos ventilados acima, que exaltam a segurança jurídica e defendem o ato jurídico perfeito, deve o interprete sopesar que do outro lado da balança sopesa direito tão relevante quanto ao ato jurídico perfeito, consubstanciado no direito adquirido que tem o mesmo peso constitucional, nos termos fulcro constitucional (Constituição da República, artigo 5º, inciso XXXVI e Lei de Introdução ao Código Civil, artigo 6º).
Põe-se então a validade do direito adquirido de todo e qualquer segurado ter deferida sua pretensão de ver o benefício calculado do modo mais vantajoso, consideradas todas as datas de exercício possíveis desde o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria.
No enfrentamento da questão, o Supremo Tribunal Federal entendeu, apesar dos argumentos da Administração Previdenciária estarem de acordo com a Lei 8.213/91, que em determinados casos específicos, no cumprimento estrito da regra, poderá haver ofensa ao princípio da isonomia e justiça ao simples argumento de que uma vez incorporado o direito à aposentação ao patrimônio do segurado, sua permanência na ativa não poderia prejudicá-lo.
De outra ótica, é preciso verificar que o princípio da obrigatoriedade da concessão do benefício mais vantajoso, já se encontra incorporado em nossa ordenamento jurídico pátrio, consoante lições na obra do especialista Raul Carvalho, que dispõe:
“No âmbito da análise da concessão de um benefício previdenciário, por inúmeras hipóteses, enfrentará o servidor da previdência social situações na qual o segurado atende os requisitos para a concessão de dois benefícios não acumuláveis do Regime Geral da Previdência Social.
Em tais situações, não pode o segurado, sob o enfoque do princípio geral da estrita legalidade, ficar ao dispor de critérios subjetivos do servidor responsável pela análise da concessão do melhor ou pior benefício ao segurado.
Assim, reguardado o interesse público, em que pese o princípio não figurar como uma regra explícita em nosso ordenamento, trata-se de princípio a nortear as decisões da previdência, consoante enunciado nº 5 do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS: "A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido."
Assim, por esse princípio, deve a Previdência, na oportunidade da decisão administrativa, ainda que o segurado requeira benefício diverso, conceder o benefício mais vantajoso ao segurado.”[3]
Na mesma linha, leciona Allan Barros:
“No momento do julgamento administrativo, mesmo seja possível duas ou mais interpretações jurídicas sobre o caso concreto, devem os servidores do INSS verificar as provas produzidas nos autos e, caso constatado o direito a benefício diverso do requerido e/ou mais vantajoso economicamente, informar ao interessado e, no caso de anuência deste, proceder à concessão do benefício.[4]
Corrobora também esse entendimento o próprio regulamento do Processo Administrativo Previdenciário IN/45 – Instrução Normativa da Presidência do INSS nº 45, de 06 de agosto de 2010, que dispõe:
“Art. 623. Se por ocasião do despacho, for verificado que na DER o segurado não satisfazia as condições mínimas exigidas para a concessão do benefício pleiteado, mas que os completou em momento posterior ao pedido inicial, será dispensada nova habilitação, admitindo-se, apenas, a reafirmação da DER.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se a todas as situações que resultem em um benefício mais vantajoso ao segurado, desde que haja sua manifestação escrita.”
Dessa forma o tema restou consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, através do julgamento do recurso extraordinário 630.501, no qual a Ministra Ellen Gracie, relatora, exarou voto favorável aos segurados, conforme evidenciado no Informativo n 617 do STF, que dispõe:
“A Min. Ellen Gracie, relatora, deu parcial provimento ao recurso, para, atribuindo os efeitos de repercussão geral ao acolhimento da tese do direito adquirido ao melhor benefício, garantir a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial (RMI) possível no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional, com efeitos financeiros a contar do desligamento do emprego ou da data de entrada do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas.”RE 630501/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 23.2.2011. (RE-630501)[5]
Dentre os argumentos dos quais se valeu a Eminente Ministra, que conferiu ainda efeitos vinculantes ao referido julgado, destacam-se:
1)Que não se estar, no caso, diante de uma questão de direito intertemporal, mas da preservação do direito adquirido em face de novas circunstâncias de fato, devendo-se, com base no Enunciado 359 da Súmula do STF, distinguir a aquisição do direito do seu exercício; 2) Que cumpridos os requisitos mínimos (tempo de serviço e carência ou tempo de contribuição e idade, conforme o regime jurídico vigente à época. o segurado adquiriria o direito ao benefício. 3) que a perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que atendidos esses requisitos. 4) que a modificação posterior nas circunstâncias de fato não suprimiria o direito já incorporado ao patrimônio do seu titular; 5) que, uma vez incorporado o direito à aposentação ao patrimônio do segurado, sua permanência na ativa não poderia prejudicá-lo.”
No julgamento em questão restaram vencidos os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que consideravam o requerimento de aposentadoria ato jurídico perfeito, por não se tratar, na hipótese, de inovação legislativa.
Na modulação dos efeitos, a Suprema corte atribuiu repercussão geral ao acolhimento da tese do direito adquirido ao melhor benefício assegurando-se a possibilidade de todos segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados nos termos do voto da relatora supra transcrito, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vendidas.
Não obstante a repercussão positiva para os segurados da previdência social, padeceu de omissão a modulação dos efeitos quanto ao cumprimento administrativo por parte do INSS, uma vez que, nos moldes do julgado da Suprema Corte, infinitas são as possibilidades de revisão de benefício previdenciário, a inviabilizar que a Administração Previdenciária proceda administrativamente todas as revisões, independente de requerimento dos segurados interessados.
Procuradora Federal, Coordenadora Estadual da PFE/IBAMA-DF, Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília. Brasília/DF
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