O direito de greve na legislação brasileira

Resumo: Neste trabalho iremos discorrer acerca do direito de greve na lei brasileira. O direito de greve na nossa lei é alçado a categoria de direito fundamental estando a sua previsão imersa no Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” da Constituição Federal 1988. O artigo 9º da nossa Carta Magna é que dispõe acerca desse direito. Comentaremos os mais relevantes aspectos da lei ordinária 7.783/89 que regulamenta o direito de greve em nosso ordenamento pátrio, bem como os requisitos impostos pela referida lei para a deflagração de uma greve. Abordaremos também a história da greve. Por fim, ainda abordaremos acerca da previsão constitucional para o exercício do direito de greve pelos funcionários públicos expressa no artigo 37, VII da CF.  

INTRODUÇÃO.

Essa pesquisa tem por finalidade expor, comentar acerca do direito de greve a luz do ordenamento jurídico brasileiro. Temos como propósito consignar os aspectos gerais e principias de acordo com o direito de greve analisando o que disciplina a nossa Constituição de 1988 acerca do assunto.

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Analisaremos também os ditames da Lei 7.783/89 que disciplina o exercício da greve, regulando tal direito, estabelecendo requisitos que devem ser atendidos para que uma greve seja deflagrada dentro dos parámetros e limites que a lei impõe.

A despeito de o direito de greve em nosso ordenamento ser elevado a categoria de direito fundamental há que se ressaltar que esse não é exercível de forma absolutamente ampla e aleatória. Como todos os direitos fundamentais garantidos pela nossa Carta Constitucional, o direito de greve é mitigável face aos direitos fundamentais de outrem. Nesse sentido dispõe a lei 7.783/89 quando proibe, por exemplo, a deflagração de greve em serviços considerados essenciais.

Iniciaremos com um breve enfoque acerca da parte histórica do direito de greve. Há que se ressaltar que a história desse instituto se confunde com a história do direito do trabalho.

Devido as péssimas condições de trabalho os trabalhadores iniciam as primeiras greves como forma de presionar e reivindicar por melhores condições de trabalho. Durante a Revolução Industrial os trabalhadores laboravam em condições subumanas com jornadas de trabalho extenuantes de mais de 16 horas. Os locais de trabalho eram insalubres e impróprios o que causavam aos mesmos doenças do trabalho levando muitos  a morte ou acidentes que lhe diminuiam a capacidade laboral por terem que manipular máquinas e equipamentos sem nenhuma proteção.

Comentaremos ainda mais detidamente sobre a lei 7.783/89 acerca de todos os requisitos que a mesma impõe para a deflagração de uma greve. A não observação desses ditames que a referida lei determina acarreta o abuso do direito de greve.

Quando a justiça do trabalho se pronuncia acerca da ilegalidade de uma greve, em outras palavras enuncia, decide, que determinado movimento paredista é abusivo. Tal determinação não tem efeitos positivos sobre o vínculo laboral e em caso de desobidiência dos grevistas quanto a cessação do movimento paredista, estes podem ser demitidos por justa causa.

Usaremos como respaldo para as nossas considerações as melhores doutrinas acerca do assunto e utilizaremos como método de pesquisa o descritivo analítico. A presente pesquisa é bibliográfica. 

I. O DIREITO DE GREVE.

Nas sociedades primitivas os conflitos sociais eram resolvidos pelos próprios interessados cada qual usando de sua superioridade, seja física, moral ou econômica frente ao seu desafeto.

Contudo, o direito moderno vem banindo o exercício da autotutela afim de que haja um equilíbrio nas relações humanas, para que prevalecam o direito e a justiça em detrimento dos abusos e arbitrariedades daqueles que detém superioridade física, moral ou econômica.

No entanto, o direito admite algumas exceções a proibição do exercício da autotutela tendo como pressuposto o fato de que algumas situações concretas justifica a imediata ação daquele que vê seu direito ameaçado. O ordenamento jurídico brasileiro consigna situações em que se outorga aos jurisdicionados o direito de exercer a autotutela. Como exemplo podemos citar o direito de retenção previsto em diversas passagens do Código Civil Brasileiro.

Portanto, para o Direito do Trabalho a greve representa excepecionalmente um mecanismo de autotutela. Sendo esta o meio mais relevante que os empregados detém em seu favor contra o empregador e a sua consequente superioridade econômica, pois como se sabe, o empregador, na maioria das vezes, tem em sua posse além do capital os intrumentos de trabalho.

 Em nosso ordenamento jurídico a greve representa, então uma forma de autotutela admitida como exceção e que se perfaz com a paralisação coletiva, pacífica e temporária da prestação de serviço por parte dos trabalhadores. Em linhas gerais, tal movimento é decidido através da manifestação de vontade da organização sindical, que em seu estatuto deve dispor acerca da assembléia geral de convocação dos associados para deliberar acerca da pauta de reinividicações e do quorum mínimo para que possa ser deflagrada uma greve.

O termo greve vem de grève  que em francês quer dizer cascalho, areal. Relata-se que antes da canalização do rio Sena em Paris com as suas cheias eram depositados em uma praça gravetos e pedras ao qual ficou conhecida por place de grève. Nessa praça costumavam se reunir trabalhadores à procura de emprego. Com o surgimento da paralisação do trabalho, os trabalhadores passaram a se reunir nessa mesma localidade. Com isso o termo grève passou a ser sinônimo de paralisação do trabalho.[1]

Quando nos referimos a greve tem- se a noção restrita de que tal instituto apenas se restringe ao campo laboral. No entanto, antes de mais nada a greve é uma realidade sociológica que cujas consequências se irradiam para o campo jurídico necessitando, por tanto, que o direito se ocupe em estudá-la e apresentar soluções para as implicações geradas pela mesma.

Existem tipos de greve que não necessariamente têm como função primordial buscar melhores condições de trabalho. Algumas greves podem ser oriundas de fatos sociais que não estão diretamente ligadas a reivindicações trabalhistas, mas a fatos políticos e econômicos por exemplo. Na classificação[2] dos tipos de greve encontraremos os seguintes tipos: greve de fome, greve política, greve solidária, greve de zelo, “operação tartaruga” que para alguns doutrinadores e alguns ordenamentos jurídicos não se tratam de greve em sentido estrito, pois não há paralisação da prestação de serviços.

Todavia, nesse trabalho de pesquisa em epígrafe  nos deteremos a discorrer acerca do instituto da greve apenas sob o prisma do Direito Laboral.

Ao focarmos na historicidade da greve observaremos que a mesma passou pela fase da proibição com uma dupla qualificação: ilícito civil, que impunha aos grevistas resolução contratual, e ilícito penal, no qual punia os grevistas com a imputação de um delito. Em uma fase posteior, a greve deixa de constituir um ilícito penal, mas, todavia, continua constituindo um ilícito civil, esse período se denomina por período da tolerância. Finalmente, a greve passa a ser reconhecida como um direito, inclusive nos Estados Democráticos de Direito, tendo o exercício ao direito de greve estatus de Direito Constitucional. Passou-se a enxergar o direito de greve como uma forma legítima de autotutela e defesa dos trabalhadores, consituindo, portanto meio legal de constranger o empregador a acatar as reivindicações dos trabalhadores.[3]    

Como aludimos acima, por tratar-se primeiramente de um fato social, antes mesmo de ser um fato jurídico, a greve constituiu um dos elementos que ensejou o desenvolvimento do Direito do Trabalho, pois tal instituto sempre foi usado pela classe operária como instrumento de pressão por melhores condições de trabalho. Por isso, em muitos momentos, a história do Direito do Trabalho confunde-se com o instituto em análise.[4]

2.  O instituto da greve atualmente no ordenamento jurídico brasileiro.

No ordenamento jurídico brasileiro atualmente o direito de greve é um direito constitucional, sendo um direito social dos trabalhadores, tratando-se de um Direito Fundamental por estar no Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” da Constituição Federal 1988. O artigo 9º da Carta Magna assim dispõe acerca do direito de greve:

Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

§ 1º – A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

§ 2º – Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.”

Como se pode ver a Constituição assegura o direito de greve por si própria, não a condicionando a regulamentação e/ou eventual previsão de lei. Trata-se, pois de uma norma constitucional de eficácia plena.  No entanto, nada impede que a lei infraconstitucional estabeleça determinados procedimentos e solenidades para o exercício do direito coletivo da greve.

No conjunto de leis do ordenamento jurídico brasileiro atualmente a lei 7.783/89 é que regulamenta o exercício do direito de greve no setor privado. De acordo com o que esculpi a mencionada lei em seu artigo 2º: a greve trata-se da suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços ao empregador.

Ainda nessa esteira, como se pode ver pelo o que consigna o Caput do artigo acima transcrito os trabalhadores têm total discricionariedade quanto ao momento de deflagrar uma greve, bem como acerca do conteúdo de suas reivindicações.

No entanto, há de se ressaltar que a lei 7.783/89 determina em seu artigo 3ª parágrafo único e em seu artigo 13º alguns requisitos que devem ser observados quando da deflagração da greve senão vejamos:

“Artigo 3º – Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.

Parágrafo único – A entidade patronal correspondente ou os empregadores diretamente interessados serão notificados, com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas, da paralisação. (grifo nosso).

Artigo 13 – Na greve, em serviços ou atividades essenciais, ficam as entidades sindicais ou os trabalhadores, conforme o caso, obrigados a comunicar a decisão aos empregadores e aos usuários com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas da paralisação.” 

Logo, vê-se que a despeito do que emana do artigo 9ª da Carta Magna, de que os empregados têm discricionariedade quanto ao momento de exercício da greve, devem, todavia, cumprir prazos que a referida lei infraconstitucional impõem para que o respectivo direito possa ser exercido com respeito ao direito alheio, bem como ao ordenamento jurídico, sob pena de abuso de direito de greve tema que adiante comentaremos.

Ainda é importante salientar que a greve deve ser exercida em face do empregador, que é o sujeito ao qual se dirige as reivindicações da classe trabalhadora e nunca em face de terceiros, pois dessa forma não estaria configurada a greve.

No entanto, há de se destacar que o Estado ao regulamentar o Direito Constitucional a Greve por meio da lei ordinária 7.783/89 não deve se olvidar de que essa regulamentação nunca deve ser no sentido de restringir, dificultar, obstacular o exercício de tal direito. Até porque como já mencionamos acima, o direito de greve de acordo com o que esculpi a nossa Lei Maior trata-se de um Direito e Garantia Fundamental.

Todavia, por outro lado, há de se consignar que é pacífico o fato de que grande parte dos direitos fundamentais não são intocáveis e absolutos. O homem é um ser social e político, principalmente pelo fato de viver em sociedade, e estar em contato com outros sujeitos que também gozam de suas respectivas garantias e prerrogativas que defluem do Estado Democrático de Direito. Evidentemente em alguns momentos irão ocorrer choques entre os direitos de um indivíduo e outro. Portanto, havendo choques entre direitos fundamentais de pessoas distintas uma das partes pode ter seu direito fundamental mitigado em face da existência de um direito fundamental pertencente a outrem.

Logo, como todos os direitos outorgados por nosso ordenamento jurídico, o direito ao exercício de greve sofre restrições face aos direitos alheios para que não haja abusos por parte daqueles que o exercem. O ordenamento jurídico pátrio consigna o direito de greve, mas também põe a salvo os direitos individuais e da sociedade como um todo.

Na própria lei 7.783/89 se encontram em seus artigos as seguintes determinações:

Art. 6º São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:(…)

§ 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.

§ 2º É vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.

§ 3º As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.”

Tais vedações nada mais são do que consignação da lei infraconstitucional que regulamenta o direito ao exercício de greve da proteção e respeito aos Direitos Fundamentais alheios que devem ser observadas quando no momento e durante a deflagração de uma greve. Como bem explicita os dispositivos acima transcritos deve haver um respeito aos direitos fundamentais de ir e vir esculpido no artigo 5º, XV da nossa Carta Maior, portanto, não é permitido aos grevistas impedir o acesso dos outros obreiros aos locais de trabalho, pois participar ou não de uma greve da categoria a qual pertence é uma escolha individual de cada trabalhador.

Observa-se ainda no trecho da lei 7.783/89 acima transcrito que há uma preocupação também em resguardar o direito de propriedade que se encontra no artigo 5º, XXII da Constituição Federal Brasileira constituindo o direito de propriedade também um direito fundamental em nosso ordenamento jurídico. Sob esse prisma é que o parágrafo 3º do artigo 6º acima declinado resguarda a incolumidade ao patrimônio do empregador. Logo, não é licito aos grevistas em seus protestos depredarem a empresa e suas dependências. Nesse exemplo, claramente se constata o choque entre dois direitos fundamentais distintos: o direito fundamental a greve e o direito fundamental de propriedade. Ainda nessa esteira, não poderíamos deixar de destacar os seguintes artigos da mencionada lei que assim sedimenta:

“Artigo 9º – Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal ou diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de assegurar os serviços cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento.

Parágrafo único – Não havendo acordo, é assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo.”

Também se constata do parágrafo 3º do artigo 6º a preocupação em proteger a incolumidade física do ser humano bem como a sua livre vontade. Nesse sentido corrobora nossa Lei Maior em seu artigo 5º, Caput da Constituição Federal Brasileira na qual aduz dentre outros que o direito a liberdade, segurança e a propriedade são invioláveis. Senão vejamos:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, á liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:”

Ainda nesse sentido corrobora os demais incisos do supramencionado artigo 5º da Constituição, como por exemplo, o inciso II, que aduz que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se não em virtude de lei; o inciso XXII que garante o direito de propriedade. Há que se acrescentar também a esse respeito o relevante artigo 1º, III da Carta Magna que consigna a dignidade da pessoa humana. 

Por fim, não podemos deixar de mencionar que a multicitada lei 7.783/89 impõe algumas determinações e limites ao exercício de greves em atividades consideradas essenciais.

Entende-se por atividades essenciais aquelas sem as quais a sociedade entraria em colapso em pouco tempo, quiçá em poucas horas. Imaginem todos os hospitais fechados, serviços de telefonia totalmente paralisados, coleta de lixo, distribuição de alimentos, controle de tráfego aéreo e etc. A vida moderna requer a continua prestação de alguns serviços que sem os quais a vida da população se torna inviável. Em razão disso, há que se resguardar não só o direito de greve dos obreiros, mas também há que se proteger os direitos fundamentais que pertencem a uma infinidade de pessoas configurando direitos difusos.

 O artigo 114, §3º da Constituição aduz acerca da vedação de greve em atividades essenciais assim dispondo:

“Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.”

Logo, em caso de greve em serviços essenciais o Ministério Público do Trabalho pode agir de ofício ajuizando dissídio coletivo com a finalidade de que a justiça do trabalho decrete a ilegalidade da greve. Na seara trabalhista os excessos praticados pelo empregado durante a greve podem gerar penalidades aplicadas pelo empregador variando desde de advertência verbal até a extinção do contrato de trabalho por justa causa, contanto que o referido movimento paredista seja decretado ilegal ou abusivo.

Tais vedações tratam-se de óbvias proteções, resguardos aos Direitos Fundamentais da população. O exercício do direito de greve, reconhecido pela Carta Magna Brasileira, não deve mitigar e por em risco o interesse de toda uma sociedade, interesses e direitos esses trasindividuais.

A já declinada lei 7.783/89 em seu artigo 10º estabelece o quais são os serviços e atividades consideradas essenciais senão vejamos:

“Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I – tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de     energia elétrica, gás e combustíveis;

II – assistência médica e hospitalar;

III – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

IV – funerários;

V – transporte coletivo;

VI – captação e tratamento de esgoto e lixo;

VII – telecomunicações;

VIII- guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais;

X – controle de tráfego aéreo;

XI compensação bancária.”

3. REQUISITOS IMPOSTOS PELA LEI PARA A DEFLAGRAÇÃO DE GREVE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.

Apesar do direito de greve como já analisamos outrora, ser um direito garantido por nossa Constituição, sendo inclusive uma norma constitucional de eficácia plena, deve o mesmo estar em consonância com alguns requisitos consistentes em atos preparatórios como: necessidade de prévia negociação coletiva, ou seja, tentativa de concretizar-se uma autocomposição, autorização expressa de assembléia sindical convocada especialmente para esse fim e comunicação expressa da data do início da paralisação. Nesse sentido assim dispõe a lei 7.893/89 no já mencionado artigo 3º.

O não cumprimento dos requisitos supracitados acarreta abuso do direito de greve cujas conseqüências, dependendo do caso, podem repercutir nas esferas civis, penais e trabalhistas. Acerca do abuso do direito de greve e suas conseqüências discorreremos mais adiante.  

Conforme comentamos a pouco, a lei 7.783/89 exige em seu artigo 3º que a decretação do movimento paredista só deve se dar após os esgotamentos de tentativas de negociação coletiva, ou seja, autocomposição. Logo, não havendo êxito na tentativa de negociação coletiva e não se optando nem pela mediação e nem pela arbitragem o movimento de greve é plenamente exercitável.

Há de se ressaltar que o Tribunal Superior do Trabalho , que representa a Corte Suprema em assuntos que dizem respeito a Direito do Trabalho, considera que quando a entidade sindical não se propõe em colocar em pauta a negociação das reivindicações da classe trabalhadora junto ao sindicato patronal ou diretamente junto ao empregador e deflagra movimento paredista estar cometendo abuso do direito de greve. Ou seja, se houver movimento de greve sem tentativa prévia de autocomposição pelas partes interessadas, considera o TST por meio de sua Orientação Jurisprudência de nº. 11 da Seção de Dissídios Coletivos nos seguintes termos:

“Greve. Imprescindibilidade de tentativa direita e pacifica da solução do conflito. Etapa negocial previa. Inserida em 27.03.1998.”

É abusiva a greve levada a efeito sem que as partes hajam tentado, direta e pacificamente, solucionar o conflito que lhe constitui objeto.  

Outro requisito também pedido pela lei para a justa deflagração de movimento paredista diz respeito à convocação de Assembléia Geral pela entidade sindical interessada com objetivo específico de definir assuntos concernentes a greve que se encontra em eminência. O artigo 4º da lei 7.893/89 enuncia de forma clara nesse sentindo aduzindo da seguinte forma:

“Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembléia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.

§ 1º O estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação e o quorum para a deliberação, tanto da deflagração quanto da cessação da greve.

§ 2º Na falta de entidade sindical, a assembléia geral dos trabalhadores interessados deliberará para os fins previstos no "caput", constituindo comissão de negociação.”

Portanto, deve o sindicato interessado que representa a categoria profissional convocar nos termos de seu estatuto Assembléia Geral específica com o fito de definir: início da paralisação dos serviços, pauta de reivindicações e eventual cessação do movimento paredista.

Há de se ressaltar, porém, que não havendo sindicato representativo de determinada categoria profissional em caso de deflagração de greve e conseqüente necessidade de convocação de assembléia deve os trabalhadores convocarem uma assembléia geral cuja finalidade precípua será a de constituir uma comissão de negociação junto ao empregador ou seu sindicato representativo. A lei 7.783/89 em seu artigo 4º, §2º acena nesse sentido senão vejamos:

“Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembléia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços. (…)

§ 2º Na falta de entidade sindical, a assembléia geral dos trabalhadores interessados deliberará para os fins previstos no "caput", constituindo comissão de negociação.”

Deve-se também esclarecer que cada entidade sindical deve ter em seu estatuto as formas de convocação de assembléias gerais e o quorum mínimo necessário para a aprovação da proposta de greve, bem como de sua cessação. Nesse sentido leciona o artigo 4º, §1º da supramencionada lei 7.783/89 que já citamos acima.

Por fim, para que a greve esteja imersa nos requisitos de legalidade, além da tentativa de autocomposição como a pouco explicitamos e a autorização em assembléia geral se faz necessário o aviso prévio da mesma nos seguintes termos: comunicação a entidade patronal da paralisação dos serviços no prazo de 72 horas em se tratando de serviços essenciais, e de 48 horas para as demais atividades. Nesse sentido aduz os artigos 13º e 3º, § único, respectivamente da lei 7.893/89 que regulamenta o exercício de greve no país.

Destaque-se também outro fator importante da lei com intuito de nítida proteção ao patrimônio do empregador. Dispõe o artigo 9º da lei 7.783/89 que deve os empregados manterem em funcionamento os serviços inadiáveis, assim considerados aqueles cuja suspensão importem danos irreparáveis a bens, máquinas e equipamentos do empregador, bem como a manutenção de serviços que são necessários a retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento paredista. Não cumprindo determinada disposição da lei fica o empregador autorizado nos termos do § único do artigo 9º a contratar temporariamente serviços de terceiros para evitar prejuízos.

Percebe-se nesse caso claramente a preocupação do legislador em proteger o patrimônio do empregador em face do constitucional direito fundamental de greve. De um lado o obreiro exercendo o direito de greve que lhe assiste de outro o direito do empregador de proteger seu patrimônio, seu estabelecimento comercial, adimplir com contratos inadiáveis, garantir o bom funcionamento de máquinas que não podem ficar paradas ou sem manutenção.

Lock-out.

É quando o empregador para dificultar o exercício do direito de greve dos empregados fecha o estabelecimento comercial, paralisa as atividades empresariais como uma espécie de represália as reivindicações dos obreiros, consequentemente cessando o pagamento de salários. Tal atitude por parte do empresário tem como finalidade pressionar os empregados a celebrarem com os mesmos acordos coletivos de trabalho que contemple seus interesses.

Nossa lei proíbe tal prática. O artigo 17 da lei 7.783/89 assim dispõe:

“Art. 17. Fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (lockout).

Parágrafo único. A prática referida no caput assegura aos trabalhadores o direito à percepção dos salários durante o período de paralisação.”

Pertinentes as observações de José Cairo Júnior  quando aduz que o que a lei proíbe na verdade são os efeitos que o lock out e não a conduta em si. Se o empregador quiser paralisar as atividades empresariais terá que continuar cumprindo com as obrigações do contrato de trabalho, ou seja, pagando salários e demais direitos trabalhistas durante o período em que suas atividades se encontram paradas.

4. EFEITOS DA GREVE NO CONTRATO DE TRABALHO.

O período em que perdura uma greve pode ter efeito de suspensão ou interrupção do contrato de trabalho.

De acordo com o que reza o artigo 7º da lei 7.783/89 a greve suspende o contrato de trabalho devendo as relações obrigacionais do mesmo ser regidas de acordo com convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho. Senão vejamos o que dispõe o referido artigo:

“Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho”.

Em sendo decretada pela Justiça do Trabalho a ilegalidade da greve o tempo que a mesma perdura será tida como interrupção do contrato de trabalho, pois os grevistas não farão jus aos salários do período, por exemplo, nem as demais obrigações trabalhistas a que fazem jus, já que suas reivindicações foram tidas por não justas. Ou seja, o instrumento por meio do qual a greve teve fim, laudo arbitral, sentença normativa, acordo ou convenção coletiva de trabalho é que elucidará quais os efeitos do movimento paredista sobre o contrato de trabalho.

5. O EXERCÍO DA GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO.

A atual lei ordinária que regulamenta o exercício do direito de greve no Brasil a lei 7.783/89. Tal diploma normativo regulamenta a greve no âmbito da iniciativa privada.

O direito de greve para os servidores públicos, por sua vez, está previsto no inciso VII, do art. 37 da Constituição, in verbis:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:(…)

VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;”

O artigo acima transcrito se encontra inserido no capítulo da Constituição Brasileira de 1988 que se encarrega de versar acerca da Administração Pública (Capítulo VII, do Título III).

A Carta Magna Brasileira no artigo 9ª outorga o direito de greve aos trabalhadores, bem como, dispõe em seu artigo 37, VII, como consignamos a pouco, o direito de greve aos servidores da administração pública. Tal previsão topológica diferenciada decorre do regime jurídico diferenciado que se dispensa ao serviço público, que sempre deve atender aos interesses da coletividade.

Como sabemos um dos princípios basilares da administração pública é a Supremacia do Interesse Público. De acordo com o que reza tal princípio o interesse da coletividade deve se sobrepor ao interesse do particular, o que não significa que os direitos deste não serão respeitados. Logo, sempre que houver confronto entre os interesses público e privado há de prevalecer o interesse público.

Em razão disso a Constituição Federal de 1988 estabelece que a greve no setor público deve ser regulamentada de forma diferenciada da do setor privado, sendo aquela regulamentada por lei específica em face da supremacia do interesse público.

 Por outro lado, há de se ressaltar que o regime jurídico diferenciado entre trabalhadores empregados e servidores públicos, bem como o princípio da supremacia do interesse público, não lhes pode impor violação a direitos fundamentais, na medida em que são todos trabalhadores.

Ademais, como já ressaltamos alhures, o exercício ao direito de greve outorgado pela Constituição Federal aos trabalhadores são alçados pela mesma a categoria de Direitos e Garantias Fundamentais. Portanto, não é admissível a privação dos servidores públicos ao exercício do direito de greve.

A despeito do que convenciona o já mencionado artigo 37, VII da Constituição Federal a greve no setor público ainda não foi regulamentada por lei infraconstitucional em atendimento ao que dispõe a própria Constituição. No entanto, enquanto o Poder Legislativo que ordinariamente é o poder competente para legislar e editar lei não se manifesta, os servidores públicos podem exercer seu direito constitucional a deflagrar greve utilizando-se da lei 7.783/89, que como já aduzimos trata-se da lei ordinária que regulamenta o exercício do direito de greve no setor privado. Nesse sentido, assim dispõe a Corte Suprema diante da análise dos mandados de injunção de números 670 e 712 movidos em face de tal omissão legislativa.

CONCLUSÃO.

No decorrer dessa pesquisa concluímos que o exercício do direito de greve é um poderoso instrumento para os empregados em face dos empregadores que detêm muitas vezes além do capital, os instrumentos de trabalho. Não é difícil depreender que o obreiro muitas vezes depende única e exclusivamente de seus rendimentos a título de salário para a manutenção de sua subsistência e de sua família e que temerosos pelo seu vínculo laboral muitas vezes não lutam ativamente pelos seus direitos.

Diante desse cenário até corriqueiro entram em cena os sindicatos para lutar pelos direitos dos trabalhadores evitando o confronto direto entre estes e os empregadores. Portanto, o direito de greve constitui importante arma dos obreiros como forma de pressão que os mesmos podem exercer contra os desmandos dos empregadores.

Constatamos também ao longo de nosso trabalho monográfico que a greve não se constitui apenas em um fato jurídico, sobretudo para o ramo do Direito Laboral, mais também em um fato social, pois nem toda greve tem apenas o cunho de reivindicar direitos trabalhistas. Como expomos alhures existem vários tipos de greve como: greve de fome, greve política, greve solidária, greve de zelo, também conhecida como “operação tartaruga”

Nesse sentido, concluímos que a greve em sentindo lato é um mecanismo de democrático e barato a disposição do pólo hipossuficiente nas relações sociais para postular direitos que julgam ser detentores em face do pólo mais dominante das relações sociais.

No entanto, apesar de nosso ordenamento jurídico, principalmente a nossa Constituição Federal, como bem esclarecemos ao longo de nossas considerações, consignar em seu artigo 6º que a greve é um direito social, portanto, na clássica classificação dos Direitos Fundamentais constituir um Direito Fundamental de segunda geração

 

Referências.
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2006.
Jr. José Cairo. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2009.
MARTINS, Sérgio Pinto. Curso de Direito do Trabalho.26ª ed. São Paulo: Atlas, 2010
SARAIVA, Renato. Direito do Trabalho-versão universitária. 5ª ed. São Paulo: Método/forense, 2012.
Notas:
[1] MARTINS, Sérgio Pinto. Curso de Direito do Trabalho.26ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 857.
[2] Jr. José Cairo. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2009.
[3] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2006.
[4] Jr. José Cairo. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. Salvador: jus podivm, 2009.

Informações Sobre o Autor

Rayanne Ismael Rocha

Pós graduada em Direito Previdenciário pela Uniderp/LFG. Pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Uniderp/LFG. Doutoranda pela UMSA. Advogada


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