O direito penal, pedofilia e os crimes sexuais contra vulneráveis

Resumo: Esse trabalho objetiva apresentar aspectos relacionados às formas e tipos de crimes sexuais contra vulneráveis, às suas causas e suas consequências no panorama jurídico. Buscou-se identificar as várias teorias que tentam explicar essa conduta com o escopo de diagnosticar em cada uma delas argumentos para melhor compreender o que é a pedofilia, o pedófilo e o que se passar na mente desse indivíduo tão curioso. Ademais com esses conhecimentos em mãos pretendeu-se visualizar no campo processual penal a dinâmica e o tratamento dispensado a esses indivíduos, bem como quais são e como são as penas á eles aplicáveis. Realizou-se pesquisa histórica e de teorias diversas que pretendem explicar e resolver de alguma forma tais questionamentos. Posto isto, sob o olhar das previsões de inimputabilidade da legislação penal fez-se nova análise da pedofilia, na qual, se chegou à possibilidade da castração química ser a solução para a questão.

Palavras-chave: Crimes sexuais contra vulneráveis. Pedofilia. Processo Penal. Direitos da Criança e do Adolescente.

Abstract: This article presents aspects related to the forms and types of sexual crimes against vulnerables, its causes and its consequences in the legal landscape. Sought to identify the various theories that attempt to explain this behavior with the scope to diagnose in each arguments to better understand what is pedophilia, pedophile and what is going on in the mind of that individual so curious. With this knowledge in hand it was intended to display the criminal justice field treatment meted out to these individuals and what the penalties are and how they will apply. There was history and various theories that purport to explain and solve somehow such research questions. That said, under the gaze of forecasts unaccountability of criminal law became new analysis of pedophilia, in which, we arrived to the possibility of chemical castration be the solution to the issue.

Keywords: Sexual crimes against vulnerable. Pedophilia. Criminal Procedure. Rights of Children and Adolescents.

1 VULNERABILIDADE E CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEIS

Cada vez mais, a exploração sexual do menor, em todas as suas acepções vem sendo ferreamente combatida e amplamente difundida para fins de prevenção. Inúmeras convenções internacionais em face da dimensão mundial que o problema tomou e da verdadeira organização internacional que vem assumindo o tráfico de menores para fins sexuais condenam e punem duramente os praticantes de tão imoral delito.

No Brasil, a partir da Lei nº 12.015 de agosto 2009 inova, trazendo um capítulo em reservado para tratar dos crimes contra vulneráveis, acobertado pelo art. 227 § 4º da Magna Carta de 1988 que prescreve: “A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”; com tanto, a nação brasileira mais que nunca condena o menoscabo a exploração do menor.

Mirabete (2010) dispõe sobre o conceito de vulnerável e esmiúça a respeito do bem jurídico que o legislador brasileiro quis proteger com a imposição da lei supra, dizendo que a pessoa do vulnerável no sentido que o Código Penal Brasileiro lhe conferiu é, em primeiro plano, a pessoa menor de 14 anos, que, por sua personalidade ainda incompleta, se encontra particularmente sujeita aos abusos e à exploração e sofre, em maior intensidade, os efeitos danosos causados por delitos de cunho sexual.

O renomado autor ainda leciona que a pessoa vulnerável é também aquele portador de enfermidade ou deficiência mental que não tem o discernimento necessário em relação às práticas sexuais e que, por essa mesma razão, se encontra também particularmente sujeita a exploração sexual. Vulnerável é ainda, a pessoa que “por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência” (art. 217, § 1º, 2ª parte). Refere-se à lei neste ponto a qualquer pessoa que se encontre na situação de não poder oferecer resistência à conduta do agente.

Mas para melhor compreensão do fenômeno da pedofilia e sua ligação direta com os crimes sexuais contra vulneráveis, fixe-se no primeiro conceito de vulnerável, o menor de 14 anos, que de imediato é o objeto de estudo desde trabalho.

Os crimes sexuais contra vulneráveis abrangem os crimes de estupro de vulnerável (art. 217-A), indução de menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem (art. 218), satisfação da lascívia mediante presença de criança ou adolescente (art. 218-A) e favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável (art. 218-B); frise-se que para ocorrer a pedofilia não é necessário a consumação de nenhum destes delitos pelo indivíduo; da mesma forma, que uma conduta para ser enquadrada nos tipos legais em tela não precisa ser necessariamente realizada por um pedófilo, sendo o saneamento desta complexidade o intuito principal deste artigo. Em se tratando de pedófilos, só há crime quando a pedofilia extrapola os limites da mente e do corpo do próprio pedófilo, atingindo o menor e enquadrando-se nas tipificações acima.

O autor ainda nos ensina que em alguns dispositivos, a lei penal estabeleceu tratamento diferenciado em relação ao menor de 14 anos e ao maior de 14 anos e menor de 18 anos, reconhecendo que em relação aos últimos há de ser respeitada alguma liberdade sexual.

Assim, não existe uma correlação assimétrica sobre o que a lei brasileira considera criança (menor de 12 anos, por força do artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente) e o que outros autores de diversas áreas consideram como criança, para uns criança é o menor de 14 anos, para outros não há limites de idade prevalecendo as características do desenvolvimento de cada indivíduo, assim, deste ponto de vista, criança é aquele indivíduo que se aparenta fisicamente como tal e se comporta como tal.

Observa-se que algumas das tipificações supracitadas são resultados de ações que sequer depende do contato físico do autor com a criança para se ter consumado o crime, como por exemplo, a indução de menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem, prevista no art. 218 do Código Penal. Na lição de Rogério Greco (2010) se consuma o crime quando se induz menor de 14 (quatorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem, onde o agente presta assistência à libidinagem de outra pessoa, com ou sem finalidade econômica. Assim pode-se deduzir que o autor deste tipo penal – o indutor, não é tido como pedófilo, porém o beneficiário da indução o é, pois satisfaz sua própria lascívia com o menor de 14 anos incorrendo no estupro de vulnerável (art. 217-A).

Posto isto, grosso modo é importante salientar que nem todos os pedófilos são criminosos sexuais contra vulneráveis, assim como nem todos os criminosos sexuais contra vulneráveis são pedófilos. A pedofilia é, portanto fenômeno que em si não implica em crime, porém exteriorizá-la, praticá-la, envolver a criança implica em crime.

Em análise ao disposto no artigo 218-A do Código Penal que tipifica a satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente verifica-se uma situação interessante, tendo em vista que, o autor deste delito não entra em contato direto com a criança, porém, sua satisfação sexual depende da presença desta; trata-se de uma espécie de voyeurismo onde o ápice da relação sexual implica no fato de saber que a criança ou o vulnerável assiste ao ato sexual praticado pelo adulto, sendo esse elemento, mais um fator que propicia prazer ao agente.

Pelo explanado até o momento, é necessária elaborar a seguinte questão, o autor deste tipo penal (art. 218-A) pode ser considerado pedófilo? Em termos genéricos não, pois, é preferível a terminologia voyeurismo invertido ao invés de pedofilia, trata-se de variante do voyeurismo onde o fator relevante para a satisfação sexual do agente está no fato de haver um menor de 14 anos assistindo ao ato libidinoso e não de ser o menor de 14 anos o foco principal da libido do autor, não participando de tais atos libidinosos.

O intuito dos artigos retro mencionados é tutelar bens jurídicos tais como a liberdade e a dignidade sexual do vulnerável. Rogério Greco (2010) adiciona ainda o desenvolvimento sexual do vulnerável como bem juridicamente tutelado pelo art. 217-A.

Assim, é possível elaborar um rol de crimes previstos no Código Penal cuja prática se dará necessariamente por um pedófilo, seja ele estruturado ou oportuno, bem como rol de crimes cuja prática não se dará sempre por um pedófilo, traçando-se um paralelo entre os dois grupos, veja-se:

Estupro de vulnerável – art. 217-A: restringindo-se o termo vulnerável ao menor de 14 anos, estamos diante de situação que exige a incidência da pedofilia para a consumação do crime, pois, conforme já foi dito o indivíduo que detém como objeto de seu desejo sexual a criança é considerado pedófilo, ainda que de maneira oportuna (conforme as chances que o decorrer da vida propicia). Um indivíduo cuja sexualidade, ao menos beira a normalidade não é capaz de praticar atos libidinoso-sexuais com crianças.

Considerando-se vulnerável em sua forma mais ampla, como por exemplo, o paciente de doença que o imobilize ou deficiente físico ou mental, por exemplo, não persiste a necessidade de se incidir a pedofilia para se ter consumado o crime de estupro de vulnerável, pois o elemento do tipo penal deixou de ser o menor de 14 anos e passou a ser qualquer pessoa incapaz de oferecer resistência, independentemente de idade.

Na indução de menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem – art. 218, trata-se de figura híbrida conforme já foi dito, onde se tem no mesmo tipo penal duas figuras distintas o indutor e o beneficiário da indução, o primeiro não se enquadra nos conceitos de pedófilo, pois não se aproveita diretamente da criança para satisfação de sua lascívia, o que ocorre com o segundo, que se beneficia da ação criminosa do primeiro para ter satisfação e prazer sexual, incorrendo na figura do estuprador de vulnerável (art. 217-A).

 Já na satisfação de lascívia mediante a presença de criança ou adolescente – art. 218-A: é sem dúvida um dos pontos mais críticos a ser estudado neste paralelo, pois, como já foi dito a presença da criança é fator que propicia prazer sexual ao agente do tipo penal, levando-se a crença de que se trata de uma forma de pedofilia, no entanto, autores como Guilherme de Souza Nucci (2012) classificam tal perversão sexual como forma invertida de voyeurismo, pois, o agente do crime quer que o menor de 14 anos atue como voyeur de ato sexual seu ou de outrem.

2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEIS

Annina Lahalle apud Cury (2003), pesquisadora francesa de alto renome, elogia a legislação brasileira no que concerne a sua inovação e profunda preocupação com as regras de proteção e de garantia dos direitos da criança, sendo a primeira legislação latino-americana a aprofunda-se tanto no tema.

No mesmo sentido, Dom Luciano Mendes apud Cury (2003), esmiúça tratar-se a referida lei de um fruto do esforço conjunto de milhares de pessoas e comunidades empenhadas na defesa e promoção das crianças e adolescentes do Brasil. […] Para resgatar diante de Deus, a dignidade do Brasil, onde milhares de menores ainda hoje são exterminados pelo descaso e pela crueldade, é preciso, (com amor, promover, desde o primeiro momento, a vida de toda criança.

Assim, referido Estatuto representa uma grande inovação legislativa, jurídica, política, administrativa e social. É uma lei de amplo espectro, destinada a instrumentar a ação de um novo salto civilizatório.

Os crimes previstos no ECA são todos relacionados à criança e à sua integral proteção; o Capitulo 1 do Título VII da lei em tela é destinado aos crimes cometidos exclusivamente contra a criança e o adolescente, boa parcela destes crimes tem conotação e condutas tipicamente pedofílicas e foram acrescentados ao Estatuto pela lei 11829 de 25 de novembro de 2008 que serão esmiuçados a seguir.

O artigo 240 traz um rol de condutas bastante amplo para caracterizar e criminalizar o envolvimento da criança ou adolescente em mídias pornográficas, seja produzindo, dirigindo, fotografando, filmando ou registrando, por qualquer meio cena de sexo explícita ou pornográfica, envolvendo a criança ou o adolescente, incorre o agente no referido tipo sujeitando-se a uma pena de quatro a oito anos sem o prejuízo de multa.

O parágrafo único do artigo em análise amplia ainda mais o rol de condutas criminalizáveis fazendo incorrer nas mesmas penas do caput quem agenciar, facilitar, recrutar, coagir, ou de qualquer outro modo intermediar a participação da criança ou do adolescente nas cenas referidas no caput e ainda quem com a criança ou o adolescente contracenar.

Aumentando-se em 1/3 a pena (parágrafo segundo) quando o agente cometer o crime no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la (inciso I) ou ainda prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade (inciso II) por conta da facilidade e da possível subjulgação do menor ao agente e por fim prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vitima ou de quem, de qualquer outro titulo, tenha autoridade sobre a vítima, mesmo com seu consentimento.

É medida punitiva em maior grau á quem por hierarquia ou por respeito familiar tem o poder de submeter a criança ou adolescente caracterizando dupla perversidade na ação do tipo e pela violação do dever legal e constitucional de prover e protegê-la criança ao invés de abusá-la seja sexual ou moralmente.

Em síntese os artigos que sucedem o ora analisado todos criminalizam ações relativas á aquisição, distribuição, compra, venda, divulgação, produção, troca, disponibilização, armazenamento, exposição, posse, etc. de material midiático, seja por fotografia, vídeos, cenas, imagens, ou qualquer outro meio que contenham crianças ou adolescentes em contexto sexual ou pornográfico. Frise-se que o mero fato de se ter imagens obtidas em grandes sites de busca como Google, por exemplo, em arquivo de computador ainda que de uso exclusivo caracteriza o crime, penalizado com reclusão de uma a quatro anos (artigo 241-B); sendo a pena prevista para o indivíduo que aufere rendimento com esse material, vendendo ou expondo de quatro a oito anos de reclusão (artigo 241).

Importante salientar que a expressão genérica “cena de sexo explícito ou pornográfica” encontra seu conceito legal no artigo 241-E, tal qual seja: “qualquer situação que envolva a criança ou o adolescente em atividades sexuais explicitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescentes para fins primordialmente sexuais”. Conceito que confere a amplitude pretendida pelo Estatuto com fim de punir qualquer conduta que envolva a criança ou o adolescente num contexto essencialmente sexual.

Ademais, incorre em pena ainda mais grave (quatro a dez anos e multa) quem submete criança ou adolescente à prostituição o a exploração sexual – artigo 244-A, caracterizando o profundo repúdio social à esta prática, merecendo maior punição àquele que explora a criança com finalidade econômica através da prostituição e ainda quem a explore sexualmente de maneira gratuita, que se pode denominar de a mais detestável e odiosa das possibilidades de exploração de uma criança ou adolescente, convertendo-se em verdadeira escravidão sexual, que conforme explicitado nos capítulos anteriores deste trabalho configura ação traumática á criança.

Trata-se de dezenas de condutas todas com características pedofílicas, no entanto, algumas condutas como a submissão da criança ou adolescente à prostituição, por exemplo, podem ser praticadas por indivíduos não pedófilos, o que permite dizer-se ser ainda mais repulsiva e imoral tal conduta, haja vista, gozar de plena normalidade e sanidade mental quem a pratica, sendo esta inescusável pelo seu caráter fútil ou torpe.

3 PROCESSO E PEDOFILIA: UMA QUESTÃO DE INIMPUTABILIDADE PENAL

A pedofilia é circunstância por demais intrigante, e, como não poderia deixar de ser cria uma série de debates entre seus estudiosos, havendo certa variação em sua conceituação. Um ponto em comum entre todos esses conceitos é a predileção sexual por crianças e/ou pré-adolescentes, porém, não há consenso sobre a subdivisão da pedofilia em heterossexual e homossexual, da delimitação de sua pratica para caracterização, etc.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) elabora de tempos em tempos uma sistematização de todas as doenças catalogadas no mundo, essa sistematização é denominada Classificação Internacional de Doenças – CID e acompanhada do algarismo referente á sua edição, assim, é vigente atualmente a décima convenção, realizada em 2006, ou seja, CID-10.

O CID-10 classifica as doenças dando-lhe códigos formados por letras e números, a pedofilia é a doença de código F65.4, inserida no rol dos Transtornos de Preferência Sexual ou Parafilias (F65) que por sua vez está agrupado entre os  Transtornos Mentais ou Comportamentais (F00-F99), e, é definida como a preferência sexual por crianças quer se trate de meninos, meninas ou de crianças de um ou do outro sexo, geralmente pré-púberes ou no início da puberdade.

Note-se que não há diferenciação entre meninos e meninas, assim, não há um pedófilo homossexual ou heterossexual, a pedofilia é condição única e caracteriza-se pela preferência por crianças, indiscriminadamente.

Partindo-se desta premissa, importante se faz compreender o impacto que isso pode causar no campo processual penal, tendo em vista o instituto da Inimputabilidade Penal e seus reflexos no julgamento do indivíduo que comete ato delituoso.

Rege o Código Penal, através de seu Titulo III denominado “Da Imputabilidade Penal” as circunstâncias e os critérios que deverão ser usadas no momento de responsabilizar o indivíduo pelos seus atos no campo processual penal. Assim, prescreve o Artigo 26 do referido Código que é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Conforme já explanado, o pedófilo (estruturado) se enquadra perfeitamente nesse contexto, haja vista, o fato de que ao manter contato sexual com uma criança este não percebe o abismo que o separa do pequeno, pois, não é capaz de compreender, tampouco medir os malefícios que com aquela prática impõe ao menor.

Trata-se de um indivíduo com sexualidade regredida que ao contrário do que muitos pensam, não está ali para se satisfazer com a criança, e sim, satisfazê-la, pelo menos de seu próprio ponto de vista distorcido.

Nas palavras de Muñoz Conde apud Bitencourt (2010) quem carece de capacidade, por não ter maturidade suficiente, ou por sofrer de graves alterações psíquicas, não pode ser declarado culpado, e, por conseguinte, não pode ser responsável penalmente pelos seus atos, por mais que sejam típicos e antijurídicos.

Este é sem dúvida o ponto crucial da diferenciação necessária entre o pedófilo denominado estruturado e o pedófilo oportuno, pois, ao primeiro há de se aplicar a medida de segurança e ao segundo a reclusão em obediência ao artigo 96 e seguintes do Código Penal.              Ao inimputável deverá aplicar-se medida de segurança, isto é, uma "providência substitutiva ou complementar da pena, sem caráter expiatório ou aflitivo, mas de índole assistencial, preventiva e recuperatória, e que representa certas restrições pessoais e patrimoniais (internação em manicômio, em colônia agrícola, liberdade vigiada, interdições e confiscos), fundada na periculosidade, e não na responsabilidade do criminoso”.

Em se tratando de pedófilos, vê-se perfeitamente preenchidos os requisitos legais para a aplicação da medida de segurança, que conforme leciona Cézar Roberto Bitencourt (2010) são: a) a prática de fato típico punível: a ação pedofilica é tipificada no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente em inúmeros artigos. b) periculosidade do agente: é visível a periculosidade do agente pedófilo, que se materializa no risco de subjugar novas crianças à atos libidinosos e sexuais. c) ausência de imputabilidade plena: por ser a pedofilia considerada pela OMS como transtorno mental, verifica-se a plena imputabilidade do pedófilo.  

Desta feita, conforme já abordado, a medida de segurança é apropriada levando-se em consideração o fato de a pedofilia ter pouquíssimos casos de recuperação plena, logo, como já menciona o Código Penal no parágrafo primeiro de seu artigo 97, a medida de segurança será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação de periculosidade; enquanto que a reclusão manterá o indivíduo pelo tempo de sua pena afastado da sociedade, no entanto, após cumpri-la certamente voltará a delinquir.

A história está repleta de indivíduos abusadores que ao retomar o convívio em sociedade retomaram a vida criminosa, abusando cada vez mais de crianças, pois, é a pedofilia transtorno mental; não competindo à cadeia recuperar um indivíduo que desse transtorno padece, ainda mais quando falamos em Sistema Penitenciário Brasileiro, cujas impotências e falhas são de conhecimento público, não necessitando sequer de escusas ao classificá-lo nesse trabalho como falho e inadequado á qualquer ser humano, por maiores e horrendos crimes que tenha cometido, quiçá de um detento tão especial como o pedófilo.

4 A CASTRAÇÃO QUÍMICA COMO PENA ALTERNATIVA

Inúmeros estudiosos, médicos, psicólogos e teóricos se ocupam em identificar uma possível cura para a, até agora, considerada incurável pedofilia. Como já explanado, não se têm registros de cura plena do indivíduo pedófilo, mas sim, tratamentos psíquicos e psiquiátricos que têm como intuito ampliar a capacidade de autocontrole do pedófilo.

No entanto, muito recentemente vem sendo aprimorada a técnica da castração química, que já é utilizada em boa parte dos Estados Unidos e Europa. Tal medida consiste no uso de doses regulares de medicamentos, cuja função é diminuir a intensidade da libido do pedófilo com o fim de prevenir a prática de atos libidinosos ou sexuais com crianças e adolescentes.

Em síntese, submete-se o pedófilo aos medicamentos que inibem ou diminuem seus impulsos sexuais com a diminuição por efeito da produção da testosterona, hormônio masculino responsável pelo desejo sexual. Tais doses medicamentosas são à base de progesterona, hormônios femininos que inoculados no homem reduzem significativamente o apetite sexual, frise-se que não há registros desse tipo de tratamento em mulheres pedófilas, que apesar de serem suma minoria no universo de pedófilos também causam problemas sociais.

Existe (como não poderia deixar de ser) a possibilidade de surgirem inúmeros efeitos colaterais nessa prática, tais como a ginecomastia, que é o crescimento de mamas nos homens por conta de alterações hormonais, depressão, diabetes, excessiva fadiga, alterações na coagulação do sangue, dentre outras.

No entanto, a maioria dos estudiosos da área defende a castração química como medida curativa da pedofilia, levando em consideração o grande benefício que a pratica traria á sociedade, justificando-se os sofrimentos dispensados ao paciente pedófilo.

Nesse sentido, Trindade & Breier (2007) apontam que mais de 90% (noventa por cento) dos indivíduos pedófilos submetidos á medida da castração química obtiveram significativa melhora, em compensação, cessando-se as medicações, o índice de recaídas foi definido pelos ilustres autores como alto. Já as medidas psicossociais de tratamento e controle, resultam numa melhora de apenas 50% (cinquenta por cento), enquanto o índice de recaída é definido como baixo a moderado.

É necessária, portanto, profunda reflexão sobre medidas curativas ou de controle da pedofilia, tendo em vista a grande relevância social que emana do tema e com o fim de afastar qualquer tipo de injustiça, condenando-se os que devem ser condenados e tratando-se os que devem ser tratados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo exposto questiona-se se é a cadeia o melhor remédio para esse tipo de indivíduo e atreve-se a concluir que não. O indivíduo recluso, não terá jamais sucesso na “cura” para sua sina pedofílica, afinal, falamos de um ser humano com um desenvolvimento incompleto de sua sexualidade e de fato os demais criminosos reclusos no cárcere não são os mais indicados para proporcionar um tratamento psicológico eficaz a esse indivíduo. Note-se que não se quer aqui adentrar na qualidade do sistema carcerário brasileiro, mas como é de conhecimento público suas falhas é possível afirmar que definitivamente, um indivíduo que seja condenado por ser pedófilo (estruturado) sairá após cumprir sua pena carregando outros adjetivos, ladrão, assassino, estuprador talvez.

Defende-se por fim, a aplicação de medida de segurança, para o indivíduo diagnosticado com o Transtorno de Preferência Sexual, ou pedófilo oportuno, reconhecido pela Organização Mundial de Saúde como padecente de transtorno mental grave, assim, é preferível ter um indivíduo como esse em perpétuo tratamento psicológico, que preso e livre novamente com novos conhecimentos sobre crimes e com ainda viva necessidade de se relacionar com crianças.

A medida de castração química parece ter sua eficácia comprovada, no entanto, há muitos empecilhos e a sociedade brasileira não parece preparada para esse tipo de pena. Direitos humanos certamente são violados, mas cabe ao princípio da proporcionalidade identificar até que ponto esses direitos podem ser violados e favor dos direitos difusos e coletivos em se ter tranquilidade e paz social bem como os direitos da criança, que por sua situação peculiar merece maior atenção dos entes estatais e judiciários.

No que toque ao pedófilo oportuno, apesar de serem possíveis diversos questionamentos, entende-se ser esse indivíduo punível pela reclusão, pois, como bem foi demonstrado não se verifica nele a necessidade ou a incapacidade de se manter uma relação sexual-afetiva com um indivíduo adulto. Assim, não se justifica a aplicação da medida de segurança.

Quanto à criança abusada, pode-se dizer que merece toda atenção e acompanhamento possíveis, pois, como bem salienta em várias ocasiões o Estatuto da Criança e do Adolescente, é um indivíduo em pleno desenvolvimento físico e mental, é vítima absoluta das taras do adulto e as consequências de tal abuso se não sanadas de início poderão se perpetuar por toda a vida, trazendo transtornos á vítima e aos que a rodeiam consequentemente.

 

Referências
BITENCOURT, Cézar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva 2010.
BRASIL, Constituição Federal da República Federativa do. 1988.
BRASIL, Lei 8069 de 13 de Julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
CROCE, Delton; CROCE JR. Delton. Manual de medicina legal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. São Paulo, Malheiros, 2005.
DEL-CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara. Medicina Legal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. – (Coleção curso & concurso/coordenação Edilson Moungenot Bonfim).
GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 4. ed. Niterói: Impetus, 2010.
MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. V. 2. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
TRINDADE, Jorge; BREIER, Ricardo. Pedofilia: aspectos psicológicos e penais. Livraria do Advogado. Porto Alegre, 2007.

Informações Sobre os Autores

Antonio Henrique Maia Lima

Advogado mestrando em Desenvolvimento Local 2013-2014 pela Universidade Católica Dom Bosco UCDB sendo bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES. Possui pós-graduação latu sensu em Psicologia Jurídica 2013 pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci UNIASSELVI e é graduado em Ciências Jurídicas 2012 pela Universidade Católica Dom Bosco tendo participado do Programa de Iniciação Cientifica PIBIC nas áreas de Direitos Humanos e Sociologia Urbana como bolsista pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2011-2012. Atuou como Auxiliar de Pesquisa no Centro de Referência Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes CECRIA e no Comitê Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual Cometida Contra Crianças e Adolescentes

Mauricio Serpa França

Acadêmico do curso de Direito pela Universidade Católica Dom Bosco bolsista de Iniciação Científica pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq e membro do grupo de pesquisa “Análise histórica de processos trabalhistas do Tribunal Regional do Trabalho 24 Região – MS 1962 – 1984” da Universidade Católica Dom Bosco


Equipe Âmbito Jurídico

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