“A responsabilidade estatal é simples corolário da submissão do Poder Público ao Direito.” Celso Antônio Bandeira e Mello
No século XVII inúmeros pensadores consideravam que o homem era um ser livre por natureza, que independente da vontade humana a liberdade era algo inerente a sua essência.
Com o desenvolvimento da vida social percebeu-se que a liberdade plena não era mais compatível. Reconheceu-se que a sociedade é o modo natural do ser humano viver, já que ao contrário de outras espécies, ele não se realiza solitariamente, apenas cumprindo e alcançando suas finalidades quando junto de outros homens.[1] Dessa forma, apesar de possuir um valor absoluto, necessitaria viver em sociedade para conservar sua vida, sua liberdade e seus bens.
Exige-se, então, uma organização da liberdade dos indivíduos em interação recíproca, de maneira que todos permanecessem livres ao máximo conciliável com a vida em sociedade. À medida que desfrutava da vida em comum, o homem deveria consentir em determinadas limitações e restrições.
Todavia, como se sabe, o poder irresponsável sempre se utilizou do temeroso princípio de que os fins justificam os meios, e a manipulação dos povos através da força ou da política populista interpôs-se por toda a história da humanidade.[2] As instituições sociais e políticas oprimiam o homem atuando de maneira destoante e intolerável, funcionando o Estado como um inimigo da liberdade.
Sob esta ótica percebe-se a necessidade de uma nova estruturação da sociedade, das instituições e do Estado, propondo-se a limitação e a divisão dos poderes.
Ao Direito é conferido, pelo liberalismo, a instituição, organização e limitação do Poder buscando-se assegurar fundamentalmente a liberdade e os direitos do homem. Ou seja, pretende-se a garantia dos direitos fundamentais, não sob o aspecto da positivação ou efetivação, mas sim da proteção. O Estado submete-se ao império do Direito e utiliza a fórmula, ainda no século XVIII, do Estado de Direito.[3] Esse conceito permeia todo o Direito Público, porque a base é um Estado que cria o Direito e é submetido ao mesmo em razão da garantia dos indivíduos.[4]
A partir da nova doutrina, surge a tendência dos textos constitucionais carregarem um preceito normativo genérico, estabelecendo a responsabilidade do Estado por danos causados aos particulares.[5] A limitação do poder pelas regras jurídicas tornou-se, então, o primeiro princípio fundamental contido na Constituição da República de 1988, quando é eleito o modelo do Estado de Direito, no qual o poder é definido e organizado na Constituição.[6]
O Direito seria, nesse aspecto, uma limitação natural, que tem sua existência justificada por “uma sociedade em que o indivíduo é o elemento de valorização e de medida geral para a validade e certeza de todas as diretrizes e dinâmica institucional”.[7] Abandona a função de realização do Poder e passa a ser instrumento de efetivação da justiça a serviço do indivíduo.[8]
A partir daí, o Estado detém exclusivamente os poderes estabelecidos, devendo se conformar à execução do que a lei prescreve, não estando acima da juridicidade.[9] A lei maior torna-se condicionante da validade de todos os atos praticados pelos órgãos estatais.
A Constituição institui e reconhece os poderes existentes no Estado, os chamados poderes constituídos – que devem manifestar-se através do exercício, se fazendo valer nos casos concretos, sendo um meio e não um fim em si mesmo -, e apresenta-se como instrumento de que se vale o Estado para atingir sua verdadeira finalidade.[10]
Fundado e organizado em normas jurídicas, o Estado de Direito estrutura-se em órgãos criadores, executores e aplicadores do direito e cujas esferas de ação são preestabelecidas. Os funcionários da Administração ou do Governo, aos quais são delegadas atribuições ou poderes para agiro delegadas atribuiç quais s95), na qualidade de representantes da vontade estatal, têm credibilidade oficial, sem consideração pessoal. Atuam em nome do Poder Público, suas individualidades são afastadas nos atos que praticam e ocasionalmente acarretam danos a terceiros.[11]
Não é necessário que se analise o comportamento culposo do funcionário. Carlos Roberto Gonçalves reforça a idéia afirmando que “basta que haja o dano, causado por agente do serviço público agindo nessa qualidade, para que decorra o dever do Estado de indenizar”.[12] Nesse sentido o Poder Público, dando causa a prejuízos aos indivíduos ou a outras entidades públicas quando da realização de seus atos, assume a responsabilidade de recompor os agravos cometidos.
Considere-se que autores como José Afonso da Silva entendem estar a sociedade no quadro atual do chamado Estado Democrático de Direito. Essa configuração é importante à medida que não revela apenas uma união formal entre os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito, mas sim uma nova idéia “que leva em conta os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em que incorpora um componente revolucionário de transformação do status quo”.[13]
As atuações são submetidas à lei. O princípio da legalidade é basilar, a idéia central é a subordinação à Constituição e o fundamento é a legalidade Democrática. Traduzindo-se como a expressão da vontade coletiva, a lei incide de tal maneira que “supere as desigualdades sociais e regionais e instaure um regime democrático que realize a justiça social”.[14]
Ao contrário dos regimes absolutos, no estágio de submissão do Poder Público ao Direito, a liberdade estatal é exercida nos limites e parâmetros traçados, restando a sujeição à ordenação jurídica. Assim como no Direito Privado, em que existe a necessidade de reparação pelo autor do dano; incorrendo o Estado em atos danosos a terceiros, fica este também sujeito a obrigação legal do ressarcimento.[15]
Isto porque, é óbvio que no desenvolvimento das variadas atividades que lhe são próprias, os atos estatais rendem danos mais intensos que os gerados pelos particulares, já que os deveres públicos o colocam permanentemente na posição de obrigado a múltiplas prestações ou porque seu constante contato com os administrados lhe possibilita dar origem a prejuízos em escala macroscópica.[16] Passando de ente político a produtor, a comerciante e a prestador de serviços, têm iluminada a extensão da responsabilidade que lhe cabe, na medida em que ocasiona prejuízos a pessoas ou bens que se encontram em seu território. “Com o alargamento da esfera de atuação […], vem o Estado sofrendo o influxo, no plano jurídico, dos mecanismos de defesa de interesses particulares que o Direito tem engendrado”.[17]
É o princípio da legalidade, basilar do direito, a que se subordinam as atuações do Estado e faz manifestar a obrigatoriedade de reparação do prejuízo.[18]
Como afirma Carmen Lúcia Antunes Rocha, em seus valiosos e conclusivos dizeres, é afinal, com a submissão do Estado à legalidade e ao Direito, que o indivíduo encontra a possibilidade de fazer cessar o conflito entre seus interesses e a tutela dos interesses coletivos, sem que com isto, restem prejudicados os objetivos públicos.[19]
Advogada. Especialista em Direito Administrativo
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