Resumo: O presente artigo tem por objetivo abordar a Proposta de Emenda Constitucional nº 287/2016 com foco nas alterações relacionadas, em especial, às professoras. Será demonstrado que o exercício da docência é uma profissão de risco, o qual poderá desenvolver doenças tanto psíquicas como físicas. Nesse panorama, será ressaltado que a PEC nº 287 representa um retrocesso na conquista de direitos do gênero feminino ao igualar a idade de homens e mulheres para se aposentar. Tal alteração prejudica significativamente as professoras que terão que lecionar quase o dobro do tempo que teria pelas regras atuais para alcançar a integralidade do benefício previdenciário.
Palavras-chave: Reforma Previdenciária. Retrocesso. Restrição de direitos
Abstract: This Article aims to address the Proposal for Constitutional Amendment nº. 287/2016 focusing on changes related, in particular, to teachers. It will be demonstrated that teaching is a profession of risk, which can develop both psychic and physical illnesses. In this scenario, it will be emphasized that PEC nº. 287 represents a setback in the conquest of women's rights by matching the age of men and women to retire. Such a change significantly impairs teachers who will have to teach almost twice as much time as they would have under current rules to achieve full social security benefits.
Keywords: Social Security Reform. Retrogression. Restriction of rights.
Sumário: 1. Introdução. 2. A Previdência é Deficitária ou Superavitária ?. 3. A Proposta da Emenda Constitucional Nº 287/2016 em Relação aos Docentes. 4. As doenças ocupacionais que podem ser desenvolvidas com o Exercício da Docência.5 Considerações Finais. Referências
1.INTRODUÇÃO
O governo tem difundido a ideia que há um déficit na Previdência, e por isso, deve-se fazer a reforma urgentemente para equilibrar as contas. Alega que nas gerações futuras a quantidade de segurados aposentados estará superior que os segurados em atividade, causando um colapso.
Em contrapartida, representantes de entidades e classes nacionais apresentam discurso contrário, argumentam que a previdência apresenta superávit de arrecadação.
Nessa linha de raciocínio, o argumento contrário à reforma se baseia na forma de custeio da Seguridade Social prevista na Constituição Federal, qual seja o sistema tripartite (governo, empregado e empregador).
Com efeito, a Seguridade Social compreende a Saúde, Previdência e Assistência Social, conforme o que dispõe a Carta Magna. No entanto, o sistema econômico entende que a Previdência deve se manter pelos seus próprios recursos como conceitua o sistema bipartite (Empregado e Empregador).
Nesse sentido, será relatado neste artigo que Receitas como contribuição para financiamento da Seguridade Social (COFINS) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) destinadas a pela Carta Magna para custear a Seguridade Social são desviadas pela área econômica para pagamento da dívida pública [1].
Deste modo, o Governo além de desviar as receitas destinadas ao custeio da Seguridade Social para pagamentos diversos, difunde na mídia de forma geral o discurso que a Previdência necessita de reforma [2].
Dentre alterações sugeridas pela PEC nº 287, está a idade de sessenta e cinco anos tanto para os homens quanto para as mulheres para se aposentar, o qual aumenta significativamente para as professoras se aposentarem com integralidade do benefício.
Deste modo, será demonstrado que o exercício da docência é uma profissão de risco e poderá desenvolver doenças ocupacionais tanto psíquicas como físicas e que a desconsideração das peculiaridades desta profissão por parte do governo poderá comprometer o sistema educacional como um todo.
1. A PREVIDÊNCIA É DEFICITÁRIA OU SUPERAVITÁRIA ?
O presidente da República enviou a Proposta da Emenda Constitucional nº. 287 ao Congresso Nacional argumentando ser imprescindível a reforma diante do déficit existente na Previdência.
Assim, as justificativas da famigerada reforma vão de encontro com a Constituição Federal porque o governo difunde a informação que a Previdência deve se manter pelos seus próprios recursos, qual sejam contraprestação do Empregado e Empregador.
Conforme o art. 194 da Constituição Federal, a Seguridade Social compreende a Saúde, Assistência Social e a Previdência. Sendo assim, Previdência faz parte da Seguridade Social, e por isso, deve ser também beneficiada pelas receitas adquiridas como a Saúde e a Assistência Social.
Ainda, o artigo 195 da Constituição Federal determina que toda a sociedade deve contribuir de forma direta e indireta num modelo tripartite: trabalhadores, empresários e governo.
Em conformidade com o dispositivo legal acima citado, o Empregador contribui com percentual sobre a folha de salários, a receita ou faturamento e o lucro; o Empregado sobre seus rendimentos e o governo por meio de receitas de concursos de prognósticos e do importador de bens ou serviços do exterior.
Conforme Eduardo Fagnani [3] a parcela que cabe ao governo tem como fonte de custeio a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), permitindo a consolidação da receita.
No entanto, o governo argumenta que a única receita destinada à Previdência é apenas a contribuição ao INSS dos trabalhadores e as receitas próprias da Seguridade Social como COFINS, CSLL e concursos prognósticos são transferência da União.
Apesar do modelo tripartite de financiamento da Seguridade Social instituído pela Constituição de 1988, o Ministério da Previdência e Assistência social (MPAs) desconsidera a parcela do governo.
Ensina Fagnani que desde o 1989, os presidentes não cumprem o que determinam os artigos 194 e 195 da Constituição Federal, uma vez que apropriam das fontes de financiamento da Seguridade Social e continuam a contabilizar apenas as contribuições dos empresários e trabalhadores como fontes de financiamento da Previdência social [4].
Segundo Fagnani, a área econômica do governo além de desconsiderar sua contraprestação, desviou as receitas destinadas pela Constituição Federal à Seguridade Social (Previdência, Saúde e Assistência Social) para o pagamento de juros, despesas financeiras, desonerações aos empresários e para a concessão de subsídios àqueles que não precisam [5].
Conforme o Boletim nº. 37/2015 do Senado Federal “o principal argumento para negar o déficit é que deveriam ser vinculadas e contabilizadas como receita do INSS a arrecadação da (Cofins) e (CSLL), usadas hoje para cobrir o déficit. Assim, a alegação é que esses tributos, que somaram R$ 160 bilhões até julho, deveriam pertencer à Previdência porque são contribuições constitucionalmente destinadas à Seguridade Social, mas foram desviados por conta da Desvinculação das Receitas da União” (DRU[6].
Nessa linha de raciocínio, as receitas constitucionalmente reservadas para a Seguridade Social foram subtraídas com a ampliação da Desvinculação de Receitas da União (DRU), de 20% para 30%.
Conforme o Senado Federal, Desvinculação de Receitas da União é “ um mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. A principal fonte de recursos da DRU são as contribuições sociais, que respondem a cerca de 90% do montante desvinculado”. Na prática, permite que o governo aplique os recursos destinados a áreas como educação, saúde e previdência social em qualquer despesa considerada prioritária e na formação de superávit primário. A DRU também possibilita o manejo de recursos para o pagamento de juros da dívida pública”[7]
Com efeito, o art. 68, parágrafo 1° da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), aborda a constituição do Fundo do Regime Geral de Previdência Social. Gentil acrescenta que: “ao criar um fundo exclusivo para a previdência, a LRF desconstitui o conceito de seguridade, tal como formulado na Constituição. Esse foi o passo necessário para o segundo equívoco: considerar os recursos da COFINS, CSLL e CPMF como externos ao orçamento da previdência e, portanto, passíveis de serem rotulados como transferências da União.” [8]
O artigo 195 da Constituição Federal determina que a Seguridade Social será financiada mediante recursos provenientes do orçamento da União, além das contribuições sociais anteriormente citadas. Sendo assim, o governo deve participar com recursos do Orçamento Fiscal para atender as Necessidades da Seguridade Social e não o contrário.[9]
Conforme Lemos, o governo fabrica o falso déficit da Previdência omitindo e não considerando receitas de contribuições sociais, que financiam o Sistema de Seguridade Social e se fizesse a conta completa e correta haveria um Superávit da Seguridade Social (receitas maiores que despesas) de R$ 24 bilhões em 2015 .[10]
Sendo a Previdência parte da Seguridade social e se o orçamento da Seguridade Social é superavitário, não há que se falar em déficit na Previdência, ainda, não se pode prosperar as argumentações do Governo em realizar reformas extremamente prejudiciais aos segurados, uma vez que contrariamente ao que determina a Constituição Federal desvia recursos das demandas sociais para outros fins, como por exemplos pagamento da dívida pública.
2. A PROPOSTA DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 287/2016 EM RELAÇÃO AOS DOCENTES
Em 05 de dezembro de 2016, o governo apresentou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda constitucional (PEC) nº. 287/2016 que prevê entre outras alterações o aumento da idade mínima da aposentadoria para 65 anos de idade tanto para os homens quanto para as mulheres atrelada exigência de 49 anos de contribuição para obtenção de aposentadoria integral e excluiu a distinção nas regras de Previdência Geral e Previdência dos Regimes Próprios.
A famigerada proposta representa, dentre outros, um retrocesso na conquista dos direitos das mulheres, ao igualar tempo de contribuição e idade para aquisição da aposentadoria aos homens.
Conforme a lei 8213/91, as mulheres podem se aposentar cinco anos a menos do que os homens, tanto na aposentadoria por idade quanto por tempo de contribuição. Tal benesse deve-se ao fato do gênero feminino enfrentar condições desfavoráveis no mercado de trabalho, realizar dupla ou até tripla jornada, tendo em vista a quantidade de horas por semana dedicadas por elas aos afazeres domésticos e ao cuidado com os filhos. [11]
Conforme os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de domicílios (Pnad) do IBgE de 2014, as mulheres declararam trabalhar cerca de 24 horas por semana em afazeres domésticos, enquanto homens dedicaram 10,5 horas por semana ao mesmo tipo de tarefa. [12]
Nesse contexto, prevalece o número de mulheres dentre os docentes de Ensino Fundamental, o que “ indica que as questões de gênero não podem ser desconsideradas ao se pensar em ações fonoaudiológicas de promoção da saúde vocal e geral de professoras que levem em conta a qualidade de vida, uma vez que elas estão mais expostas às responsabilidades e cargas de trabalho decorrentes do acúmulo de papéis sociais nos ambientes de trabalho e familiar [13].
A redução de cinco anos do período contributivo para se aposentar destinado aos docentes prevista na PEC nº 287se torna fictícia em virtude da obrigatoriedade de contribuir por 45 anos para conquistar o salário integral. Tal alteração não considera que as peculiaridades do exercício da docência podem desenvolver diversas doenças laborais. Neste contexto, a condição da professora agrava mais ainda.
3. AS DOENÇAS OCUPACIONAIS QUE PODEM SER DESENVOLVIDAS COM O EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA
Conforme Costa o dia-a-dia do professor e as condições de trabalho têm sido os causadores de afastamento da sala de aula. Assim, o ritmo intenso de trabalho, jornadas de quarenta ou mais horas semanais, a tensão do ambiente escolar, o acúmulo de atividades do professor bem como a indisciplina e dificuldade de aprendizagem dos alunos têm sido apontados como uma das fontes geradoras de doenças para os docentes. [14]
“Segundo dados da APEOESP (2006), no Brasil observam-se um grande número de professores readaptados (afastados temporária ou permanentemente para as atividades administrativas), sendo afetados por uma ou algumas doenças da área da psiquiatria, neurologia, otorrinolaringologia, reumatologia ou mesmo professores que se mantém em sucessivas licenças de saúde por razões diversas.
Estes afastamentos dos docentes de suas atividades podem ser associados às condições das quais se submetem (muito tempo em pé, ou em assentos nada ergonômicos, número de alunos excessivos em sala, jornada de trabalho excessiva, baixos salários dentre outros).
No Brasil, as jornadas de trabalho situam-se em torno de 40hs semanais, sendo raros os casos em que parte deste tempo (em geral 10% ou 20%) é dedicada ao trabalho extraclasse. Com isso muitas destas atividades inerentes ao ensino são realizadas no período extraclasse pelos docentes em casa em seu horário de descanso. A sobrecarga de horas extraordinárias e pouco remuneradas tem efeitos particularmente nocivos sobre as condições de trabalho e de saúde dos educadores, uma vez que torna mais acentuadas as condições já estressantes do trabalho realizado em condições satisfatórias normais. [15]
Costa acrescenta ainda que: “Tradicionalmente, a docência não tem sido uma profissão considerada de risco direto para a saúde, por não estar exposta a riscos óbvios. Mas a partir da década de 90 no Brasil, cresceu o número de investigações acerca do processo saúde-doença dos professores. Estas investigações têm dado visibilidade aos processos de adoecimento ocorridos e sustentado a necessidade de intervenções nas condições de trabalho dos professores. Os estudos sobre condições de trabalho demonstram uma crescente precarização e deterioração das condições laborais dos docentes, desvalorização do trabalho, baixos salários, múltiplos empregos, formação deficiente, postura corporal inadequada, exposição ao pó de giz, ruídos, infraestrutura precária e carência de recursos materiais e humanos que têm acentuado a sobrecarga de trabalhos destes profissionais”. [16]
A Fundação Jorge Duprat e Figueiredo (Fundacentro) juntamente com as confederações sindicais de professores do setor público e do setor privado realizou pesquisa e em uma das entrevistas, a professora de uma escola estadual de São Paulo relatou (COSTA apud LEITE; SOUZA, 2007):“eu trabalho só no Estado. Já trabalhei em escola particular e no Estado e no município e no Estado. Agora estou com dois cargos no Estado, não com carga horária integral em cada um porque não aguento. Mas tem professores que dão até 64 aulas semanais.” Outros dois professores mencionaram os dilemas em escolas privadas de SP: “tenho 50 alunos na sala de aula. Para mim, é normal ter 50 alunos na rede estadual, mas não na particular” e “é uma jornada estafante demais. São 20 turmas por semana em escola pública” [17]
A respeito da relação “trabalho/professor”, Goulart ensina: “O trabalho é um dos meios pelos quais construímos nossa subjetividade, nos tornamos sujeitos. Isto porque o homem se objetiva através do trabalho; porque o trabalho é a oportunidade que ele tem de "ver-se" nos seus iguais, de perceber que partilham todos do mesmo destino social. Isto ocorre porque o trabalho é (ou deve ser) o resultado de uma escolha sua. O fato de o trabalho constituir uma escolha torna-se muito importante quando se trata de ser professor, porque se trata de uma profissão que, diferentemente de outras, não se encerra na jornada de 6 ou 8 horas, mas está associada a uma série de valores, atitudes, crenças e comportamentos dos quais às vezes nem temos consciência, mas que estão presentes em nossa vida 24 horas por dia.” [18]
Nesse sentido, o exercício da docência por si só tende a desenvolver doenças ocupacionais, vez que exige a realização de movimentos repetitivos (movimento de escrever e apagar a lousa e preencher diários); problemas circulatórios devido ficar muito tempo em pé; doenças respiratórias e alérgicas por causa da exposição do pó de giz ; nódulos nas cordas vocais por usar a voz para ministrar as aulas, agravando quando excede o número de alunos por sala; submissão dentre outras situações [19].
Cabe ressaltar ainda, que a atividade do professor está intrinsecamente ligada à voz, que é por ela que o aprendizado acontece, falando por 40 horas semanais ou mais que o docente vai ficando sem seu bem precioso. Assim, nódulo ou calo nas cordas vocais representa um dos problemas mais recorrentes por essa classe de trabalhadores.
“Na profissão docente, a voz é fator relevante para o desempenho profissional e a atuação do professor em sala de aula, especialmente enquanto componente constitutivo da identidade do professor como trabalhador, do impacto do docente sobre o discente e componente do processo ensino-aprendizagem..
[…]
A relação entre o aumento do tempo de magistério e piores escores do QVV mostra que, com o passar dos anos de profissão, aumentam-se as chances de que os docentes venham a ter problemas com o uso da voz e comprometimento da sua saúde vocal e geral [20]
Conforme Costa, estudos realizados em todo mundo demonstram que o exercício da docência pode provocar esgotamento físico e mental, considerando as dificuldades materiais e psicológicas, profissionais associadas ao exercício da docência. [21]
Conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a profissão docente é hoje considerada como uma das mais estressantes, uma profissão de risco [22]
“Para Zille (2005) o estresse contribui de forma significativa para a produtividade diminuir e relaciona essa questão à dificuldade de concentração, decisão e esquecimento, podendo alcançar inclusive estafa (esgotamento físico-mental). Codo e Vasques-Menezes (1999) caracterizam o burnout como uma síndrome que manifesta em trabalhadores, sendo a classe dos professores uma das que pertence ao grupo de risco, e essa síndrome apresenta alguns sintomas como a perda do sentido da sua relação com o trabalho. Nada mais passa a ser importante e o esforço passa a ser inútil. [23] .
A prática da docência em uma carga horária de quarenta horas semanais no lapso temporal extenso, levando em consideração toda a peculiaridade da profissão pode acarretar um mal-estar, que por sua vez se transformar em estresse e esgotamento mental e, consequentemente, desencadear a Síndrome de Burnout (SB).
“(SB) pode ser compreendida como uma reação ao estresse excessivo e crônico relacionado ao trabalho (BARBOSA et al, 2016. p.01).
Maslach (2005) define burnout como uma síndrome psicológica que apresenta exaustão avassaladora, sensações de ceticismo e desligamento do trabalho, além de sensações de ineficácia e falta de realização. Codo e Vasques-Menezes (1999) chamam a atenção para que o burnout não seja confundido com estresse, sendo o burnout uma resposta ao estresse laboral crônico.[24]
Burnout, portanto, é o sofrimento do profissional diante do dilema entre o que pode realmente fazer e o que efetivamente consegue fazer. Neste dilema encontra-se a raiz de suas angústias e de sua dor. O professor adoece e pode até desistir da profissão.” [25]
Segundo Reinhold , Sindrome de Burnout é “um tipo especial de stress ocupacional que se caracteriza por profundo sentimento de frustração e exaustão em relação ao trabalho desempenhado, sentimento que aos poucos pode estender-se a todas as áreas da vida de uma pessoa”. [26]
Com efeito, os docentes são os profissionais que trabalham diretamente com seres humanos, na sua maioria em desenvolvimento, e têm na atualidade que promover o processo ensino aprendizagem não só em assuntos cognitivos, mas também em aspectos morais e sociais, Carlotto ensina que “a severidade de burnout entre profissionais de ensino já é, atualmente, superior à dos profissionais de saúde, o que coloca o Magistério como uma das profissões de alto risco".[27]
5. A PEC nº 287 e o possível impacto social
Segundo Camana, a doença do professor, não se refere a uma questão individual e sim social, vez que pode afetar um grande número de alunos com a diminuição da qualidade pedagógica. [28]
“Analisando a importância e a contribuição do educador para colocar em prática o que ditam as leis, fica claro o quanto se perde com o adoecimento dessa /classe. A consequência do adoecer acaba afetando diretamente a qualidade do exercício das funções e o papel desempenhado pelos professores é realmente insubstituível em qualquer sociedade. Diariamente se ouve nos noticiários ou se lê em jornais e revistas comentários sobre as condições e riscos aos quais os professores estão expostos, principalmente nas escolas públicas. Dados da Secretaria Estadual de Educação apontam que 217 professores foram agredidos fisicamente no interior das escolas públicas do Estado de São Paulo em 2006. Levando-se em conta que o ano letivo no Estado é de 200 dias, na média, mais de um professor sofre algum tipo de agressão diariamente. Cabe acrescentar que esses dados não são muito diferentes daqueles registrados em outros estados brasileiros. [29]
Assim, estando o docente doente poderá desenvolver condutas negativas como fazer críticas em relação aos alunos, prevalecendo o cinismo ou dissimulação afetiva, e ainda, atribuir o fracasso do trabalho apenas aos alunos. [30]
“O professor é um elemento de fundamental importância para o bom funcionamento da escola, para tanto se torna necessário que o mesmo esteja com sua saúde em perfeitas condições para que possa contribuir no processo de ensino-aprendizagem, e também possa colaborar no processo de construção de uma melhor qualidade de vida para si e as pessoas com as quais o mesmo se relaciona”. [31]
Assim, o artigo. 205 da Constituição Federal de 1988 dispõe que: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
Conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n º 9.394/96, em seu Art. 22 : “A educação básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.”
Sendo o professor a mola impulsionadora direta da educação, faz se necessário um olhar de mais cuidado a este profissional, uma vez que conforme a carta Magna é dever de todos promover e incentivar a educação. Estando o docente doente devido as agruras de sua profissão não conseguirá cumprir o que dispõe os artigos acima citados.
Conforme o art.56 da lei Nº 8.213/91, o professor da educação básica (infantil, fundamental e médio) se aposenta com proventos integrais aos 30 (trinta) anos de efetivo exercício em funções de magistério se professor, e 25 (vinte e cinco) se professora, com proventos integrais;
Apesar da Proposta de Emenda Constitucional nº 287/2016 haver a previsão de redução de cinco anos ao professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil, no ensino fundamental e médio, não estabeleceu que se seriam com proventos integrais.
Nesse panorama, as professoras serão as mais prejudicadas porque será aumentado mais de dez anos para se aposentar com pouco mais de 50% dos seus rendimentos, porque se quiserem receber integralmente, terão então que lecionar por mais dez anos, totalizando vinte anos a mais que as regras atuais preveem.
Com menos de vinte e cinco anos de docência professores adquirem doenças laborais tanto psíquicas como físicas, como será o quadro clinico desses profissionais se tiverem que lecionar por quarenta e cinco anos de contribuição para receber uma aposentadoria integral?
Assim, com a carência exigida de vinte e cinco anos de contribuição para os docentes se aposentarem pela legislação atual, tem se um número considerado de licenças e professores readaptados, o período sugerido pela proposta se torna desumano.
As mulheres conquistaram ao longo de décadas o direito de serem tratadas com privilégio em relação aos homens, para que assim, ocorresse a isonomia. Sendo o gênero feminino o que têm tripla, as vezes quadrupla jornada será muito prejudicado com a igualdade de idade para se aposentar em relação aos homens. [32]
Nesse sentido, o período de transição apenas ameniza o impacto da reforma as que tiverem idade acima de quarenta e cinco anos de idade, que terão que contribuir mais 50% do tempo que faltaria para se aposentar levando em consideração a PEC 287/2016.
Com relação às professoras com idade inferior a quarenta e cinco anos de idade, se aprovada a famigerada reforma previdenciária, diante das doenças desencadeadas pelo exercício da docência, a maioria viverá em constantes licenças de saúde, pedidos de reabilitação e aposentadoria por invalidez.
Com efeito, para um docente laborar em efetivo exercício de magistério pelo período de vinte cinco anos, as condições de trabalho deveriam ser melhoradas como por exemplo a quantidade mínima de alunos por sala ser obedecida, extinção do quadro a giz, acompanhamento psicológico e fonoaudiológico, proteção especial em escolas com alto índice de violência, dentre outras melhorias.
Sendo assim, a PEC 287/2016 não leva em consideração as peculiaridades da profissão e as doenças laborais desencadeadas com o exercício da docência. Como também, não se preocupa com os impactos da alteração sugerida no que consiste na qualidade educacional do país.
Conclusão
Conforme o exposto no presente artigo, a Previdência Social não apresenta déficit, sendo excesso de restrição de direitos sociais a reforma proposta pelo governo nos moldes que fora apresentada.
Nesse contexto, a PEC nº 287 apresenta alterações que aumentarão significativamente o tempo de contribuição dos professores, em especial das professoras, o qual representa um retrocesso nas conquistas do gênero feminino.
Com efeito, a relação aluno-professor apresenta situações peculiares a qual se diferencia das demais, principalmente devido este profissional laborar com seres humanos em desenvolvimento. Assim, esta relação está intrinsecamente ligada ao afeto, ao contato direto, ao aconselhamento e, estando este profissional doente, sem equilíbrio psicológico, não conseguirá desenvolver o processo ensino-aprendizagem satisfatoriamente.
Sendo assim, a proposta sugerida pelo governo poderá proporcionar um impacto social imenso, tanto para os professores que, doentes solicitarão cada vez mais licença de saúde, readaptação e aposentadoria por invalidez com benefícios insuficientes para suprir as necessidades básicas, como também, para os alunos que terão um corpo docente doente sem as devidas condições de promover o processo ensino-aprendizagem.
Sendo notório a precariedade do sistema e os baixos índices educacionais, a sociedade como um todo sofrerá as consequências desta proposta vez que o professor é a mola direta propulsora do processo ensino-aprendizagem.
formada em Direito pela Faculdade Estácio advogada e pós-graduanda em Direito Previdenciário pela Universidade Cândido Mendes / Legale
Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale
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