Resumo: O presente trabalho objetiva analisar as diferentes formas de colocação de criança e adolescente em família substituta, quais sejam a guarda, a tutela e a adoção, englobando, também a importância do poder familiar, vez que a sua suspensão ou extinção gera a obrigação de colocar a criança ou adolescente numa família substituta. A importância desse artigo é demonstrada pela finalidade dos supracitados institutos, considerando que eles têm por objetivo assegurar a assistência material, moral, educacional e afetiva da criança ou do adolescente que se encontra em situação de risco, motivo pelo qual devem seguir o procedimento disciplinado em lei. Ademais, estudará o processo de adoção, perpassando por sua evolução histórica, a influência, as semelhanças e dessemelhanças com o direito comparado, suas modalidades, o procedimento legal exigido, além das irregularidades ocorridas nesse processo. Por fim, para o desenvolvimento deste trabalho será utilizada a pesquisa bibliográfica com a contribuição dos doutrinadores Barros (2011), Elias (2010) Ishida (2013) e Souza Filho (2011), bem como o entendimento recente dos tribunais acerca do tema, tudo isso, visando a maior compreensão do assunto, e, ainda, desejando enfatizar os equívocos corriqueiros ocorridos no processo de adoção e as possíveis soluções para esse problema.
Palavras-Chave: Família substituta. Adoção. Criança. Adolescente. Irregularidades.
Abstract: This study aims to analyse the different forms of child and adolescent be placed in a substitute family, by the guard, guardianship or adoption. The family power is important to highlighting because in case of suspension or extinction, it is necessary to put child or adolescent in substitute family. The responsibilities of institutes are ensure assistance material, moral, educational and affective to children and adolescents who are at risk situation. These purposes are highlighted in the article because it should follow disciplined procedure in law. In addition, process of adoption will be seen passing by your historical evolution, influence, similarities and dissimilarities with the comparative law, arrangements, legal procedure required, in addition to the irregularities occurring in the process. Finally, for development of this production will be used the literature search with the contribution of the indoctrinators Barros (2011), Elias (2010) Ishida (2013) and Souza Filho (2011), and the more recent understanding of the justice courts on the subject, for biggest understanding of the subject, as well as emphasize the common misconceptions that occur in the process of adoptive and the possible solutions to this problem.
Key words: Substitute Family. Adoption. Child. Adolescents. Irregularities.
Sumário: Introdução 1. Do poder familiar: características, suspensão e extinção 2. Família substituta: guarda, tutela e adoção 3. O instituto da adoção 4. Das espécies de adoção 5. Dos requisitos da adoção 6. Direito comparado 6.1Direito Francês 6.2 Direito Português 6.3 Direito Norte-Americano 7. Do procedimento 8. Das irregularidades.
Introdução
Este trabalho tem por objetivo a análise do ingresso de crianças e adolescentes em famílias substitutas e, em especial, o estudo do processo adoção, vez que se trata de um tema cotidiano e no qual existe uma grande quantidade de erros em seu procedimento.
No atual ordenamento jurídico brasileiro, a proteção da criança e do adolescente é de extrema importância. A palavra proteger possui uma ampla conceituação, podendo significar defender, afastar algo ou alguém do perigo, abrigar-se do mal.
Em razão disso, a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88), em atendimento ao disposto na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959), adotou a Doutrina da Proteção Integral. Essa doutrina surgiu para assegurar à criança e ao adolescente todos os seus direitos fundamentais que, até então, não lhes eram proporcionados, vez que esses sujeitos eram vistos como seres objetos de compaixão. Ademais, essa doutrina consagrou que os menores são indivíduos que possuem absoluta prioridade e que devem ser respeitadas as suas condições peculiares de desenvolvimento.
No Brasil, essa doutrina pode ser claramente percebida pela literalidade do art. 227, da CRFB/88. Com o advento desse dispositivo, foi atribuído à criança e ao adolescente um extenso rol de direitos e garantias fundamentais, até então não conferidos a eles. Cabendo esclarecer que a absoluta prioridade deve ser interpretada de maneira extensiva, de acordo que estabelece o art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em que se afirma que a absoluta prioridade compreende a destinação de recursos públicos, a formulação e execução das políticas sociais públicas, o atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública e o recebimento de proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, tudo isso visando assegurar a dignidade da pessoa humana e o princípio da prevalência de interesses.
Do mesmo modo, a doutrina da proteção integral pode ser observada no ECA sob várias vertentes, sendo uma delas, o direito a convivência familiar, prevista no art. 19 e seguintes do ECA, vez que não há proteção maior do que está inserido em um seio familiar.
De acordo com o supracitado dispositivo, tem-se que existem dois tipos de família: a natural e a substituta. A natural é aquela formada por um ou ambos os pais e seus descendentes, ou seja, há vínculos sanguíneos. Já a substituta é aquela para a qual o menor deve ser encaminhado, excepcionalmente, por meio da guarda, da tutela e da adoção. Nesse caso, trata-se de vínculos socioafetivos, originados por meio da convivência familiar.
Preferencialmente, a criança e o adolescente devem conviver em sua família natural, no entanto, caso isso não seja possível, será adotado uma das modalidades de família substituta, visando à consagração dos princípios da proteção integral e o do melhor interesse do menor, ambos previstos no art. 1º do ECA.
As modalidades de inserção da criança e do adolescente em família substituta estão disciplinadas no ECA e no Código Civil de 2002. Esses diplomas estabelecem regras e procedimentos a serem respeitados, porém, nem sempre tais disposições são seguidas, motivo pelo qual acarreta graves consequências ao processo.
Na oportunidade, será utilizada a pesquisa bibliográfica, principalmente, a dos doutrinadores Barros (2011), Elias (2010) Ishida (2013) e Souza Filho (2011) e documental, tendo em vista que envolve o exame de livros, artigos doutrinários, jurisprudências e legislações acerca do tema.
1 Do poder familiar: características, suspensão e extinção
O poder familiar consiste numa série de direitos e deveres que são conferidos aos pais para tutelarem as relações que envolvam os seus filhos, sempre buscando o melhor interesse da criança.
Esse instituto está resguardado e disciplinado no art. 21 do ECA , no art. 226, § 5º, da CRFB/1988 e no art. 1.630 do CC/2002, e tem como principais características “O pátrio poder apresenta características bem marcantes: a) é um múnus público, uma espécie de função correspondente a um cargo privado (direito-função ou poder-dever); b) é irrenunciável: dele os pais não podem abrir mão; c) é inalienável: não pode ser transferido pelos pais a outrem, a título gratuito ou oneroso; todavia, os respectivos atributos pode, em casos expressamente contemplados na lei, ser confiados a outra pessoa (na adoção e na suspensão do poder dos pais); d) é imprescritível: dele não decai o genitor pelo simples fato de deixar de exercê-lo; somente poderá o genitor perdê-lo nos casos previstos em lei; e) é incompatível com a tutela, o que é bem demonstrado pela norma do parágrafo único do art. 36 do estatuto da Criança e do Adolescente.” (ISHIDA, 2012, p. 46-47).
O poder familiar é de titularidade dos pais, devendo ser seguido o princípio da isonomia, vez que ambos os pais podem exercer, igualitariamente, seu poder sob os filhos. Tais informações estão dispostas expressamente no art. 226, § 5º, da CRFB/1988, bem como no art. 1.630 do CC/2002.
Diferentemente do que acontecia no CC/1916, o poder familiar, mais conhecido por pátrio poder, era tido como um regime de autoritarismo, onde a figura paterna exercia todos os poderes sobre o filho. Com o advento do CC/2002, o poder familiar passou a ser declinado a ambos os pais, com uma finalidade de orientar, educar e resguardar o interesse dos menores.
O art. 1634 do atual Código Civil elenca uma série de deveres a serem cumpridos pelos detentores do poder familiar, no qual se inclui a criação, a educação, a guarda, o consentimento para o casamento, o consentimento para viagem, dentre outros.
Advém ressaltar que esse rol é meramente exemplificativo, posto que o poder familiar sempre deve ser interpretado de maneira extensiva, além de sempre buscar assegurar o melhor interesse da criança e do adolescente.
Apesar de o poder familiar ser um direito irrenunciável e inalienável, é possível que ele venha a sofrer mitigações. Em razão disso, surgem os institutos da suspensão e extinção do poder familiar. Quando se fala em suspensão do poder familiar, refere-se a uma situação temporária, que pode ser revertida a qualquer tempo, desde que cesse o motivo que a determinou. A suspensão pode ser total ou parcial, a depender do caso em que será aplicada. Já a extinção do poder familiar refere-se a uma ocasião de caráter definitivo, que pode ser gerada por fatos naturais ou por decisão judicial. De acordo com o art. 1.635/CC, são motivos que geram a extinção do poder familiar: a morte dos pais ou do filho, a maioridade, a adoção, a decisão judicial, entre outros.
2 Família substituta: guarda, tutela e adoção
A família é um dos institutos mais antigos no meio social, bem como de maior importância, vez que é nela que o indivíduo aprende os primeiros conceitos e valores para a vida em sociedade.
Em virtude de sua relevância, os códigos jurídicos sempre trataram acerca do assunto. Atualmente, a Carta Magna reza, em seu art. 226 que, “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Além disso, o ECA, no art. 19, também confere aos menores o direito à convivência familiar, nos moldes já explanado.
Ante o exposto, nem sempre é possível que a criança ou adolescente seja educado no seio de sua família natural, motivo pelo qual surgiram as modalidades de família substituta.
A família substituta é aquela que sucede a família biológica da criança ou do adolescente quando há a perda ou a suspensão do poder familiar, instituindo-se por meio da guarda, da tutela, ou da adoção.
Em todas as modalidades citadas acima é recomendado que haja a oitiva da criança ou adolescente para que sua opinião seja levada em consideração na decisão judicial. O ECA ainda dispõe que, quando se tratar de guarda, tutela ou adoção de adolescente, é necessário que haja, obrigatoriamente, a sua oitiva, e, consequentemente, seu consentimento, nos moldes do seu art. 28.
A guarda é um instituto que visa regularizar uma situação de fato ou, até mesmo, gerar uma situação jurídica originária. A guarda está disciplinada no art. 1.583 e seguintes do CC/2002 e nos arts. 33 a 35 do ECA.
Na visão de Ishida, “Guarda de menor é o conjunto de relações jurídicas que existem entre uma pessoa e o mesmo, dimanadas do fato de estar este sob o poder ou companhia daquela, e da responsabilidade daquela em relação a este, quanto à vigilância, direção e educação.” (2012, p. 83).
Cumpre ressaltar que a guarda disciplinada no ECA não é a mesma que é tratada no CC/2002 (direito de família), vez que essa surge quando os genitores do menor separam-se, já aquela é concedida a terceiros, numa situação que seja necessário o uso de uma das modalidades de colocação de criança ou adolescente em família substituta.
Ao guardião são incumbidos todos os deveres inerentes à família biológica do menor. Diante disso, tem-se que cabe a ele prestar assistência material, moral, educacional e afetiva à criança ou adolescente, podendo, também, opor-se a terceiros, inclusive aos pais biológicos, para resguardar os seus interesses, nos moldes do art. 33 do ECA.
Com base no ECA, existem três modalidades de guarda, a saber, a provisória, a permanente e a peculiar. A guarda provisória é aquela que surge, liminar ou incidentalmente, nos processos de tutela ou adoção. Já a permanente, é utilizada quando não for cabível uma ação de tutela ou adoção, ou seja, quando não houver a suspensão ou extinção do poder familiar. Por fim, a guarda peculiar é aquela que visa suprir uma eventual falta dos pais.
O instituto da guarda não exige que haja a perda ou a suspensão do poder familiar, é o que se extrai do art. 33, caput, do ECA. Em razão disso, a legislação prevê a possibilidade do direito de visitas dos pais. No entanto, tal regra comporta exceções, pois o direito de visitas não será concedido aos pais quando se tratar de uma guarda para preparação de adoção ou se houver determinação expressa da autoridade competente, conforme dispõe o art. 33, § 4º, do ECA.
Ao contrário da guarda, a tutela exige que haja a perda ou a suspensão do poder familiar. Essa modalidade de colocação da criança ou adolescente tem por objetivo que o menor seja assistido ou representado em determinadas situações
Ao tutor são atribuídos todos os deveres do guardião, a saber, a assistência material, moral, educacional e afetiva, bem como a administração dos bens do tutelado.
A adoção é a terceira modalidade de colocação de criança e adolescentes em família substituta. Diferentemente das espécies tratadas acima, a adoção cria, entre o adotante e o adotado, um vínculo jurídico definitivo e irrevogável.
Em razão desse vínculo, são extintos os vínculos existentes entre o adotando e seus pais biológicos, somente subsistindo o vínculo anterior quanto aos impedimentos matrimoniais, por questões genéticas, nos termos do art. 41 do ECA.
Por se tratar de um instituto com grande importância social ele está disciplinado não só no ECA, mas, também no CC/2002, a saber, nos artigos 1.618 e 1.619, posto que os demais artigos foram revogados tacitamente com o advento do ECA.
3 O instituto da adoção
Por ser o principal objeto deste trabalho, o instituto em questão será analisado em tópico específico, abrangendo o que vem a ser tal instituto, sua natureza jurídica, suas características, seu procedimento, e os principais erros cometidos nele.
Segundo Artur Marques da Silva Filho, “A adoção é, portanto, ato jurídico complexo que estabelece vínculo de filiação. É ato jurídico porque promana inicialmente da vontade autônoma das pessoas envolvidas. No entanto, seus efeitos jurídicos, com base em uma situação de fato – interesse em adotar e colocação da criança ou adolescente em família substituta -, se produzem ex lege, “sem consideração de uma correspondente de resultado do agente”. (2011, p. 64).
A adoção sempre foi sistematizada pelos povos da antiguidade. Com isso, afirma-se que o Código de Manu – considerado a primeira codificação existente – já travava, mesmo que esparsamente, sobre esse assunto. Posteriormente, no Código de Hamurabi, houve uma regulamentação específica acerca o tema, o que pode ser percebido nos artigos 185 a 193 do Código, que tem por título: Adoção, Ofensa aos pais, Substituição da Criança.
Ainda nesse contexto, é possível perceber que o tema adoção foi abordado pelos hebreus, na Lei do Liverato, e, também, na Bíblia Sagrada, em que se traz a figura de Ester, filha adotiva de Mardoqueu e de Efraim e Manassés, filhos adotivos de Jacó.
Superada essa fase histórica, é importante abordar acerca da natureza jurídica desse instituto, tendo em vista que se trata de “um ato jurídico em sentido estrito. Tal como já afirmado acerca do reconhecimento de filho, a adoção é ato jurídico que não pode ter seus efeitos modulados – não é, pois, negócio jurídico.” (BARROS, 2011, p. 77).
Esse instituto, assim como as demais espécies de família substituta, possui caráter excepcional, motivo pelo qual só haverá o ingresso de crianças e adolescentes nessas famílias se não for possível que eles convivam no seio de sua família biológica.
O ECA disciplina que, via de regra, será possível utilizar-se da adoção quando o sujeito for criança ou adolescente, ou seja, quando possuir até 18 (dezoito) anos de idade. Porém, existe uma exceção, que é quando o sujeito possuir mais de 18 anos de idade, mas que, por sua vez já se encontrava, anteriormente, sob a guarda ou tutela dos adotantes.
4 Das espécies de adoção
No Brasil, existem várias espécies de adoção, quais sejam: a unilateral, a bilateral, a póstuma, a intuitu personae, a internacional e a conhecida como adoção à brasileira, que é tida como crime no ordenamento jurídico.
Prevista no art. 41 § 1º, do ECA, a adoção unilateral ocorre quando um dos cônjuges ou companheiro adotam o filho do outro que, por sua vez, adveio de um outro relacionamento. Note-se que, nesse caso, não há o rompimento total dos laços familiares entre o adotado e os pais biológicos.
A adoção bilateral, também conhecida como conjunta, prevista no art. 42 § 4º, do ECA, exige o rompimento dos vínculos familiares anteriores. Nessa espécie de adoção, podem ser sujeitos ativos os que são casados civilmente, e os que convivam em união estável, desde que possuam estabilidade familiar, nos moldes do art. 42 § 2º, do mesmo diploma legal.
A lei também possibilita que os divorciados, os judicialmente separados e o ex-companheiros adotem em conjunto. No entanto, para que isso ocorra exige-se que estágio de convivência entre os adotantes e o adotado tenha sido iniciado antes da separação. Ademais, a lei exige que sejam comprovados vínculos de afinidade e afetividade entre o adotando e o cônjuge ou companheiro que não será titular da guarda.
Também conhecida como post mortem, a adoção póstuma, preconizada no art. 42 § 5º do ECA, é aquela que se configura quando o adotante falece no curso do processo de adoção. Nesse caso, há a conclusão do processo desde que o adotante já tenha manifestado sua vontade em adotar a criança ou adolescente antes da prolação da sentença.
Nessa modalidade, os efeitos da adoção, excepcionalmente, retroagirão à data do óbito, visto que, nas demais espécies, os efeitos só repercutem a partir do trânsito em julgado da sentença constitutiva, conforme estabelece o art. 47 § 7º, do ECA.
Na adoção intuito personae há uma espécie de acordo entre os pais biológicos ou responsáveis pelo menor e os pais adotivos, dado que aqueles indicam que serão os adotantes da criança ou do adolescente. Dessa forma, trata-se de uma exceção existente no processo de adoção, pois, em regra, é necessário que os pais adotivos estejam inscritos e habilitados no cadastro de adotantes.
Existe, também, a figura da adoção internacional, disciplinada no art. 51 e seguintes do ECA. Segundo Guilherme Freire de Melo Barros, “adoção é internacional quando o postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, independentemente da nacionalidade” (2011, p. 89)
Por fim, há a figura da adoção à brasileira, que ocorre quando pais não biológicos registram a criança, em cartório civil, como sendo seu filho, dessa forma, descumprindo o procedimento legal da adoção. Em virtude disso, o direito brasileiro tipifica tal conduta como um crime.
5 Dos requisitos da adoção
Para que haja a realização de uma adoção diversos requisitos devem ser observados, tanto em relação à pessoa do adotante, como em relação ao adotado, é o que se demonstrará a seguir.
Inicialmente, cumpre ressaltar que é necessário que a pessoa do adotante possua capacidade. A capacidade exigida pela legislação brasileira é a capacidade plena, ou seja, a capacidade de gozo (adquirida com a personalidade jurídica) e a capacidade de exercício (adquirida com a maioridade civil).
No entanto, não se pode confundir capacidade com legitimidade, vez que, o fato de o indivíduo ser capaz não confere a ele, automaticamente, o direito de ação. Para que isso ocorra, também é indispensável que o indivíduo possua legitimação, ou seja, tenha interesse em movimentar a relação processual.
A idade é outro requisito para o ingresso da ação. O adotante, no início do processo, deve possuir 18 (dezoito) anos, nos termos do art. 42 do ECA. Além disso, o ECA exige, em seu art. 42, §3º, a diferença mínima de 16 (dezesseis) anos idade entre o adotante e o adotado. Segundo a doutrina, “A diferença mínima de idade deve existir como na filiação biológica, ou seja, uma suficiente diferença de idade, como se o adotante pudesse ser pai do adotado. Entre o adotante e o adotado deve haver laços de hierarquia e subordinação. Evita-se o perigo de se estabelecerem vínculos afetivos distintos da relação paterno-filial.” (SILVA FILHO, 2011, p. 75).
Ademais, outras regras devem ser observadas no processo de adoção. No tocante ao parentesco, ressalta-se que é vedada a adoção por ascendentes e colaterais de primeiro grau do adotando (art. 42, § 1º, ECA), porém, em determinadas situações os Tribunais vêm admitindo a mitigação desse preceito.
No art. 39, § 2º, do ECA veda-se a chamada adoção por procuração, que é aquela em que existe um documento público que confere, em regra, poderes a alguém para realizar todos os atos concernentes à adoção. Essa vedação teve por alicerce o fato dessa modalidade violar um dos principais objetivos da adoção: a criação de um vínculo afetivo entre adotante e adotado, pois, na maioria das vezes, todo o processo de adoção tramitava sem o contato pessoal entre os sujeitos.
Por fim, o ordenamento jurídico brasileiro veda a existência de qualquer espécie de diferença entre os filhos naturais e os adotivos, devendo os pais obedecer ao princípio da igualdade entre os filhos.
No tocante à capacidade do adotado, observa-se que os diplomas brasileiros, a saber, o ECA e o CC/2002, não disciplinaram um limite mínimo de idade para o adotando. Em razão disso, a doutrina e a jurisprudência divergem acerca da possibilidade de adoção do nascituro, visto que, nos moldes do atual CC/2002, que adota a teoria natalista (art. 2º, CC/2002), o nascituro ainda não possui capacidade jurídica.
Na visão de Silva Filho, “malgrado entendamos que haja exceções à ideia de que só existe direito quando existe o sujeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente, mesmo após as alterações trazidas pela Lei 12.010/2009, não veda expressamente a adoção do nascituro, sem, inclusive, fazer qualquer tipo de referência ao termo inicial da vida.” (2011, p. 90).
Em relação aos já concebidos e nascidos não há dissensão, posto que há unanimidade na ideia de bastar a capacidade de direito e não a de fato, para que o indivíduo possa ser adotado.
Nos moldes expostos, o ECA não indica um limite de idade para o adotando. Porém, dispõe, em seu art. 40, que o adotado deve possuir uma idade máxima de 18 (dezoito) anos à data do pedido, exceto se o adotando já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes.
6 Direito comparado
A adoção é um instituto histórico, visto que está presente há séculos na sociedade, além de ter sido disseminado por vários lugares do mundo. Neste tópico, aborda-se-á sobre a adoção em alguns países, levando-se em consideração influência, as semelhanças e dissonâncias com as regras adotadas no Brasil.
6.1 Direito Francês
Na França, a adoção foi instituída no período da Revolução Francesa por meio das leis civis da Assembleia Nacional e permanece até hoje no Código Civil Francês.
Existem duas espécies de adoção: a plena e a simples. A plena subdivide-se em conjunta e individual. A adoção conjunta pode ser requerida pelo casal que contraiu matrimônio há mais de 02 (dois) anos e desde que ao menos um dos adotantes possua 28 (vinte e oito) anos de idade, requisitos não exigidos pela legislação brasileira.
Na adoção individual, a idade requerida também é de 28 (vinte e oito) anos. Cabe ressaltar que, caso o adotante seja casado e não separado de fato, deverá haver o consentimento do outro cônjuge. Há, ainda, a exigência de uma diferença de 15 (quinze anos) entre o adotante e o adotado ou de 10 (dez) anos, se o adotante for o filho do outro cônjuge.
Esse procedimento pode ser realizado até o adotando completar 18 (dezoito) anos de idade, desde que este esteja na companhia do adotante até seus 15 (quinze) anos, o que não ocorre nas adoções brasileiras.
Em semelhança ao ordenamento jurídico brasileiro, o Direito Francês dispõe que no procedimento de adoção deve haver um estágio de convivência entre os sujeitos do processo, também deve haver o consentimento do adotando e o consentimento dos pais biológicos acerca do processo, além de também se tratar de um procedimento irrevogável, onde há a transferência do poder familiar da família biológica para a família substituta.
Por fim, em relação à adoção simples tem-se que devem ser seguidos os requisitos listados acima, com exceção do estágio prévio de convivência. Trata-se de um procedimento revogável, em que não há a destituição do poder familiar da família de origem do adotando.
6.2 Direito Português
Ao contrário muitos países, a adoção, em Portugal, é um instituto recente, regulamentado a partir do Código Civil de 1966. No direito português encontram-se duas espécies de adoção: a plena e a restrita.
A adoção plena se assemelha, em diversos aspectos, à adoção brasileira. Em consonância com o Brasil, a adoção portuguesa só pode ser realizada se apresentar reais vantagens para o adotado. Ademais, o código português também prevê a adoção conjunta e a individual. No tocante aos efeitos, afirma-se que é um procedimento irrevogável, e extingue os vínculos entre o adotando e seus pais naturais.
Já restrita possui traços próprios que divergem do ordenamento brasileiro. Nessa modalidade de adoção, pode adotar aquele que possuir mais de 25 (vinte e cinco) e menos de 50 (cinquenta) anos, exceto se o adotado for filho do cônjuge. Acerca dos efeitos, esclarece-se que o adotado conserva todos os seus direitos em relação à família de origem, além de ser um procedimento revogável.
6.3 Direito Norte-Americano
Nos Estados Unidos não há uma legislação específica que regulamente o procedimento de adoção, posto que os Estados que são responsáveis por criar as suas próprias regras.
Nesse país, a adoção “significa o ato de criar um relacionamento jurídico que não existia entre pais e crianças. Declara, desta forma, a criança como sendo legalmente filha dos pais adotivos e herdeira deles perante a lei, com todos os direitos e privilégios, sujeita a todas as obrigações de um filho.” (SILVA FILHO, 2011, p. 57).
Apesar da autonomia dos Estados, algumas regras gerais devem ser observadas, quais sejam: a possibilidade da tutela provisória, o consentimento dos pais biológicos, o consentimento do menor de 12 (doze) anos, as audiências confidenciais, a irrevogabilidade do procedimento, dentre outros requisitos que também se assimilam às regras brasileiras.
Por fim, nos Estados Unidos qualquer adulto, independentemente do seu estado civil, pode ajuizar uma ação de adoção.
7 Do procedimento
A adoção é a modalidade de colocação de criança e adolescentes em família substituta mais complexa, podendo ser nacional ou estrangeira. Em razão disso, esse procedimento deve observar uma série de regras e princípios para ser considerado válido. A partir de agora, o objeto de estudo do presente trabalho passa a ser a adoção nacional.
A princípio, observa-se que o procedimento da adoção divide-se em duas fases: uma administrativa e uma judicial, devendo ambas respeitarem os preceitos legais, inclusive, a participação obrigatória do Ministério Público.
O procedimento da adoção tem início com o cadastramento dos interessados no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), criado em 2008 pelo Conselho Nacional de Justiça. Esse cadastro tem por objetivo agilizar e facilitar o processo de adoção, e está previsto no art. 50 do ECA.
Ao cadastrarem-se, os requerentes devem preencher uma ficha de inscrição com as informações que podem interferir nesse processo, como por exemplo, se a adoção será individual ou conjunta, sobre a situação econômica financeira, sobre a existência de outro filho, dentre outras.
No Brasil, essa inscrição deve ser feita nas Varas de Infância e Juventude por um assistente social. Na oportunidade, esse profissional deverá alertar os requerentes acerca dos pontos mais difíceis do processo de adoção, como por exemplo, os reflexos da relação paterno filial.
Após essa triagem, serão analisados todos os elementos objetivos e subjetivos para a elaboração do laudo social e psicológico. Posteriormente, o juiz competente ouvirá o membro do Ministério Público e decidirá sobre a efetuação do cadastro dos requerentes.
Com o deferimento do cadastro, o requerente já estará habilitado para o procedimento de adoção.
Por fim, estabelece o art. 197-E do ECA que “Deferida a habilitação, o postulante será inscrito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo a sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem cronológica de habilitação e conforme a disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis.”
Ante o exposto, tem-se que, com a conclusão do cadastramento e, consequentemente, a habilitação, o sujeito está apto a participar das demais fases do processo de adoção.
Cabe ressaltar que o ECA dispõe de algumas situações em que não se exige o cadastro dos adotantes (art. 50, § 13, ECA). Segundo Barros, nessas situações “a condição fundamental é ser domiciliado no Brasil” (2011, p. 90).
A primeira hipótese que dispensa o cadastramento é quando se tratar de adoção unilateral, ou seja, quando uma pessoa adota uma criança ou adolescente que já é filho do seu cônjuge ou companheiro. A segunda situação ocorre quando o adotando já convive com pessoas de sua família natural. A última modalidade em que o cadastro dos postulantes não é realizado ocorre quando a criança, maior de 03 (três) anos, ou o adolescente já está sob a guarda legal ou tutela do adotante.
Ressalva-se que, apesar de haver a dispensa de um requisito essencial, o processo de adoção, para que seja considerado válido, deverá percorrer todo o tramite processual exigido em lei.
Conforme dispõe o art. 47 do ECA, o processo de adoção constitui-se a partir de uma sentença judicial. No entanto, a intervenção judicial não é um mero ato homologatório, trata-se de um ato constitutivo, vez que o Poder Judiciário deve velar por todos os atos do processo.
O processo de adoção desencadeia-se por meio do pedido dos requerentes perante o Judiciário. Em seguida, “Convencendo-se de que o processo deva prosseguir, determinará o juiz a realização do estudo social, preferencialmente, por equipe interprofissional, reunindo o maior contingente possível de informações sobre toda a situação familiar do adotando e dos pretendentes, para bem avaliar o estágio de convivência.” (SOUZA FILHO, 2011, p. 151).
No processo de adoção a intervenção dos pais ou do representante legal da criança ou do adolescente é obrigatória. Apesar do poder familiar ser irrenunciável, é possível que os pais consintam com o processo adotivo. Em duas situações o processo de adoção percorrerá sem prejuízos, mesmo sem a intervenção dos pais do adotando. A primeira é quando os pais forem desconhecidos, a segunda é quando eles forem destituídos do poder familiar.
Antes dos pais concordarem com adoção, eles terão um acompanhamento junto a uma equipe interprofissional, que deverá esclarecer todas as consequências da adoção. Essa orientação é indispensável, uma vez que se trata de um procedimento irrevogável, portanto, devendo os pais possuir ciência dos efeitos de sua concordância.
Em relação ao consentimento do adotando tem-se que, em determinadas situações, a saber, nas hipóteses dos arts. 28, §1º e 168 do ECA, a criança ou adolescente será ouvido sempre que for possível, devendo-se respeitar o seu estágio de desenvolvimento e sua compreensão sobre o processo de adoção. Já em relação aos adolescentes, o consentimento do adotando é obrigatório.
O estágio de convivência é uma etapa indispensável durante esse processo, pois, é nesse momento em que há o fortalecimento dos vínculos afetivos entre o adotante e o adotando. Vale ressaltar que tal regra comporta exceções, logo o estágio de convivência pode ser dispensado quando o adotando não tiver mais de um ano de idade ou quando, qualquer que seja sua idade, ele já estiver convivendo com o adotante há tempo suficiente para avaliar o vínculo, conforme dispõe o art. 46, § 1º, do Estatuto.
O papel do Ministério Público nos processos de adoção é de grande valia, posto que foi atribuído a este órgão, por lei, o dever de proteger os direitos fundamentais das crianças e adolescentes, em situações judiciais e extrajudiciais.
Suas competências estão listadas no art. 200 e seguintes do Estatuto, dentre as quais inclui o direito/dever de intervir e ser intimado pessoalmente para todos os atos do processo, sob pena de nulidade, a legitimidade extraordinária para ingressar com a ação de suspensão ou destituição do poder familiar, a competência para ajuizar ação civil pública e, ainda, instaurar inquérito civil quando houver desrespeito aos direitos coletivos e difusos de crianças e adolescentes, entre outras.
Após todas as fases citadas acima, cabe ao juiz competente decidir se a adoção confere reais vantagens para o adotando. Assevera Silva Filho que “Com todos esses elementos coligidos, ouvindo as testemunhas arroladas e resguardando a amplitude de defesa, colhendo as manifestações das partes, habilita-se o julgador a proferir sentença. Por meio dela é que se constituirá a adoção (art. 47, ECA).” (2011, p. 161).
A sentença que constitui o vínculo adotivo tem efeitos ex tunc, ou seja, a partir do trânsito em julgado da decisão, exceto na adoção post mortem, em que os efeitos retroagem à data do óbito do adotante.
Após o trânsito em julgado as sentença, ela será inscrita no Cartório de Registro Civil, em que se constará o nome dos adotantes como pai, bem como o de seus ascendentes, além disso, haverá o cancelamento do registro original do menor, a inclusão do sobrenome dos adotantes ao nome do adotando, podendo-se, inclusive, haver a alteração do seu prenome, desde que ele seja capaz e concorde com tal alteração. Por fim, o processo de adoção será arquivado para que o adotando possa ter acesso a qualquer tempo
8 Das irregularidades
Como visto, o processo de adoção inicia-se com a habilitação dos adotantes e extingue-se com o registro da criança ou adolescente no Cartório Civil. Para percorrer esse inter validamente, as regras e princípios dispostos em lei devem ser fielmente observados, porém, nem sempre é isso que ocorre. Neste tópico, abordar-se-á as principais irregularidades ocorridas no processo de adoção, bem como as consequências acarretadas por tais erros no processo.
Inicialmente, é necessário esclarecer que os diplomas legais, a saber, o ECA e o CC/2002, não estabelecem hipóteses de inexistência, anulabilidade ou nulidade do processo de adoção. Contudo, por ter natureza de negócio jurídico, a sentença só poderá produzir efeitos se não estiver eivada de vícios. Em virtude disso, a doutrina estabeleceu alguns critérios que podem gerar a inexistência ou anulação do ato.
No tocante às hipóteses de inexistência, afirma-se que, assim como os requerentes, para que uma criança ou adolescente esteja apto a participar de um processo adotivo é necessário que ela esteja previamente cadastrada no CNA. Por meio desse cadastro, o Poder Judiciário tem o controle geral, bem como os dados estatísticos de menores que estão habilitados a serem adotados. O cadastramento prévio é um requisito crucial à adoção, vez que ele estabelece um critério cronológico e uma ordem a ser seguido. Segundo Silva Filho, “a ausência de requisitos essenciais impede a “existência” da relação jurídica de adoção, podendo resultar, pelo fato residual, noutra figura do direito. (2011, p. 226)”. É o que pode ser percebido pelo seguinte entendimento jurispudencial: “ECA – PEDIDO DE ADOÇÃO – ADOTANTES SEM CADASTRO PRÉVIO PERANTE O JUÍZO – INDEFERIMENTO DE GUARDA PROVISÓRIA COM BUSCA E APREENSÃO DA CRIANÇA – INSURGÊNCIA – AUSÊNCIA DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. Para garantia da lisura, legalidade e imparcialidade do procedimento de adoção, é de rigor a fiel observância da sistemática imposto pelo art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, somente se deferindo a adoção a pessoas previamente cadastradas e habilitadas. (…). (TJ-PR – AI: 1748838 PR Agravo de Instrumento – 0174883-8, Relator: Accácio Cambi, Data de Julgamento: 13/09/2005, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/09/2005 DJ: 6965).” (grifo nosso).
Outro aspecto determinante nos processos de colocação de criança ou adolescente em família substituta é o consentimento dos pais e do adotando, sendo aquele de caráter obrigatório e esse de caráter obrigatório ou facultativo, a depender da situação. Para que os genitores do menor manifestem sua vontade acerca do processo é necessário que ocorra uma citação válida que, por desídia do Judiciário, nem sempre é realizada. O consentimento dos pais do adotando é um requisito essencial para a validade do processo de adoção, e sua ausência pode acarretar na invalidade de todo os atos processuais, é o que se percebe pelo seguinte julgado: “APELAÇAO CÍVEL ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – PEDIDO DE GUARDA – COLOCAÇAO EM FAMÍLIA SUBSTITUTA – CONCORDÂNCIA DA MAE DA MENOR – EVENTUAL AUSÊNCIA DE CITAÇAO SUPRIDA PELO COMPARECIMENTO EM JUÍZO – NECESSIDADE DE OITIVA DA INFANTE E SUA GENITORA PELA AUTORIDADE JUDICIÁRIA – INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS – SENTENÇA ANULADA. (…) 6. De igual relevância é a oitiva do menor, quando revele condições de exprimir sua vontade, como ocorre na espécie, onde a infante já tem 07 (sete) anos de idade e não apresenta qualquer impedimento para manifestar a sua opinião, que deve ser devidamente considerada pelo MM. Juiz na apreciação do pedido de colocação em família substituta (arts. 28, 1º, e 168 do ECRIAD). (…). 8. Recurso provido. Sentença anulada. (TJ-ES – AC: 24069000826 ES 024069000826, Relator: CATHARINA MARIA NOVAES BARCELLOS, Data de Julgamento: 21/03/2006, QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 09/05/2006).” (grifo nosso).
Conforme afirmado, a presença do Ministério Público em todos os atos do processo de adoção é imprescindível, posto ele atua na defesa dos direitos da criança e do adolescente. Por ser um ato essencial à validação do processo, alega-se que a sua ausência em qualquer ato, seja judicial ou extrajudicial, ocasiona a inexistência do ato. Esse é o entendimento dos tribunais, veja-se: “CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE ADOÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL PARA MANIFESTAR-SE ANTES DO PROVIMENTO JURISDICIONAL. 1) É nulo o processo quando o membro do Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir (art. 279 do CPC 2015/ art. 246 do CPC 1973). Conforme art. 178 do NCPC, “ o Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam, dentre outros, o interesse de incapaz. 2) Assim, em se tratando de processo que envolve interesse de incapaz é obrigatória a intervenção do Ministério Público, e a sua não intimação para o ato acarreta a nulidade da sentença.¹. (…) 4) Autos que devem retornar ao juízo de origem para sanar a irregularidade formal, com a devida intimação do Ministério Público, anulando-se todos os atos processuais a partir do momento em que se tornou obrigatória a intimação do órgão ministerial. 5) Decisão Unânime. (TJ-PI – AC: 201600010003732 PI 201600010003732, Relator: Des. José James Gomes Pereira, Data de Julgamento: 31/01/2017, 2ª Câmara Especializada Cível).” (grifo nosso).
Em relação às nulidades, dispõe o CC/2002, em seu art. 104, que o negócio jurídico será válido quando o agente for capaz, o objeto for lícito, determinado ou determinável, e quando revestir-se de forma prescrita ou não defesa em lei. Observando as disposições do ECA, percebe-se que foram estabelecidos requistos quanto ao agente, ao objeto e à forma adequada a ser utilizada no processo de adoção. Caso o processo não atenda aos seguintes preceitos, ele será eivado de nulidade absoluta.
Em relação ao adotante, já fora apresentado que ele deve possuir capacidade plena, além de possuir legitimação para atuar no polo ativo do feito. No tocante ao objeto, que
“é a destituição do poder familiar com a consequente ruptura dos vínculos da família de origem, constituindo-se um novo vínculo paterno-filial com os adotantes e de parentesco entre o adotado e os ascendentes do adotantes, poderá ocorrer, por exemplo, quando um ascendente (avó) adote o próprio neto. Há regra proibitiva expressa de adoção (art. 42, § 1º, ECA), aplicável no regime jurídico adocional.” (SILVA FILHO, 2011, p. 228).
No que diz respeito à forma, para que haja a constituição do vínculo de adoção é fundamental que o juiz expeça uma sentença constitutiva, sob pena de nulidade absoluta do processo. A necessidade de autorização judicial para a colocação de criança ou adolescente em família substituta pode ser percebida pelo seguinte julgado: “ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. REPRESENTAÇÃO CONTRA ENTIDADE DE ABRIGO. PERMANÊNCIA DA CRIANÇA COM PADRINHOS. SAÍDAS EM FINAIS DE SEMANA. VIAGEM. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. IRREGULARIDADE. ARTIGO 30, INC. II, DO ECA. PENALIDADE DE ADVERTÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. (…) 2 – O ARTIGO 30 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE É EXPRESSO NO SENTIDO DE QUE "A COLOCAÇÃO EM FAMÍLIA SUBSTITUTA NÃO ADMITIRÁ TRANSFERÊNCIA DA CRIANÇA OU ADOLESCENTE A TERCEIROS OU A ENTIDADES GOVERNAMENTAIS OU NÃO-GOVERNAMENTAIS, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL" 3 – NÃO MERECE REPARO A SENTENÇA QUE APLICOU A PENALIDADE DE ADVERTÊNCIA À ENTIDADE E DETERMINOU QUE SE ABSTIVESSE DE PROMOVER A COLOCAÇÃO EM FAMÍLIA SUBSTITUTA SEM A PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. 4 – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.(TJ-DF – APE: 42466020068070001 DF 0004246-60.2006.807.0001, Relator: ANA CANTARINO, Data de Julgamento: 24/06/2009, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 13/07/2009, DJ-e Pág. 30).” (grifo nosso).
Por fim, afirma-se que o processo de adoção também pode ser afetado pelas nulidades relativas, dispostas no art. 171 do CC/2002, quais sejam: incapacidade relativa do agente, ou por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
Conclusão
Este artigo teve por objeto o estudo de todas as modalidades de colocação de criança e adolescente em família substituta, a saber, a guarda, a tutela e a adoção, levando-se em consideração as causas de suspensão e/ou extinção do poder familiar, visto que, é através da sua suspensão ou extinção que surgem alguns dos supracitados institutos.
No que se refere à adoção, percebe-se que fora realizado um estudo pormenorizado, compreendendo o contexto histórico, as suas espécies, os requisitos, as influências, semelhanças e dessemelhanças com o direito comparado e, também, sobre o seu procedimento, que vai do cadastramento do adotante e do adotando até ao registro, em cartório cível, da criança ou do adolescente.
Em busca da efetivação dos preceitos constitucionais e do princípio do melhor interesse do menor, a lei disciplina um procedimento rigoroso a ser seguido no processo de adoção. Contudo, como foi possível perceber, várias regras são burladas pelos mais variados motivos, o que ocasiona sérios prejuízos ao processo.
Ademais, o desrespeito ao trâmite legal do processo de adoção viola diversos princípios, tais como o da legalidade, o da igualdade, o do devido processo legal, o do contraditório e o da ampla defesa, o do melhor interesse do menor, dentre outros.
Note-se que o ordenamento jurídico brasileiro atribuiu grande importância a cada uma das regras do processo de adoção, motivo pelo qual as disciplinou minuciosamente lei, por isso, o desatendimento a qualquer uma delas promove a nulidade (absoluta ou relativa) ou inexistência dos demais atos processuais, conforme é pacificado pela doutrina e pela jurisprudência.
A adoção é um instituto complexo, que fornece ao sujeito ativo (adotante) autoridade máxima sobre a criança ou adolescente, vez que o poder familiar dos pais naturais é suprimido e conferido aos pais adotivos. Em razão de sua magnitude, o processo de adoção sempre deve seguir os preceitos legais para que ele alcance, com êxito, a sua finalidade.
Para que isso ocorra, faz-se necessário que haja um maior cuidado e fiscalização em cada uma das fases do processo adotivo. O Poder Judiciário, juntamente com os demais órgãos envolvidos nesse processo, devem instalar órgãos e/ou servidores para acompanharem cada etapa desse inter, tudo isso visando assegurar à criança ou adolescente uma família substituta que atenda a todas as suas necessidades, quais sejam, assistência moral, material, educacional e, sobretudo, a afetiva, posto que esse é o principal objetivo do instituto da adoção.
Advogada. Acadêmica do curso de Letras/Literatura
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