Resumo: As inovações tecnológicas vêm crescendo bastante ultimamente, tendo tais novidades adentrado, há pouco, o Judiciário, mormente por meio do Processo Eletrônico. Ocorre que, com isso, sérias questões têm sido rediscutidas. Nesse contexto inserem-se as contendas sobre o registro de Nomes de Domínio, sendo, na maioria dos casos, indicada a utilização do instituto da Arbitragem, tendo em vista suas características peculiares.
Palavras-Chave: Direito Eletrônico. Arbitragem. Internet. Nomes de Domínio.
Sumário: 1 – Introdução; 2 – Os Nomes de Domínios da Internet; 3 – O Instituto da Arbitragem; 4 – A Arbitragem na Solução de Litígios Referentes aos Domínios de Internet – Prática do Cybersquatting e do Typosquatting; 4.1 – A Prática do Cybersquatting; 4.2 – A Prática Do Typosquatting; 5 – Conclusões; 6 – Referências Bibliográficas.
1 – Introdução
Nos últimos tempos, a Internet, a grande Rede Mundial de Computadores tem alcançado espaço jamais imaginado, já se falando, hodiernamente, em mais de 550 milhões de internautas (NIELSEN, ONLINE). Ciente do poder dessa ferramenta, o Poder Judiciário vem, cada vez mais, utilizando-a como forma de alcançar-se o maior ideal de justiça, mediante a inserção, paulatina, de mecanismos informatizados em seus procedimentos. Tanto o é assim que, no ano de 2006, promulgou-se a Lei Nº 11.419/2006, estipulando o regramento legal do Processo Judicial Eletrônico.
Ocorre que essa utilização nem sempre se dá de forma pacífica. Inúmeras são as situações conflituosas que têm origem na Rede das Redes, aí se incluindo a questão que aqui se tratará, referente aos Nomes de Domínio da Internet. E nesse ponto surge a utilização da Arbitragem, forma alternativa ao Judiciário, como mecanismo fundamental à pacificação desses litígios, em razão de suas características típicas, que se adaptam, com encaixe simétrico, às necessidades peculiares dos conflitos atinentes a esses registros.
2 – Os Nomes de Domínios da Internet
Com essa grandiosidade da Internet, inúmeros são os sites à disposição do internauta. Com o intuito de facilitar a memorização e a digitação de endereços de páginas dessa Rede, foi criado, em 1983, na Universidade de Wisconsin (Estados Unidos), o conceito de Sistema de Nome de Domínio (do inglês, DNS), aquele endereço que segue o “http://www.”. Ele é composto por nomes ou números, podendo apresentar ambos simultaneamente, tendo no mínimo 2 e no máximo 26 caracteres. O órgão que coordena mundialmente esses registros é o ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), que é ligado ao Departamento de Comércio dos Estados Unidos e determina, entre outros, a criação de novos sufixos (.com, .net, .gov, etc.). O responsável pelos registros brasileiros é o Nic.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR).
Vale lembrar que o texto alfabético dos domínios somente traduz os números que sinalizam o IP (do inglês, Internet Protocol), que, na verdade, é um protocolo sobre o qual se assenta a infra-estrutura da Internet, identificando um computador, de forma única, nessa Rede, sendo composto por uma sequencia de 4 números que variam de 0 a 255, separados por “.” (pontos finais). À guisa de ilustração, quando se digita http://www.google.com, nada mais se está fazendo do que entrando no endereço IP 66.102.9.99.
O registro desses nomes não pode ocorrer de forma aleatória. Muito pelo contrário, deve ser muito bem pensado antes, já que essa será a maneira através da qual um possível cliente terá acesso à empresa, ou ao serviço que busca. Caso seja um nome muito difícil de lembrar, provavelmente, o cliente quando precisar dos serviços desse empreendimento não conseguirá acessá-los, podendo o concorrente, com um referencial mais acessível, ser o escolhido.
Os nomes de domínio, desde a sua idealização até os dias de hoje, são distribuídos à vontade; o indivíduo que primeiro o requisitar passa a ser seu detentor. Afinal, nunca se imaginou a proporção que a Grande Rede atingiria. Com o desenvolvimento da Internet como ferramenta fundamental a diversos ramos e a sua crescente importância, passou a haver verdadeiras altercações por alguns domínios.
O assunto é sobremaneira controverso, de tal forma que, almejando isentar-se de maiores problemas, o Comitê Gestor da Internet, através da Resolução nº. 008/2008, afirma em seu art. 1º e parágrafo único que:
“Art. 1º – Um nome de domínio disponível para registro será concedido ao primeiro requerente que satisfizer, quando do requerimento, as exigências para o registro do mesmo, conforme as condições descritas nesta Resolução.
Parágrafo único – Constitui-se em obrigação e responsabilidade exclusivas do requerente a escolha adequada do nome do domínio a que ele se candidata. (…)”
Surgem, então, alguns questionamentos. Em se instaurando um conflito nessa seara, qual direito regerá a classificação do ato? Quem será o sujeito passivo? Qual será o foro competente? Somem-se a esses, vários outros aspectos que ainda não estão completamente definidos no âmbito da Internet.
Como se verá, a Arbitragem surge como alternativa eficaz para encontrar a solução de muitas dessas indagações, havendo, algumas, contudo, para as quais ainda não há única solução, cabendo aos experts no tema debaterem e chegarem à melhor conclusão sobre o tema em específico debatido.
3 – O Instituto da Arbitragem
Apesar das desavenças oriundas da convivência na sociedade digital, é certo que os homens buscam, via de regra, viver de forma pacífica. Com o intuito de melhor solucionar esses desentendimentos, surge como alternativa à Justiça Estatal a Arbitragem, em cujas particularidades se irá deter doravante.
Passando a uma definição prática do conceito que se objetiva enfatizar, deve-se lançar mão das palavras do professor Matthieu Boisséson (apud OPORTO e VASCONCELLOS, ON LINE), que se refere à Arbitragem como “a instituição pela qual as partes confiam a árbitros, que livremente designam, a função de resolver seus litígios”. Essa liberdade decorre da Lei de Arbitragem, Lei Nº 9.307/1996, vigente desde o dia 23 de novembro de 1996, logo, há mais de 10 (dez) anos, a qual, em seu artigo 18 afirma que “as partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de Arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral”.
Observa-se, pois, que a Arbitragem surge de maneira definitiva como alternativa à Justiça Estatal, tendo como missão, dentre outros, ajudar aos juízes no cumprimento de sua importante função. O que prejudica esse fato, porém, é a grande desinformação da população quanto aos procedimentos alternativos ao Judiciário. Há ainda aqueles que, apesar de conhecerem essas outras possibilidades, não as procuram por descrédito, não dando o devido valor a tais alternativas, indo socorrer-se no Judiciário, mesmo diante de situações que poderiam ser melhor analisadas por árbitros especializados na área do litígio.
Ao insuflar “nova vida” na Justiça, optando-se pelos sistemas extrajudiciais, como a Arbitragem e a mediação (que apresenta algumas diferenças em relação à Arbitragem, não estando ainda regulamentada no Brasil), naturalmente, há a tendência de uma desobstrução dos tribunais convencionais, solucionando os litígios em menor tempo e com uma melhor acuidade.
4 – A Arbitragem na Solução de Litígios Referentes aos Domínios de Internet – Prática do Cybersquatting e do Typosquatting
Certo é que a Arbitragem apresenta todos os requisitos para ser utilizada na solução de litígios ainda não muito bem definidos em Lei, tais como os relativos ao registro de domínios, já que é rápida, econômica, não possui os formalismos exacerbados, apresenta grande amplitude de poder e é sigilosa, sendo ideal para a resolução desses quesitos referentes à Propriedade Intelectual (WIPO, ON LINEa).
Concorre, também, em favor da utilização desse instituto o fato de que, consoante afirmado no art. 1º da Lei 9.307/96, tal procedimento pode ser utilizado para “dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”, assim entendidos aqueles em relação aos quais as partes envolvidas podem livremente deles dispor, tendo em vista não haver qualquer violação ao disposto no ordenamento jurídico. E os litígios relativos à Internet, em sua maioria, envolvem interesses patrimoniais dessa monta.
Devido a essa convergência de fatores, em 1994, antes mesmo da entrada em vigor no Brasil da Lei de Arbitragem, criou-se o WIPO Arbitration and Mediation Center (Centro de Arbitragem e Mediação), como unidade administrativa da WIPO (World Intellectual Property Organization – Organização Mundial de Propriedade Intelectual) em Genebra (Suíça), com o intuito de oferecer solução para disputas comerciais entre particulares, envolvendo Propriedade Intelectual, aí se incluindo o tocante aos nomes de domínio. Esse Centro é internacional, independente e neutro, e é assistido em suas operações por um corpo de consultores composto de especialistas na resolução de disputas internacionais e relativas à propriedade intelectual. (WIPO, ON LINEa)
Desde a sua criação até meados de julho de 2009, a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (do inglês WIPO) já arbitrou 15.779 casos, abrangendo indivíduos de 149 países distintos. (WIPO, ON LINEb)
4.1 – A Prática do Cybersquatting
Antes de adentrar o assunto, convém definir o termo Cybersquatting, que pode, basicamente, ser entendido como “utilizar um nome de domínio com má-fé para lucrar com a boa fé de uma marca comercial pertencente a outra pessoa” (GOOGLE, ON LINE). Consoante informações trazidas pelo Anti-Cybersquatting Consumer Protect Act, é tido como cybersquatting “obter nomes de domínio com má-fé que são idênticos ou confusamente similares a uma marca registrada ou a uma marca de serviço” ANTICYBERSQUATTING , ON LINE).
Como o registro de domínios ainda é relativamente fácil, os “posseiros digitais” não encontram muita dificuldade em registrar os nomes que desejam, utilizando-os depois com diferentes intuitos. Dentre eles, destaca-se: capturar internautas não conhecedores do real endereço virtual da instituição que pretendem entrar; ludibriar os usuários mais distraídos, aplicando-lhes golpes econômicos; bem como para referir-se depreciativamente a produtos e a empresas, constituindo, geralmente, esta última hipótese caso de concorrência desleal, cuja análise foge ao escopo maior do presente.
Essa foi a idéia central utilizada pelo WIPO para decidir, utilizando-se da Arbitragem, litígio acerca do uso do nome <itau.info> (Case No. D2003-0454), registrado no dia 5 de outubro de 2001, indevidamente pelo argentino F. Nazar através do site BulkRegister.com, o qual não tinha nenhuma relação com a instituição financeira homônima, detentora do domínio <itau.com.br> e de aproximadamente outros 200 domínios que contém a palavra “itaú” (www.itau.com.br/, www.itaucultural.org.br/, www.itauinvestnet.com.br/, etc.).
Os argumentos para devolver a guarda do domínio ao banco giraram em torno do fato de que em nome do argentino não havia negócios sob o nome “Itaú” e que o domínio não estava sendo utilizado em conexão com sites ativos, não estando demonstrado interesse legítimo por parte dele, restando evidenciada a intenção maliciosa de evitar o uso deste endereço pelo banco.
Diante do exposto, resta patente que se deve dar plena atenção a esse aspecto, vez que tal comportamento, apesar de todas as tentativas em sentido contrário, tem crescido de forma vertiginosa. Apenas no ano de 2008, foram registrados, na Organização Mundial da Propriedade Intelectual, 2.329 casos de cybersquatting, o que significa um crescimento de quase 10% em relação ao ano de 2007, consoante dados obtidos na própria Organização Mundial indigitada (WIPO, ON LINEb).
4.2 – A Prática Do Typosquatting
Recorrendo-se à definição de typosquatting, encontra-se que esse termo é entendido como “uma forma de pirataria de domínio que se baseia na probabilidade de que certo número de usuários da Internet digitará incorretamente o nome de um domínio ao tentar acessá-lo”. (GOOGLE, ON LINE)
Como se observou pela acepção do termo, enquadram-se neste caso os sites registrados com pequenos erros de digitação em relação ao original. Como exemplo, cita-se um caso real arbitrado pela WIPO (Case No. D2000-0548) que envolveu pedido da Microsoft contra o registro do domínio <microsof.com> feito por Tarek Ahmed, que, claramente, foi idealizado com o intuito de captar usuários, de forma desonesta, através de pequena alteração da grafia em relação ao nome verdadeiramente buscado. Os árbitros da WIPO decidiram que efetivamente houve abuso no registro do site, tendo sido o domínio retirado do ar e entregue a sua posse à Microsoft.
Há inúmeros outros casos relatados de typosquatting, e, tal como o cybersquatting, esse tipo de prática também pode ser utilizado a fim de lesar economicamente o indivíduo com menor conhecimento acerca dos perigos da Internet. Nesse sentido, basta que uma pessoa mal intencionada, almejando passar pelo Banco do Brasil, por exemplo, crie um endereço de e-mail como atendimento@bancobrsail.com.br (perceba a sutil troca da ordem das letras a e s na palavra Brasil, no nome de domínio) e passe, através dele a divulgar e-mails oferecendo vantagens a quem se logar na sua conta do Banco. Assim, possibilita-se ao falsário a aquisição de todos os dados bancários de quem cair nessa verdadeira “armadilha virtual”.
A fim de evitar esses problemas, principalmente as grandes empresas, tão logo se estabelecem na Internet, tentam registrar o maior número de sites que possam ser digitados erroneamente referindo-se a seu nome original. Nesse sentido, o site orkut.com pode ser acessado através dos endereços <orcut.com>, <orcit.com>, <orkat.com>, dentre outros, todos redirecionando ao verdadeiro domínio. Dessa maneira, a empresa tentou remeter para o seu domínio principal as principais falhas de digitação possíveis de ocorrer.
5 – Conclusões
A novel Era da Informação, implantada de forma definitiva com a Internet, está modificando-se com uma rapidez nunca antes imaginada. Essas alterações se processam de maneira tal que as legislações não as conseguem acompanhar pari passu, ficando defasadas, não havendo previsões legais para as inovações surgidas.
Daí ainda se pensar que a Internet é uma “terra sem dono”, território propícia à “grilagem eletrônica”, tal como o cybersquatting e o typosquatting, pois conforme nossa Carta Magna preceitua em seu art. 5º, inciso II, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Dessarte, a utilização da Arbitragem como meio extrajudicial de solução dos litígios ocorridos na Grande Rede aparece como uma alternativa bastante viável, já que sua solução é de grande celeridade, os árbitros possuem alto conhecimento acerca do assunto da lide e não apresenta grande ônus a quem recorre a esse tipo de solução.
Mostrou-se também que essa Rede pode ser perigosa àqueles que não tiverem suficiente habilidade em observar as malícias que podem ser introduzidas de forma subreptícia em algumas mensagens propaladas através de e-mails e web sites. O cybersquatting e o typosquatting são fatores que têm desvelado inúmeros estudiosos que buscam, de forma pertinaz, medida de grande eficácia para barrar esse crescente mau uso da Internet e de suas outras ferramentas.
Fica claro, portanto, que a Grande Rede ainda está passando por período de adaptação, não estando ainda muito bem explicados alguns de seus detalhes, requerendo do Legislador muita atenção, visando tornar esse meio cada vez mais harmonioso. Com a colaboração de todos seus usuários, é certo que esses objetivos serão atingidos e se conseguirá aliar informação e divertimento sem riscos para os seus utilizadores e divulgadores.
Acadêmico do 7º semestre do curso de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC). Extensão em Propriedade Intelectual pela World Intelectual Property Organization (WIPO). Extensão em Direito da Tecnologia da Informação pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Extensão em Perícia Forense Computacional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR) – em conclusão. Colaborador da Comissão de Informática Jurídica – Ordem dos Advogados do Brasil /Seccional Ceará (CIJ – OAB/CE).
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