Introdução
Sendo o contrato de Arrendamento Mercantil, o Leasing, um contrato novo, ainda não regulado por legislação específica, muito menos pelo Código Comercial Brasileiro, controvertidos são os posicionamentos dos tribunais ao julgarem processos sobre a matéria.
Na tentativa de, dentro do possível, apresentar uma posição neutra, colocarei algumas das diferentes posições jurisprudenciais em torno do contrato de leasing. Oferecerei também um conceito técnico e apresentarei, de forma sucinta, as questões contratuais discutidas, por se tratar de um acordo de natureza contratual, finalizando com o entendimento adquirido em torno das discussões apresentadas.
Conceito: “é um contrato comercial pelo qual uma pessoa física ou empresa, desejando utilizar um bem de consumo durável (carro, avião, computador, etc.), consegue que uma instituição financeira adquira o bem desejado, alugando-o ao interessado por prazo certo, sendo que, ao término do referido prazo, o locatário possa optar pela devolução do bem, a renovação da locação ou a compra pelo preço residual fixado no momento inicial do contrato”.
Tratando-se então de um contrato, onde os partícipes estipulam as cláusulas contratuais de acordo com as suas vontades, há os que entendam que aquilo que foi acordado tem força de lei entre as partes. Essa parcela da doutrina se guia pela máxima “pactum sunt servanta”, significando que os contratos devem ser cumpridos, que apoiada pelos princípios da “autonomia da vontade”, da “liberdade para contratar” e da “igualdade das partes contratantes”, formaram o liberalismo econômico, o qual possibilitou o total desrespeito a condição humana à época da Revolução Industrial, conforme fatos históricos marcantes como a jornada de trabalho superior a 16 horas e o salário de fome.
Recente julgamento do Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, por unanimidade da 2ª Câmara, em acórdão que teve como relator o Juiz Felipe Ferreira (Bol: AASP n° 2094), decidiu: “Se o contrato foi firmado livremente entre as partes, prevalece a regra do pacta sunt sevanda. O leasing não está regido pelo Código de Defesa do Consumidor, vez que a operadora não é fornecedora, segundo o art. 3° daquele Código.”
De outro modo, um segundo posicionamento existente na doutrina a respeito dos contratos é o que admite que o espaço reservado para que os particulares auto-regulem suas relações é reduzido por normas imperativas, que passam a funcionar como orientadoras da relação obrigacional, buscando distribuir eqüitativamente os deveres e direitos, dentro da concepção do estado de bem-estar social (Welfare State).
Para essa parcela de juristas, ao contrário da teoria clássica de Savigny, segundo a qual a vontade interna deveria prevalecer sobre a vontade declarada, prevalece a teoria da confiança, valorizando a vontade declarada, com o fim de dar maior certeza às relações contratuais. Explica Cláudia Lima Marques que, segundo a teoria da confiança “admite-se a responsabilidade de alguém que, por seu comportamento na sociedade, fez nascer no outro contratante a justificada expectativa no cumprimento de determinadas obrigações”.
Valorizando então a “função social do contrato, que passa a reconhecer a influência social na necessária realização da justiça” (Wiehweg) a teoria deu origem ao Princípio da Boa-fé Objetiva, princípio este que segundo julgamento da 4ª Câmara do 2° Tribunal de Alçada Civil, na apelação sem revisão 520.951, que teve como relator o Ilmo. Juíz Moura Ribeiro (Bol. AASP, suplemento AASP 2099, pág. 1) possui dupla função na nova teoria contratual:
“1. Como fonte de novos deveres especiais de conduta durante o vínculo contratual, os chamados deveres anexos; 2. como causa limitadora do exercício antes lícito, hoje abusivo, dos direitos subjetivos ( vide arts. 4°, III; 51, IV; 30 e 31 CDC)”.
O entendimento da 4ª Câmara do 2° TACIVIL é de que as empresas de leasing, enquanto integrantes do Sistema Financeiro Nacional, sob a fiscalização do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do Brasil, enquadra-se perfeitamente nos moldes do §2° do art. 3° CDC, o qual estende às atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária os regramentos do Código. Em se tratando, as empresas de leasing, desenvolver atividades de natureza financeira, recaem sob a conceituação supracitada.
Conclusão
Nos contratos de qualquer natureza, como no caso específico do leasing, existe a necessidade imperiosa de o Estado atuar como um limitador ou regulador da relação, impedindo que, seja pela posição social, esperteza, conhecimento, poder econômico etc., uma parte tome vantagens abusivas da outra, pela situação desigual composta entre os contratantes. Fá-lo então pela lei, positivando princípios consagrados do Direito como a “Boa-fé”, a “igualdade das partes contratantes” a “liberdade para contratar”, e impondo limites, ou seja, restringindo as suas aplicações práticas, possibilitando assim a averiguação caso a caso, desigualando os desiguais na busca da igualdade objetiva, criando deveres anexos, limitando, até mesmo, a faculdade de um sujeito mover a máquina estatal na busca de uma pretensão que, por conta do contrato, se tornou impossível.
O Código do Consumidor, por ser um código novo, oriundo de profundas pesquisas jurídicas realizadas no âmbito mundial, trouxe ferramentas extremamente poderosas que servem de proteção àquelas pessoas físicas ou jurídicas que se utilizam de produtos ou serviços. A sua aplicabilidade ao contrato de arrendamento mercantil é evidente ao passo que a Resolução n° 351,do BCB no seu art.3° dá, às empresas que realizam operações de arrendamento mercantil, o mesmo tratamento que às instituições financeiras e, com a evolução trazida pela Lei 7.132 de 26-10-83, extendendo o leasing às pessoas físicas, estes se enquadram também no art.3° §2° do CDC por realizarem atividade no mercado de consumo, de natureza financeira.
Por estes fundamentos, improcedente deve ser julgado o posicionamento da 2ª câmara daquele TACIVIL.
Estudante de Direito da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA. Bolsista do Fundo – PROICT/ULBRA
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