Resumo: Este artigo trata do instituto da exceção de pré-executividade sob o enfoque da Fazenda Pública. Após a necessária conceituação da temática, será abordada, de maneira exemplificativa, hipóteses de cabimento do mencionado remédio processual na defesa dos entes públicos em juízo, sempre com suporte em doutrina especializada e na jurisprudência atinente à matéria.
Palavras-chave: Exceção. Pré-executividade. Fazenda. Pública. Cabimento.
Abstract: This article deals with the office of pre-execution exception under the focus of Exchequer. After the necessary concepts of theme, will be dealt with, illustrative way, chances of place of mentioned procedural remedy in the daily lives of the defense of public entities in judgment, always with support in specialized teaching and in case law with regard to the matter.
Keywords: Exception. Pre-execution. Exchequer. Place.
Sumário: Introdução. 1. Sobre a exceção de pré-executividade. 2. Algumas hipóteses de cabimento. 2.1. Descompasso entre valor executado e título executivo judicial. 2.2. Desrespeito ao devido processo legal. 3. Da necessária proteção ao patrimônio coletivo. Conclusão. Referências.
Introdução
Dentro do cotidiano da defesa da Fazenda Pública em âmbito judicial, os advogados públicos das três esferas de poder (municipal, estadual e federal) deparam-se com inúmeras situações práticas nas quais necessitam valer-se da arma processual mais eficiente a fim de coibir qualquer espécie de ameaça ao bem público. Nesse panorama, o presente trabalho objetiva trazer uma pequena contribuição aos mencionados profissionais do Direito, no sentido de esclarecer a importância da exceção de pré-executividade em determinadas ocasiões, as quais serão melhor destrinchadas a seguir.
1. Sobre a exceção de pré-executividade
Meio endoprocessual de insurgência do devedor contra a pretensão executória do credor, a exceção de pré-executividade já está sedimentada no panorama jurídico brasileiro, muito embora careça de expressa contemplação legislativa. Seu objetivo principal é permitir ao executado aventar matérias de ordem pública para apreciação na própria fase executiva, porquanto tais questões podem ser conhecidas de ofício pelo magistrado.
No que diz respeito mais especificamente à defesa da Fazenda Pública no curso da execução, a oposição de embargos (Código de Processo Civil, art. 730) é a forma de irresignação mais corriqueira. Trata-se de ação independente, na qual a argumentação está restrita aos pontos elencados nos incisos do art. 741 do CPC.
Há casos, entretanto, em que a exceção de pré-executividade ascende como meio necessário para a proteção dos interesses da Fazenda Pública – e do interesse público, em última análise. Aponta a doutrina uma dessas situações:
“Há, no entanto, uma possibilidade de a Fazenda Pública apresentar a exceção de pré-executividade: quando perdido o prazo para embargos, houver uma questão de ordem pública que cause a nulidade da execução ou que enseje sua extinção. Nessa hipótese, poderá a Fazenda Pública ajuizar a exceção de pré-executividade, defendendo-se por meio de uma mera petição.” (CUNHA, 2012, p. 381-382).
De forma esclarecedora, afirma Luiz Guilherme Marinoni:
“Admite-se possível ao executado apresentar no curso da execução, independentemente de momento apropriado ou de cautela especial, certas defesas evidentes. Entende-se que sujeitar o executado a vários requisitos formais – como prazo específico ou, no regime anterior, a prévia segurança do juízo pela penhora – para que possa deduzir tais defesas seria excessivo exagero, ante a manifesta injustiça do prosseguimento da execução. Por isto se permite que estas defesas sejam apresentadas, sob qualquer formato, no curso da execução.(…)
Outrossim, a sua alegação está condicionada à inexistência de prévia decisão acerca do assunto. Assim, se a questão já foi objeto de deliberação judicial antes da sentença, no curso da execução ou, ainda, na decisão de impugnação, não se pode admitir nova discussão a seu respeito.” (2008, p. 315 e 316).
Assim, seguindo a linha dos pensamentos acima esposados, outra situação de cabimento da exceção de pré-executividade – além do escoamento do prazo para embargos – seria na hipótese da matéria executiva controvertida não ter sido objeto de efetiva manifestação judicial, pois os argumentos do devedor careceriam de apreciação em seu mérito. Tais argumentos, frise-se, têm de prescindir de dilação probatória e devem versar sobre questões de ordem pública, não se sujeitando, portanto, às regras e prazos ordinários de preclusão.
Dessa maneira, enquanto não quitado o débito sobre o qual controvertem exequente e executado, é possível a este lançar mão do já referido incidente processual. Sobre o tema, leciona Araken de Assis:
“Não há termo final para deduzir a exceção de pré-executividade. Ressalva feita aos casos de preclusão, a exemplo do que acontece com a impenhorabilidade, e sem embargo da responsabilidade pelas despesas derivadas do retardamento (art. 267, § 3º) – e, assim mesmo, se a arguição ocorrer após o prazo para embargos –, ao executado se mostra lícito excepcionar em qualquer fase do procedimento ‘in executivis’, inclusive na final: na realidade, permanece viva tal possibilidade enquanto o juiz não extinguir o processo” (2008, p. 1074).
Dada a sua notória importância, a temática encontra-se sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça:
“Súmula 393: A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.”
Em que pese o texto sumular fazer menção direta à execução fiscal, tal baliza pretoriana deve ser estendida para os diversos tipos de demandas executivas, inclusive nos casos em que a Fazenda Pública esteja situada no polo passivo da relação processual.
Seguindo a linha do estudo, vale consignar que a doutrina e jurisprudência especializadas indicam como típicas para o uso da exceção de pré-executividade as circunstâncias em que seja preciso alegar prescrição, decadência, litispendência, ausência de pressupostos processuais ou de alguma das condições da ação, dívida já quitada, obrigação inexistente, etc.
2. Algumas hipóteses de cabimento
O enfoque dado adiante, por seu turno, será em duas hipóteses emblemáticas sob o ponto de vista da defesa judicial da Fazenda Pública.
2.1. Descompasso entre o valor executado e o título executivo judicial
Como é de palmar conhecimento, a sentença (nas execuções de título judicial) deve ser o espelho da pretensão executória do credor. Desse modo, não se aceitar a exceção de pré-executividade como veículo hábil a frear qualquer descompasso entre a sentença exequenda e a execução efetivamente proposta é criar mais uma hipótese de rescisão da coisa julgada, porque, em termos práticos, o que se verificaria nessa situação seria a mudança do comando decisório expresso no decisum.
Não são raros os processos em que o credor da Fazenda Pública violenta o teor da sentença condenatória, apresentando, na fase executiva, planilha de cálculos com parâmetros completamente dissonantes da decisão de mérito. A inexatidão, em certas ocasiões, pode advir da própria contadoria judicial, o que não retira (ao contrário, eleva) a necessidade de retificação. Por sua clareza e essencialidade, confira-se o seguinte julgado:
“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA. DISPOSITIVO TRÂNSITO EM JULGADO. CORREÇÃO A QUALQUER TEMPO. POSSIBILIDADE. RESPEITO À COISA JULGADA. OBEDIÊNCIA AOS LIMITES DEFINIDOS PELO JULGADOR DO PROCESSO DE CONHECIMENTO.
1. Fixado pela sentença trânsita, o termo a quo da fluência dos juros, é defeso modificá-lo na execução, cujo escopo é tornar efetivo o julgado, sem ampliá-lo.
2. A correção do rumo da execução, para fins de dar fiel cumprimento ao dispositivo da sentença trânsita em julgado pode ser engendrada de ofício pelo Juiz, em defesa da coisa julgada, atuar que só preclui com o escoamento do prazo para a propositura da ação rescisória.
3. A execução que se afasta da condenação é nula (nulla executio sine previa cognitio), por ofensa à coisa julgada, matéria articulável em qualquer tempo e via exceção de pré-executividade.
4. O processo de execução de título judicial não pode criar novo título, o que ocorreria, in casu, acaso se considerasse a possibilidade do cômputo de juros moratórios a partir de termo a quo diverso daquele estabelecido em decisão final transitada em julgado.
5. Consequentemente, mesmo diante da ausência de impugnação específica da Fazenda Nacional em relação à inexatidão engendrada pela Contadoria Judicial quanto ao cômputo dos juros moratórios a partir da citação, e não do trânsito em julgado, revela-se possível sua correção ex officio pelo Magistrado, porquanto medida de defesa da Jurisdição conquanto conferidora da segurança das decisões judiciais passadas em julgado.
6. Precedentes doutrinários e jurisprudenciais.
7. Recurso especial conhecido e improvido”. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 531.804/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 25/11/2003, DJ 16/02/2004, p. 216. )
Outro indicativo nítido da possibilidade do uso da exceção de pré-executividade pela Fazenda Pública na hipótese ora analisada é o disposto no artigo 1o-E da Lei nº 9.494/97:
“São passíveis de revisão, pelo Presidente do Tribunal, de ofício ou a requerimento das partes, as contas elaboradas para aferir o valor dos precatórios antes de seu pagamento ao credor.” (Incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001).
Num simples exercício interpretativo, se as contas que serviram de base para os precatórios podem ser revistas antes do efetivo pagamento ao credor da Fazenda Pública, nada mais lícito do que concluir que a correção judicial para as ofensas ao título executivo pode ser efetivada em momento anterior, no curso da execução de sentença, via exceção de pré-executividade.
2.2. Desrespeito ao contraditório e ao devido processo legal
Direitos de envergadura constitucional (Constituição Federal, art. art. 5º, LV) o contraditório e a ampla defesa são elementos componentes do mega-princípio do devido processo legal que, na lição doutrinária, “[…] deve ser uma realidade durante as múltiplas etapas do processo judicial, de sorte que ninguém seja privado de seus direitos, a não ser que no procedimento em que este se materializa se constatem todas as formalidades e exigências em lei previstas”. (TUCCI, 1999, p. 259).
Quando se fala na necessidade de observância do devido processo legal ‘durante as múltiplas etapas do processo judicial’, inclui-se, evidentemente, a fase executiva. No curso da execução contra si dirigida, deve ser oportunizada à Fazenda Pública a possibilidade de eficiente manifestação acercas dos aspectos formais e materiais da pretensão, sob pena de absoluta nulidade do procedimento. Sobre o contraditório, professa Fredie Didier Jr.:
“O processo é um instrumento de composição de conflito – pacificação social – que se realiza sob o manto do contraditório. O contraditório é inerente ao processo. Trata-se de princípio que pode ser decomposto em duas garantias: participação (audiência; comunicação; ciência) e possibilidade de influência na decisão.” (2009, p. 56/57).
Acerca da necessidade de observância do contraditório na fase de execução, ensina abalizado doutrinador fluminense:
“É certo que no processo de execução o juiz não é chamado a prover o mérito da causa, não havendo nesse tipo de processo julgamento da pretensão do demandante ou declaração da existência do crédito exigido. Ocorre, porém, que no processo de execução o juiz é chamado, a todo momento, a proferir decisões quanto a questões como as referentes à presença das condições da ação e dos pressupostos processuais, ou dos requisitos necessários para a prática dos atos executivos.” (CÂMARA, 2007, p. 54).
Fixadas essas premissas, calha aduzir que a exceção de pré-executividade pode coibir o desrespeito ao devido processo legal quando a mácula se materializar no curso da execução e, por exemplo, o prazo legal de trinta dias para oposição de embargos restar esgotado. Há, também, a hipótese da violação ao mega-princípio se dar em momento processual posterior aos embargos à execução, como no caso de o magistrado julgar procedente o pedido contido nos embargos da Fazenda Pública, decotando o excesso de execução, mas, em seguida, determinar a quitação do débito por meio diverso do previsto em lei (precatório e requisição de pequeno valor) ou sem obedecer às formalidades legais.
Na mesma linha, urge apresentar a exceção de pré-executividade se, porventura, o juiz da execução de alguma maneira embaraçar ou impedir a oposição dos embargos. A título de exemplo, imagine-se a hipótese de o magistrado não citar a Fazenda Pública para opor embargos e, posteriormente, intimá-la já na fase de expedição do precatório ou da requisição de pequeno valor. De igual modo, cabe a exceção no caso de ausência de intimação da decisão que não receber os embargos à execução. Se não há ciência, não há como interpor o recurso cabível. Seguindo o processo executivo o seu curso mesmo assim, e o Juiz ulteriormente alegar a ocorrência de preclusão em face da Fazenda Pública, a exceção de pré-executividade, mediante simples petição nos autos, deve ser apresentada. Entretanto, na hipótese do Julgador não conhecer da exceção e seguir firme no propósito de negar ao Ente Público o direito de se defender eficientemente, o caminho a seguir será a interposição de agravo de instrumento ao Tribunal competente.
Em suma, na fase executiva, qualquer medida judicial constritiva ou potencialmente constritiva de direitos da Fazenda Pública, que não atente para os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, pode ser objeto de impugnação via exceção de pré-executividade.
3. Da necessária proteção ao patrimônio coletivo
Conforme visto alhures, a execução contra a Fazenda Pública traz em si embutido o risco iminente de afetação, legítima ou ilegítima, dos recursos financeiros do Poder Público. Sendo assim, salvaguardar o erário contra pretensões executórias tendentes a lesá-lo pode muito bem ser considerado como o fim último de ambas as hipóteses de cabimento da exceção de pré-executividade anteriormente mencionadas.
Nessa esteira de intelecção, explana Leonardo José Carneiro da Cunha:
“Ademais, em se tratando de verbas públicas, deve-se exigir a aplicação do princípio da moralidade que, em confronto com a garantia da coisa julgada, enseja a aplicação do princípio da proporcionalidade para empreender a aplicação da tese da relativização da própria coisa julgada em favor da moralidade administrativa, evitando-se desvios de verbas públicas e pagamentos indevidos com recursos orçamentários.” (2012, p. 382).
Como é cediço, o enriquecimento ilícito é algo abominado pela ordem jurídica, muito mais quando o lesado é o tesouro público. Isso porque, por via de consequência, todos são prejudicados quando o interesse público é atingido.
Conclusão
Imperioso concluir, portanto, que ao responsável pela defesa judicial da Fazenda Pública é atribuída a missão de se voltar, com base nos elementos dos autos, contra a ameaça de direcionamento do dinheiro público para quem não possui – total ou parcialmente – alicerce firme a sustentar sua sanha executória. Já ao Magistrado que comanda o curso da execução, quando é requerido que conheça da exceção de pré-executividade manejada pela Fazenda Pública, são confiadas basicamente duas funções: zelar pela supremacia do interesse público sobre o interesse particular e fazer imperar a justiça no caso concreto.
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