Resumo: O escopo do presente consiste em analisar o Ministério Público em sua evolução histórica inserta nas Constituições Brasileiras. O órgão em tela conquistou o status atual em meio a dificuldades diversas, principalmente, no tocante a definição de sua localização na organização estrutural dos textos constitucionais, que, consequentemente, projetava a ideia de sua vinculação a um Poder específico. Sua independência funcional sempre foi tolhida, até o advento da Constituição Federal de 1988, quando sua presença se tornou exponencial, propiciando sua figuração como instituição dotada da grande confiabilidade popular hodiernamente alcançada. Empregou-se o método indutivo, utilizando-se de revisão bibliográfica com a análise dos diplomas legais contextualizados à temática[1].
Palavras-chave: Ministério Público. Evolução Histórica. Constituições Brasileiras.
Sumário: 1. Introdução; 2. Histórico do ministério público nas constituições brasileiras; 3. Reconfiguração do ministério público na Constituição Federal de 1988; 4. As funções do ministério público pós Constituição Federal de 1988; 5. Conclusão.
1 INTRODUÇÃO
A evolução do Ministério Público, tanto em contexto mundial quanto em terras nacionais é a evolução dos objetivos basilares do próprio direito. A figura do parquet traz consigo a ideia de luta pela justiça, da representatividade social e, ultimamente, da efetividade dos direitos da coletividade mesmo em caráter extrajudicial. Neste sentido, denota ainda, celeridade na resolução de questões, munidas da possibilidade de se dirimir demandas por vias menos traumáticas e mais conciliadoras que as judiciais.
Nota-se, ao longo da história, que as Constituições Federais, paulatinamente, fortaleceram a instituição, conferindo-lhe a necessária autonomia que hoje se encontra já estabelecida. Longe de uma gradação isolada, o Ministério Público desenvolveu-se atrelado ao contexto de cada época, mas em todas elas manteve sempre a postura, respeitados os limites culturais inerentes a cada momento histórico, de pleiteador dos direitos declarados nas leis vigentes, avançando rumo a um Estado Democrático de Direito nos moldes almejados e alcançados atualmente.
A projeção da instituição ocorreu por uma necessidade social não preenchida. Perceber-se-á que a burocracia anteriormente marcante no Órgão, deu lugar ao dinamismo que culminou com atribuições diversas, todas elas ligadas de algum modo à promoção dos direitos fundamentais do cidadão, seja individual, seja coletivamente. Uma plêiade de possíveis ações em diversas áreas que transformaram o Ministério Público em curador de inúmeros seguimentos sem voz, ou, com legitimidade anteriormente passível de desequilíbrio de força no campo processual.
Assim, este artigo se propõe a uma análise da evolução do Ministério público nas Constituições Brasileiras, avaliando os pontos mais evidenciados em cada Lei Máxima relacionados ao parquet, culminando com a presença do Órgão na Constituição atual e os novos caminhos nas décadas subsequentes à promulgação da Constituição de 1988 com seus novos e constantes desafios não só ao Ministério Público, mas para o ordenamento jurídico nacional.
2 HISTÓRICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
Antes mesmo de se traçar uma evolução histórica sobre o Ministério Público pautada nas Constituições editadas até a atualidade, faz-se necessária uma abordagem que permita compreender seu surgimento no Brasil. Em sua obra “Curso de Direito Constitucional”, o professor Uadi Lamnêgo Bulos oferece uma visão geral dos atos que originaram o Órgão em pauta, no contexto nacional. Bulos (2015) esclarece que as figuras do procurador dos feitos da Coroa e do promotor de justiça surgiram com a criação do Tribunal de Relação da Bahia por meio do Alvará de 7 de março de 1609.
Alguns séculos depois, em 1832, encontra-se a referência ao “promotor da ação penal” no Código de Processo Criminal do Império. Posteriormente, o Decreto nº 120, de 21 de janeiro de 1843, regulamentou o Ministério Público brasileiro, estabelecendo os critérios de nomeação dos promotores. Na sequência, já em 1876 com a Consolidação Ribas, aparecia, sem, contudo, ser o chefe dos procuradores, o procurador da Coroa. Com o Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890, o órgão ministerial obteve maior relevância, por obra do precursor da independência do Ministério Público, Campos Salles, então Ministro da Justiça do Governo Provisório. Na exposição de motivos do referido Decreto, que dispunha sobre a Lei Orgânica da Justiça Federal, explicita-se:
“[…] o Ministério Público é instituição necessária em toda organização democrática e imposta pelas boas normas de justiça, à qual compete: velar pela execução das leis, decretos e regulamentos que devam ser aplicados pela Justiça Federal e promover a ação pública onde ela convier” (BRASIL, 1890)
Ainda em 1890, “veio a lume o Decreto n. 1.030, que implementou, definitivamente, o Ministério Público no Brasil” (BULOS, 2015, p. 1401). Este decreto organizava a instituição em sua atuação no Distrito Federal, e preceituava que deveria o Parquet:
“[…] funcionar como “o advogado da lei, o fiscal de sua execução, o procurador dos interesses gerais, o promotor da ação pública contra todas as violações do direito, o assistente dos sentenciados, dos alienados, dos asilados e dos mendigos, requerendo o que for a bem da justiça e dos deveres da humanidade”. (SOUZA, 2004, p. 7)
Em se tratando especificamente da presença da instituição nas Constituições Brasileiras, observa Alexandre de Moraes (2014) não haver alusão ao Ministério Público na Constituição Imperial de 1824. Ainda que não haja referência ao órgão, o art. 48 da Constituição apontada confere ao procurador da Coroa e a Soberania Nacional o dever de acusar nos crimes em que a acusação não pertencesse à Câmara dos Deputados (BULOS, 2015). Afora o artigo 48, não há “outra menção à instituição, que se encontrava desorganizada e desarticulada, o recrutamento de seus membros ocorria de maneira precária, já que não era suficiente o número de bacharéis diplomados” (POLI, 2010, p. 3).Nota-se apenas referência aos promotores públicos, na Constituição de 1824. A atuação desses agentes ocorreu anos depois, no já citado Decreto nº 120 de 21 de janeiro de 1843, “onde se constata a ausência absoluta de garantias e de independência em relação ao Poder Executivo” (PORTO, s.d., p. 3):
“Os promotores serão nomeados pelo Imperador no Município da Corte, e pelos presidentes nas províncias, por tempo indefinido; e servirão enquanto convier a sua conservação ao serviço público sendo, caso contrário, indistintamente demitidos pelo Imperador, ou pelos presidentes das províncias nas mesmas províncias”. (BRASIL, 1843).
Como em muitos países, defende Porto (s.d.), o Ministério Público tem sua legalização primeiramente no plano infraconstitucional, antes de se situar no cenário constitucional onde hoje se encontra. A Constituição de 1891 originou-se a partir de dois poderes constituintes, o do Governo Provisório, dito revolucionário e fático, e o poder constituinte do Congresso Nacional, considerado soberano e direito, explica Souza (2004). Era necessária à época que as instituições existentes fossem estáveis, o que gerou o engajamento do Governo Provisório no sentido de estabelecer uma forma estrutural organizada para cumprimento efetivo das funções do Ministério Público, objetivo que Campos Salles procurou alcançar e que se esperava estar concretizado na Carta constitucional. Contudo, o art. 58 da Constituição Brasileira de 1891 trazia o seguinte texto:
“Art. 58. Os Tribunaes Federaes elegerão de seu seio os seus presidentes e organizarão as respectivas secretarias.
§ 1o A nomeação e a demissão dos empregados de secretaria, bem como o provimento dos officios de justiça nas circumscripções judiciarias, compete respectivamente aos presidentes dos tribunaes.
§ 2o O Presidente da Republica designará, dentre os membros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador Geral da Republica, cujas attribuições se definirão em lei” (BRASIL, 1891).
Mantinha-se, assim, o costume da época imperial, havendo apenas uma referência a nomeação do Procurador-Geral da República e escolha privativa do Chefe do Executivo entre membros da cúpula do Poder Judiciário. Nos anos seguintes, o que se viu foi a paulatina codificação do direito brasileiro com a promulgação do Código Civil de 1917, Código Penal de 1940 e Código de Processo Penal em 1941, sendo que o Código Civil conferiu ao Ministério Público diversas atribuições, dentre as quais: curadoria das fundações; legitimidade para propor ação de nulidade de casamento; defesa dos interesses de menores; legitimidade para propor ação de interdição; legitimidade para promover a nomeação de curador de ausente.
Data deste período ainda, a discussão basilar e interminável sobre a natureza jurídica do Ministério Público, que, nas palavras do Ministro Alfredo Valladão, apresenta-se como um verdadeiro poder de Estado, defensor da sociedade e da lei, explica Souza (2004). Ressalta Alexandre de Moraes (2014) uma maior preocupação da Constituição de 1934 com o Ministério Público, “regulando-o no Título I (Da organização Federal), Capítulo VI (Dos órgãos de cooperação nas actividades governamentais), Secção I (Do Ministério Público)” (MORAES, 2014, p. 615).
Porto (…) defende que a denominação dada no Capítulo VI da Constituição de 1934, a saber: “órgão de cooperação nas atividades governamentais” é ainda mais precisa do que a que foi adotada pela Constituição Federal de 1988. Ainda que na Lei Maior de 1934 o Procurador-Geral continuasse sendo nomeado pelo Presidente da República, já se fazia necessária a aprovação prévia do Senado e os outros integrantes da instituição deveriam ingressar por meio de concurso público, adquirindo então, estabilidade. O tratamento cuidadoso explicitado por Moraes fica manifesto ao se deparar com o contido no texto da Constituição Federal de 16 de julho de 1934 conforme se segue:
“CAPITULO VI
DOS ORGÃOS DE COOPERAÇÃO NAS ATIVIDADES GOVERNAMENTAIS
SECÇÃO I
Do Ministerio Publico
Art 95. O Ministerio Publico será organizado na União, no Districto Federal e nos Territorios por lei federal, e, nos Estados, pelas leis locaes.
§ 1.º O Chefe do Ministerio Publico Federal nos juizos communs é o Procurador Geral da Republica, de nomeação do Presidente da Republica, com approvação do Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos estabelecidos para os Ministros da Côrte Suprema. Terá os mesmos vencimentos desses Ministros, sendo, porém, demissivel ad nutum .
§ 2º Os Chefes do Ministerio Publico no Districto Federal e nos Territorio serão de livre nomeação do Presidente da Republica dentre juristas de notavel saber e reputação illibada, alistados eleitores e maiores de 30 annos, com os vencimentos dos Desembargadores.
§ 3.º Os membros do Ministerio Publico creados por lei federal e que sirvam nos juizos communs, serão nomeados mediante concurso e só perderão os cargos, nos termos da lei, por sentença judiciaria, ou processo administrativo, no qual lhes será assegurada ampla defesa” (BRASIL, 1934).
Outras importantes contribuições desta Constituição são, primeiramente, a “lógica atribuição do Procurador-Geral da República, de acompanhar a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo” (SOUZA, 2004, p. 8) e, em segundo lugar, a instituição do chamado “Quinto” constitucional, que prevê a composição de um quinto dos membros dos Tribunais por indivíduos provenientes do Ministério Público e Advocacia, de forma alternada, segundo art. 104, § 6º da referida Constituição:
“§ 6.º Na composição dos tribunaes superiores serão reservados lugares, correspondentes a um quinto do numero total, para que sejam preenchidos por advogados, ou membros do Ministerio Publico de notorio merecimento e reputação illibada, escolhidos de lista tríplice, organizada na fórma do § 3º” (BRASIL, 1934).
Ainda o artigo 76 da Carta Magna de 1934 estabelece ao parquet a titularidade da revisão criminal, ex-officio, em benefício dos condenados. Assim, por muito pouco, não alcançou o Ministério Público, por meio desta Constituição, independência institucional e política para cumprir seu papel perante a sociedade, explica Poli (2010). Houve um claro retrocesso com a Carta Federal de 1937, outorgada após o golpe de Estado apoiado por militares. Moraes (2014), ainda, aponta apenas breves referências ao Órgão na Carta, no título sobre o Poder Judiciário, mais especificamente ao Supremo Tribunal Federal.
Em seu art. 99 trazia a previsão da investidura do chefe do Ministério Público Federal que seria de livre nomeação e exoneração do Presidente da República. Previa ainda, no art. 101, parágrafo único, possibilidade de interposição de recursos pelo parquet e no art. 105 tratava do chamado “quinto constitucional”, que seria apenas aplicável em tribunais superiores. “Cria-se a máxima, que se veria repetida no Golpe Militar de 31 de março de 1964: regime ditatorial forte, Ministério Público fraco”, destaca Souza (2004). Mendes e Branco (2015), expondo ideia de Hugo Mazzilli, concordam que houve avanço, na fase referida, no campo infraconstitucional, distinguindo:
“[…] como marco relevante, o Código de Processo Penal de 1941, que tornou regra a titularidade da ação penal pelo Ministério Público. No plano cível, o papel do Ministério Público foi também ganhando realce como fiscal da lei e como parte. Além dos dispositivos pertinentes dos Códigos de Processo de 1939 e de 1973”. (MENDES; BRANCO, 2015, p. 1028)
Souza (2004) comenta que o Código de Processo Civil de 1939 estabeleceu a obrigatoriedade da intervenção do Ministério Público como custus legis, com o Promotor de Justiça, em determinados tipos de lides, apresentando seu parecer em prol do interesse público, após a manifestação das partes. Sua participação tinha o objetivo de proteger os valores sociais considerados indisponíveis ou mais importantes, incluindo-se a defesa da propriedade privada. Apesar de, no campo constitucional, a instituição regredir, o historiador gaúcho Axt Günter acentua que:
“[…] paradoxalmente, nos Estados, o Ministério Público não deixou de crescer, tanto em envergadura quanto em atribuições. O Código de Processo Civil, de 1939, e o Código de Processo Penal, de 1941, consolidaram atribuições e padronizaram procedimentos em todo o País. Nesse sentido a instituição acompanhava as tendências de complexificação das relações sociais e de ampliação da esfera de intervenção do Estado na sociedade. Em contrapartida, houve um verdadeiro refluxo em matéria das garantias funcionais”. (AXT, 2001 apud PORTO, s.d., p. 5)
Nascida em um movimento contra o Estado Novo, a Constituição de 1946 devolveu ao país o princípio federativo e forneceu uma grande autonomia aos Estados e Municípios. Procurou restaurar as prerrogativas comuns aos regimes democráticos dos poderes Legislativo e Judiciário. Deixava, o Ministério Público, de figurar como um instrumento político dos governantes, consolidando a independência do parquet, explica Poli (2010). Tal independência se manifesta, inclusive, na preferência da Constituição de 1946 em situar o Órgão em título especial, considerando que os artigos 125 a 128 encontram-se no “Título III – Do Ministério Público”, independente dos demais poderes do Estado. Moraes (2014) enumera outras importantes implementações empreendidas por esta Lei Maior no que tange ao Parquet. A necessidade de concurso público para ingresso na carreira, além da inamovibilidade e estabilidade são previstas como norma constitucional:
“Importante previsão era a do art. 127, que proclamava três importantes regras: concurso público, estabilidade e inamovibilidade. Assim, ficou determinado que os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressariam nos cargos iniciais da carreira mediante concurso e, após dois anos de exercício, não poderiam ser demitidos senão por sentença judiciária ou mediante processo administrativo em que lhes facultasse a ampla defesa; nem removidos, a não ser mediante representação motivada do chefe do Ministério Público, com fundamento em conveniência do serviço”. (MORAES, 2014, p. 616)
Os Ministérios Públicos Estaduais deveriam observar essas regras. A escolha do Procurador-Geral da República deveria ocorrer entre cidadãos com a idade de 35 anos, notável saber jurídico e libada conduta, segundo o art. 99, mesmos requisitos exigidos para Ministro do Supremo Tribunal Federal, havendo a necessidade da aprovação do Senado Federal quanto a escolha do Presidente da República. Havia também previsão da participação do Ministério Público na composição do Tribunal Federal de Recursos, no art. 103, bem como a transferência da regra do “quinto constitucional” para a Justiça Estadual. Finalmente, e não menos importante, o art. 126, parágrafo único, deixou sob o encargo de o Ministério Público representar a União em juízo.
A Constituição de 1946 vigeu, teoricamente, até 1966. Poli (2010) destaca, entretanto, que de fato, de 1964 a 1966 foram editados quatro atos institucionais e quinze emendas constitucionais, que ao final, somados posteriormente ao AI-5, promoveram uma verdadeira barbárie no país. A Constituição de 1967 colidia com a realidade autoritária da época. Na Lei Máxima de 1967, o parquet foi recolocado dentro do capitulo que tratava do Poder Judiciário, sem maiores inovações em relação às Constituições anteriores. Souza (2004) encontra um fator positivo na localização destinada ao Órgão que “ao vir a integrar o Título que tratava do Poder Judiciário, o Ministério Público deu importante passo na conquista de sua autonomia e independência, através da importante e aguardada equiparação com os juízes” (SOUZA, 2004, p. 9).
O maior avanço para a instituição na opinião de Porto, foi a abolição dos concursos internos, que sempre permitiam influências políticas poderosas, dando lugar ao concurso de provas e títulos, previsto no § 1º do art. 138 da Constituição de 1967. Nova regressão se apresentou com a Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, Constituição outorgada, que demoveu a imparcialidade e independência do parquet, subordinando-o ao Poder Executivo, suprimindo ainda a oitiva do Senado Federal quando da nomeação do Procurador-Geral da República. Nos anos 70, o termo Ministério Público começa a ser conhecido da população em geral e ganha perfil voltado para a defesa dos direitos sociais, os direitos humanos de segunda geração:
“A Emenda nº 7 de 1977 cunhada na abertura “lenta, gradual e segura”, do Governo Ernesto Geisel, alterou o artigo 96 da Constituição de 1969, que autoriza os Estados a organizarem a carreira de seus Ministérios Públicos, por meio de leis estaduais. Através desta Emenda ficava estabelecida a possibilidade da União ditar normas genéricas a serem adotadas na organização dos Ministérios Públicos Estaduais, através de Lei Complementar de iniciativa do Chefe do Poder Executivo. Era mais uma tentativa de centralizar as diretrizes na formação do Ministério Público brasileiro.
Desta forma, promulgada foi a Lei Complementar nº 40 de 14/12/1981 que traçou um novo perfil ao Ministério Público, asseverando, em seu art. 1º que era “instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, é responsável, perante o Judiciário, pela defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da sociedade, pela fiel observância da Constituição e das Leis”. Tal definição viria a ser praticamente repetida no artigo 127 da Constituição Federal de 1988” (SOUZA, 2004, p. 10).
A evolução que se delineou desde que, em sua origem, o Ministério Público assumia o papel “de advogado da Coroa e da Administração Pública” (PORTO, s.d., p 11), ganhou autonomia, com o processo de democratização mundial, para se tornar, finalmente, o defensor do povo de forma exclusiva e principal. Goular (1998), destaca Porto (s.d) baseado do conceito de Gramsci de um Estado subdivido em sociedade política e sociedade civil, analisa que, nas últimas décadas, o Ministério Público adota uma nova função por se deslocar da sociedade política para sociedade civil. Não compõe mais o aparelhamento coercitivo do Estado, ao contrário, é parte integrante dos órgãos que promovem a democracia através da transformação da realidade, representando valores que simbolizam e incorporam os anseios da população. Remete ainda, Porto (s.d), essa condição do parquet de defensor do povo, à figura romana do “Tribuno da Plebe”, possuidor de imunidades no Senado romano, para poder, de maneira independente, realizar suas funções.
3 RECONFIGURAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Uma das questões que sempre marcou a inserção do Ministério Público nas Constituições Federais foi sua vinculação aos Poderes de Estado. Há grande discussão, ressalta Dirley da Cunha Júnior (2013), quanto à divisão do Estado atribuída nos três poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Isto porque o Estado tem poder uno, com divisão apenas funcional. Assim, haveria de ser falar em três funções do Estado, ainda que seja de adoção geral, a já arraigada denominação de poderes. Por sua vez, o Ministério Público não compõe nenhum poder estatal, é independente e autônomo. Ainda assim, foco de grande polêmica quanto a ter semelhanças de um quarto poder, no ano de 2003 o Supremo Tribunal Federal alocou o parquet, ao tratar de uma ação declaratória de inconstitucionalidade, sob a égide do Poder Executivo. Garcia (apud CUNHA JÚNIOR, 2013), esclarece que a Suprema Corte seguiu um raciocínio de exclusão, uma vez que o Ministério Público não pode ser considerado um órgão jurisdicional nem legislativo, devendo ser integrado ao poder Executivo. Cunha Júnior (2013) entende que não há obstáculo em haver órgãos sem vinculação a nenhum dos poderes, partindo-se de uma interpretação sistemática da Constituição, pois, sob um prisma teleológico, o parquet, na perspectiva do autor, pode ser tomado com um quarto poder.
O mais importante a salientar, é que o advento da Constituição Federal de 1988, promoveu a necessidade de se buscar a consolidação plena do Estado Democrático de Direito e, para tanto, a construção de mecanismos que garantissem a concretização de tal objetivo. Neste sentido, cuida explicitar que um Estado fundado na dignidade da pessoa humana carecia de instrumentos que realizassem a profunda transformação social proposta pela Constituição vigente. Daí advém a importância salutar do Ministério Público na referida Carta Magna, órgão eleito para zelar pelos valores e princípios de um Estado de justiça social “cuja missão está diretamente relacionada à defesa do Estado Democrático de Direito, da cidadania e da dignidade da pessoa humana” (DAHER, 2016, p. 299).
Para promover mudança que se construiu ao longo da história das Constituições, a Lei Maior vigente localizou o Ministério Público no capítulo denominado “Funções Essenciais à Justiça”, em que também trata da advocacia pública, da defensoria pública e da advocacia privada. Essenciais exatamente porque o judiciário não atua de ofício, tornando-se imprescindível pessoas ou órgãos que atuem perante o poder Judiciário ainda que não o integrem. Observam Paulo e Alexandrino (2015) a destacada importância da existência de órgãos como o Ministério Público que atuem na defesa dos interesses da sociedade, com competências e titularidades diversas, independência e autonomia. A busca pela delimitação do posicionamento institucional do parquet, conforme elucida Bulos (2015), tem o condão de aferir uma questão mais profunda que é a natureza jurídica do Ministério Público.
Para o doutrinador, o Órgão atua desempenhando funções de natureza administrativa: “como promover ações públicas, zelar pelo regime democrático, tutelar interesses sociais e individuais indisponíveis, opinar como custus legis etc” (BULOS, 2015, p. 1404). Mais que uma evolução, Souza (2004) denomina de revolução institucional os avanços do Órgão na Constituição Federal de 1988. Enfatiza que alguns pontos são imprescindíveis serem citados no que tange as inovações relativas ao parquet na Lei Magna em questão:
“- A exclusividade para a promoção da ação penal pública, lhe sendo permitida a requisitação de investigação às autoridades públicas competentes;
– Autonomia financeira, administrativa e orçamentária embora haja colisões do art. 127, §§ 2º e 3º, da CF, com alguns dispositivos constitucionais esparsos, como os arts. 61, § 1º, II, d), e 68, § 1º, da CF;
– Consagração dos princípios institucionais da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional;
– Controle externo da atividade policial;
– Defesa de interesses transindividuais e individuais indisponíveis;
– Defesa em juízo dos difeitos e interesses de comunidades indígenas;
– Exercício de outra função, pública, ressalvando-se uma de magistério;
– Fim da representação da União e dos Estados, com a respectiva vedação à representação e consultoria de órgãos públicos:
– Indicação dos fundamentos jurídicos de suas emanações processuais;
– Missão de zelar pelo respeito mútuo entre os Poderes e pelos serviços de relevância pública;
– O Procurador-Geral da República deverá ser da carreira, e só poderá ser destituído do cargo com autorização do Senado;
– Participação da OAB nos concursos para carreira, que serão de provas e títulos;
– Percepção de vantagens pecuniárias, derivadas do exercício de suas atribuições;
– Permissão para realização direta de diligências investigatórias;
– Promoção do inquérito civil e da ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
– Promoção, nas várias formas existentes na pertinente legislação, da competente ação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo;
– Vedação a atividade político-partidária, exceto a filiação e o direito de candidatar-se ou exercer cargo eletivo;
– Vedação do exercício da advocacia;
– Vitaliciedade, inamovibilidade e total equiparação de vantagens pecuniárias com os membros do Poder Judiciário” (SOUZA, 2004, p. 14-15)
O artigo 128 da Constituição Federal estabelece os ramos abrangidos pelo Ministério Público que se dividem em Ministério Público da União, nele inclusos o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e, fora daquele, o Ministério Público dos Estados. O Presidente da República nomeará o Procurador-Geral da República, que por sua vez chefiará o órgão. Deverá ser nomeado dentre os membros de carreira, maiores de trinta e cinco anos, com aprovação prévia pela maioria absoluta do Senado Federal, com mandato de dois anos e permitida uma recondução, tendo atrelada sua destituição à autorização da maioria absoluta do Senado e ser deflagrada por iniciativa do Presidente da República.
Quanto ao Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal, esclarece Cunha Júnior (2013), deverá ser formada lista tríplice entre os integrantes de carreira, afim de que se escolha o Procurador Geral, na forma da lei, nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, que, em se tratando dos estados será o Govenador e no caso do Distrito Federal o Presidente da República, com mandato de dois anos e permitida uma recondução.
No que tange à destituição, ocorre por deliberação do poder Legislativo, que no caso dos Estados compete à Assembleia Legislativa e no Distrito Federal e Territórios pelo Senado Federal, destacando-se que neste caso, não se dá a deliberação pela Câmara Legislativa do Distrito Federal. Além dos ramos evidenciados, há ainda o Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, que, como declara Mendes e Branco (2015), não fazem parte nem do Ministério Público da União nem dos Estados. Explicam ainda que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a estatura constitucional e organização própria do Órgão, mas esse não possui autonomia administrativa, compondo a estrutura do Tribunal de Contas.
Os princípios institucionais do Ministério Público estão enumerados no art. 127, § 1º da Constituição Federal e são a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. No que se refere ao princípio da unidade, consiste na integração, por promotores e procuradores, de um só órgão dirigidos por um único chefe, esclarece Mendes e Branco (2015). “Vale a advertência de que a divisão atende a critérios eminentemente funcionais, e que a referida unidade está inserta em cada órgão ministerial” (CUNHA JÚNIOR, 2013, p. 1140) não havendo unidade entre os diversos ramos do Ministério Público da União nem entre o mesmo e o Ministério Público dos Estados. A respeito da indivisibilidade, denota de acordo com o delimitado em lei, a admissão que possa haver substituições de um por outro integrante da mesma carreira nos processos, podendo-se dizer que a atuação, neste caso, é da instituição.
A independência funcional vincula o membro do Ministério Público à sua própria consciência jurídica, no que tange assunto de sua atividade funcional. Mendes e Branco (2015) elucidam que tal independência permitiu a dedução doutrinária do promotor natural, que é meio de defesa do membro do parquet mesmo diante do Procurador-Geral. Mantém-se a hierarquia no âmbito administrativo, e exclui-se no campo funcional, assevera Cunha Júnior (2013). Bulos (2015), por sua vez, inclui, no contexto dos princípios institucionais, os princípios constitucionais do promotor natural, do livre exercício da ação penal, da irresponsabilidade e da irrecusabilidade. Esta última, aclara o eminente doutrinador, refere-se a pedido do Procurador-Geral da República de arquivamento dos autos de inquérito cuja competência originária seja do Supremo Tribunal Federal, não poder ser recusado. Sua primeira promoção de arquivamento deverá ser acolhida, visando manter a unicidade da instituição em detrimento de possíveis manifestações por divergências entre os ocupantes do cargo de chefia do parquet.
A Lei Maior prevê o controle da atuação, tanto financeira quanto administrativa do Ministério Público, e também dos deveres funcionais dos membros do parquet através do Conselho Nacional do Ministério Público. Composto por quatorze membros, aprovados por maioria absoluta do senado e nomeados pelo Presidente da República para mandato de dois anos permitida uma recondução, conforme descrito no art. 130-A da Constituição Federal. O Conselho é integrado pelo Procurador-Geral da República como seu presidente, quatro membros do Ministério Público da União, representando cada uma das suas carreiras, três membros do Ministério Público dos Estados, dois juízes, um indicado pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça, dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e dois indicados, um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal, de notável saber jurídico e reputação ilibada, enumera Cunha Júnior (2013).
4 AS FUNÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO PÓS CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
A figura do Onbudsman é a principal responsável pelo perfil conferido ao Ministério Público na Constituição Federal de 1988 e em sua evolução no hoje conhecido como neoconstitucionalismo. Silva (s.d.) o define como “controlador da regularidade do serviço público e defensor do povo nos Países nórdicos” (SILVA, s.d., p. 5), asseverando que a missão similar a descrita foi conferida ao parquet. Ainda que tal figura não fosse conhecida no Brasil, o era em diversos países latino americanos. Conhecido também como Defensor del Pueblo, a figura escandinava foi incorporada pelo Órgão que passou a ser sinônimo de acesso à justiça, de auxílio para o cidadão humilde que precisava de esclarecimentos, explica Porto (s.d). O autor cita trecho de entrevista de Plínio Sampaio sobre a figura em tela em relação a Constituição Federal:
“O Deputado Constituinte e Promotor Paulista, relator do Projeto do Ministério Público na Assembléia Nacional Constituinte, Plínio Arruda Sampaio, mencionou haver sido pressionado a introduzir a novidade do ombudsman no Brasil, mas que reagira negativamente a ela, afirmando, na época, que “o ombudsman desse país é o Ministério Público. Tem um ombudsman em cada cidade. Então um ombudsman nacional não serve para nada. Não vai fazer coisa nenhuma, vai ser envolvido por dois ou três processos que interessam a algum grupo. Esse órgão não terá o know-how que o Ministério Público tem (entrevista concedida em 07/07/1995)” (PORTO, s.d., p. 13-14).
Contudo, somente anos após a promulgação da Lei Maior de 1988, a figura referida se solidificou no âmbito jurídico nacional. Essa solidificação pode ser atribuída ao advento do neoconstitucionalismo, que traz em sua proposta “a superação do paradigma do direito meramente reprodutor da realidade para um direito capaz de transformar a sociedade” (ALMEIDA, 2008, p. 7). Os direitos constitucionais, individuais e coletivos, a partir do advento da Constituição vigente, careciam de crescente efetivação. Tais direitos, no plano coletivo, são objetos de implementação para transformação da realidade social com a redução das desigualdades e efetivação da dignidade da pessoa humana, explica Almeida (2008).
A partir dessa nova concepção, ainda que sem se desconsiderar as funções ministeriais expressas em texto constitucional, de vital importância para toda a sociedade, o Ministério Público evolui para, pelo menos, duas funções distintas que modernamente se contrapõem e se complementam. A ideia, trabalhada com maestria por Almeida (2008), de dois modelos de Ministério Público, um demandista e outro resolutivo. Baseado nos conceitos de Marcelo Pedroso Goulart, o autor explica que o parquet demandista é aquele que transfere a demanda ao Poder Judiciário a resolução dos problemas sociais. Já o resolutivo se lança à ação extrajudicial, aplacando e solucionando os conflitos sociais como intermediador. Neste sentido, o Órgão, contemporaneamente faz uso de instrumentos como o inquérito civil, o termo de ajustamento de conduta, as recomendações e das audiências públicas.
Porto (s.d) vê como “um dos mais significativos passos de reforço sistêmico do Ministério Público nos últimos anos” (PORTO, s.d., p. 16) a utilização de inquéritos civis, incluindo a abertura da possibilidade de se celebrar termos de ajustamento de conduta com diversas entidades visando o benefício público. A não judicialização, a resolução do conflito por outras vias, fortalece o Estado Democrático de Direito e se destaca como principal função pós Constituição Federal de 1988, exatamente por interferir na mutação social de maneira benéfica e dinâmica. Uma das grandes dificuldades enfrentadas, a priori, principalmente para os novos direitos coletivos, foi encontrar um Poder Judiciário ainda engessado, com o direito formal se sobrepondo ao direito material, e a ênfase nas rotinas que comtemplavam os direitos individuais excluindo a relevância dos direitos coletivos. Nesse cenário, o inquérito civil, principalmente, permitiu uma diferenciação entre o Ministério Público e o Poder Judiciário, contornando o modelo demandista e firmando o modelo resolutivo. Desta forma, Porto ainda acrescenta:
“Isso tudo, aliado à tradicional morosidade da justiça, levaria ao fracasso na tutela dos novos direitos coletivos, forçando o Ministério Público a uma nova diferenciação: a atuação administrativa extrajudicial, reunindo a um só tempo, uma plêiade de sanções negociadas apenas sob a ameaça de outras sanções aplicáveis por diversos órgãos administrativos ou judiciais, diante da provocação do Ministério Público. O inquérito civil com seu aparato de coleta de provas, mediante requisições documentais e periciais e audiências, inclusive publicas, e sua possível conclusão em compromissos de ajustamento às normas legais, constituiu-se destarte em um instrumento ara acoplamentos estruturais sistêmicos com setores da sociedade (entidades e empresas) e da própria administração pública, que permitem nequentropia institucional, aqui resumida, na conquista da legitimação política para a ação institucional” (PORTO, s.d., p. 18).
O parquet detém a exclusividade, delimitada constitucionalmente, para a promoção do inquérito civil. Um instrumento de grande vulto no que tange a solução de conflitos, para a sociedade. A legislação processual é repleta de meandros que tendem a eternizar uma demanda em juízo, e muitos dos grandes litígios não chegam aos Tribunais. Pessoas com maior carência econômica, ao litigarem, o faziam com parco conhecimento de seus direitos não obtendo resultados satisfatórios. O Ministério Público com o inquérito civil, tornou-se capaz de instruir provas que “sustentavam demandas massificadas, buscando a efetividade de direitos sociais, sejam coletivos, difusos ou individuais, com destaque do interesse público e social” (SILVA, s.d., p. 7). A forma mais imediata de alcançar resultados satisfatórios no inquérito civil, foi reconhecida no termo de compromisso de ajustamento de conduta. Tal solução tem o condão de evitar a judicialização do conflito e surtir efeitos amplos e urgentes, o que, de fato, tem funcionado, esclarece Silva (s. d). E, caso não logre êxito a proposta do ajustamento de conduta, o Órgão Ministerial, após a promoção do inquérito civil, tem ajuizado as competentes ações civis públicas para garantia dos direitos fundamentais lesados.
Além desses instrumentos que explicitam as funções ministeriais de transformação social de maneira tão contundente, Almeida (2008) entende ser a mais importante tutela jurídica do Estado Democrático de Direito, a saber, a tutela preventiva. Decorrendo do princípio de prevenção geral, poderá ser a responsável por evitar a prática, continuidade ou repetição do ilícito, evitando-se o dano que, na dimensão social, dificilmente permitem a reparação correspondente, pois tende a atingir o ambiente, ou a saúde, o idoso, a criança e o adolescente. Logo, raciocina o autor, “só restaria nesses casos uma tutela repressiva do tipo compensatória ou do tipo punitiva” (ALMEIDA, 2008, p. 23), insatisfatória enquanto garantia fundamental do Estado Democrático de Direito. O doutrinador exemplifica asseverando ser bem melhor o combate a ocorrência de atos de improbidade, que apenas agir repressivamente quando estes ocorrerem. Melhor o controle de constitucionalidade para que se evite a aplicação de uma lei inconstitucional, que permitir a aplicação da lei ferindo a sociedade que se pretende defender.
Aprofundando sua ideia do Ministério Público resolutivo, Gregório Assagra de Almeida (2008) enfatiza que a defesa dos interesses sociais pelo parquet deve ocorrer em todas as suas esferas de atuação. Assim, no campo criminal, poderá o Órgão apurar por meio de estudos realizados, as causas da criminalidade e promover, junto com o Poder Público, políticas preventivas para se evitar o crescimento da violência, bem como envidar esforços concentrados na investigação e punição dos ilícitos que mais abalam a sociedade. No tocante aos direitos coletivos, poderá agir preventivamente para que se impeça a violação dos direitos sociais e combater, articuladamente, condutas que sejam lesivas aos direitos das massas. Em sua atuação extrajurisdicional ou extrajudicial, poderá agira preventivamente através de ações pedagógicas, com o fito de orientar a coletividade quanto ao exercício da cidadania o que poderá ser feito através das recomendações, termo de ajustamento de conduta e audiência públicas. De fato, merece destaque a função pedagógica do Ministério Público, exatamente por ser o Brasil um país com um ensino exageradamente formal e separado da realidade dos direitos do cidadão:
“O ensino no País contribui para a exclusão de um grande contingente popular do processo democrático e não cumpre os objetivos e princípios informadores da educação, estabelecidos no art. 205 da CF, especialmente o pleno desenvolvimento da pessoa e o seu preparo para o exercício da cidadania. Até que haja a reestruturação do ensino médio no Brasil, a Imprensa e as instituições de defesa social como o Ministério Público, têm o compromisso, imposto constitucionalmente, de contribuírem para a divulgação dos direitos e deveres inerentes à cidadania, possibilitando que um maior número de cidadãos participem efetivamente do processo de democratização da sociedade brasileira e, com isso, não fiquem dispersos e sujeitos a manobras imorais e espúrias do poder político e econômico” (ALMEIDA, 2008, p. 26).
O Ministério Público adota, em sua configuração pós Constituição Federal de 1988, não apenas o papel de custus legis, mas também e primordialmente o de custus societatis, e de guardião do próprio direito, custus juris. Assim, explicam Barros e Rangel (2016), como guardião da sociedade, desempenha o Órgão Ministerial o imprescindível papel de defensor dos direitos fundamentais. Seu novo perfil constitucional, torna o parquet hegemônico na defesa dos direitos fundamentais, função preponderante e sustentadora, em sentido lato, das demais.
5 CONCLUSÃO
Enquanto as antigas constituições e, consequentemente, as leis infraconstitucionais prezavam a propriedade, protegendo-a e promovendo os meios para sua garantia legal, a Constituição de 1988, em especial, enfatizou os direitos fundamentais como expressão de uma sociedade que emergia fortalecendo-se progressivamente quanto a dignidade da pessoa humana. Neste cenário, o ponto culminante da implementação do Ministério Público ao longo da história do país, foi fundamental para que o Estado Democrático de Direito se firmasse e suas conquistas permanecessem atuais e constantes.
A mobilidade social impera o estabelecimento de instituições que, sendo funções essenciais à justiça, se movimentem demandando o Poder Judiciário representando o povo, fiscalizem os poderes Executivo e Legislativo interferindo quando excessos forem cometidos, e atuando de forma resolutiva entre a população e seus mais diversos litígios. Cumpre este papel o Ministério Público, obtendo importância desde sua primeira aparição, ainda pouco desenvolvido nas primeiras constituições, adquirindo expressão tão emblemática que chegou a ser alvo de discussão sobre seu quase status de um quarto poder com a Constituição Federal de 1988, e ampliando sua existência indispensável diante dos novos desafios trazidos pela plasticidade dinâmica da sociedade brasileira.
Vencendo a burocracia, nos limites do possível, o Ministério Público amoldou-se as necessidades de um novo tempo, e migrou de uma perspectiva demandista para uma perspectiva resolutiva, na qual os conflitos são dirimidos sem se ingressar no judiciário, por meio dos instrumentos criados para aparelhar o parquet em suas inúmeras atribuições, sempre na defesa dos mais vulneráveis e na promoção efetiva da justiça.
Acadêmico de Direito da Multivix Cachoeiro de Itapemirim-ES
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
Acidentes de trânsito podem resultar em diversos tipos de prejuízos, desde danos materiais até traumas…
Bloqueios de óbitos em veículos são uma medida administrativa aplicada quando o proprietário de um…
Acidentes de trânsito são situações que podem gerar consequências graves para os envolvidos, tanto no…
O Registro Nacional de Veículos Automotores Judicial (RENAJUD) é um sistema eletrônico que conecta o…
Manter o veículo em conformidade com as exigências legais é essencial para garantir a sua…
Os bloqueios veiculares são medidas administrativas ou judiciais aplicadas a veículos para restringir ou impedir…