Resumo: O presente trabalho versa sobre os direitos da infância e juventude, tendo como foco a análise sobre o papel do Conselho Tutelar na efetividade dos direitos da criança e do adolescente no Município de Porto Alegre. Elucidando suas competências e atribuições, assim como as dificuldades encontradas para que as garantias fundamentais sejam devidamente garantidas e efetivadas. Embora em constante aperfeiçoamento, constata-se que, para efetiva garantia dos direitos das crianças e adolescentes, ainda falta um programa constante de capacitação técnica e científica destinado aos conselheiros e, também, a falta de políticas públicas por parte do Estado. O estudo foi desenvolvido a partir da evolução histórica das legislações internacionais e menoristas brasileiras até as bases para atual legislação, assim, analisando o processo de construção dos direitos da criança e do adolescente. Prosseguindo com a análise dos direitos fundamentas da criança e adolescente onde o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, foi criado para fazer-se cumprir e regularizar as conquistas obtidas em favor da infância e da juventude.
Palavras-chave: Crianças e do Adolescentes; Conselho Tutelar; Estatuto da Criança e Adolescente
Abstract: The present work deals with the rights of children and youth, focusing on the analysis of the role of the Guardian Council on the effectiveness of the rights of children and adolescents in the city of Porto Alegre. Elucidating their powers and duties as well as the difficulties encountered in the fundamental guarantees are properly secured and effect. Although constantly improving, it is clear that to effectively guarantee the rights of children and adolescents, there is still a constant program of scientific and technical training for the directors and also the lack of public policies by the state. The study was developed from the historical evolution of international law and children in Brazil until the basis for current legislation and by analyzing the process of constructing the child and adolescent. Continuing with the analysis of the fundamental rights of children and adolescents where the Statute of Children and Adolescents – ECA was created to be met and regularize t he achievements made on behalf of children and youth.
Keywords: Children and Adolescents; Guardian Council, the Child and Adolescent
Sumário: 1. Introdução. 2.Histórico Internacional dos direitos da Criança e do Adolescente. 2..1 Histórico dos Direitos das Crianças e Adolescentes no Brasil. 2.2 Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente. 3. A Instituição Conselho Tutelar: criação e composição. 3.1. Competências do Conselho Tutelar. 3.2. Atribuições do Conselho Tutelar. 4. O Conselho Tutelar como meio para viabilizar a efetivação dos Direitos da Criança e do Adolescente. 4.1 Abordagem e procedimentos administrativos e aplicação de medidas protetivas. 4.2 Da Representação junto ao Ministério Público. 5 conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO[1]
A presente monografia, Trabalho de Conclusão de Curso está vinculada à linha de pesquisa: Direitos Humanos na Constituição Brasileira que estuda relação entre a complexidade social e efetivação de Direitos Fundamentais na ordem constitucional. Trazendo como foco da pesquisa os Direitos Fundamentais das Crianças e Adolescentes e a atuação dos Conselhos Tutelares do Município de Porto Alegre, na busca para a efetividade das garantias previstas na Constituição Federal e Estatuto Da Criança e Adolescente.
Este trabalho visa a observar, de um modo geral, o papel do Conselho Tutelar e atuação de seus conselheiros quanto aos procedimentos administrativos e aplicação das medidas protetivas, quando violados as garantias e direitos das crianças e adolescentes. Também analisa a real eficácia do órgão Conselho Tutelar como instrumento para viabilizar a aplicação efetiva dos direitos e garantias destinados a crianças e adolescentes.
Primeiramente, é realizado um breve relato sobre a evolução histórica dos direitos e garantias fundamentais destinados às crianças e adolescentes, iniciando na pré-história, percorrendo brevemente a Idade Média, e o início do Século XX, quando crianças e adolescentes não tinham tratamento diferenciado, aplicando-se os códigos penais retribucionistas , até chegarmos ao final do século XX, quando surgem as primeiras leis específicas à crianças e adolescentes. Somente em 1979 foi criada a primeira lei direcionada para crianças e adolescentes em situação irregular, mas somente com a Constituição Federal de 1988 é que ocorreram avanços significativos na garantia dos direitos fundamentais, e com advento do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, em 1990 , este passa a regular o artigo 227 da Constituição Federal, tornando-se um marco na definição das garantias dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes.
Em um segundo momento, é abordada a Instituição Conselho Tutelar como órgão autônomo, destinado a zelar pelos direitos das crianças e adolescentes, como preconiza o artigo 131 do ECA, bem como suas atribuições e competências. Ainda neste capítulo, abordaremos a criação do primeiro Conselho Tutelar, que se deu no município de Porto Alegre, através da Lei nº 6.787/91, consolidado com a Lei Municipal nº. 7.394/93, que também implantou a Corregedoria dos CT’s , órgão que possui como função precípua, controlar o funcionamento dos Conselhos Tutelares.
Finalmente, analisou-se a atuação do Conselho Tutelar, buscando expor questões procedimentais quanto as formas com que o Conselho Tutelar tem conhecimento das condutas lesivas aos direitos de crianças e adolescentes, e em comprovada a efetividade do dano, como a Instituição busca revertê-lo, protegendo e fazendo cumprir tais direitos legalmente estabelecidos pelo ECA- Estatuto da Criança e do Adolescente, se utilizando da aplicação de Medidas Protetivas, ou quando necessário, sua representação junto ao Ministério Público.
2 Histórico Internacional dos direitos da Criança e do Adolescente
Enquanto na pré-história as crianças e adolescentes são praticamente desconhecidos para o campo do Direito, assim que os povos entram na história já se constata o poder praticamente absoluto, paternal e/ou maternal acerca de sua prole, sem atribuir valor a vida ou a liberdade dos filhos. No Direito romano a autoridade suprema era a do pai, passado algum tempo, só os filhos de militares obtiveram esses direitos reconhecidos, como a possibilidade de dispor de bens aos quais seus pais tivessem adquirido por meio de suas atividades. E no cristianismo devido à preocupação de defender os mais fracos surge a consideração às crianças. Assim a história da criança possui relação temporal de início próxima dos anos 60, e a descoberta da infância iniciou no século XIII, no entanto, assim que a criança não dependesse mais de cuidados de sua mãe ou de sua ama, ingressava no mundo dos adultos e não havia entre eles qualquer distinção. Na Idade Média, a preocupação com a criança era relacionada ao sistema escolar como: leis sobre o trabalho infantil, agência encarregadas da delinquência infantil, serviços de bem-estar infantil, etc. Também na Idade Moderna iniciam-se a distinção do tratamento às crianças em relação aos adultos, havendo uma coesão entre ambas as atitudes, uma vez que se deram internamente em uma mesma sociedade.[2]
No início do século XX, o único tratamento jurídico destinado à infância e adolescência encontrava-se nos códigos penais retribucionistas aplicado aos adultos, tendo como única diferenciação o tempo de pena que era reduzido a um terço para infratores menores de 18 (dezoito) anos. Às crianças e adolescentes era destinado o mesmo tratamento penal dos adultos, assim como alojados nos mesmos estabelecimentos penais, sofrendo todo o tipo de agressão, tanto física como psicológicas, sem nenhum vestígio de dignidade. [3]
As condições impostas às crianças e adolescentes geraram, neste período, em toda a América Latina, em intensidade diferente, indignação moral, o que por consequência, acarretou a criação de uma legislação destinada aos menores como um todo, visando à proteção de uma parte infância que até então era supostamente abandonada e delinquente. A partir deste momento o juiz de menores passou a exercer uma função paternal com o intuito de concretizar a saúde e a educação, embora muitos acreditassem que a função do juiz era inútil, por considerarem que a delinquência era genética.[4]
Em beneficio de crianças e adolescentes ocorreram movimentos internacionais como a Convenção para Repressão do Tráfico de mulheres e crianças em Genebra no ano de 1921, o Protocolo de Emenda no Brasil aconteceu em 1955 através do Decreto 37.165. A Declaração de Genebra de 1924 foi a primeira a mencionar os direitos da criança, o que também preconizou a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas de 1959. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica do ano 1969 em seu artigo 19[5] reafirma os Direitos, o Protocolo de San Salvador o qual reproduziu este texto no art.19 ratificou esta singular plataforma.[6]
Até a Convenção Internacional dos Direitos Humanos em (1989), todas as legislações de menores inspiravam-se nos princípios da doutrina da situação irregular, que continha como traço específico e essencial a classificação da infância em categorias, subdividindo-as em crianças, adolescentes e menores, sendo esse último grupo considerado como excluído de escolas, da família e saúde. Devido ao adendo da Convenção, as legislações latino-americanas, basearam-se na proteção integral da infância, não havendo distinção entre menores, crianças e adolescentes, pois todos passaram a ser passíveis de direitos e deveres.[7]
Em 20 de novembro de 1989, a ONU institui a Convenção sobre os Direitos da Criança, que trouxe o maior número de ratificações, servindo de alicerce aos atuais parâmetros direitos de crianças e adolescentes. O Brasil reiterou esta Convenção pelo Decreto 99.710 em 24 de setembro de 1990. No mesmo ano em Nova Iorque, deu-se o Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, na sede das Nações Unidas, em que 71 países compromissaram-se em combater a desnutrição, analfabetismo, erradicar doenças, melhorar a saúde de crianças e mulheres e, desse modo, estabeleceram a Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, o Desenvolvimento e a Proteção da criança nos anos 90.[8]
2.1 Histórico dos Direitos das Crianças e Adolescentes no Brasil
O desenvolvimento de políticas sociais desempenhadas pelo Estado brasileiro no início do século XX, às populações carentes de recursos financeiros, era entregue aos cuidados da Igreja Católica por intermédio de algumas instituições, entre elas as Santas Casas de Misericórdia, que atuavam tanto com os doentes quanto com os órfãos e desprovidos, e adotavam o sistema da Roda das Santas Casas, vindo da Europa no século XIX, que tinha o intento de amparar as crianças abandonadas e de recolher donativos.[9]
Em sintonia com a política nacional da época iniciou o funcionamento do estabelecimento público pioneiro para atender menores no Rio de Janeiro (Distrito Federal). Neste mesmo caminho, em 1927, nasceu o Primeiro Código de Menores, sob a autoria de Melo Mattos, juiz de menores.
Refletindo o período autoritário ou do Estado Novo vivenciado pelo Brasil ,no ano de 1942, nasceu o SAM – Serviço de Assistência ao Menor tendo vínculo com o Ministério da Justiça nos moldes do sistema penitenciário voltado a menor idade. Mesmo sem alterações nas políticas sociais e penais no país, durante o período de extrema relevância da democracia, ocorrido entre 1945 e 1964, surgiram movimentos sociais que visavam manter e ampliar os direitos já alcançados.[10]
Nessa esteira, em 1967, durante o período de governo militar, dois documentos significativos que instituíram a visão vigente à época, com a criação de duas leis: Lei nº 4.513 de 1/12/64. A primeira foi responsável pela criação da FUNABEM – Fundação Nacional do Bem Estar do Menor com o objetivo de ser a grande instituição de assistência à infância, cuja ação era a internação, tanto dos abandonados e carentes como dos infratores seu principal foco, e a nível estadual, as FEBEMs (Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor) imbuída da tarefa executora. A segunda foi a Lei nº Lei 6697 de 10/10/79, que criou Código de Menores, de 1979[11].
A promulgação da Carta Magna de 1988, conhecida como: Constituição Cidadã, representou grandes avanços para os movimentos sociais da infância brasileira, pois, até então, a organização dos grupos em torno do tema da infância era basicamente de dois tipos: os menoristas e os estatutistas. Os primeiros defendiam a manutenção do Código de Menores, que se propunha a regulamentar a situação das crianças e adolescentes que estivessem em situação irregular, Já os demais defendiam uma grande mudança no código, instituindo novos e amplos Direitos às Crianças e aos Adolescentes, que passariam a ser sujeitos de direitos e a contar com uma Política de Proteção Integral[12].
Os anos oitenta foram de extrema importância ao que se refere aos Direitos das Crianças e dos Adolescentes. Foi nessa década, que a luta pelos seus direitos foi defendida por inúmeros movimentos e entidades, que obtiveram êxito, fazendo constar seus direitos na Carta Magna Brasileira, impondo aos governantes à responsabilidade de assumirem compromissos públicos com a causa dos Direitos da Infância e da Juventude[13].
Na Assembléia Constituinte, organizou-se um grupo de trabalho comprometido com o tema da criança e do adolescente, cujo resultado concretizou-se no artigo 227, que estabeleceu o conteúdo e enfoque próprios da Doutrina de Proteção Integral da Organização das Nações Unidas, trazendo os avanços da legislação internacional para o Brasil. Este artigo garante à criança e ao adolescente seus direitos fundamentais, além de protegê-los de forma especial[14]. E em 13 de julho de 1990, nasceu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), passando a regular o artigo 227 da Constituição Federal, tornando-se um marco na definição das garantias às crianças e aos adolescentes[15].
Segundo Ana Paula Motta Costa:
“O Brasil seguiu a tendência internacional de valoração de direitos humanos especiais, mas, sobretudo, é fruto do esforço conjunto de milhares de pessoas e comunidades empenhadas na defesa desses direitos. Esse movimento social fez aflorar a necessidade histórica de uma transformação efetiva da realidade conquistando em 1º lugar, a inclusão do art. 227 na Constituição Federal.”[16]
O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado para fazer-se cumprir e regularizar as conquistas obtidas em favor da infância e da juventude. Portanto, por meio deste instrumento é que vimos expressos os direitos da criança e do adolescente, os considerando como indivíduos que necessitam de respeito por estarem em pleno desenvolvimento, e de proteção integral por parte da família, do Estado e da Sociedade. Ao recepcionar a Lei nº 8069/90, houve três mudanças, classificadas em três grupos no cenário dos direitos e garantias das crianças e adolescentes[17].
O primeiro grupo foi o das “Mudanças de Conteúdo”, na medida em que o Estatuto da Criança e do Adolescente acrescentou em nosso País, conteúdos novos ao elenco dos Direitos da Infância e da Juventude. Essas mudanças de conteúdo incluem-se os direitos individuais, que seriam o direito à vida, à liberdade e o direito à dignidade. E também incluem-se os direitos coletivos, que seriam os direitos econômicos, sociais e culturais. O segundo grupo de modificações reitera “Mudanças de método”, e neste campo o Estatuto da Criança e do Adolescente inova drasticamente, principalmente em relação às crianças e adolescentes carentes. Portanto, o Estatuto está em busca da superação do assistencialismo como o princípio definidor das relações entre os pobres e o ramo social do Estado, pois, superando o assistencialismo os sujeitos passarão a ser vistos como sujeitos de direitos exigíveis em lei. Dessa maneira, é preciso substituir o assistencialismo por um trabalho social e educativo, visto que somente assim às crianças e os adolescentes poderão mudar das necessidades aos direitos, da condição de menor à condição de cidadão, detentor do direito de ter direitos.[18]
O terceiro grupo de alterações trazidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é o das “Mudanças de Gestão”, que revisou a relação entre os entes federados, fazendo existir uma divisão do trabalho social não só entre União, Estados e Municípios, mas também quanto à relação entre esses e a sociedade civil organizada.[19]
Evidencia-se que diante das mudanças instituídas pela Constituição Federal e Estatuto da Criança e do Adolescente, três avanços puderam ser observados. A primeira novidade em relação à criança e o adolescente é que a criança tem direito ao respeito, à dignidade e à liberdade, e não são mais objetos da família, da sociedade e do Estado[20].
“(…) se, num passado remoto, a criança ou adolescente era coisa conseqüentemente descartável e, num passado recente, interessava apenas ao direito penal, depois, em razão de alguma patologia, erigia-se um conjunto de normas tendentes a integração sócio-familiar (doutrina da situação de risco), modernamente passa a ser considerado como sujeito de direitos, sendo-lhe devida a proteção integral perante a família, a sociedade e o Estado.”[21]
A segunda novidade em relação à criança e o adolescente é que estas passam a ser consideradas pessoas em condição peculiar de desenvolvimento. Ou seja, têm direitos iguais em relação aos adultos, mas em razão da idade, também têm direitos especiais pelo fato de eles ainda não terem acesso ao conhecimento pleno de seus direitos e encontrarem-se em uma etapa de desenvolvimento que requer cuidados especiais. Por ainda não terem atingido condições de defender seus direitos, frente às omissões e transgressões capazes de violá-los. Por não contarem com meios próprios para arcarem com a satisfação das suas necessidades básicas e por se tratar de seres em pleno desenvolvimento físico, emocional, cognitivo, e sócio-cultural, não podendo assim responder pelo cumprimento das leis e demais deveres e obrigações da mesma maneira que os adultos[22].
A terceira novidade em relação aos Direitos da Criança e do Adolescente é o princípio da prioridade absoluta, entendida como a prioridade em receber proteção e socorro. A qualidade no atendimento por serviço ou órgão público, a preferência na formulação e execução das políticas sociais. Como também a destinação privilegiada de recursos públicos às áreas relacionadas com a proteção da infância e da juventude[23].
“(…) no sentido de resguardo às condições para a felicidade atual e futura, enquanto o termo integral relaciona-se com a idéia de ser devida à totalidade dos seres humanos, nos seus mais variados aspectos, notadamente físico, mental, espiritual e social.”[24]
Diante do que foi visto nesse capítulo percebe-se a evolução da visão política acerca do papel social e dos Direitos da Criança e do Adolescente. Assim ao lado de todos os princípios e normas firmados na Constituição Federal, a Convenção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas, que o Brasil ratificou, serviu como fonte inspiradora para o Estatuto da Criança e do Adolescente.
2.2 Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente
No Brasil, os direitos das crianças e adolescentes estão pontuados na Doutrina de Proteção Integral da Organização das Nações Unidas, Constituição Federal e regulamentados na Lei nº 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Trata-se de três institutos que devem ser analisados de maneira harmônica, pois um complementará o outro.
A Declaração dos Direitos das Crianças, estabelecida pela ONU, prevê em seu preâmbulo que[25]:
“a criança, em virtude de sua falta de maturidade física e mental, necessita proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção legal, tanto antes quanto após seu nascimento”;
O artigo primeiro desta Convenção destina-se a conceituar a criança enquanto menor de dezoito anos, exceto se a maioridade for alcançada antes, em consonância com a legislação aplicável. O artigo 2º estabelece que os Estados Partes, comprometem-se a respeitar e aplicar a cada criança sob sua jurisdição os direitos constantes na presente convenção sem qualquer distinção, buscando meios para assegurar a proteção da criança contra discriminação, ou castigo, em função de sua condição,atividade, opinião, ou crença de seus pais, familiares ou representantes legais. Considerando-se sempre o interesse maior da criança pelas autoridades administrativas ou órgãos legislativos quando de sua atuação.[26]
Tendo em vista o artigo 4º da Convenção sobre os Direitos da Criança[27], a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227 elenca os direitos fundamentais que são indispensáveis à formação das crianças e adolescentes.
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Em conformidade com a Constituição Federal, o ECA em seu artigo 7º aborda os direitos fundamentais:
“Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.”
São os dois primeiros direitos previstos no artigo 4º, corroborando o preceito constitucional programático, conforme o artigo 227 da Constituição Federal.[28]
O direito à vida conforme o autor Roberto João Elias:
“(…) é o mais relevante de todos os direitos, pois, sem à vida findam-se todos eles. A personalidade jurídica, que dá ensejo a que todo individuo seja sujeito de direito, cessa com a morte.”[29]
Tendo como base o direito à vida, outros direitos surgiram com intuito de garantir o desenvolvimento da criança. Enquanto nascituro, conforme o artigo 8º é assegurado à gestante no pré e pós-parto, pelo sistema único de saúde, atendimento adequado e acompanhamento médico na fase pré-natal. Neste mesmo artigo assegura-se o direito á alimentação do infante desde sua concepção, o ECA ainda classifica como responsáveis pela saúde e vida, além da família, a rede de atendimento a saúde, como hospitais, postos, ambulatórios. O artigo 9º traz uma preocupação com o aleitamento materno, fazendo com que seja garantido por instituições e empregadores, inclusive as crianças cujas mães estejam cumprindo medidas privativas de liberdade.[30]
O artigo 10 do Estatuto estabelece um meio de controle para o cumprimento das obrigações inerentes aos estabelecimentos que atendem à saúde das gestantes de acordo com o transcrito:
“Art. 10 – Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são obrigados a:
I – manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos;
Il – identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normalizadas pela autoridade administrativa competente;
lIl – proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais;
IV – fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato;
V – manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe.”
Salienta-se que o descumprimento das normas do artigo 10, da Lei 8069/90 é tipificado como delito conforme os artigos 228 e 229, da mesma lei:
“Art. 228. Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de manter registro das atividades desenvolvidas, na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a seu responsável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato:
Pena – detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa.
Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10 desta Lei:
Pena – detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa.”
O artigo 15 do ECA refere-se ao direito á liberdade, ao respeito e à dignidade, de maneira ampla:
“Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.”
Destacando-se que criança e adolescente do qual trata o artigo é aquela em fase de desenvolvimento.[31]
O direito à liberdade encontra-se elencado no artigo 16, que regra tal direito, observando que o seu titular é um ser em desenvolvimento, por isso, a liberdade, neste caso, sofre algumas restrições[32]:
“Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II – opinião e expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;
V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI – participar da vida política, na forma da lei;
VII – buscar refúgio, auxílio e orientação.”
As restrições existentes ao direito de liberdade da criança e adolescente, objetiva garantir a esses uma proteção integral, observando aspectos importantes para o desenvolvimento da personalidade da criança e do adolescente, como o direito à liberdade de brincar, fazer esportes, divertir-se, participar da vida comunitária, familiar de acordo com a condição de desenvolvimento e também política. Compete ao Estado, a família e a comunidade, propiciarem assistência das mais variadas maneiras às crianças e os adolescentes. Não deixando de maneira alguma de cumprir com as suas obrigações.[33]
O artigo 17 do ECA aborda o direito ao respeito:
“Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”
O direito ao respeito, segundo ELIAS, ressalta as obrigações de todos de negligenciar-se de ação que possa ferir a integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente. No que se refere à integridade física explicita que além dos maus tratos e lesões, deve-se ter cuidado com a privação de tudo o que é necessário para a preservação e o desenvolvimento do corpo.[34]
O princípio à dignidade, ou a dignidade da pessoa humana é de grande relevo em nosso ordenamento jurídico, e encontra-se inicialmente previsto na Constituição Federal, artigo 1º, inciso III:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III – a dignidade da pessoa humana;”
A concepção de dignidade que se tem hoje nasceu logo após a Segunda Grande Guerra ao desvendar-se a crueldade sofrida nos campos de concentração onde crianças e adolescentes sofriam as mesmas agressões que os adultos. É certo que não há existência deste principio de formas distintas para crianças e adultos, mas em relação a crianças e adolescentes cabe a todos zelar pela dignidade destes conforme preceitua o artigo 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente.[35]
“Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.”
A expressão “pondo-os a salvo”, utilizada no referido artigo, atribui a todos a legitimidade ativa para que se empenhem na defesa dos direitos que garantam à criança e ao adolescente a proteção integral.[36]
O direito a dignidade possui íntima ligação com os demais direitos fundamentais, avizinhando-se principalmente dos direitos ao respeito, à vida, e à liberdade. Claro que os primeiros a proteger e zelar por estes direitos de crianças e adolescentes devem ser seus pais em decorrência do poder familiar que não pode ser delegado, renunciado ou negociado. O mesmo Estatuto já dispunha em seu artigo 5º, vedação relacionada com o mesmo princípio fundante, qual seja a dignidade.[37]
“Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.”
Ingo Wolfgang Sarlet ensina que a dignidade da pessoa humana:
“é uma qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos”.
Além de um direito, trata-se de um fundamento do Estado Democrático de Direito que pelo fato de ser regido por meio de seus princípios constitucionais, precisa observar a sua eficácia, e ainda segundo SARLET[38], uma das principais dimensões da eficácia é a “vinculatividade dos direitos fundamentais”, pois segundo o art. 5º, § 1º da Constituição Federal, os direitos fundamentais não são dispensáveis, logo, o Estado se encontra obrigado a realizar tais direitos, aplicando todos os recursos necessários para efetivá-los, observando o caput do artigo 5º que determina que todos serão iguais perante a lei, destarte, deve-se resguardar os direitos e garantias fundamentais de todos, incluídos as crianças e adolescentes.
Como observou Antonio César Peluso destaca que a dignidade:
“Constituição brasileira consagra a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República. Não se trata apenas de um princípio jurídico, mas de fundamento da República (artigo 1°, III). Portanto, se o casamento, no largo sentido de união do homem e da mulher, com vistas à constituição de uma família, está inserido dentro das relações que resguardam essa dignidade, então deve ser vista como o mais importante mecanismo sócio-político que se presta a tutelar a pessoa na condição específica de membro da instituição familiar. As pessoas ( e, digo eu, particularmente as crianças e os adolescentes) são tuteladas pelo ordenamento jurídico dentro da família , porque está o organismo destinado a promover e a garantir a dignidade da pessoa e o pleno desenvolvimento de todas as suas virtualidades, ou seja, a família é o lugar especial de tutela da vida e da pessoa humana”
Além de ser uma premissa constitucional, a dignidade é inerente ao seio familiar, e nesse contexto é que se criam, estabelecem as ramificações que constituirão a dignidade da criança. É por intermédio dos pais que a criança constitui a dignidade, pois a família é que tem o papel fundamental de construção da dignidade[39].
Em se dizendo que a todos, sociedade, família e Estado compete zelar pela dignidade de crianças e adolescentes, é importante destacar que alguns indivíduos em função de sua profissão estão comprometidos em maior grau, por terem sob sua autoridade, guarda ou vigilância, criança ou adolescente, que não podem em nenhuma hipótese expor a vexame ou constrangimento sob pena de ser responsabilizado.[40]
Dentre os órgãos competentes e responsáveis em velar pela dignidade e outros direitos das crianças e adolescentes encontra-se o Conselho Tutelar, tema do presente estudo e que pode ser um meio eficaz para a efetivação destes direitos.
3 A Instituição Conselho Tutelar: Criação e Composição
O Conselho Tutelar foi criado a partir da Lei Federal nº 8069/90, como órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, criado com a responsabilidade de zelar pelos direitos das crianças e dos adolescentes e fazer com que se cumpram os direitos garantidos a eles, por parte da família, da sociedade e do Estado[41], conforme o Art. 131[42] do Estatuto da Criança e do Adolescente.
De acordo com Mônica Bragaglia, o Conselho Tutelar é uma organização recente, criada em 1990, com características da modernidade[43]. A criação e institucionalização dos Conselhos Tutelares, além de objetivar uma atenção maior as crianças e adolescentes, visou à instrumentalidade de desjudicialização de questões sociais, direcionando políticas sociais e não ações repressivas. Ainda podem ser classificados como instrumentos de controle social, uma vez que, protegem pelas garantias das crianças e adolescentes previstas na Constituição Federal e no ECA[44] e devem fiscalizar as demais instituições que prestam atendimento a esse público.
O Conselho Tutelar é um órgão público municipal, que deve ser constituído por Lei de iniciativa do Poder Executivo do município, deve integrar-se ao conjunto de instituições nacionais que estão vinculadas ao ordenamento jurídico nacional[45]. A Lei Municipal que institui o Conselho Tutelar também deve disciplinar sua organização e o procedimento de escolha dos conselheiros tutelares, como dispõe o artigo 132[46] do Estatuto.
Por conseguinte, os conselheiros tutelares serão escolhidos conforme o pleito regulamentado pelo artigo 134 do ECA[47], e exercerão um serviço público, como preconizado no artigo 135[48], porém com algumas peculiaridades como: mandato de três anos sem subordinação à prefeitura local ou ao chefe do Executivo municipal.[49]
O Conselho Tutelar de Porto Alegre foi criado mediante a lei municipal 6787/91 e consolidado com a lei municipal nº 7394 de 28 de dezembro de 1993. Tais Leis criaram cargos públicos para os conselheiros, mecanismos de controle e funcionamento da organização interna dos Conselhos Tutelares. Sendo assim, na cidade de Porto Alegre, em sua primeira etapa de regulamentação, a Lei Municipal estabeleceu a implementação dos CT’s, com competência regionalizada.
A lei também criou a Corregedoria dos CTs, órgão de controle e funcionamento dos Conselhos Tutelares, atualmente composta por cinco conselheiros tutelares, um representante do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), um representante do Fórum Municipal de Entidades, dois representantes do Poder Legislativo e dois representantes do Poder Executivo. A competência da Corregedoria dos Conselhos Tutelares de Porto Alegre está elencada no art. 12 e seus incisos[50] e no regimento interno da instituição Conselho Tutelar. Nesta mesma Lei também fora criado a Coordenação dos Conselhos Tutelares, que é constituída por um membro de cada Conselho, pois é o órgão que disciplina a organização interna no conjunto dos Conselhos Tutelares no município[51]. Segundo Mônica Bragaglia, a composição dos CT’s, compondo-se de cinco pessoas diferentes com o desígnio de garantir os direitos da Criança e do Adolescente, cuja atribuição é a proteção integral da criança e do adolescente.
A instituição Conselho Tutelar no município de Porto Alegre, ao longo dos anos, vem em uma crescente organização e unificação de seus procedimentos. Nas estruturas e regulamentações atuais, a cidade está dividida em dez microrregiões, sendo que em cada microrregião há um Conselho Tutelar, com cinco membros escolhidos pela comunidade, por intermédio do voto. Os CT’s do município estão vinculados financeira e administrativamente à Prefeitura de Porto Alegre, por meio da Secretaria Municipal de Coordenação Política e Governança Local (SMCPGL), que disponibiliza aos CT’s duas equipes, uma de apoio operacional e outra de apoio técnico[52].
O regimento interno dos Conselhos Tutelares de Porto Alegre dispõe sobre a organização, sede, estrutura de apoio técnico e administrativo, funcionamento, coordenação geral dos Conselhos Tutelares, competência, procedimentos, registro de denúncias e comunicados e reforma do regimento interno. Como é uma instituição que deve funcionar vinte e quatro horas por dia, o regimento determina que funcione com regime de um plantão noturno e nos finais de semana da forma centralizada, ou seja, no centro do município, com a presença de no mínimo dois Conselheiros Tutelares, oriundos de cada microrregião. Os horários de trabalho e escala de plantões deverão estar fixados nas respectivas sedes, o Conselho Tutelar escalado é o responsável pela prestação de seu respectivo plantão[53].
A Coordenação geral do CT’s é um órgão colegiado composto por 10 (dez) representantes, sendo um de cada microrregião, tendo à função de disciplinar a organização interna do conjunto dos Conselhos. Compete à Coordenação ordenar a forma de distribuição de casos atendidos pelo plantão, elaboração do regimento interno e o seu cumprimento, uniformizar a forma de trabalho de acordo com o manual de procedimentos, manifestar-se em nome dos Conselhos Tutelares de Porto Alegre, prestar contas ao executivo e legislativo municipal e ao Conselho Municipal dos Diretos da Criança e do Adolescente, disciplinar o horário de trabalho dos conselheiros, convocar e coordenar as assembleias gerais, criar grupo de trabalho sempre que necessário e expedir resoluções[54].
O colegiado do Conselho Tutelar é o órgão que representa a autonomia do Conselho Tutelar nas suas decisões e competências, é formado pelos seus cinco membros, isto é, os conselheiros tutelares de cada microrregião. A Assembleia Geral é a instância máxima dos Conselhos Tutelares, pois reúne todos os conselheiros da cidade, com a responsabilidade de tomar decisões em relação aos atendimentos a serem prestados, para que sejam o mais unificados possível. Ainda estão previstas comissões e grupo de trabalho que serão criados, se necessário, para estudos ou execução de atribuições e procedimentos relativos à ação do Conselho Tutelar, as comissões serão autônomas e reunir-se-ão ordinariamente a cada quinze dias.
Ao longo dos anos, foram desenvolvidos instrumentos de trabalho para a efetivação dos Direitos da Criança e do adolescente no município. Nesse contexto, foi instituído no município, em 1997, a FICAI (Ficha de Comunicação do Aluno Infrequente), implantado pela articulação do Conselho Tutelar, Secretarias de Educação, Município e Estado e Ministério Público. A FICAI constitui-se em um instrumento de verificação e acompanhamento da frequência escolar da criança e do adolescente no ensino fundamental, como preconiza o art. 54[55] do Estatuto da Criança e do Adolescente[56].
As comissões de políticas Públicas e de Educação também são exemplos de instrumentos qualificados de atuação dos Conselhos Tutelares. Constituídas por dez membros representantes de cada Conselho Tutelar regional que têm atribuição de discutirem casos relacionados à educação, sendo que em suas reuniões são definidas as pautas para o fórum de FICAIS. Atualmente, o Fórum de Educação em que são realizadas todas as segundas-feiras de cada mês, na sede do Ministério Público, onde se reúnem os representantes da Secretaria de Educação do Estado e do Município, do Conselho Tutelar e do Ministério Público, para discutir e elaborar documentos e mecanismos que viabilizem o trabalho desses órgãos, para que realmente se consiga na esfera da educação, garantir o acesso e a frequência dessas crianças e adolescentes, do município, à escola[57].
Passou a se chamar, esse espaço de articulação institucional de “fórum de educação” uma vez, que não se discutem somente FICAIS, mas também assuntos em geral, relacionados à educação do município. Como escolas distantes e de difícil acesso, quando o ECA preconiza que a criança ou adolescente deva estudar em escola próxima a residência art. 53, V, do ECA[58]. Tal dispositivo, na prática, efetivado de maneira bem diferente pela demanda que há na cidade, muitas crianças estão estudando longe. Foi por meio desta comissão de educação que em 1998 houve uma mobilização de entidades de atendimento, ou seja, um grande movimento social iniciado pela grande Cruzeiro e Glória, bairros da microrregião 5, e após isso, pelas outras microrregiões que desse modo, conseguiu-se concomitantemente com os poderes legislativo e executivo o “Projeto Vou a Escola” para o Ensino Fundamental, para crianças que estudam longe de sua residência conforme critérios criados pela Secretaria Municipal de Educação do Município (SMED), famílias que não têm condições de arcar com essa despesa são contempladas no projeto.
No cotidiano do trabalho de cada Conselho Tutelar, o fluxo de atendimentos funciona da seguinte forma: Os Conselhos Tutelares recebem as denúncias e comunicações de direitos violados da criança e do adolescente, e o conselheiro faz o primeiro atendimento, mas nem sempre esse caso será acompanhado pelo conselheiro que recebeu a informação. Após o primeiro procedimento, é feito o registro administrativo, averiguação do direito violado, mediante visita domiciliar ou notificação e entrevista. Se improcedente a denúncia, arquiva-se. Se procedente, faz-se abertura de expediente, entrevista com a família, criança ou adolescente aplicação de medidas protetivas e encaminhamentos que se façam necessário; discussão no colegiado e acompanhamento das medidas aplicadas.[59]
3.1 Competências do Conselho Tutelar
O tema da Competência, no que se refere à atuação do Conselho Tutelar, diz respeito ao limite funcional, às áreas de abrangência que correspondem à atuação do serviço público a ser prestado à população, em relação ao território art.138[60], conforme a Lei federal 8.069/90.
Seguindo-se as determinadas no art. 147 da mesma lei, a competência do Conselho Tutelar, quanto à área de abrangência, define-se da seguinte forma:
“A competência será determinada:
I – pelo domicílio dos pais ou responsável;
Quando não é possível esse elemento, atua-se pela localidade onde se encontra a criança ou adolescente
II – pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável.”
Quanto às atribuições e competências, consoante dos incisos I e II do artigo citado, estas se equivalem quando se tratar de espaço geográfico e físico do local de domicílio ou residência dos pais, responsáveis ou onde se localiza a criança e o adolescente.[61]
“§ 1º. Nos casos de ato infracional, será competente a autoridade do lugar da ação ou omissão, observadas as regras de conexão, continência e prevenção.”
Esse inciso diz respeito ao juiz da infância e juventude, pois em se tratando de ato infracional, somente o juiz poderá aplicar mediadas sócio-educativas pertinentes a cada caso.
“§ 2º A execução das medidas poderá ser delegada à autoridade competente da residência dos pais ou responsável, ou do local onde sediar-se a entidade que abrigar a criança ou adolescente.
§3º Em caso de infração cometida através de transmissão simultânea de rádio ou televisão, que atinja mais de uma comarca, ser competente, para aplicação da penalidade, a autoridade judiciária do local da sede estadual da emissora ou rede, tendo a sentença eficácia para todas as transmissoras ou retransmissoras do respectivo Estado”.
Assim em matéria de competência atribuída ao Conselho Tutelar, segundo a Lei Estatutária 8.069/90 art. 138, aplica-se o determinado no art. 147, ou seja, há uma limitação funcional determinada segundo as atribuições que estão previstas no art. 136, e limite segundo o território, também denominada competência de foro.
Esta competência em relação ao foro é aquela que vincula o Conselho Tutelar ao local onde haja sido sediado, desta feita os conselheiros que atuam nesta unidade é que atenderão as demandas que digam respeito às crianças e adolescentes daquela localidade, sem a possibilidade de delegar a terceiros aquilo que for de sua competência.[62]
Resta ainda salientar no que se refere a competência o que bem define Maria Dinair Acosta Gonçalves:
“A respeito da competência do Conselho Tutelar, expressa no artigo 138, da Lei 8069/90, e equiparada à competência dos juízes de direito, conforme artigo 147 se esclarece fixando-se na diferença de atribuição entre órgão jurisdicional que profere decisões erga omnes no devido processo legal, assegurado o contraditório e ampla defesa às partes em lide e a atribuição do Conselho Tutelar, órgão não jurisdicional que só pode aplicar medidas de proteção às Crianças e Adolescentes em situação de risco, conforme artigo 98[63], da Lei 8069/90.
3.2 Atribuições do Conselho Tutelar
O Conselho Tutelar atende caso a caso, somente no âmbito de sua microrregião ou no seu município, dando encaminhamentos pertinentes. A instituição, portanto, recebe denúncias de violação de direitos como maus-tratos, negligência, violência física e psicológica, abuso sexual, abandono ou a própria conduta. Por ser um órgão autônomo, deve tomar decisões colegiadas e aplicar medidas protetivas, (ECA art. 101, I ao VII) sem interferência externa, ou seja, sem interferência política, ou hierárquica. Somente o Poder Judiciário poderá rever as medidas aplicadas pelo Conselho Tutelar, mediante pedido de quem tem legítimo interesse, ou seja, pelo Ministério Público ou a parte interessada conforme o art. 137 da lei 8069/90. Ainda como forma de controle da atuação do Conselho Tutelar, as pessoas que se sentem prejudicadas, inclusive o Judiciário, Ministério Público, podem fazer denúncia, junto à Corregedoria dos Conselhos Tutelar[64]·.
O Conselho Tutelar tem deveres e poder para atuar quando há direitos violados ou ameaçados, seja comissivo, ou omissivo, por parte do estado ou da sociedade em geral, ou pela própria conduta da criança e do adolescente, quando deve- se aplicar as medidas de proteção asseguradas no art.98[65] , e elencadas no art.101[66] do ECA.[67]
A função do Conselho Tutelar não é prestar serviços de forma a atender direitos, e sim zelar para que quem deva cumprir os cumpra efetivamente, essa instituição não pode ser o primeiro órgão a ser procurado. O Conselho Tutelar é um órgão fiscalizador e não oferece serviço, mas o requisita. Assim quando a necessidade da criança é no âmbito da educação, esse direito deve ser efetivado pela família, pelo Estado e pela sociedade, ou seja, o Conselho Tutelar só será acionado quando quem deveria cumprir seu dever não o faz.[68]
As atribuições do Conselho Tutelar estão elencadas no artigo 136 da Lei nº 8069/90, regulamentando não apenas o atendimento direcionado às crianças e adolescentes como também as penalidades impostas àqueles que deixarem de observá-las.
Segundo o inciso I, do referido artigo, poderá o Conselho Tutelar visando o atendimento de crianças e adolescentes, nas hipóteses previstas nos artigos 98[69] e 105[70], aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII, aplicar dentre outras, verificadas qualquer das hipóteses prevista no artigo 98 do ECA, as seguintes medidas:
“I. Encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II. Orientação, apoio e acompanhamento temporários; III. Matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento de ensino fundamental; IV. Inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança ou adolescente; V. requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI. Inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos.”
Em se tratando de ato infracional praticado por adolescente, a competência é do juiz da infância e juventude para a aplicação das medidas sócio-educativas conforma artigo 112[71] do ECA, que verificando a pratica de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: advertência;obrigação de reparar o dano; prestação de serviço a comunidade; liberdade assistida; internação em estabelecimento educacional. E qualquer uma das medidas de proteção prevista do art. 101, I ao VI, sendo que a medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la bem como as circunstâncias e a gravidade da infração. Quando se tratar de ato infracional praticado por criança caberá ao Conselho Tutelar apenas aplicar medidas protetivas conforme artigo 105[72] ECA.
O inciso II,do artigo 136, é direcionado aos pais ou responsáveis de crianças e adolescentes, pois prevê atendimento e aconselhamento aos mesmos. Ainda no que se refere ao artigo 129[73] do Estatuto, que elenca as medidas aplicáveis caso os direitos e garantias destes não sejam efetivados. No presente inciso o Conselho Tutelar possui em sua atribuição a finalidade de aconselhar, orientar pais e responsáveis, ter um fim educativo para com as famílias no sentido de superar suas dificuldades, muitas das vezes materiais ou psicológicas, com a finalidade de garantir que a criança e o adolescente possam permanecer na companhia de seus pais, em que terão um desenvolvimento completo.
O inciso III possibilita ao Conselho Tutelar requisitar serviços, na área da educação como: vaga em escolas infantis (creches), vagas em escola de ensino fundamental até mesmo para o cumprimento da medida do art.129, inciso V do ECA, ou seja, matricula e frequência obrigatória em estabelecimento de ensino citado acima. Possibilita ainda requisitar serviço na área da saúde tais como: consulta ou exames necessários, tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico em regime ambulatorial ou hospitalar, inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento para alcoólatras e toxicômanos. No que se refere ao trabalho e segurança, poderá exigir do Ministério do Trabalho que fiscalize empresas que submetem adolescentes a serviços, penosos, insalubres e com índice de periculosidade[74].
Poderá o Conselho Tutelar quando, ainda representar, junto à autoridade judiciária os casos injustificados de suas deliberações o que dará início ao procedimento para apuração a infração administrativa, previsto no artigo 249[75] do ECA.
O Conselho Tutelar quando tiver de posse de informações sobre infrações administrativas ou penal contra os direitos da criança e do adolescente, deverá imediatamente dar ciência do fato ao Ministério Público, para que este tome as providências necessárias tais como: requerer novas diligências, a instauração de inquérito policial ou oferecer denúncia, pois assim determina o inciso IV do artigo 136 do Estatuto.
O inciso VII traz um grande avanço aos Conselhos Tutelares para que possam cumprir com maior efetividade suas atribuições, pois autoriza que os conselheiros expedirem notificações. Dessa maneira, o Conselho Tutelar poderá notificar pais, adolescentes, servidores públicos, e também responsáveis por entidades, como também adotar providências para fazer-se cumprir os direitos da criança e do adolescente, ou pelo simples fato de cessar a violação a tais direitos. Através da notificação o Conselho Tutelar poderá também deixar os destinatários e beneficiários cientes das medidas aplicadas. Como também, poderá fazer com que se cumpra o direito da criança à frequência escolar.
O Conselho Tutelar, sem ônus algum e sob qualquer circunstância, poderá requisitar aos cartórios de registro civil das pessoas naturais, certidão de nascimento e de óbito de criança ou adolescente. Dessa maneira, o conselho tutelar consegue suprir com a falta deste documento para crianças e adolescentes de famílias de baixa renda a segunda via do documento, facilitando desta forma a garantia de seus direitos básicos, que, em muitos casos, não são garantidos pelo simples fato de não possuírem a certidão de nascimento. Esta prerrogativa está elencada no inciso VIII do estatuto.
Segundo o inciso IX, cabe aos Conselhos Tutelares o auxílio na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento às crianças e adolescentes.
Segundo Andre Karst Kaminski[76], caberá aos conselheiros o auxílio ao Poder Executivo referente às propostas que visem planos e programas de atendimento Às crianças e adolescentes, pois são pessoas próximas a comunidades dessa forma, possuem ciência das necessidades existentes, sugerindo propostas efetivas quanto a solução de tais problemas
O inciso XI estabelece uma parceria entre Ministério Público e Conselho Tutelar, sempre que há abusos contra os filhos cometidos pelos pais, o Conselho Tutelar na maioria dos casos é o primeiro a tomar conhecimento, que irá se posicionar de forma que se faça valer os direitos da criança ou adolescente, pois aplicará as medidas protetivas e encaminharão os mesmos à tratamento, quando necessário. Como também, remetem ao Ministério Público, um relatório circunstanciado que detém competência para requerer judicialmente a suspensão ou perda do poder familiar, conforme artigos. 155[77] e 201, III[78], do ECA.
Assim sendo, o Conselho Tutelar imbuído da sua competência e no exercício de suas atribuições busca em sociedade um meio de efetivar os direitos, essencialmente aqueles fundamentais da criança e adolescente. Todas essas concepções são referentes ao município de Porto Alegre.
4 O Conselho Tutelar como meio para viabilizar a efetivação dos Direitos da Criança e do Adolescente
O Conselho Tutelar nasce atrelado a Doutrina de Proteção Integral, buscando superar a idéia de que o trato com crianças e adolescentes não era de real importância, segundo autora Mônica Bragaglia.[79]
E assim o Conselho Tutelar efetivou-se com o condão de ter o direito de crianças e adolescentes reconhecidos, protegidos e respeitados o que se denota ante as palavras de Ana Paula Motta Costa: “A pessoa humana criança ou adolescente encontra dificuldades de ter efetivada sua dignidade na medida em que depende do seu reconhecimento pelos adultos”.[80]
Segundo Sarlet [81] os direitos fundamentais são aqueles estabelecidos no ordenamento jurídico pátrio, em nossa Constituição Federal figuram no artigo 5º. Sua regulação específica, conforme Ana Paula Motta Costa, encontram-se nos artigos 227 e 228, pois tratam dos direitos específicos das crianças e adolescentes[82].
No Estatuto da Criança e do Adolescente, tais direitos encontram-se no Livro I, e referem-se ao direito a vida e saúde, direito a liberdade a ao respeito e à dignidade, do direito a convivência familiar e comunitária, direito à educação, cultura esporte e lazer, do direito a profissionalização e à proteção no trabalho.
O Conselho Tutelar fiscaliza a efetivação dos direitos de crianças e adolescentes, sendo assim, compete ao Conselho Tutelar vigiar para que a família, a sociedade em geral e o poder público façam cumprir estes direitos prioritários as crianças e adolescentes, cobrando que cada uma das instituições cumpra com o seu dever.[83]
Considerado como órgão permanente, a atuação do Conselho Tutelar é uma ação contínua, não podendo ser extinto, ignorado, ou suspenso nas suas funções. Possui autonomia para agir conforme o previsto pelo ECA, dentro das atribuições estabelecidas na legislação, Assim diante de cada caso agirá de forma administrativa, porém suas decisões poderão ser revistas judicialmente. Quanto a não jurisdicionalidade do Conselho, desnecessário seria tal menção, uma vez que o CT é órgão integrante do Poder Executivo Municipal, sendo atuação meramente administrativa, realizando deliberações e jamais sentenças, estas exclusivas do Poder Judiciário.[84]
As atribuições do Conselho Tutelar encontram-se dispostas no artigo 136 do ECA, Ressalte-se neste contexto o zelo pelo cumprir os direitos da criança e do adolescente defendendo-os de qualquer situação ameaçadoras, tanto com de medidas protetivas, como ação curativa.[85]
Ainda, segundo Edson Sêda, membro da Comissão Redatora do Estatuto, o Conselho Tutelar nada mais é que:
“É uma equipe de cinco pessoas, escolhidas pelos cidadãos do Município para atender casos de crianças e adolescentes ameaçados ou violados em seus direitos e tomar as providências adequadas para FAZER VALER esses direitos.”
Ainda segundo André Kartst Kaminski:
“O desmembramento das anteriores competências judiciais, surge o Conselho Tutelar, órgão público, permanente, autônomo, não jurisdicional. Criado pela lei federal como autoridade municipal com atribuição para atender em primeiro lugar a todas as situações jurídicas e não jurídicas envolvendo a ameaça e/ou violação dos direitos da criança e do adolescente. Então a partir do Estatuto, o juiz atenderá somente as questões jurídicas judiciais, ficando todas as demais situações jurídicas não judiciais, ou seja as administrativas e socioassistenciais, sob a atribuição do Conselho Tutelar”.[86]
Desta forma, o CT- Conselho Tutelar tomou para si o atendimento aos casos de violação dos direitos da Criança e Adolescente como situações de maus-tratos, abandono, violência em qualquer das suas formas ou proporções retirando da Justiça da Infância e da Juventude tal incumbência.[87]
O Conselho Tutelar, por suposto, não tem o poder, nem a atribuição de prestar serviços que correspondam ao atendimento dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, mas é extremamente importante em seu papel de fiscalizar quem os deva cumprir o faça efetivamente, segundo Mônica Bragaglia[88]:
“Nesse cenário o conselho tutelar é um organismo “chave” que tem, em sua definição, a competência formal de zelar pelo cumprimento dos direitos previstos na lei.”
Contudo, o Conselho Tutelar não deve ser a primeira instituição a ser acionada, uma vez que em sua função de fiscalização presta-se a requisitar e não prestar propriamente o serviço, a exemplo da prestação de educação escolar que inicialmente é dever familiar, posteriormente do Estado e em não sendo prestado pelos respectivos responsáveis, será então o Conselho chamado a efetivar tal direito da Criança ou Adolescente[89], requisitando serviços e tomando as providências para a responsabilização de prestar o respectivo atendimento.
No próximo item buscar-se-á expor questões procedimentais quanto à atuação do Conselho Tutelar na medida em que toma conhecimento das condutas lesivas aos direitos de crianças e adolescentes, e comprovada efetividade do dano, busca revertê-lo, protegendo e fazendo cumprir tais direitos legalmente estabelecidos pelo ECA – Estatuto da Criança e Adolescente, utilizando-se da aplicação de Medidas Protetivas.
4.1 Abordagem e procedimentos administrativos e aplicação de medidas protetivas.
O inciso II do artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente define que o Conselho Tutelar é a quem se destina as denuncias em que figuram crianças e adolescentes como atores, disponibilizando-se a atender e aconselhar pais ou quaisquer responsáveis.
Cabe aos Conselheiros Tutelares, dentre outras atribuições, atenderem as reclamações feitas pela comunidade, suas reivindicações, e também as solicitações que partem das próprias crianças e adolescentes, suas famílias, ou cidadãos que compõem tal comunidade, ouvindo, orientando, aconselhando se for o caso . Aplicará as medidas protetivas especificas ao caso especifico, requerendo serviços necessários para o sucesso do atendimento de cada situação. Participa do planejamento e formação de políticas públicas, bem como na elaboração de planos municipais que visem atender à criança ou ao adolescente, bem como às famílias da comunidade. [90]
A ele destinam-se as denúncias de maus tratos, abandono, e outras, tais comunicações que partem da sociedade, da comunidade. Assim, o Conselho sai em busca da confirmação, fazendo de forma preliminar uma investigação e, posteriormente, se proporá a oferecer possíveis soluções, dentre as quais relatório na modalidade circunstanciada ao Juiz ou ao Promotor de Justiça como se verá adiante.
No cotidiano do trabalho de cada Conselho Tutelar, o fluxo de atendimento funciona da seguinte forma: primeiramente, recebem as denúncias e comunicações de direitos violados das crianças e do adolescentes. Um conselheiro faz o primeiro atendimento, mas nem sempre esse caso será acompanhado pelo conselheiro que recebeu. Após o primeiro procedimento, é realizado o registro administrativo, averiguação do direito violado, através de visita domiciliar ou notificação e entrevista. Se improcedente a denúncia, arquiva-se. Se procedente, faz-se abertura de expediente, entrevista-se a família, criança ou adolescente aplicando-se medidas protetivas e encaminhamento que se fizerem necessário; discussão no colegiado e acompanhamento das medidas aplicadas.[91]
Segundo os procedimentos administrativos quanto ao recebimento das denuncias estas podem ser feitas via telefone, de forma pessoal, ou através de documentos compostos por relatos efetuados pelas redes de atendimento a crianças e adolescentes, como escolas, creche, grupos de extraclasse, através de instituições de saúde ou outros, ou mesmo ainda por meio do Ministério Público.[92]
“Cuidar não é atribuição exclusiva do conselheiro tutelar, mas ele precisa estar atento no trato do dia-a-dia com outros cuidadores pais, professores, irmãos mais velhos, tios, avós, etc.). É importante ter a sensibilidade para perceber quando não existe amor, pois de tudo que amamos, também cuidamos, e quando cuidamos, amamos. Quem cuida se responsabiliza e se compadece.”[93]
O Conselho trabalha de forma direta com as pessoas que na maior parte das vezes vão até o CT, ou até mesmo recebem a visita de conselheiros que tem noticiadas situações de crise ou dificuldades, a fim de compreender o caso para traçar a maneira correta de agir no auxilio destas pessoas. Nestas visitas efetuam-se entrevistas de forma acertada para que não se perca o foco da denúncia, e preenche-se o “Formulário Visita Domiciliar” ou de “Entrevista”[94]
Em denúncias feitas por telefone, cabe ao conselheiro colher o maior numero de informações possíveis, todavia visa-se o convencimento do denunciante a formalizar sua denúncia de forma presencial, sem, no entanto ter seus dados pessoais divulgados, ou seja, garantindo-lhe anonimato.
Desta feita, qualquer denúncia deverá ter preenchido o Formulário chamado “Recebimento de Denuncia”, assim colher-se-a o maior numero de informações possíveis a fim de elucidar os fatos. Dentre os dados importantes a serem coletados quando da denúncia, estão o nome, endereço, data de nascimento e nome dos pais ou responsáveis.
Se a denúncia for feita de forma pessoal deve-se buscar que o relato seja o mais completo possível, em ordem do acontecimento efetivo dos fatos, o conselheiro deve sempre estar atento a veracidade das informações mesmo que seja necessário que se busque outras fontes informativas, buscando identificar o real objetivo da denúncia.
Na busca por confirmar as informações prestadas deve o conselheiro tutelar solicitar dados como o grau de parentesco com a criança ou adolescente, o agente causador do dano e qual a sua relação com este, encontrava-se presente no momento do fato e se esta denúncia é única ou recorrente.
No formulário em que se descrevem os fatos e relata-se a denúncia, registra-se da veracidade, constando hora e localização da realização da averiguação, a fim de tornar ágil qualquer procedimento que se faça necessário, ou, em caso negativo, há campo determinado para a informação da inexistência do fato, e o mesmo é arquivado.
Sempre que for feita determinada entrevista deverá o conselheiro ter o cuidado de utilizar linguagem que possa diferenciar o relato do denunciante de suas anotações e opiniões pessoais sobre o fato. [95]
O manual de procedimentos para os Conselhos Tutelares de Porto Alegre em seu artigo 74 determina que:
“No que se refere a aplicação de medidas, o Conselheiro deverá construir um plano de ação junto à criança, adolescente, família e agentes violadores, sempre que os maus-tratos forem intrafamiliares, respeitando possibilidades e limites dessas pessoas,desmistificando falsas expectativas em relação à situação, que possam aumentar as frustrações”[96].
Os Conselhos Tutelares do Município de Porto Alegre deverão, segundo o manual referido, tratar com zelo e agilidade todas as denúncias recebidas, com intuito de preservar a integridade física e psicológica da criança e adolescente.[97]
Após a chegada da denúncia, a entrevista com as partes envolvidas, e a verificação da veracidade dos fatos, ou danos, o Conselho Tutelar, de forma colegiada (composta pelos conselheiros integrantes daquele Conselho), reunir-se-á para traçar um plano de ação sobre as providências especificas a cada situação de violação de direitos
Desta feita, verificada a ameaça ou violação de direitos na realização do estudo de cada caso concreto, tomam-se providências para cessar a ameaça ou violação.
As medidas de proteção serão sempre aplicadas a crianças e adolescentes que tenham seus direitos violados ou ameaçados conforme preceitua o artigo 98 do ECA:
“Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicadas sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III – em razão de sua conduta.”
No que tange a deficiência em assegurar os direitos fundamentais da criança e adolescente, por parte do Estado ou da Sociedade, ou quando a proteção destes direitos se der de forma deficitária, incompleta ou irregular, se estará diante da chamada ameaça ou violação por ação ou omissão da Sociedade e do Estado.[98]
É verdade que existem situações em que a própria criança e adolescente coloca-se em situação de risco, envolvendo-se com terceiros de índole duvidosa, agindo com ameaça ou violação de deveres e direitos inerentes a sua cidadania, ou a cidadania alheia, todavia estes também contarão com a possibilidade da aplicação de medidas protetivas.
Da mesma forma há a aplicação de medidas aqueles pais ou responsáveis[99] (tutor, guardião, dirigente de abrigo, etc.) que por algum motivo não possam ou simplesmente não possibilitem assistência, criação, e educação as crianças ou adolescentes sob sua responsabilidade, seja por falta no caso morte ou ausência.
Quanto a prática do ato infracional, teremos medidas de proteção aplicadas às crianças, e poderão também ser aplicadas medidas aos pais ou responsáveis. A criança infratora poderá ser encaminhada aos pais ou responsáveis ante a assinatura do termo de responsabilidade assumido por estes, submetida à tratamento psicológico, orientadas sobre seus deveres. Na falta de pais ou responsáveis, poderá a criança ser encaminhada a entidade de acolhimento, sendo necessário fará tratamento médico, será matriculado regularmente em estabelecimento escolar, e incluído em programas socioeducativos.[100]
As medidas que podem ser aplicadas de forma autônoma pelos Conselhos Tutelares, estas encontram-se previstas no artigo 101, incisos I a VI do Estatuto da Criança e do Adolescente, da forma descrita abaixo:
“Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II – orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;
IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;”
Em primeiro lugar, busca o Conselho Tutelar notificar pais ou responsáveis que, por algum motivo, não cumpriram com seus deveres, convocando-os à sede do Conselho para a assinatura e recebimento do termo de responsabilidade compromissando-se a partir daquela data a sanear seus deveres.
A ação dos pais ou responsáveis também poderá contar com o auxilio de políticas públicas de assistências social, ou a pedido dos próprios, ou partindo de estudo do caso especifico, quando haja real dificuldade e limitação ao cumprimento de educar e orientar as crianças e adolescentes sob sua responsabilidade.[101]
Criança e adolescente devem estar devidamente matriculados em instituições de ensino, com freqüência escolar comprovada, sempre que os pais não forem capazes ou não tiverem possibilidade. Assim, o Conselho orientará a família ou a entidade onde a criança ou adolescente for atendido buscando que zelem pelo caso.[102]
Caberá ao responsável pelo estabelecimento de ensino denunciar imediatamente, em acompanhando o caso e no cumprimento de sua obrigação legal[103] ao Conselho maus tratos que envolvam seus alunos, reincidência em faltas não justificadas, fugas escolares e esgotamento de recursos das escolas, bem como repetência em proporções indesejadas.
Caberá igualmente ao Conselho Tutelar buscar, se necessário, serviço publico de saúde, garantindo atendimento à criança e ao adolescente e o tratamento necessário, especializado se for o caso. De outra parte, caberá ao CT tomar as providências necessárias quando suas famílias não forem atendidas nestas unidades de saúde, ou se forem de forma inadequada. Solicitará igualmente junto ao Poder Público, a inclusão da criança ou adolescente em programa oficial ou em sua comunidade para auxiliá-lo, e orientá-lo, bem como encaminhá-lo, se for o caso, a orientação e tratamento a alcoolistas e dependentes químicos.[104]
O artigo 236 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que em casos de desobediência injustificada de suas determinações tanto por órgão governamental ou não, o Conselho encaminhará a autoridade judiciária explicitando o prejuízo ou risco que esta falta ou omissão poderá acarretar em detrimento dos direitos da criança e do adolescente, bem como o desamparo as suas famílias.[105]
Em o juiz considerando relevante a representação do Conselho poderá intervir, enviando o caso ao Ministério Público, que fará a apuração da infração, como se verá no capitulo a seguir.
Ressalta-se que os procedimentos aqui referidos como os realizados pelo Conselho Tutelar, são previstos na legislação, sendo apenas orientações para que as ações destinadas ao atendimento das denúncias em que hajam direitos violados, sejam uniformizadas a nível estadual[106].
4.2 Da Representação Junto ao Ministério Público
A representação é a exposição dos fatos, faltas ou irregularidades, realizados por escrito e remetidos à autoridade competente, solicitando providências. Trata-se de uma reclamação fundamentada, contendo a descrição detalhada dos fatos considerados como irregulares. [107]
Segundo o inciso IV do artigo 136 do Estatuto, o Conselho Tutelar deve encaminhar ao Ministério Público notícia de fato e representação, que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente.
De acordo com o que preceitua Afonso Armando Konzen:
“Além da precaução de que os encaminhamentos entre órgãos públicos sempre devam ser formalizados, por ofício ou outra forma estabelecida em comum entre o encaminhante e o encaminhado, há a assinalar que o Estatuto, pelo menos em relação às incumbências do inciso IV do artigo 136, repete-se zelosamente. Ora, se determinado fato constitui-se em uma infração administrativa, está o Conselho Tutelar legitimado a oferecer a representação à autoridade judiciária competente (artigo 194 do Estatuto). Agora, no inciso IV do artigo 136, abre a possibilidade de comunicar o fato ao Ministério Público. Tem o Conselho, portanto, duas alternativas. Ou oferece a representação, ou comunica o fato ao órgão do Ministério Público.”[108]
Quando ocorrer descumprimento por parte de pais ou responsáveis a qualquer determinação do Conselho Tutelar, caracterizando desta feita infração administrativa, a noticia será enviada ao Ministério Público[109], de quem é a competência para a representação nestes casos, assim como nos crimes chamados de embaraço[110], pois cabe a este último a competência para intentar ação penal[111].
Todavia não é competência do Conselho Tutelar a intervenção nas questões e decisões onde haja envolvimento de familiares na guarda de crianças ou adolescentes, caso em que terão por obrigação o encaminhamento a autoridade competente, quando por qualquer motivo venha a seu conhecimento questões que envolvam estas situações irregulares [112]. No entanto, é de competência concorrente do Conselho Tutelar, juntamente com Ministério Público e o Poder Judiciário, a fiscalização das entidades mantenedoras de programas de atendimento a crianças e adolescentes, sendo entidades governamentais ou não. [113]
Uma vez constatadas irregularidades nas entidades de atendimento à crianças e adolescentes, poderá o Conselho Tutelar iniciar procedimento de apuração judicial, oferecendo a representação junto a autoridade competente, neste caso o Juiz da Infância e Juventude, como preceitua o artigo 191 do ECA.[114]
Todavia, a representação encontra entraves, e sua aplicação torna-se pouco freqüente, ou em proporções menores que as esperadas, conseqüência da dificuldade dos próprios conselheiros em identificar as situações onde haja real necessidade da devida representação, e/ou pelo próprio despreparo que muitos apresentam.
No que se refere à qualificação necessária para o exercício da funcão de conselheiro tutelar, cabe referir que o ECA, no artigo 133, trás os requisitos a serem preenchidos[115] por aqueles que pretendam se candidatar a conselheiros tutelares. Porém, por não mensurar qualificações específicas, os requisitos foram aumentados através de lei municipal nº 628/09, alterada recentemente, que prevê uma qualificação mais específica, direcionada ao tratamento de crianças e adolescentes, comprovado através de cursos[116].
No entanto, as exigências ainda não são suficientes para sanar algumas dificuldades encontradas, como a falta de conhecimento técnico e jurídico necessário, o que restou evidenciado com a pesquisa realizada entre os Conselhos Tutelares, na qual apontaram que as atribuições do Conselho Tutelar não são mais bem desenvolvidas devido a falta de capacitação dos próprios conselheiros, ainda evidenciando que muitos tomaram conhecimento do ECA somente quando no desempenho de suas funções.[117]
Outro fator relevante que se tornou um obstáculo na efetividade dos direitos das crianças e adolescentes é a falta de políticas públicas, constatada através de análise realizada na Prestação de Contas dos Conselhos Tutelares do ano de 2009. Conclui-se que há uma necessidade de investimentos nas políticas públicas para que os direitos sejam plenamente efetivados e que a inclusão social seja uma realidade em grande escala.
Devido ao conjunto de fatores elencados, a efetividade dos Direitos Fundamentais das crianças e adolescentes torna-se, muitas vezes, deficiente por parte dos Conselhos Tutelares, tornando a representação diante do Ministério Público, no mais das vezes, vital para a efetivação desses direitos quando esgotarem-se todos os recursos por parte do Conselho Tutelar . Porém, esse não é um fato isolado, pois a escassez de políticas públicas direcionadas a este público, contribui para que a prestação de serviços a fim de garantir os seus direitos previstos constitucionalmente e positivados pelo ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, não sejam plenamente observados.
5. Conclusão
Crianças e adolescentes possuem direitos próprios previstos em diversos instrumentos internacionais e na própria legislação brasileira. No plano internacional, ressalta-se a Convenção sobre o Direito da Criança, aprovada pela ONU, em 1989, e em vigência no Brasil desde 1990.
A Constituição Brasileira de 1988 relaciona em seu artigo 227 aqueles direitos destinados a conceder às crianças e adolescentes absoluta prioridade no atendimento ao direito à vida, saúde, educação, convivência familiar e comunitária, lazer, profissionalização, liberdade, integridade etc.
Neste mesmo texto, fica claro que é dever do Estado, da família e da sociedade livrar a criança e o adolescente de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Crianças e adolescentes possuem primazia em receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, precedência no atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude, programas de prevenção e atendimento especializado aos jovens dependentes de entorpecentes e drogas afins.
Mas o marco na definição das garantias às crianças e adolescentes foi em 1990 com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que passou a regular os direitos previstos na Constituição Federal, estabelecendo um conjunto de direitos específicos dessas pessoas.
Com o ECA, não apenas surgiam leis destinadas às crianças e adolescentes, como também, ocorriam mudanças essências no cenário das garantias fundamentais deste público. Inicialmente, observaram-se os direitos individuais, como: vida, liberdade, e o direito a dignidade, Assim como os direitos coletivos, tais como: os direitos econômicos, sociais e culturais. Passam a ser considerados pessoas em condições peculiares de desenvolvimento, sendo atribuída uma condição de prioridade absoluta, referente ao recebimento de proteção e socorro, atendimento por serviço ou órgão público e na execução de políticas públicas.
As mudanças também ocorreram quanto a gestão, reforçando a importância do artigo 227 da Constituição Federal, responsabilizando União, Estados, Município, e também a sociedade civil. O ECA estabeleceu uma divisão do trabalho social entre todos os responsáveis pelos direitos da infância e juventude.
No entanto não bastava apenas a normatização das Leis, sendo necessária a criação de uma instituição para que esses direitos fossem realmente garantidos, com este intuito que o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de garantir os direitos desses pequenos cidadãos, esta prevista a criação de pelo menos um Conselho Tutelar em cada município, assim como determina as atribuições elencadas no art. 136 do ECA, ainda ressalta que cada município deverá através de lei municipal regulamentar o funcionamento e manutenção desta nova instituição Conselho Tutelar.
O Conselho Tutelar de Porto Alegre foi criado em 1991, sendo o pioneiro no país. Atualmente, está dividido em dez microrregiões, composto por cinco conselheiros eleitos pela comunidade. Considerado um órgão público, constituído por iniciativa do Poder Executivo e de forma definitiva, subordina -se ao ordenamento jurídico nacional. Ressalva-se que as decisões dos colegiados dos CT’s, ou seja, decididas por todos os conselheiros que o compõe, possuem autonomia quanto as suas decisões, podendo essas serem revistadas, somente pelo Poder Judiciário, mediante pedido do Ministério Público ou por parte legítima interessada.
O Conselho Tutelar de Porto Alegre, ao longo dos anos vem buscando aprimorar suas atribuições com o intuito de aprimorar a efetividade dos direitos da infância e juventude, com isso, criaram-se inúmeros instrumentos de trabalho, divididos em vários setores sociais, priorizando a educação, a exemplo do FICAI (Ficha de Comunicação do Aluno Frequente), uma parceria entre os CT’s e a Secretaria Municipal de Educação, com intuito de diminuir a evasão escolar.
Por estarem divididos por regiões, os CT’s possuem suas competências limitadas pela área de abrangência, correspondente a sua atuação. Desta forma, a competência dos conselheiros é vinculada a região em que se encontra o CT.
A atuação dos Conselhos Tutelares possui uma parceria junto ao Ministério Público, pois quando as deliberações referirem-se a infrações administrativas e penais, estas serão comunicadas imediatamente ao MP para que tome as providências necessárias.
Os conselheiros tutelares atuam no âmbito de sua região, quando houver direitos violados ou ameaçados, seja por terceiros ou por conduta da própria criança ou adolescente. No entanto, o CT possui como função precípua zelar pelo efetivo cumprimento das garantias fundamentais das crianças e adolescentes, responsável em requisitar serviços, e não de atender direitos.
No entanto, quando não prestados de forma adequada os serviços básicos, caberá ao CT buscar a efetividade na prestação do serviço público, como: saúde, educação, proteção de forma adequada, mesmo que tenha que acionar o Poder Judiciário.
Embora esteja em constante aprimoramento, os CT’s ainda encontram dificuldades interna e externas para garantir de forma integral e eficaz as garantias fundamentais destinadas à infância e juventude.
Mesmo com as alterações sofridas recentemente, a lei que rege os requisitos para uma pessoa se candidatar a conselheiro tutelar ainda não são suficientes para atender as peculiaridades do cargo. Ainda faltam conhecimentos técnicos específicos que acarretam dificuldades na aplicação de medidas com intuito de garantir ou restaurar os direitos violados.
Quanto ao fator externo que gera dificuldade na prestação dos serviços, encontramos a falta de políticas públicas destinadas ao público infanto-juvenil, não esquecendo que muitas vezes se torna necessário um trabalho com toda a família para que os direitos básicos das crianças e adolescentes sejam observados, tais como saúde e habitação.
Os cuidados com o público infanto-juvenil ao longo dos anos vêm passando por aprimoramentos a fim de resguardar todas as garantias a ele destinadas, considerando que se trata de pessoas em situação peculiar e em constante desenvolvimento. Por isso, cabe á todos, Estado, família e sociedade zelar pela garantia de seus direitos, sendo o Conselho Tutelar um órgão auxiliar neste serviço.
Contudo, não basta apenas existir um Conselho Tutelar em cada município, se não houver políticas públicas capazes de garantir um desenvolvimento físico e psíquico saudável e completo de crianças e adolescentes. Logo, não basta a infância e adolescência serem prioridades apenas nas leis e não o serem de fato, é preciso que a Constituição Federal e ECA sejam aplicadas de forma integral.
Acadêmica de Direito
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