Resumo: O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) embasou-se nos preceitos fundamentais fornecidos pela Constituição Federal do Brasil de 1988. O Estatuto internalizou uma coleção de normas internacionais, regulando os direitos humanos das crianças e adolescentes. O ECA opõe-se ao Código de Menores, no que tange a participação processual, vez que, o Código de Menores possuía mínima participação. O Parquet no âmbito do ECA, possui presença constante, seja sob forma de autor, de interventor e no papel de fiscal da ordem jurídica. O Estatuto intenta reformar a aparência da questão do menor em situação de vulnerabilidade, mudando a atuação do poder público, conferindo ao Ministério Público ampliação de seus poderes para que sua atuação seja efetiva e decisiva nesta esfera.
Palavras-chave: Estatuto da Criança e do Adolescente. Ministério Público. Constituição Federal. Código de Menores. Menor Vulnerável.
Abstract: The Statute of the Child and Adolescent (ECA) was based on the fundamental precepts provided by the Federal Constitution of Brazil of 1988. The Statute internalized a collection of international norms, regulating the human rights of children and adolescents. The ECA opposes itself from the Juvenile Code, as far as procedural participation is concerned, since the Juvenile Code had minimal participation of the Public Ministery. Within the scope of ECA, the Public Ministery has a constant presence, whether in the form of author, intervener or in the role of public prosecutor. The Statute seeks to reform the appearance of the issue of the child in a situation of vulnerability, changing the performance of the public power, giving the Public Prosecutor's Office an ampliation of its powers so that its action is effective and decisive in this sphere.
Keywords: Statute of the Child and Adolescent. Public Ministry. Federal Constitution. Code of Minors. Vulnerable Minor.
Sumário: Introdução; 1. Desenvolvimento; 1.1 Ministério Público como autor; 1.2 Ministério Público como Fiscal da Ordem Jurídica; Conclusão; Referências Bibliográficas.
Introdução
O marco teórico da criação de um conjunto de normas para ordenamento jurídico brasileiro, visando a proteção integral da criança e do adolescente, teve prelúdio com a instituição da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, notoriamente conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Embasando-se nos preceitos fundamentais fornecidos pela Constituição Federal (CF) de 1988, esta internalizou uma coleção de normas internacionais, regulando os direitos humanos das crianças e adolescentes.
1. Desenvolvimento
A CF/88, com a redação dada pela Emenda Constitucional (EC) nº 65 de 2010, deu especial atenção ao dispor sobre os direitos da criança e do adolescente, elaborando um capitulo que tratasse exclusivamente sobre os direitos destes, conjuntamente com os da família, do jovem e do idoso.
A EC nº 65, de 2010, trouxe um instituto plúrimo de proteção aos grupos de menores vulneráveis, acrescentando a palavra jovem, agregando assim, ao seu rol de proteção, todos que necessitassem de uma atenção sui generis do Estado.
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)” (grifo nosso).
Com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que substituiu a Lei nº 6.697 de 1979 (Código de Menores), o Ministério Público adquiriu novas e amplas atribuições. Desde a promulgação da CF/88, as atribuições do Ministério Público vem se multiplicando, evidenciando a confiança do legislador no Órgão.
O ECA opõe-se ao Código de Menores, no que tange a participação processual, vez que, o Código de Menores possuía mínima participação. O Parquet no âmbito do ECA, possui presença constante, seja sob forma de autor, de interventor ou quando desempenhar o papel de fiscal da ordem jurídica. Há, também, uma nova característica acrescentada ao rol de atribuições do MP (dado pelo ECA); este é conhecido como o instituto da remissão, onde o MP, com ampla discricionariedade, exerce a faculdade de não proceder contra adolescente autor de ato infracional.
1.1 Ministério Público como autor
Nas hipóteses em que o membro do Parquet atuar como autor, este se habilita como curador das crianças e adolescentes, representando uma figura protetora de suas garantias.
Conferidos pelo ECA, o MP poderá propor:
a. Ação cível de proteção dos interesses difusos, coletivos ou individuais, relativos à infância e à adolescência;
b. Ação de alimentos, em favor de criança ou adolescente;
c. Ação de suspenção e destituição do pátrio poder;
d. Ação de prestação de contas de tutores, curadores e quaisquer administradores de bens de crianças e adolescentes;
e. Ação de remoção de tutores, curadores e guardiães;
f. Ação de especialização de hipoteca legal dos bens de tutores e curadores;
g. Ação de responsabilidade civil do infrator de normas de proteção à criança e ao adolescente;
h. Ação de execução de multa cominatória e de sentença condenatória;
i. Ação penal decorrente da prática dos crimes definidos na nova lei contra a criança e adolescente.
j. Mandado de segurança, de injunção e habeas corpus, visando os interesses sociais e individuais indisponíveis, relativos à criança e ao adolescente;
k. Procedimento para apuração de irregularidades em entidades de atendimento;
l. Procedimento para apuração de infração administrativa às normas de proteção à criança e adolescente;
m. Procedimento para apuração de ato infracional;
n. Qualquer outra ação ou medida judicial ou extrajudicial, visando assegurar o efetivo respeito aos direitos e garantias legais das crianças e adolescentes.
Não obstante, pode instaurar de forma exclusiva o inquérito policial, procedimentos administrativos, instaurar o inquérito policial, requisitar diligências, e sindicâncias.
1.2 Ministério Público como Fiscal da Ordem Jurídica
O MP, no contexto do Código de Menores, exercia a função de fiscal da ordem jurídica nos autos processuais. O ECA preservou esta função e trouxe como novidade a função de fiscal fora do processo, ordenando a atuação comunitária.
Nos casos em que o Parquet não for autor este deve intervir, de forma obrigatória, em todos os feitos, atuando na defesa dos interesses e direitos tutelados pelo ECA, sendo obrigatória a vista por parte deste aos autos depois das partes, podendo juntar documentos, requerer diligências e usar todos os recursos cabíveis.
Nos casos em que o MP não fruir/intervir da vista dos autos do processo, segundo o art. 204 do ECA, “ acarreta a nulidade do feito, que será declarada de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado”, contudo, a jurisprudência entende que se não houver intimação do MP, a ausência deste não enseja anulação, se não houver prejuízo para a parte sob o qual ele intervém. O que é obrigatório, é a intervenção.
No âmbito infracional, o ECA trouxe o instituto da remissão, este no qual o Ministério Público, com ampla margem discricionária, isto é, com liberdade de escolha de sua conveniência, exercer a faculdade de não agir contra o adolescente autor de ato infracional.
O instituto da remissão está previsto nos arts. 126, 127 e 128 do ECA e dispõe que anteriormente ao procedimento judicial de apuração de ato infracional cometido pelo adolescente, o representante do Parquet, pode conceder a remissão, ou seja, perdão, como forma de excluir o processo.
No caso de concessão da remissão após iniciado o procedimento, a concessão do benefício pela autoridade judiciária, importara na suspensão ou extinção do processo. Esta, ainda, não implica necessariamente no reconhecimento ou comprovação da responsabilidade do infrator, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir, conjuntamente, a aplicação de qualquer das medidas previstas na legislação.
A medida, aplicada por força do benefício, poderá ser revista judicialmente em qualquer momento, desde que seja realizada mediante pedido expresso do infrator ou seu representante legal, ou do Ministério Público.
No caso de discordância da autoridade judiciária, da concessão ou modalidade da medida supracitada, deverá proceder a remessa dos autos ao Procurador Geral de Justiça, mediante despacho fundamentado, e este oferecerá representação e designará outro membro do Parquet para apresentá-la, ou ratificará o arquivamento ou a remissão, que só então estará a autoridade judiciaria a homologar, vide art. 181, § 2º do ECA.
O ECA, de forma oposta ao Código de Menores (Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979), que tratava de forma branda sobre a participação processual do MP, conferiu ao Órgão maior presença como interventor e fiscal da lei.
É mister ressaltar que o ECA conferiu ao Ministério Público vasta gama de poderes, verbi gratia, de colher depoimentos, requisitar certidões de órgãos públicos e privados, expedir notificações, inspecionar entidades públicas e privadas e a fazer recomendações para melhoria de serviços, no sentido de instrumentalizar sua atuação.
No contexto da atuação extraprocessual MP, este fiscaliza todas as entidades governamentais e não-governamentais, como preconiza o art. 95 e art. 201, inciso XI, do ECA.
Vejamos:
“Art. 95. As entidades governamentais e não-governamentais referidas no art. 90 serão fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pelos Conselhos Tutelares.
Art. 201. […]
XI – inspecionar as entidades públicas e particulares de atendimento e os programas de que trata esta Lei, adotando de pronto as medidas administrativas ou judiciais necessárias à remoção de irregularidades porventura verificadas; […]”
Em decorrência, o Parquet é o destinatário natural das notícias sobre a existência de irregularidades nas entidades, conforme dispõe o art. 97, do ECA.
“Art. 97. São medidas aplicáveis às entidades de atendimento que descumprirem obrigação constante do art. 94, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal de seus dirigentes ou prepostos
I – às entidades governamentais:
a) advertência;
b) afastamento provisório de seus dirigentes;
c) afastamento definitivo de seus dirigentes;
d) fechamento de unidade ou interdição de programa.
II – às entidades não-governamentais:
a) advertência;
b) suspensão total ou parcial do repasse de verbas públicas;
c) interdição de unidades ou suspensão de programa;
d) cassação do registro.
§ 1o Em caso de reiteradas infrações cometidas por entidades de atendimento, que coloquem em risco os direitos assegurados nesta Lei, deverá ser o fato comunicado ao Ministério Público ou representado perante autoridade judiciária competente para as providências cabíveis, inclusive suspensão das atividades ou dissolução da entidade.
§ 2o As pessoas jurídicas de direito público e as organizações não governamentais responderão pelos danos que seus agentes causarem às crianças e aos adolescentes, caracterizado o descumprimento dos princípios norteadores das atividades de proteção específica de irregularidades porventura verificadas”.
Nos casos de infração administrativa ou infração penal contra os direitos das crianças e adolescentes, o ECA determina que o Conselho Tutelar deve informar os fatos ao MP. Vejamos:
“Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar: […]
IV – encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente; […]”
Conclusão
Como explicitado acima, na qualidade de interventor, o estatuto conferiu legitimidade para impetrar uma vasta gama de ações, para que haja, de forma efetiva, a proteção dos direitos individuais, coletivos e difusos das crianças e adolescentes.
Desta forma, o ECA intenta reformar a aparência da questão do menor em situação de vulnerabilidade, mudando a atuação do poder público, conferindo ao Ministério Público ampliação de seus poderes para que sua atuação seja efetiva e decisiva nesta esfera.
Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio Brasília
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