Resumo: O presente estudo visa analisar a cobrança de pedágio a luz do princípio da não limitação ao tráfego de pessoas e a luz da ressalva de via alternativa, oportunidade em que será necessariamente tratada a natureza jurídica do instituto.. Dentro do estudo desse princípio, é confrontada a divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da possibilidade do pedágio ser cobrado em uma rodovia que não conte com uma via alternativa, isto é, se a cobrança do pedágio é permitida mesmo na hipótese da rodovia em que é auferida essa cobrança é a única possível ao cidadão. A hipótese, confirmada, é a inobrigatoriedade de via alternativa para a referida cobrança, sendo o pedágio uma tarifa (preço público) consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Palavras-chave: Pedágio; limitação tráfego; taxa; tarifa; via alternativa
Abstract: The present study aims to analyze the toll collection in light of the principle of non-limitation to the traffic of people and the light of the reservation of alternative way, in which occasion it will necessarily be treat the legal nature of the institute. Within the study of this principle, the doctrinal and jurisprudential divergence is confronted about the possibility of toll being collected on a highway that does not have an alternative route, that is, if the toll collection is allowed even in the hypothesis of the highway in which it is obtained This collection is the only possible to the citizen. Thus, this work intends to analyze the jurisprudential and doctrinal understandings of both argumentative faces, as well as to address seemingly disparate issues that will shape the final understanding of this study, such as the classification of tolls on taxa taxa or taxa. The hypothesis is the conclusion, due to the nonobligatory nature of an alternative route to the mentioned collection, and the toll is a tariff (public price) according to the understanding of the Federal Supreme Court.
Keywords: Toll; traffic limitation; rate; tariff; via alternativeSumário: Introdução; 1. Do princípio da não limitação ao tráfego de pessoas e bens; 2. O pedágio como taxa ou tarifa; 3. Da necessidade de via alternativa. Considerações finais. Referências.
INRODUÇÃO
O princípio da não-limitação de tráfego de pessoas com a ressalva do pedágio disposto no artigo 150 inciso V da Constituição Federal sempre gerou grandes discussões na doutrina e na jurisprudência.
São dois os pontos que geram mais controvérsia que serão tratados a seguir: a natureza jurídica do pedágio e a necessidade ou não de via alternativa na sua instituição.
Primeira discussão que está ligada ao fato do pedágio dever ou não ser reconhecido como tributo e sujeito a restrições constitucionais próprias, diferentemente de ser reconhecido como tarifa e apresentar uma natureza jurídica contratual de direito privado.
Segunda discussão que está ligada à compulsoriedade ou não da utilização das vias de transporte pedagiadas, do fato de todo pedágio se apresentar como facultativo, com a possibilidade dos usuários utilizar outro caminho para seu destino final.
Dois pontos, atrelados ao artigo 150 da Constituição, que geraram importante precedente do Supremo Tribunal Federal, disposto em seu informativo 750, que também será tratado neste artigo.
Eis a problemática posta, de confronto de conceitos e posições doutrinárias para analisar o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria pedágio, em duas acepções centrais: sua natureza jurídica e a exigência de via alternativa.
1. Do Princípio da não Limitação ao Tráfego de Pessoas e Bens
O princípio da não limitação ao tráfego de pessoas e bens está inscrito no inciso V do art. 150 da Constituição Federal de 1988 (CF/88), qual seja:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
V – estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público”;
O artigo 150 inciso V da CF/88 funciona como uma espécie de especificação do dispositivo constitucional que abarca a liberdade de comoção, também conhecido como direito de ir e vir, no caso descrito no art. 5º inciso XV: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens […]”.
Coloca-se, anteriormente ao avanço na compreensão do princípio especificamente estudado, a observação sobre os tributos de forma genérica, no caso, a leitura que Sabbag (2016, p. 281), faz dos incisos I ao V do artigo 97 do Código Tributário Nacional (CTN), que “[…] compete ao legislador ordinário, no ato de instituição do tributo, confeccionar a lei de exação tributária, delimitando-lhe o fato gerador, entre outros elementos essenciais que compõem a tipologia tributária”.
“O objetivo do legislador constituinte foi evitar que os entes políticos criassem tributos (normalmente taxas) incidentes sobre a passagem de pessoas e bens em seus territórios” (ALEXANDRE, 2015 p. 238), ou seja, evita-se aqui uma cobrança que teria como fato gerador a intermunicipalidade (divisa entre municípios) e a interestadualidade (divisa entre Estados-membros), protegendo o tráfego de pessoas e bens, nesses âmbitos, por regra de imunidade.
“Esse preceito atende a uma preocupação que, segundo o relato de Pontes de Miranda, vem do primeiro orçamento brasileiro, na Regência de D. Pedro, que procurou imunizar o comércio entre as províncias; no Império, contudo, criou-se o imposto interprovincial; na República, apesar da vedação constitucional, algumas práticas contornaram o obstáculo. O que a Constituição veda é o tributo que onere o tráfego interestadual ou intermunicipal de pessoas ou de bens; o gravame tributário seria uma forma de limitar esse tráfego. Em última análise, o que está em causa é a liberdade de locomoção, mais do que a não discriminação de bens ou pessoas, a pretexto de irem para outra localidade ou de lá virem; ademais, prestigiam-se a liberdade de comércio e o princípio federativo” (AMARO, 2014, p. 145).
Adiciona-se, ainda, seguindo entendimento de Sabbag (2016), que o princípio visa trazer imunidade a qualquer operação interestadual ou intermunicipal de pessoas e bens. Mas, em verdade, coibir a instituição de tributo que contenha como elemento fundante a transposição de fronteiras interestadual ou intermunicipal per se, sendo permitida, por exemplo, uma “taxa municipal de turismo”, em cidade litorânea, que se estruture como taxa de polícia, como o caso do município de Bombinhas, no estado de Santa Catarina; que, através da Lei Complementar n. 185/2013, instituiu a Taxa de Preservação Ambiental que, resumidamente, cobra uma taxa objetivando a mitigação de prejuízos de ordem ambiental provocados pelo elevado volume de pessoas e veículos na temporada de verão.
A propósito desse exemplo da TPA, na cidade de Bombinhas-SC, a citação dos artigos 2º – sobre o fato gerador – e 3º – sobre a base de cálculo desse tributo – da LC n. 185/2013, cita-se:
“Art. 2º: A TAXA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL – TPA tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia municipal em matéria de proteção, preservação e conservação do meio ambiente no território do Município de Bombinhas, incidente sobre o trânsito de veículos utilizando infraestrutura física e a permanência de pessoas na sua jurisdição.
Art. 3º: A TAXA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL – TPA tem como base de cálculo o custo estimado da atividade administrativa em função da degradação e impacto ambiental causados ao Município de Bombinhas, no período compreendido entre 15 de novembro e 15 de abril do exercício seguinte.”
O princípio comporta duas exceções. A primeira exceção, de caráter doutrinário, é referente ao ICMS e, sobre ele, versa Alexandre (2015, p. 239):
“A regra possui exceções. A primeira é a possibilidade de cobrança do ICMS
interestadual. Como um gravame incidente também sobre operações que destinam a outro Estado determinados bens e sobre a prestação de determinados serviços, o tributo interestadual acaba por constituir uma limitação ao tráfego de bens pelo território nacional. Como a cobrança tem fundamento constitucional, é plenamente válida, não havendo que se discutir sua legitimidade”.
A segunda exceção, de caráter constitucional, é a constada na parte final do inciso V do art. 150 da CF/88, referente aos pedágios. Nessa exceção, o constituinte quis garantir que a exigibilidade do pedágio não fosse ameaçada pelo princípio da não limitação ao tráfego de pessoas e bens, como traz Amaro (2014, p. 133), com entendimento crítico acerca deste:
“O preceito em análise abre exceção, em sua parte final, para a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público. Portanto, o pedágio, não obstante onere (e, nessa medida, limite) o tráfego, é lícito.
O objetivo da ressalva é evidente. A técnica utilizada, porém, é canhestra, […] Se se pretendeu reconhecer a competência das pessoas políticas para cobrar pedágio, não era esse o lugar adequado, pois não é na seção das “Limitações do Poder de Tributar” que se definem poderes para tributar. Competências definem-se por preceitos afirmativos e não por meio de ressalvas a preceitos negativos. Por outro lado, se o pedágio já se inserisse na competência tributária (da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios), não seria necessário ressalvá-lo (assim como não foi necessário ressalvar o ICMS, que também pode onerar o transporte intermunicipal ou interestadual).
Ademais, se a competência para instituição de pedágio só está prevista no dispositivo que trata da vedação de tributos intermunicipais ou interestaduais, lícito será concluir que o tráfego em trecho que se contenha dentro do território de um mesmo Município não é onerável pelo pedágio, ou seja, a Constituição estaria discriminando exatamente o que ela não quer discriminar: o tráfego interestadual ou intermunicipal pode ser tributado, sem que o tráfego local o seja, ainda que ambos se efetuem pela mesma via, conservada pelo mesmo Poder Público.”
Compreendido o conceito basilar do princípio da não limitação ao tráfego de pessoas e bens, avança-se à compreensão da exceção que nomeia este trabalho, ou seja, analisar-se-á o pedágio, mencionado no próprio dispositivo constitucional (art. 150 inciso V), em sua última parte.
2. O Pedágio Como Taxa Ou Tarifa
Há forte divergência doutrinária quanto à natureza jurídica do pedágio, isto é, se ele deve ser enquadrado como taxa ou como tarifa, urgindo o anterior entendimento dessas duas espécies tributárias.
Dando início à análise doutrinária, coloca-se um sucinto conceito de Mazza (2015, p. 175) para contextualização:
“[…] Se o serviço público uti singuli for prestado diretamente pelo Estado, ou por meio de entidades da Administração indireta, a remuneração tem a natureza tributária de taxa.
Porém, se o Estado decide realizar a prestação por meio de concessionários e permissionários contratados para tal finalidade, a remuneração paga pelo usuário tem natureza não tributária de tarifa.”
2.1. TAXA
Adentrando a uma análise mais específica dos institutos, inicia-se pela taxa, a qual é um tributo vinculado à ação estatal e à atividade pública e não à ação do particular.
As taxas são tributos vinculados cobrados com o objetivo de remunerar atividades estatais específicas relativas ao contribuinte. Em termos técnicos, o fato gerador da taxa está vinculado a uma atividade estatal relacionada ao contribuinte. Diferentemente do que ocorre com os impostos, a arrecadação de taxas pressupõe um agir estatal (primeiro momento) e, só depois, promove-se a cobrança do tributo (segundo momento) com natureza de contraprestação da atuação realizada (MAZZA, 2015, pg. 167).
Sobre o fato gerador da tarifa, versa Amaro (2014, p. 38), em entendimento bastante semelhante ao retrocitado de Mazza, mas, nesse contexto para demonstrar especificamente sobre o fato gerador, que: “[…] o fato gerador da taxa não é um fato do contribuinte, mas um fato do Estado. O Estado exerce determinada atividade e, por isso, cobra a taxa da pessoa a quem aproveita aquela atividade”
Sobre a competência tributária da taxa e complementando a compreensão do fato gerador da taxa, traz Sabbag (2016, p. 478), com citação, também, de dispositivos legais:
“No plano competencial tributário, a taxa deverá ser exigida pelas entidades impositoras – União, Estados, Municípios e Distrito Federal –, em face da atuação a elas adstrita, não se admitindo a exigência em virtude de atividade de empresa privada.
Em outras palavras, as taxas são espécie de exações, classificável, pela sua hipótese de incidência, como tributos vinculados a atividades realizadas pelo Poder Público […]
O disciplinamento do tributo ora estudado vem expresso no art. 145, II, da CF c/c art. 77 do CTN:
Art. 145, II, CF: A União, Estados, Municípios e Distrito Federal poderão instituir os seguintes tributos: (…) II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.
Art. 77 do CTN: As taxas cobradas pela União, Estados, Municípios e Distrito Federal, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.”
Sendo assim, o fato gerador da taxa pode ser o exercício regular do poder de polícia ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Essas hipóteses de fato gerador estão previstas no art. 78 (taxa de polícia ou de fiscalização) e art. 79 incisos II e III (taxa de serviço ou de utilização), ambos do CTN.
2.1.1. TAXA DE POLÍCIA
Dando início à análise da taxa de polícia, cita-se o dispositivo legal que o abarca:
“Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder”.
Conceitua Amaro (2014, p. 39), que: “[…] a taxa de polícia é cobrada em razão da atividade do Estado, que verifica o cumprimento das exigências legais pertinentes e concede a licença, a autorização, o alvará e etc”.
Não existe um rol taxativo das espécies de atividades fiscalizatórias, trazendo Sabbag (2016, p. 481), exemplos dos quais o renomado doutrinador julga ser principais:
“a) Taxa de alvará (ou de funcionamento): exigida dos construtores dos imóveis, a taxa de alvará, também conhecida por taxa de localização, vem remunerar o município pela atividade fiscalizatória relativa às características arquitetônicas da obra realizada […]
b) Taxa de fiscalização de anúncios: visa ressarcir o município na ação fiscalizatória de controle da exploração e utilização da publicidade na paisagem urbana, com vista a evitar prejuízos à estética da cidade e à segurança dos munícipes […]
c) Taxa de fiscalização dos mercados de títulos e valores mobiliários pela CVM: o fato gerador é o exercício do poder de polícia atribuído à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), ex vi do art. 2º da Lei n. 7.940/89 […] (Súmula n. 665: “É constitucional a taxa de fiscalização dos mercados de títulos e valores mobiliários instituída pela Lei n. 7.940/89”)
d) Taxa de controle e fiscalização ambiental (TCFA): trata-se de taxa que sucedeu à Taxa de Fiscalização Ambiental (TFA) […]
e) Taxa de fiscalização dos serviços de cartórios extrajudiciais: a Lei n. 8.033/2003, do Estado do Mato Grosso, instituiu uma taxa de fiscalização de controle dos atos dos serviços notariais e de registro, para implantação do sistema de controle das atividades dos notários e dos registradores,
bem como para obtenção de maior segurança jurídica quanto à autenticidade dos respectivos atos, com base no poder que assiste aos órgãos diretivos do Judiciário, notadamente no plano da vigilância, orientação e correição da atividade em causa, a teor do § 1º do art. 236 da Carta Magna (ADIn 3.151/2005-MT).
f) Taxa para o FUNDAF: em 19 de setembro de 2013, o STJ (REsp 1.275.858/DF, rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T.) enfrentou relevante questão ligada à definição da natureza jurídica dos valores cobrados, pela União, a título de contribuição para o Fundo Especial de Desenvolvimento
e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – FUNDAF, se taxa ou preço público. Entendeu o STJ que se tratava de taxa e, ipso facto, considerou-a inexigível”.
No entanto, valores referentes à taxa de polícia que estão sendo discutidos não podem ser desde já cobrados, como entendeu o STJ (REsp nº 1275858/DF) com base nos argumentos:
“(I) a exação exigida tem natureza de taxa, uma vez que é compulsória e decorre do exercício do poder de polícia;
(II) em sendo taxa, deve obedecer ao Princípio da Legalidade Estrita, de modo que, não havendo na lei instituidora da parcela exigida, previsão a respeito dos elementos constitutivos da obrigação tributária (os quais estão previstos apenas em Instruções Normativas da Receita Federal), não há embasamento para sua exigência”.
Finalizando, portanto, a compreensão da taxa de polícia, coloca-se observação sobre o citado exercício regular do poder de polícia do parágrafo único do art. 78. Entendimentos mais antigos dos tribunais superiores traziam que o exercício regular significava policiamento efetivo, concreto ou real, traduzível por uma inequívoca materialização do poder de polícia, como exemplos:
“EMENTA: TAXA DE LICENÇA DE LOCALIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E INSTALAÇÃO. COBRANÇA PELA MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO. (…) O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou pelo reconhecimento da legalidade da taxa cobrada pelo Município de São Paulo, pois se funda no poder de polícia efetivamente exercitado através de seus órgãos fiscalizadores (…)”. (RE 116.518/SP, 1ª T., rel. Min. Ilmar Galvão, j. em 13-04-1993)
“EMENTA: TRIBUTÁRIO. TAXA DE LOCALIZAÇÃO E FISCALIZAÇÃO. ANÚNCIO LUMINOSO. COBRANÇA PELA FAZENDA MUNICIPAL: IMPOSSIBILIDADE, SALVO SE DEMONSTRADA A EFETIVA CONCRETIZAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA. (…)
I – A Fazenda Pública municipal só pode cobrar taxa de localização e fiscalização de anúncios luminosos se demonstrar a efetiva concretização do exercício do poder de polícia. II – Precedentes das Turmas de Direito Público do STJ: REsp 17.810/SP, REsp 27.615/SP e REsp 90.235/BA. III – Recurso especial conhecido e provido”. (REsp 152.476/SP, 2ª T., rel. Min. Adhemar Maciel, j. em 1º-09-1998)
Entretanto, esse modus operandi vem diminuindo gradativamente, posto que não é de bom grado à Fazenda Pública tal rigidez para a cobrança de taxas, mudando, inclusive, o posicionamento do STF, permitindo atualmente que o simples fato de existir um órgão estruturado e em efetivo funcionamento viabiliza a exigência de taxa. Esse entendimento foi sacramentado em 2010 em decisão do Ministro Gilmar Mendes:
“Recurso Extraordinário 1. Repercussão geral reconhecida. 2. Alegação de inconstitucionalidade da taxa de renovação de localização e de funcionamento do Município de Porto Velho. 3. Suposta violação ao artigo 145 inciso II da Constituição, ao fundamento de não existir comprovação do efetivo exercício do poder de polícia. 4. O texto constitucional diferencia as taxas decorrentes do exercício do poder de polícia daquelas de utilização de serviços específicos e divisíveis, facultando apenas a estas a prestação potencial do serviço público. 5. A regularidade do exercício do poder de polícia é imprescindível para a cobrança da taxa de localização e fiscalização. 6. À luz da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, a existência do órgão administrativo não é condição para o reconhecimento da constitucionalidade da taxa de localização e fiscalização, mas constitui um dos elementos admitidos para se inferir o efeito exercício do poder de polícia, exigido constitucionalidade. Precedentes. 7. O Tribunal de Justiça de Rondônia assentou que o Município de Porto Velho, que criou a taxa objeto de litígio, é dotado de aparato fiscal necessário ao exercício do poder de polícia. 8. Configurada a existência de instrumento necessários e do efetivo exercício do poder de polícia. 9. É constitucional taxa de renovação de funcionamento e localização municipal, desde que efeito o exercício do poder de polícia, demonstrado pela existência de órgão e estrutura competentes para o respectivo exercício, tal como verificado na espécie quanto ao Município de Porto Velho/RO 10. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. “
2.1.2.TAXA DE SERVIÇO
A taxa de serviço é cobrada em razão da prestação estatal de um serviço público dito específico e divisível. Para a análise da taxa de serviço, cita-se o dispositivo legal que o abarca, no caso, o art. 79 do CTN:
“Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:
I – utilizados pelo contribuinte:
a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;
b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento
II – específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas;
III – divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.”
Do conceito trazido, separam-se os termos, primeiramente, sob análise do caput e dos incisos II e III: a) serviço público; b) específicos; c) divisíveis.
Sobre o serviço público, versa Machado (2010), que é “toda e qualquer atividade prestacional realizada pelo Estado, ou por quem fizer suas vezes, para satisfazer, de modo concreto e de forma direta, necessidades coletivas”.
Quanto ao serviço público que implique cobrança de taxa ser específico e divisível traz Alexandre (2015, p. 93) que:
“A criação das taxas de serviço só é possível mediante a disponibilização de serviços públicos que se caracterizem pela divisibilidade e especificidade. Segundo o Código Tributário Nacional, os serviços são específicos quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas; são divisíveis quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários (art. 79, II e III).
Na prática, o serviço público remunerado por taxa é considerado específico quando o contribuinte sabe por qual serviço está pagando, o que não acontece, por exemplo, com a taxa de serviços diversos, cobrada por alguns municípios. […]
Já a divisibilidade está presente quando é possível ao Estado identificar os usuários do serviço a ser financiado com a taxa. Assim, o serviço de limpeza dos logradouros públicos não é divisível, pois seus usuários não são identificados nem identificáveis, uma vez que a limpeza da rua beneficia a coletividade genericamente considerada”.
Em resumo, diz-se que “serviço divisível, necessário para a instituição da taxa, é o suscetível de utilização individual pelo contribuinte, e específico é o destacável em unidade autônoma” (NOGUEIRA 1995., p. 162)
Analisando desta vez o inciso I, percebe-se que além de conter os atributos de especificidade e divisibilidade, o serviço público, ensejador da taxa de serviço, poderá ser de utilização efetiva ou de utilização potencial. Esses requisitos, segundo Alexandre (2015, p. 96):
“A cobrança de taxa de serviço, conforme já visto, pode ser feita em face da disponibilização ao contribuinte de um serviço público específico e divisível.
Quando esse serviço é definido em lei como de utilização compulsória e é posto à disposição do contribuinte mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento, a taxa pode ser cobrada mesmo sem a utilização efetiva do serviço pelo sujeito passivo. É o que a lei denomina de utilização potencial (CTN, art. 79, I,b).
Cabe ao legislador, ao instituir a taxa, verificar se o serviço transpõe a fronteira dos interesses meramente individuais, de forma que se fosse dado ao particular decidir por não utilizá-lo, o prejuízo pudesse reverter contra a própria coletividade. Em tais casos, o serviço deve ser definido em lei como de utilização compulsória e o contribuinte deve recolher a taxa mesmo que não use efetivamente o serviço; nos demais casos, o particular somente se coloca na condição de contribuinte se usar o serviço de maneira efetiva. A título de exemplo, o serviço de coleta domiciliar de lixo é definido em lei como de utilização compulsória, pois se fosse possível ao particular decidir por não utilizar o serviço, deixando seu lixo “às moscas”, a falta de higiene e de preocupação com a saúde pública, características de algumas pessoas, poderia prejudicar toda a coletividade. Já o serviço de emissão de passaportes não é definido em lei serviço de utilização compulsória, pois os particulares que não desejam viajar para o exterior e, por conseguinte, não utilizam o serviço, não trazem qualquer prejuízo para a coletividade.”
Para ilustração, exemplifica Amaro (2014, p. 41):
“Suponha-se que a legislação proíba os indivíduos, habitantes de área densamente povoada, de lançar o esgoto em fossas, obrigando-os a utilizar o serviço público de coleta de esgoto. Ora, a taxa que for instituída pelo Estado pode ser cobrada de quem tem o serviço à disposição, ainda que não utilize efetivamente”
Seguindo o raciocínio do exemplo do doutrinador, ementa de decisão do STJ em 2008, no caso, isentando de cobrança quem não tem acesso ao serviço, ou seja, isentos por não terem utilização efetiva ou potencial do serviço:
“EMENTA: (…) TAXA DE ESGOTO. (…) 4. Art. 77 do CTN. Se o acórdão recorrido firmou a premissa de que a CEDAE – Cia. Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro – não dispõe de sistema de tratamento de esgoto que atenda ao imóvel da autora, torna-se indevida qualquer contraprestação, em virtude, inclusive, de suposta utilização potencial do serviço. 5. Recurso especial conhecido em parte e não provido”. (REsp 1.032.975/RJ, 2ª T., rel. Min. Castro Meira, j. em 1º-04-2008)
No caso da taxa de serviço referente ao esgosto, após discussão doutrinária e jurisprudencial, chegou-se à conclusão que é possível a cobrança de taxa. Outros serviços, porém, os ditos serviços gerais, não são passíveis de cobranças de taxas, posto que, como gerais, atendem toda a coletividade de forma indeterminada, não sendo possível, portanto, a determinação de pólo passivo. Taxas de serviço que não podem ser cobradas – observando-se que, nesse caso, são cobrados mediante impostos – incluem: a) Segurança Pública; b) Limpeza Pública; c) Iluminação Pública e d) Asfaltamento. Sobre estes exemplos, Sababg (2016, p. 492) referencia,
“a) Segurança pública: trata-se de serviço público ao qual todos têm direito, conforme se depreende do art. 144, caput, V e § 5º, da Carta Magna. A segurança pública é um retumbante exemplo de serviço público geral, não passível de remuneração por meio de taxa, mas, difusamente, por impostos […]
b) Limpeza pública: há inconstitucionalidade, para o STJ, na taxa de limpeza dos logradouros públicos, atrelada a atividades como varrição, lavagem, capinação, desentupimento de bueiros e bocas de lobo. Trata-se de taxa que, de qualquer modo, tem por fato gerador prestação de serviço inespecífico, indivisível, não mensurável ou insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, não podendo ser custeado senão por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais.[…]
c) Iluminação pública: o STF julgou inconstitucional a taxa de iluminação pública, em face da ausência da especificidade e divisibilidade. Com efeito, o serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa, uma vez que não configura serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição (CF, art. 145, II)
d) Asfaltamento: as obras de pavimentação asfáltica, estando inseridas no contexto de obra pública, devem ensejar a contribuição de melhoria, e não a taxa, em face da ausência dos requisitos da especificidade e divisibilidade”.
2.2. TAXA VS. TARIFA
Embora ambos tenham a finalidade de suprir de recursos os cofres estatais por prestação de serviços públicos, a tarifa não se confunde com a taxa. Na diferenciação destes, Sabbag expõe (2016, p. 511):
“[…] A tarifa (espécie de preço público), […] pode ser agora conceituada como o preço de venda do bem, exigido por empresas prestacionistas de serviços públicos (concessionárias e permissionárias), como se comuns vendedoras fossem. Assim, a contrapartida dos serviços públicos poderá se dar por meio de uma taxa ou de uma tarifa, excetuados aqueles considerados “essenciais”, que avocarão com exclusivismo as taxas […]
O traço marcante que deve diferir taxa de preço público – do qual a tarifa é espécie – está na inerência ou não da atividade à função do Estado. Se houver evidente vinculação e nexo do serviço com o desempenho de função eminentemente estatal, teremos a taxa. De outra banda, se presenciarmos
uma desvinculação deste serviço com a ação estatal, inexistindo óbice ao desempenho da atividade por particulares, vislumbrar-se-á a tarifa”.
Ante os conceitos expostos, de prima facie, a inicial problemática do pedágio como taxa ou tarifa pareça solucionada pelos entendimentos trazidos pelos renomados doutrinadores, sendo o pedágio cobrado por entidade privada com fins lucrativos (concessionárias) uma tarifa ao passo que a cobrança de pedágio por autarquia estadual ou sociedade de economia mista teria o caráter de taxa.
Contudo, há pontos controversos no aparentemente simples enquadramento conceitual, mencionando-se, por exemplo, o fato do pedágio ser instituído e reajustado por atos de diversos de lei, critério suficiente para dar o caráter de taxa em ambos os casos.
Visando resumir os pontos controvertidos dessa questão, cita-se a ementa “ADI: pedágio e preço público – 1”, do informativo 750 do STF:
“INFORMATIVO (EMENTA): (…) Afirmou que os defensores da natureza tributária, da subespécie taxa, o fariam sob os seguintes fundamentos: a) a referência ao pedágio, nas limitações constitucionais ao poder de tributar; b) o pagamento de um serviço específico ou divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição; e c) a impossibilidade de remunerar serviços públicos por meio outro que não o de taxa. Aludiu, entretanto, que os defensores da natureza contratual da exação como preço público o fariam com base nas seguintes considerações: a) a inclusão no texto constitucional apenas esclareceria que, apesar de não incidir tributo sobre o tráfego de pessoas ou bens, poderia, excepcionalmente, ser cobrado o pedágio, espécie jurídica diferenciada; b) a ausência de compulsoriedade na utilização de rodovias; e c) a cobrança se daria em virtude da utilização efetiva do serviço, e não seria devida com base no seu oferecimento potencial. (…)”
3. Da Necessidade de Via Alternativa
Avança-se para a questão da via alternativa, com a discussão doutrinária e jurisprudencial, se a cobrança de pedágio deve contar com uma rodovia sem pedágio como via alternativa. Cita-se doutrina de Meirelles (1996) que vê no pedágio uma tarifa, isto é, o pedágio pode, pois, ser exigido pela utilização de rodovias, pontes, viadutos, túneis, elevadores e outros equipamentos viários que apresentem vantagens específicas para o usuário, tais como, o desenvolvimento de alta velocidade, encurtamento de distâncias, maior segurança, diversificando-os de obras semelhantes que se ofereçam como alternativa para o utente. Na doutrina corrente, dois são os requisitos que legitimam a cobrança desse preço público: a condição especial da obra, mais vantajosa para o usuário e a existência de outra, de uso comum, sem remuneração. Sem estes requisitos, torna-se indevida a cobrança do pedágio.
Cita-se, ainda, entendimento do STF, no Recurso Extraordinário 597981, julgado pelo Ministro Eros Grau em 2010, favorável à necessária existência de via alternativa em caso de rodovia em que se cobre pedágio:
“O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra a União e outros requerendo fosse determinado à empresa Convias se abstenha de cobrar o pedágio em todo o trecho da estrada por ela explorada na BR 116, até que seja providenciada uma via alternativa, em boas condições de uso, que leve o usuário ao mesmo destino proporcionado pela BR. […] Exige-se que a estrada apresente condições especiais de tráfego (via expressa de alta velocidade e segurança), seja bloqueada e ofereça possibilidade de alternativa para o usuário (outra estrada que conduza livremente ao mesmo destino), embora em condições menos vantajosas de tráfego.Os usuários que tiveram os valores cobrados indevidamente têm direito ao ressarcimento. Desta forma, os réus são condenados à devolução dos valores cobrados a título de pedágio, cabendo aos prejudicados procederem à liquidação e execução da sentença, na forma do art. 97 do CDC. […] O Ministério Público Federal propôs a presente ação civil pública com o objetivo de suspender a cobrança de pedágio, instituído em trecho da BR 116, até que seja providenciada uma via alternativa, gratuita, em boas condições de uso, que leve o usuário ao mesmo destino proporcionado pela BRA cobrança de pedágio, sem a disponibilização de vias alternativas de acesso, torna-se obrigatória e limita a liberdade de locomoção. Tratando-se de garantia fundamental, é objeto de cláusula pétrea e, portanto, inderrogável, mormente pela legislação ordinária. O direito fundamental à livre locomoção está previsto na Constituição Federal, em seu art. 5º, XV, o qual dispõe que é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. Partindo desse raciocínio, entendo que a cobrança de pedágio imprescinde da existência de via alternativa, de forma a permitir a escolha por parte do usuário, no sentido de utilizar a rodovia tarifada, ou fazer uso de outro trajeto, sem pedágio, mesmo que em piores condições. A cobrança de pedágio desacompanhada de via alternativa proporciona uma única opção: ou o cidadão locomove-se, e paga por isso, ou não se locomove. Nesse aspecto, apresenta-se a inconstitucionalidade do pedágio. Existindo apenas uma possibilidade para o cidadão, que implica em cobrança para o uso da rodovia, entendo que há limitação demasiada e abusiva da liberdade de locomoção, logo, em desacordo com a ordem constitucional. […] Em conclusão, a falta de via de acesso alternativa, gratuita, em boas condições de uso, que leve o usuário ao mesmo destino proporcionado pelo trecho tarifado, impede a exploração de rodovia mediante a cobrança de pedágio. Ante o exposto, opina o Ministério Público Federal pelo parcial conhecimento dos recursos e, na parte conhecida, pelo desprovimento” [fls. 1.819-1.828].6. Adoto como razão de decidir os argumentos expendidos pelo Ministério Público Federal.Nego seguimento aos recursos com fundamento no disposto no artigo 21, § 1º, do RISTF. Publique-se.Brasília, 11 de fevereiro de 2010.Ministro Eros Grau-Relator.”
Pode-se afirmar que os argumentos que advogam pela via alternativa se baseiam, resumidamente, no próprio princípio da não limitação ao tráfego, ou, nos termos do julgamento pelo Ministro Eros Grau: “[…] ou o cidadão locomove-se, e paga por isso, ou não se locomove”.
Evocando entendimentos contrários e concomitantes à proposta deste estudo, cita-se, primeiramente, Sabbag (2016, p. 296): “[…] A Carta Magna não se furta de impor empecilhos à livre circulação das pessoas, desde que devidamente amparados em lei. O pedágio é cobrado com lastro em previsão constitucional, além de avocar necessário disciplinamento legal”
Cita-se, ainda, a ementa “ADI: pedágio e preço público – 3” do Informativo 750 do STF:
“O Plenário sublinhou que seria irrelevante também, para a definição da natureza jurídica do pedágio, a existência, ou não, de via alternativa gratuita para o usuário trafegar. Reconheceu que a cobrança de pedágio poderia, indiretamente, limitar o tráfego de pessoas. Observou, todavia, que (i) essa restrição seria agravada quando, por insuficiência de recursos, o Estado não construísse rodovias ou não conservasse adequadamente as existentes. Ponderou que, diante dessa realidade, a Constituição autorizara a cobrança de pedágio em rodovias conservadas pelo Poder Público, inobstante a limitação de tráfego que essa cobrança pudesse eventualmente acarretar. Registrou, assim, que a contrapartida de oferecimento de (ii) via alternativa gratuita como condição para a cobrança de pedágio não seria uma exigência constitucional, tampouco estaria prevista em lei ordinária. Consignou que (iii) o elemento nuclear para identificar e distinguir taxa e preço público seria o da compulsoriedade, presente na primeira e ausente na segunda espécie. Nesse sentido, mencionou o Enunciado 545 da Súmula do STF (“Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu”). ADI 800/RS, rel. Min. Teori Zavascki, 11.6.2014”. (ADI-800)
Enfim, de acordo com o informativo 750, conclui-se sobre o pedágio que: i) é o valor pago pelo condutor do veículo para que ele tenha direito de trafegar por uma determinada via de transporte terrestre; ii) tem finalidade de custear a conservação das vias; e iii) é pago a um órgão ou entidade da Administração Pública ou uma empresa privada concessionária.
Mais do que isso, o Supremo Tribunal Federal acabou se filiando à corrente doutrinária (defendida por Ricardo Lobo Torres e Sacha Calmon) de que o pedágio tem natureza de tarifa (preço público), cobrado apenas pela utilização efetiva do serviço (não utilização potencial) que a pessoa pode optar por não utilizar (não tem utilização compulsória), que assim pode ser instituído por meio de atos infralegais, diferentemente de tributos. Ora. a outra corrente, que determina a natureza jurídica de taxa (tributo), defende a observância do princípio da legalidade estrita, a impossibilidade de se remunerar serviços públicos por outro meio, a divisibilidade e especificidade destes serviços e a inserção desse conceito no capítulo da Constituição atinente a tributos e limitações ao poder de tributar, na doutrina de Roque Carrazza, Luciano Amaro e Leandro Paulsen.
Eis o entendimento do STF sumulado, após o julgamento citado: 545 – preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu.
Note-se que o STF não entende como determinante o fato de existir ou não via alternativa em cada caso concreto, que poderia conduzir o raciocínio de que o pedágio passaria a ser considerado taxa nas situações de compulsoriedade, de inexistência de via alternativa. Para o Ministro Teori Zavascki, então relator, a existência ou não de via alternativa gratuita para o usuário trafegar não é uma condição estabelecida na Constituição, somando-se ao fato do indivíduo deslocar-se por outro meio de transporte. De modo que, para o STF não é inconstitucional a cobrança de pedágio, ainda que não exista nenhuma outra via alternativa gratuita para o usuário trafegar.
Eis que para o STF o regime jurídico do pedágio seria de direito privado atrelado a um contrato (com equilíbrio econômico e financeiro).
Considerações Finais
Os argumentos doutrinários e jurisprudenciais a favor da obrigatoriedade de via alternativa são inegavelmente honrosos e de bom grado, posto que visam a defesa de um princípio cristalizado do Direito Tributário em análise conjunta ao Direito De Ir E Vir, cláusula pétrea inscrita no inciso XV do art. 5º da Constituição Federal.
Ocorre que, com a devida vênia e tendo como base igualmente consagrada doutrina e jurisprudência, vemos que a cobrança de pedágio, mesmo sem oferecer a via alternativa é: (i) constitucional, mesmo que pareça, de prima facie, infringir a garantia fundamental de locomoção, o pedágio tem por objetivo a manutenção da rodovia, ocasionando, em última análise, um reforço do direito de locomoção, posto que sem a cobrança do pedágio, a rodovia em questão poderia estar em situações intransitáveis, sendo aqui o verdadeiro cerceamento de ir e vir; (ii) o dispositivo constitucional do princípio da não limitação não faz qualquer menção à exigência de via alternativa; (iii) a inexistência de via alternativa na cobrança do pedágio acaba o enquadrando em um caráter compulsório, próprio da taxa, como ensina Sabbag (2016, p. 285): “não havendo a existência de via alternativa – rodovia de tráfego gratuito, localizada paralelamente àquela por cujo uso se cobra pedágio –, a exação se torna compulsória, sem liberdade de escolha, o que reforçaria a feição tributária, própria da taxa”.
Acadêmico de direito na FAG/Toledo
Procurador da Fazenda Nacional. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Mestre em Processo Civil pela UNIPAR. Especialista em Direito Público pela Unb. Graduado em Direito pela UFPR
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