Resumo: O presente artigo visa analisar se existe direito subjetivo ˆ contrata‹o, pertencendo, ao particular, ao final da realiza‹o da licita‹o pela Administra‹o Pœblica. A tem‡tica ganha fora com a j‡ consolidada jurisprudncia acerca do direito subjetivo em casos de concurso pœblico. Buscamos, dessa forma, analisar se Ž poss’vel chegar ˆ semelhante conclus‹o neste trabalho, neste procedimento administrativo que muito se assemelha ˆ competi‹o de cargos na Administra‹o Pœblica.
Palavras-chave: direito subjetivo, Licita‹o, Mandado de Segurana, Desfazimento do Ato Administrativo, Ilegitimidade.
Sum‡rio: 1. Introdu‹o; 2. ÒMera Expectativa de DireitoÓ ou Direito Subjetivo ao Fim da Licita‹o?; 3. Uma Consequncia Jur’dica do Reconhecimento do Direito Subjetivo ˆ Contrata‹o: A Prote‹o Via Mandado de Segurana em Casos de Omiss‹o ou Desfazimento Ileg’timo do Certame; 4. Conclus›es; 5. Referncias Bibliogr‡ficas.
Introdu‹o
Em 16 de julho de 2008, o Supremo Tribunal Federal, no bojo do Recurso Extraordin‡rio de n¡ 227480-7, se debruou pela primeira vez acerca de uma fervorosa e interessant’ssima discuss‹o que tinha assento j‡ h‡ algum tempo no Superior Tribunal de Justia, qual seja: o direito subjetivo ˆ nomea‹o para a posse dos candidatos aprovados em concurso pœblico dentro de nœmero de vagas previsto no instrumento convocat—rio.
Ap—s minucioso exame e debate, contando, sobretudo, com as interven›es dos Ministros Carmem Lœcia e Marco AurŽlio, a Primeira Turma do Sodal’cio entendeu pela existncia do direito subjetivo, arrematando, ainda, que a inŽrcia da Administra‹o Pœblica ap—s o concurso pœblico n‹o deveria ser chancelada, e qualquer manifesta‹o pela n‹o contrata‹o deveria ser motivada, motivos estes que se encontravam pass’veis de aprecia‹o pelo Poder Judici‡rio .
Face este contexto, n‹o houve como impedir a realiza‹o do paralelo: existiria tambŽm um direito subjetivo ao contrato chegado o fim da licita‹o pœblica com a declara‹o de um vencedor pela Administra‹o?
ƒ o que se procura responder, a partir de agora.
1. ÒMera expectativa de direitoÓ ou direito subjetivo ao fim da licita‹o?
ƒ comum na doutrina e jurisprudncia a afirma‹o de que o licitante vencedor e adjudicat‡rio n‹o tem direito de exigir a celebra‹o do contrato em face da Administra‹o Pœblica. Costuma-se referir que a sua situa‹o Ž de Òmera expectativa de direitoÓ, raz‹o pela qual caberia ao ente contratante, ainda, ap—s todo o procedimento administrativo elaborado para a contrata‹o, decidir, a seu livre e incondicionado querer, sobre a sua realiza‹o ou n‹o.
Mantendo-nos sempre em alerta em face destes supostos consensos doutrin‡rios e jurisprudenciais, almejamos questionar sob que bases se aliceram esta teoria, a qual representa obst‡culo ao reconhecimento de um direito subjetivo em favor do particular. Em suma, Ž de perguntar-nos: o que consiste esta t‹o chamada expectativa de direito? Como se posicionam as correntes que a defendem? Sob que bases se estabelecem este precitado consenso?
Antes de avanar a estas respostas, no entanto, uma advertncia sobre o termo Òmera expectativa de direitoÓ se faz necess‡ria. ƒ que a sua utiliza‹o no ‰mbito do direito administrativo n‹o se restringiu historicamente ao caso das licita›es e contratos administrativos. TambŽm se fez frequente, por longo tempo, atribuir esta express‹o para a situa‹o do concursado aprovado dentro do nœmero de vagas do edital e que ainda n‹o teria sido nomeado para o cargo que disputou[1].
Nesse contexto, o Pret—rio Excelso chegou a consagrar este entendimento por meio da interpreta‹o de sua Sœmula de n¡ 15, que declara que ÒDentro do prazo de validade do concurso, o candidato tem direito a nomea‹o, quando o cargo for preenchido sem observ‰ncia de classifica‹oÓ.
A conclus‹o, que se extra’a como l—gica deste enunciado, era de que o candidato n‹o teria, findo o concurso pœblico, direito subjetivo ˆ nomea‹o para posse, ainda que aprovado dentro no nœmero de vagas previsto no edital. Se a Administra‹o n‹o se manifestasse em prol da contrata‹o, nada poderia fazer aquele que logrou cumprir as condi›es para admiss‹o pœblica de pessoal.
No entanto, verificado o caso em que a Administra‹o demonstrasse a sua real necessidade em efetivar trabalhadores para o cargo ora alvitrado ao pœblico, n‹o poderia o candidato ser preterido em raz‹o de terceiro em pior coloca‹o final, ou sequer estranho ao prŽlio. Nestes casos, se entendia que a mera expectativa de direito se transmutava em direito subjetivo justamente por causa desta manifesta‹o de necessidade de pessoal por parte da Administra‹o. E se a Administra‹o quisesse contratar, teria de necessariamente o fazer na ordem de classifica‹o exposta no fim do prŽlio.
Aludia-se, assim, ˆ express‹o Òmera expectativa de direitoÓ para aquela situa‹o de n‹o sujei‹o da Administra‹o Pœblica ˆ necessidade de nomea‹o do candidato aprovado no concurso pœblico. Ao particular, por sua vez, n‹o havia outra solu‹o, teria de esperar pela convoca‹o do Poder Pœblico, ou n‹o. Alguns julgados dos Tribunais Superiores brasileiros colhidos ˆ Žpoca ajudam a ilustrar o panorama:
ÒConcurso pœblico: direito ˆ nomea‹o: Sœmula 15-STF. Firmou-se o entendimento do STF no sentido de que o candidato aprovado em concurso pœblico, ainda que dentro do nœmero de vagas, torna-se detentor de mera expectativa de direito, n‹o de direito ˆ nomea‹o: precedentesÓ. (BRASIL, 2006)
ÒADMINISTRATIVO. CONCURSO PòBLICO. CANDIDATOS APROVADOS. CONTRATA‚ÌO TEMPORçRIA. ILEGALIDADE.
I – ƒ entendimento doutrin‡rio e jurisprudencial de que a aprova‹o em concurso pœblico gera mera expectativa de direito ˆ nomea‹o, competindo ˆ Administra‹o, dentro de seu poder discricion‡rio, nomear os candidatos aprovados de acordo com a sua convenincia e oportunidade.
II – Entretanto, a mera expectativa se convola em direito l’quido e certo a partir do momento em que, dentro do prazo de validade do concurso, h‡ contrata‹o de pessoal, de forma prec‡ria, para o preenchimento de vagas existentes, em flagrante preteri‹o ˆqueles que, aprovados em concurso ainda v‡lido, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou fun‹o.
III – Comprovada pela recorrente a classifica‹o no concurso para professor de l’ngua portuguesa, em primeiro lugar, em ambos os cargos que disputou, bem como incontroverso que houve a contrata‹o, em car‡ter prec‡rio, de profissionais para suprir a carncia de pessoal nasce, assim, o direito l’quido e certo de exigir da autoridade competente ˆ nomea‹o, pois demonstrada, inequivocamente, a necessidade de servidores para essa ‡rea.
Recurso provido, para determinar a nomea‹o e posse da recorrenteÓ. (BRASIL, 2007)
Ocorre que, por fora da similitude do concurso pœblico e da licita‹o, verso e anverso da mesma moeda (PEREIRA JòNIOR, 2007, p. 596), terminou este entendimento sendo sedimentado tambŽm no procedimento administrativo de contrata‹o de bens, obras e servios ˆ Administra‹o Pœblica. O esc—lio de Villela Souto (2004, p. 209) Ž preciso em evidenciar este interc‰mbio:
ÒNote-se que, assim como o aprovado em concurso pœblico n‹o tem direito ˆ investidura, o adjudicat‡rio n‹o tem direito ao contrato, cuja celebra‹o fica sujeita aos critŽrios de convenincia e oportunidade da Administra‹oÓ.
A Òmera expectativa de direitoÓ, assim, passa a se fazer presente no campo das licita›es e contratos administrativos. Mas, retornando ˆ pergunta inicial deste subt’tulo, no que consiste esta express‹o agora aplicada neste campo do direito administrativo?
Citemos, inicialmente, um exemplo doutrin‡rio:
ÒV-se, dessa forma, que a adjudica‹o n‹o traz para o adjudicat‡rio a certeza da pactua‹o do contrato. AtŽ porque, no interregno entre a adjudica‹o e a efetiva‹o da contrata‹o, poder‹o advir situa›es que afastem o interesse pœblico dessa pactua‹oÓ. (ZæNITE, 2001, p. 884, grifo nosso)
E dois outros da jurisprudncia por tratarem do tema de forma detida:
ÒA exegese do art. 49, da Lei 8.666/93, denota que a adjudica‹o do objeto da licita‹o ao vencedor confere mera expectativa de direito de contratar, sendo certo, ainda, que eventual celebra‹o do neg—cio jur’dico subsume-se ao ju’zo de convenincia e oportunidade da Administra‹o PœblicaÓ. Precedentes: RMS 23.402/PR, SEGUNDA TURMA, DJ 02.04.2008; MS 12.047/DF, PRIMEIRA SE‚ÌO, DJ 16.04.2007 e MC 11.055/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ 08.06.2006. […] 6. Recurso ordin‡rio desprovido. (BRASIL, 2009, grifo nosso)ÒInduvidoso o preju’zo ao estado, evidenciada a existncia de ilegalidade ou dos v’cios graves que levaram a essa constata‹o, a anula‹o se impunha, mesmo depois de homologada a concorrncia a favor de um dos licitantes, pois o vencedor Ž titular de simples expectativa de direito a contrata‹o.Exige-se, porem, que o ato de invalida‹o esteja plenamente justificado e que n‹o resulte no beneficio de outro concorrente, em detrimento do vencedorÓ. (BRASIL, 1992, grifo nosso)
As partes em grifo em cada uma das cita›es acima s‹o important’ssimas para a compreens‹o do que seja a Òmera expectativa de direitoÓ e vamos analis‡-las com mais detena para bem compreender essa teoria.
Com efeito, na primeira cita‹o doutrin‡ria, n‹o se reconhece o direito subjetivo ao adjudicat‡rio porque no interregno anterior ˆ consuma‹o do contrato poderia haver uma altera‹o no panorama f‡tico, e, consequentemente, no interesse pœblico afer’vel no caso concreto. Leia-se: n‹o existiria direito subjetivo ˆ contrata‹o por causa da revoga‹o. Esta, tambŽm, a linha de entendimento do primeiro excerto jurisprudencial colacionado.
J‡ no caso da segunda decis‹o transcrita, como cedio, tambŽm n‹o se acolhe a teoria da Òmera expectativa de direitoÓ. Neste caso, a justificativa para tanto Ž diversa. N‹o haveria direito subjetivo porque restaria ao ente contratante o direito de anular os seus pr—prios atos eivados de nulidade e que poderiam causar preju’zo ao interesse pœblico. Assim, n‹o existe direito subjetivo por causa da anula‹o.
A suma dos dois posicionamentos Ž simples, e, em nosso entender, se resume nos seguintes termos: pelo t‹o simples fato de a Administra‹o Pœblica poder revogar ou anular o certame n‹o existiria o direito subjetivo ao licitante adjudicat‡rio.
Em termos pr‡ticos, este racioc’nio busca legitima‹o em situa›es como: imagine-se uma cat‡strofe natural que assolou um Munic’pio e o mesmo ter‡ de alocar os recursos faltantes para corrigir os danos sofridos pelos cidad‹os. Os recursos antes destinados para a ultima‹o de uma eventual licita‹o ter‹o de ser aplicados na repara‹o reportada. Neste caso, a licita‹o poderia ser revogada pela Administra‹o Pœblica. N‹o existiria, por exclus‹o, um direito subjetivo ˆ contrata‹o.
Outra situa‹o bastante relembrada para atestar a inexistncia de direito subjetivo ˆ contrata‹o Ž tambŽm relatada por Justen Filho (2010, p. 607):
ÒSuponha-se, por exemplo, uma nova inven‹o que barateia o custo de produto cuja aquisi‹o fora objeto de licita‹o, com adjudica‹o e homologa‹o j‡ aperfeioada. Parece inquestion‡vel a possibilidade de o fato novo produzir a emiss‹o de novo ju’zo de convenincia. Ou seja, n‹o se pode admitir que a Administra‹o ficaria vinculada eternamente aos efeitos da adjudica‹o […] Logo […], a Administra‹o poder‡ promover a revoga‹o da homologa‹o e adjudica‹o anteriores, emitindo novo ju’zo de convenincia da contrata‹o. Revoga-se, conjuntamente, a licita‹o anteriorÓ.
Acontece que este pensamento, ao nosso sentir, encerra sutil equ’voco que merece reparo. Veja-se que o racioc’nio Ž realizado sempre de maneira excludente, ou seja, das duas uma: ou existe o direito ˆ revoga‹o e ˆ anula‹o, e neste caso, o particular detŽm Òmera expectativa de direitoÓ ou se concede o direito subjetivo ao particular e, neste caso, inexistiria a possibilidade da Administra‹o lanar m‹o daquelas faculdades jur’dicas. Por ser —bvio que a Administra‹o poder‡ revogar ou anular o certame para atender ao interesse pœblico, ent‹o se mantŽm o racioc’nio de que Ž o particular est‡ em situa‹o de Òmera expectativa de direitoÓ.
De fato, n‹o negamos a existncia de um poder-dever (ou dever-poder) da Administra‹o em anular os seus pr—prios atos, sequer esta mesma faculdade para revog‡-los.
O que contestamos, de forma veemente, Ž a forma excludente pela qual se forma o racioc’nio. No nosso entender, a existncia de poderes-deveres da Administra‹o Pœblica n‹o exclui a existncia do direito subjetivo. A rela‹o, a nosso ver, n‹o Ž de exclus‹o, e sim de complementaridade. Ou seja – e com o perd‹o da repeti‹o de palavras -: existe o poder-dever de anular, existe o poder-dever de revogar e existe o direito subjetivo ao contrato do particular.
A diferena, no entanto, ser‡ como conceber e conciliar cada um no caso concreto. Para esclarecer bem essa sistem‡tica, nos deteremos, inicialmente, no porqu de entendermos a existncia do direito subjetivo ˆ contrata‹o. O que nos faz entender pela sua existncia?
A resposta Ž aparentemente simples: porque a realiza‹o da contrata‹o nada mais Ž do que a execu‹o da decis‹o tomada na fase interna prŽ-contratual que julgou conveniente a realiza‹o do prŽlio para contrata‹o de terceiros. E n‹o cabe ˆ Administra‹o Pœblica, seja neste momento, seja em momento anterior, rever essa decis‹o ao seu alvedrio[2].
Repise-se, no particular, que no momento em que aquela exerceu a discricionariedade que lhe foi concedida pelo ordenamento jur’dico, que consistia na realiza‹o ou n‹o da contrata‹o perante terceiros, houve o esvaziamento da discricionariedade casu’stica da Administra‹o Pœblica referente a esta espec’fica avalia‹o, e, por fora de seu pronunciamento, encontra-se a mesma vinculada a tanto.
Nesse ponto, vale lembrar que toda contrata‹o tem in’cio em uma requisi‹o realizada no ‰mbito da Administra‹o Pœblica, com a conseqŸente defini‹o do objeto e a previs‹o orament‡ria, que formam os subs’dios para a tomada do seguinte ato administrativo: contratarei, mediante licita‹o, se o particular se amoldar a estes requisitos. Inexistia nesse momento, Ž claro, o direito subjetivo ‡ contrata‹o.
Acontece que o particular se amoldou aos requisitos da Administra‹o Pœblica, tendo a mesma, inclusive, declarado tal fato ao final do certame. Resta apenas, assim, a œltima providncia para complementa‹o da decis‹o, qual seja: a contrata‹o. E se se trata, t‹o somente, de perfectibilizar o interesse pœblico previsto na decis‹o que entendeu pela contrata‹o, ent‹o o que resta n‹o Ž uma Òmera expectativa de direitoÓ, mas direito subjetivo de parte do particular, transparecido em um ato vinculado de competncia da Administra‹o Pœblica.
Sobre o tema, Barroso (2003, p. 365/366) bem explica sobre a ausncia de discricionariedade nesses casos:
ÒPara que haja discri‹o, Ž necess‡rio que seja confirmada pelos fatos a suposi‹o legal de que haveria, no caso concreto, possibilidades variadas de solu‹o capazes de realizar seu prop—sito Ð e que justificou, afinal, a outorga ao administrador do poder discricion‡rio. Desse modo, s— h‡ poder discricion‡rio leg’timo diante de mais de uma solu‹o plaus’vel para o problema, ou seja, quando houver mais de uma possibilidade de ato a ser praticado, todos igualmente aptos a realizar o fim pœblico. Se houver apenas uma possibilidade de solu‹o —tima, n‹o haver‡ mais discricionariedade e o ato ser‡, na realidade, vinculado. Ora bem: se em determinada situa‹o concreta n‹o h‡ discricionariedade, mas na verdade vincula‹o, uma vez que apenas se atingir‡ excelentemente o fim pœblico mediante uma determinada a‹o, o particular tem direito subjetivo ˆ pr‡tica desse ato administrativo, como se passa com os atos vinculados em geralÓ. (grifos nossos)
V-se, pois, que um efeito da licita‹o Ž a contrata‹o do particular. Mas n‹o porque a Administra‹o assim o quer ou desejar‡ um dia, mas porque lhe falece competncia discricion‡ria para praticar outra conduta que n‹o a execu‹o da decis‹o tomada na fase interna. H‡, aqui, vincula‹o a uma determinada atividade, sendo a œnica admitida pelo direito. A convoca‹o para o contrato, nestas circunst‰ncias, Ž ato vinculado, verdadeiro direito subjetivo do particular.
Note-se que quando afirmamos isso, realamos, a nosso ver, o efeito de limita‹o da conduta proveniente do direito subjetivo. Ou seja, corrobora com a pr—pria conclus‹o pela existncia de um direito subjetivo a favor do particular a existncia de um de seus traos caracter’sticos. A Administra‹o Pœblica, neste caso, tal como qualquer outro sujeito passivo em uma rela‹o jur’dica[3], se v adstrita ˆ realiza‹o de t‹o somente uma conduta pass’vel de respeito ao conteœdo de outra situa‹o ativa que lhe Ž correlata.
Por esta e pelas raz›es acima delineadas n‹o hesitamos em afirmar: existe um direito subjetivo de titularidade do particular ao fim da licita‹o promovida pela Administra‹o Pœblica.
Mas, como j‡ preceitua o ditado, em toda regra h‡ exce‹o. Dizer que existe o direito subjetivo ao contrato para o particular n‹o significa que o mesmo vai prevalecer em todos os casos ap—s o fim da licita‹o. Surge, assim, concomitantemente, a possibilidade de utiliza‹o pela Administra‹o Pœblica do poder-dever de anula‹o e do poder-dever de revoga‹o.
No entanto, como no pr—prio par‡grafo anterior se assenta, o que existe n‹o Ž a imediata frui‹o no caso concreto de tais poderes, mas t‹o s— a possibilidade de sua utiliza‹o. Da’ porque, frise-se: n‹o existe competncia concreta para o ente contratante se valer de tais poderes-deveres pelo simples fato de haver finalizado o certame.
A concep‹o de tais poderes-deveres se d‡, portanto, em um plano abstrato, tal como sugerido por Sundfeld. Estes apenas passar‹o, por sua vez, ao plano do concreto no momento em que verificadas circunst‰ncias relevantes, tais como eventual irregularidade insan‡vel ao longo do processo administrativo, assim como desconformidade da contrata‹o com o interesse pœblico, por fora de irrup‹o de fato superveniente comprovado, pertinente e justific‡vel da ado‹o de tal conduta.
Da’ porque afirmamos da convivncia entre o direito subjetivo ao contrato de titularidade do particular e os deveres-poderes de revoga‹o e anula‹o. O primeiro Ž a consequncia jur’dica da licita‹o e existe desde j‡ em favor do particular, e os demais se encontram em estado latente e t‹o somente podem ser evocados em condi›es especial’ssimas, no momento em que se alvitra a possibilidade de mudana da decis‹o tomada antes mesmo de deflagrado o certame competitivo. Retornamos ˆ valiosa doutrina do ilustr’ssimo Sundfeld (1994, p. 174):
ÒTanto no caso do contrato como no da nomea‹o, o direito subjetivo decorre da circunst‰ncia do ju’zo discricion‡rio (de contratar ou nomear) j‡ haver sido exercido, restando apenas a execu‹o material da decis‹o tomada, atravŽs da formaliza‹o do contrato ou da posse, conforme a hip—tese.
Mas essa decis‹o [a decis‹o pelo contrato] n‹o Ž imut‡vel, sendo em tese poss’vel uma nova aprecia‹o a respeito, ante a ocorrncia de fatos supervenientes a ela. Da’ a homologa‹o n‹o gerar presun‹o absoluta, que n‹o teria sentido pois, mesmo ap—s a celebra‹o do contrato, Ž poss’vel ao Estado rescindi-lo unilateralmente, por raz›es de interesse pœblico […]. Mas existe deveras o direito subjetivo de ser contratado, salvo revoga‹o operada em decorrncia de fato posterior ˆ homologa‹o e processada nos mesmos termos do art. 49. Destarte, a simples omiss‹o (isto Ž, a ausncia das providncias de execu‹o da homologa‹o, sem que um ato contraposto tenha sido praticado) fere direito subjetivoÓ. (grifos nossos)
Ora se apenas pode-se utilizar o poder-dever de anular e/ou revogar o procedimento administrativo em situa›es especial’ssimas, em que deve ser sopesada a utiliza‹o de tais poderes jur’dicos com a situa‹o do particular, ent‹o podemos afirmar que estes s‹o exce‹o. E se assim o s‹o, ent‹o a outra parcela do ditado complementa o nosso racioc’nio: a exce‹o confirma a regra, ou seja, o poder-dever de anular e de revogar confirma que o direito subjetivo ao contrato deve ser o que prevalece normalmente na licita‹o.
Mas Ž preciso avanar um pouco mais. Quando dizemos que o direito subjetivo convive junto com os poderes-deveres de anular e revogar, estamos afirmando, tambŽm, que a anula‹o ou revoga‹o do certame n‹o aconteceu porque n‹o existia direito subjetivo ˆ contrata‹o, como quer fazer crer o pensamento de exclus‹o elaborado no ‰mbito da teoria da Òmera expectativa de direitoÓ. N‹o Ž esta a raz‹o, no nosso entender, pela qual se realiza o desfazimento da licita‹o.
Apenas persiste a anula‹o e a revoga‹o porque a necessidade de restaurar a ordem jur’dica, no primeiro caso, e a adequa‹o ao interesse pœblico, no segundo, se fez de tal monta importante que, no embate com o direito subjetivo do particular, julgou-se pela prevalncia destes.
Um exemplo ajuda na compreens‹o deste nosso racioc’nio. Suponha-se, novamente, o caso relatado neste estudo do Munic’pio que, por fora de uma cat‡strofe natural teve de alocar recursos para minimizar os efeitos danosos ao seu patrim™nio. Naquele caso, como realado, entendemos existir a possibilidade de revoga‹o do certame.
Agora imagine-se uma situa‹o diversa. Ocorreu, de fato, a cat‡strofe natural e os alegados preju’zos aos mun’cipes e ao patrim™nio pœblico. Acontece que, avaliando as contas do Munic’pio, percebe-se que Ž poss’vel atender aos reclames da situa‹o calamitosa e ainda assim resta aporte financeiro para pagar e realizar a contrata‹o. Inclusive, pela natureza do bem que se est‡ adquirindo, percebe-se que o mesmo ajudar‡ na reconstru‹o da cidade. E neste caso, pergunta-se: subsistiria o direito subjetivo ˆ contrata‹o? Ou em melhor dizer, haveria raz‹o para ser sustentar novo ju’zo de avalia‹o pela convenincia da contrata‹o? Certamente que n‹o.
Este exemplo final Ž bastante ilustrativo porque mostra que a avalia‹o de um fato superveniente pode, ainda assim, levar ˆ conclus‹o pela situa‹o de direito subjetivo do particular ao contrato, pela necessidade da contrata‹o. E se isso Ž poss’vel juridicamente, ent‹o o que existia anteriormente ˆ irrup‹o da nova situa‹o era, sim, um direito subjetivo ao particular e n‹o mera expectativa deste.
Com isso, demonstramos que quando se conclui pela revoga‹o em uma dada circunst‰ncia, n‹o Ž porque inexistia direito subjetivo ˆ contrata‹o, e sim porque a relev‰ncia dos outros direitos presentes no caso, como, por exemplo, a moradia, alimenta‹o e habita‹o dos demais mun’cipes, se sobrep›em ao direito subjetivo do particular na licita‹o.
Ou seja, o racioc’nio aqui se assenta sob as seguintes bases: a conclus‹o pela necessidade de revoga‹o ou anula‹o n‹o Ž uma declara‹o de inexistncia ou invalidade do direito subjetivo anterior, mas apenas a confirma‹o de que aquela outra solu‹o se aperfeioa melhor ao caso concreto, sendo, portanto, leg’tima e necess‡ria.
A sistem‡tica final que propomos neste estudo para a situa‹o do particular e da Administra‹o Pœblica ap—s finalizado o certame, ent‹o, Ž a seguinte: t‹o logo adjudicado o objeto ao vencedor do certame, surge o direito subjetivo ao contrato, por fora de restar t‹o somente a vincula‹o daquela ˆ decis‹o tomada na fase interna prŽ-contratual pelo contrato administrativo que seria realizado mediante a licita‹o. Existe, assim, uma situa‹o ativa em favor do particular que deve ser respeitada pelo Poder Pœblico, parte passiva da rela‹o jur’dica.
No entanto, excepcionalmente, podem surgir situa›es que demandem nova aprecia‹o do caso concreto ou, ainda, novo ju’zo sobre a regularidade do procedimento administrativo. Nestes casos, surge competncia da Administra‹o Pœblica para utilizar poderes-deveres que se encontravam em plano abstrato, na situa‹o concreta.
Mas com isso n‹o se chega ˆ necessidade de desfazimento da licita‹o em todos estes casos e tampouco pode autorizar ˆ intelec‹o de que a decis‹o pela revoga‹o ou anula‹o representaria a ausncia do direito subjetivo. O que deve acontecer aqui Ž uma avalia‹o da nulidade e do fato superveniente, seus efeitos no procedimento administrativo, a gravidade e les‹o a outros princ’pios jur’dicos, para assim concluir se o que surge de novo no mundo do fato e do direito Ž suficiente para se sobrepor ˆ situa‹o ativa em que se encontrava o particular em face da Administra‹o Pœblica. Ou seja, apenas se conclui pela n‹o prevalncia do direito subjetivo ap—s a verifica‹o da ilegalidade ou do fato superveniente. Antes de sua verifica‹o, o que existe Ž um direito subjetivo do particular ao contrato.
Resulta deste racioc’nio, portanto, n‹o apenas a existncia do direito subjetivo ao contrato mas tambŽm da sua convivncia com os poderes-deveres de revoga‹o e anula‹o. Afasta-se, bem por isso, o racioc’nio da existncia de Òmera expectativa de direitoÓ ao final da licita‹o, e, por sua vez, seu renitente pensamento excludente entre as hip—teses legais de conduta do Poder Pœblico.
Por fim, poder-se-ia objetar todo este estudo com argumentos de que o reconhecimento de uma situa‹o de direito subjetivo ao particular ao fim da licita‹o poderia engessar a competncia da Administra‹o Pœblica para prover o interesse pœblico, fazendo-a assinar contratos desvantajosos, resultando, ao fim, em les‹o ao er‡rio pœblico, ou quaisquer outros princ’pios e normas jur’dicas correlatas.
Apenas por incorre‹o este argumento poderia ser suscitado.
Veja-se que, primeiramente, n‹o defendemos a impossibilidade da aprecia‹o de nova situa‹o f‡tica, ou a detec‹o de irregularidade ao longo do certame. A possibilidade de revoga‹o ou anula‹o continuam existindo. Assim, se houver uma mudana emergencial no oramento, uma calamidade pœblica, ou quaisquer outras situa›es s’miles e excepcionais a licita‹o poder‡ ser desfeita.
Agora, Ž preciso atentar que estas s‹o apenas possibilidades e n‹o realidades. Se concebem em um plano abstrato e para descambar em seu exerc’cio necessitam passar por um determinado crivo jur’dico.
O que n‹o se pode aceitar, em todo caso, Ž simplesmente a inŽrcia desmotivada da Administra‹o Pœblica e/ou a evoca‹o de motivos irrelevantes para frustrar o certame, j‡ que, neste caso, estar‡ violando direito subjetivo ˆ contrata‹o do particular. Afinal, se ela j‡ declarou que o certame Ž liso e tambŽm que inexiste qualquer altera‹o relevante no panorama no mundo f‡tico no momento de realizada a homologa‹o da licita‹o, o que resta mais a fazer? Esperar que a realidade tome forma de urgncia? Afinal, porque ent‹o se licitou em primeiro plano se n‹o era para contratar?
Relembre-se, ademais, que se for o caso de desvantagem excessiva ao dito interesse pœblico ao longo do contrato, a Administra‹o Pœblica possui todos os seus poderes para extingui-lo. Veja-se que legisla‹o do tema Ž farta, e apenas como exemplo, citemos o caso de rescis‹o do contrato administrativo com base no permissivo do art. 78, inciso XII do Estatuto Geral de Licita›es e Contratos Administrativos.
A nosso ver, n‹o conceber a existncia do direito subjetivo ao fim da licita‹o reflete uma outra realidade: a dificuldade de se reconhecer uma posi‹o ativa dos sujeitos em face da Administra‹o Pœblica. ƒ a velha hist—ria de que todos est‹o obrigados em algo ao Rei, ou seja, o particular cumpre rigorosamente o que ele dita no edital sob pena de desclassifica‹o, e o Rei n‹o est‡ obrigado nunca com nenhum, ou seja, ele n‹o necessita contratar ap—s ter dito que contrataria. Uma balana sempre desequilibrada.
Mas atualmente o problema ganha facetas ainda mais complexas Ð e menos sinceras – na medida em que se justifica a possibilidade de tal conduta sob o manto da busca pelo interesse pœblico[4]. Mas, em sendo aceita essa hip—tese, pergunta-se como modo de contra-argumenta‹o: como pode se decidir inicialmente por um interesse dito pœblico e depois simplesmente buscar proteg-lo com a conduta contr‡ria? N‹o seria o pr—prio interesse pœblico que restaria ferido se n‹o realizada a contrata‹o?
Que se realce, ao fim, que a solu‹o aqui encontrada n‹o visa alcanar questionamentos sobre a eficincia nas licita›es ou, ainda, da efetiva vantagem em se optar por tal modelo de contrata‹o[5]. ƒ t‹o somente a nossa vis‹o para como fica a situa‹o de um particular em uma Administra‹o Pœblica que adota a licita‹o como forma de contratar. N‹o Ž quest‹o de ser boa ou ruim a solu‹o encontrada. ƒ quest‹o de analisar o reflexo da ado‹o de um certo modelo para as contrata›es levadas a cabo pela Administra‹o Pœblica.
Entendemos, bem por isso, que se se entende que n‹o se deve engessar tanto a conduta da Administra‹o Pœblica no momento da realiza‹o de um contrato que se cambie a forma pela qual se dar‡ a contrata‹o. No entanto, enquanto perdurar esta solu‹o pol’tico-constitucional para o problema das contrata›es pœblicas, inexoravelmente, em nosso modesto entender, o direito subjetivo ao particular continuar‡ sendo o efeito principal do processo.
Esclarecido em pormenores o nosso posicionamento acerca da existncia de direito subjetivo ao contrato ao fim da licita‹o pœblica, assim como o porqu em adotarmos este entendimento, julgamos pertinente apresentar, em breves linhas, aquela que julgamos uma das mais importantes consequncias pr‡ticas com a ado‹o desta nossa tese, qual seja, a prote‹o do particular via mandado de segurana por ato omissivo e/ou infundado da autoridade administrativa competente.
Com efeito, tal como frisamos ao estudar a figura do direito subjetivo, uma de suas principais caracter’sticas Ž o surgimento de uma situa‹o ativa em face do particular que, neste caso, ao fim da licita‹o tem ao seu lado em situa‹o passiva a Administra‹o Pœblica. E se assim se perfaz o panorama, Ž poss’vel desta œltima n‹o cumprir o conteœdo de tal direito, resultando, portanto, em sua viola‹o e conseqŸente prote‹o judicial pela interposi‹o do citado remŽdio constitucional.
ƒ preciso, assim, destrinchar neste momento os requisitos do mandado de segurana para aferir da possibilidade ou n‹o do ajuizamento de tal procedimento jurisdicional perante o Poder Judici‡rio no caso estudado.
Em primeiro lugar, temos a pr‡tica do ato tido como ileg’timo e pass’vel de corre‹o pelo Poder Judici‡rio na esteira do art. 1¡ da Lei 12.016/09, ou seja, o ato administrativo que pugnou pelo desfazimento do certame, e, por sua vez, desprivilegiou o particular que almejava contratar com a Administra‹o Pœblica. Consubstancia-se, com a decis‹o administrativa, o requisito do ato proferido por uma autoridade pœblica, tida como coatora.
Mas tambŽm pode ocorrer a hip—tese da omiss‹o e inŽrcia da Administra‹o, que n‹o cumpre aquilo que est‡ adstringida para tanto. Neste caso, n‹o temos dœvida que o mandado de segurana tambŽm Ž remŽdio pass’vel de corre‹o da ilegalidade, afinal, como asseverou Barbi (1980, p. 170):
Ò[…] n‹o Ž necess‡rio, porŽm, que o ato violador do direito seja comissivo, pois tambŽm os atos omissivos podem causar les‹o, desde que haja dever legal da Administra‹o de pratic‡-los, o que se d‡, por exemplo, quando ela deva fornecer certid‹o, despachar requerimentos etc.Ó
Repise-se que as licita›es n‹o s‹o realizadas por desfastio, e sim em prol de suprir uma necessidade atual do fazer administrativo. A omiss‹o, assim, n‹o apenas causa les‹o ao particular que pretendia e possu’a direito ˆ contrata‹o, mas tambŽm se estar‡ desprestigiando alguma necessidade pœblica.
Por oportuno, cumpre colacionar relevante jurisprudncia cultuada no ‰mbito do Superior Tribunal de Justia no sentido de prover mandamus intentado perante a Administra‹o Pœblica por omiss‹o na nomea‹o dos candidatos aprovados em concurso pœblico e que n‹o haviam sido empossados nos respectivos cargos. Os argumentos utilizados em sede jurisprudencial, de fato, mostram-se inteiramente aplic‡veis ao nosso intento. Vejamos os interessantes excertos:
ÒRECURSO ORDINçRIO EM MANDADO DE SEGURAN‚A. CONCURSO PòBLICO. APROVA‚ÌO DENTRO DO NòMERO DE VAGAS. DIREITO LêQUIDO E CERTO.RECURSO PROVIDO. […]2. A partir da veicula‹o expressa da necessidade de prover determinado nœmero de cargos, atravŽs da publica‹o de edital de concurso, a nomea‹o e posse de candidato aprovado dentro das vagas ofertadas, transmuda-se de mera expectativa ˆ direito subjetivo. 3. Tem-se por ilegal o ato omissivo da Administra‹o que n‹o assegura a nomea‹o de candidato aprovado e classificado atŽ o limite de vagas previstas no edital, por se tratar de ato vinculadoÓ. (BRASIL, 2008)
ÒADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURAN‚A. APROVA‚ÌO EM CONCURSO PòBLICO. NOMEA‚ÌO. DIREITO SUBJETIVO.
1. A classifica‹o de candidato dentro do nœmero de vagas ofertadas pela Administra‹o gera, n‹o a mera expectativa, mas o direito subjetivo ˆ nomea‹o. […] 3. A manuten‹o da postura de deixar transcorrer o prazo sem proceder ao provimento dos cargos efetivos existentes por aqueles legalmente habilitados em concurso pœblico importaria em les‹o aos princ’pios da boa-fŽ administrativa, da razoabilidade, da lealdade, da isonomia e da segurana jur’dica, os quais cumpre ao Poder Pœblico observar. 4. Afasta-se a alegada convenincia da Administra‹o como fator limitador da nomea‹o dos candidatos aprovados, tendo em vista a exigncia constitucional de previs‹o orament‡ria antes da divulga‹o do edital (art. 169, ¤ 1¼, I e II, CF). 5. Recurso ordin‡rio provido para conceder a seguranaÓ. (BRASIL, 2009)
Em segundo lugar, com base na an‡lise do art. 1¡ da Lei 12.016/09, temos o requisito da configura‹o do direito l’quido e certo, que nos dizeres de Miranda (1955, p. 260), Ž aquele que Òn‹o desperta dœvidas, que est‡ isento de obscuridades, que n‹o precisa ser declarado com o exame de provas e dila›es, que Ž, de si mesmo, concludente e inconcussoÓ.
Ora, face tudo que expomos atŽ agora, em tudo o direito subjetivo do particular ao fim da licita‹o se afeioa a estas caracter’sticas. Afinal, resta apenas um ato administrativo para se consumar a contrata‹o, qual seja, a convoca‹o do particular para a assinatura da avena, que, como cedio, representa uma vincula‹o ˆ Administra‹o Pœblica e n‹o uma nova possibilidade de aprecia‹o jur’dica ou f‡tica. Indubit‡vel, bem por isso, que a situa‹o do particular Ž ativa em face do Poder Pœblico e n‹o necessita comprovar outra coisa que n‹o a realiza‹o da licita‹o.
Deve-se, bem por isso, no intuito de comprovar a existncia do direito l’quido e certo, demonstrar a realiza‹o e a finaliza‹o do certame com a adjudica‹o, colacionando-se o processo administrativo nos autos do writ, e, no caso espec’fico de desfazimento ileg’timo do certame, a decis‹o que veiculou tal extraordin‡ria medida.
3. Conclus›es
Conclui-se, com o presente estudo, que o que existe antes da revoga‹o ou da anula‹o Ž direito subjetivo ao contrato, e n‹o Òmera expectativa de direitoÓ. E, em sendo assim, o que existe, tambŽm, Ž a convivncia entre o poder-dever de anula‹o e revoga‹o e o direito subjetivo ao contrato. A diferena, no entanto, ser‡ como conceber cada um no caso concreto. Em regra, apenas o primeiro Ž realidade, e enquanto n‹o verificado fato superveniente ou ilegalidade ao fim do certame, apenas se concebem a revoga‹o ou anula‹o como mera possibilidade jur’dica e n‹o realidade pass’vel de exerc’cio no caso concreto.
Por fim, pontuamos uma das principais conseqŸncias jur’dicas deste nosso posicionamento, qual seja, a possibilidade de impetra‹o de mandado de segurana para proteger o direito subjetivo ao contrato, que se apresenta com fei‹o de l’quido e certo ao final da licita‹o tanto no caso de desfazimento injur’dico do certame, quanto na hip—tese de omiss‹o injustificada da Administra‹o Pœblica em contratar.
No primeiro caso, poder‡ ser impetrado o remŽdio constitucional em 120 (cento e vinte) dias contados do conhecimento do ato administrativo que desfez o prŽlio sob raz›es – se Ž que as mesmas existiram – infundadas, e, na segunda hip—tese, poder-se-‡ impetrar mandamus de car‡ter preventivo, face a proximidade da expira‹o do prazo de validade das propostas dos licitantes, a teor do art. 64, ¤ 3¼, da Lei 8.666/93, ou em car‡ter repressivo, em atŽ 120 (cento e vinte) dias contados da consubstancia‹o da omiss‹o em contratar da Administra‹o Pœblica.
Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Pós-Graduado em Direito Público pela Faculdade Baiana de Direito
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