Resumo: O Judiciário está legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente nos casos em que for verificado que este praticou atos de gestão empresarial com excesso de poderes e/ou infração à lei ou ao contrato social a que está subordinado, mais especificamente nos casos em que for verificada a presunção de dissolução irregular da pessoa jurídica executada. Nestes casos, a responsabilidade atribuída ao sócio administrador será pessoal, o que distancia esta responsabilização daquelas atribuídas aos demais sócios, as quais se configuram como subsidiárias e/ou solidárias. A aplicação do entendimento jurisprudencial sobre o redirecionamento de uma execução fiscal para pessoa diversa do sujeito passivo originário da obrigação tributária exequenda sem a necessidade de qualquer tipo de procedimento anterior que valide as circunstancias para a mudança da titularidade passiva por vezes é confundida com a aplicação indevida e arbitrária do instituto da desconsideração da personalidade jurídica ou do próprio entendimento em comento. Ocorre que o objeto da presente análise não se trata de desconsideração da pessoa jurídica, fato verificado justamente pela responsabilização direta do sócio gerente, sem a necessidade de processo judicial específico, com base em Súmula elaborada pelo Superior Tribunal de Justiça. Entretanto, a desnecessidade de instauração de processo judicial específico para apurar as causas de possível redirecionamento da responsabilidade tributária para terceiros interessados não retira do nobre julgador a obrigação de, antes de proceder com a ora tratada, reunir todas as informações que lhe forem prestadas pela parte interessada (Fazenda Pública ou sócio gerente) a fim de verificar a pertinência das causas que levam a possível redirecionamento.
Palavras-chave: execução fiscal; redirecionamento; sócio-gerente; Infração; Responsabilização.
Sumário: 1. Introdução.2. Limites à responsabilidade tributária dos sócios. 2.1. Obrigações tributárias. 2.2. Presunção de dissolução irregular. 3. Óbice ao adimplemento exequendo. 3.1. Dissolução irregular – motivos ensejadores.3.2. Desnecessidade de aplicação da desconsideração da personalidade jurídica.4. A execução fiscal.5. Posicionamento do superior tribunal de justiça. 6. Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇÃO
Na seara tributária, a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal para o sócio gerente, apesar de ser ratificada por Súmula apresentada pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda é tema de discussão, tendo em vista que a hipótese trazida por tal Súmula imputa ao sócio a responsabilidade por pessoa jurídica. Tal possibilidade é cabível em casos de desconsideração da personalidade jurídica, conforme aduz o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. Desta forma, insurge a discussão acerca da necessidade de redirecionar o processo fiscal para sócio gerente, cujo nome se apresenta no título exequente apenas como corresponsável tributário.
Apesar do redirecionamento de Execução Fiscal ao Sócio-Gerente da Empresa executada pela Fazenda Nacional ser legal, atualmente, o uso indiscriminado da Súmula pelas Turmas que compõem a Primeira Seção do STJ tem trazido inúmeros empecilhos aos contribuintes e responsáveis tributários e desvirtuamento da própria jurisprudência da Corte.
A presunção de dissolução irregular da empresa contra a qual é movida originalmente a Execução Fiscal depende da comprovação de que a empresa deixou de funcionar em seu domicílio fiscal sem que tenha ocorrido a comunicação aos órgãos competentes – como, por exemplo, à Receita Federal e à Junta Comercial; e tal presunção somente autoriza o redirecionamento contra o sócio-gerente da pessoa jurídica executada.
Inicialmente, a Súmula 435 está em perfeita harmonia com a jurisprudência firmada pela Primeira Seção do STJ, que salientou ser “pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só a responsabilidade subsidiária do sócio”. Para tanto, foi enfatizada a necessidade de comprovação de que o mesmo tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa.
A leitura conjugada da Súmula ora leva a crer que somente o sócio que comprovadamente detivesse poderes de gerência, e que comprovadamente tenha praticado as condutas previstas no Código Tributário Nacional pode ter contra si a presunção de dissolução irregular da pessoa jurídica para fins de redirecionamento da Execução Fiscal.
Apesar do raciocínio claro do presente dispositivo, haja vista que somente um sócio com poderes de gerência poderia praticar atos que culminassem com a dissolução irregular da empresa, a Fazenda Nacional enxergou na mencionada Súmula 435/STJ a possibilidade de driblar o entendimento firmado em Recurso Repetitivo, e está conseguindo, com a sua aplicação indiscriminada, alterar julgamentos desfavoráveis ocorridos nas instâncias de origem, as quais, com base em fatos e provas, atribuíam a sócios minoritários ou que comprovadamente não detinham poder de gerência a responsabilidade subsidiária decorrente de suposta dissolução irregular bastando para isso mera certidão do oficial de justiça que comprovava que a empresa não funciona mais no endereço indicado.
Certo é que, se não há comprovação de que o sócio detinha poder de gerência na condução dos negócios da pessoa jurídica executada, não há como aplicar ao caso a Súmula 435, pois um sócio que não gerencia não pode praticar atos dos quais decorram a suposta dissolução irregular. Nem tampouco nos parece correto que uma simples certidão do Oficial de Justiça possa ser considerada documento suficiente para presumir-se irregularmente dissolvida a Empresa executada. Resta assim arbitrária a postura adotada pela Fazenda Nacional com o intuito de reaver créditos tributários executados.
Existe, desta forma, a necessidade de comprovação anterior de que o sócio a ser executado detinha poder para administrar a pessoa jurídica extinta, sendo que a aplicação do enunciado de forma indiscriminada pode conduzir à violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, garantidores de nossa ordem jurídica.
Diversos foram os pontos que ensejaram a origem da Súmula em tela, através de decisão proferida pelo Ministro Luiz Fux, a ser aplicada nos casos em que há a presunção de dissolução irregular de pessoa jurídica executada, cujo cadastro não foi devidamente atualizado, frustrando desta forma todas as tentativas de adimplemento do crédito tributário.
2. LIMITES À RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS
Por definição, pessoa jurídica é uma entidade abstrata com existência e responsabilidade jurídica independente, possuindo desta forma verossimilhança com a pessoa física sendo, portanto, sujeito com direitos e obrigações. Tal entidade surge com o escopo de possuir patrimônio próprio para a defesa de interesses autônomos, originados pela conjugação dos interesses comuns de uma ou mais pessoas físicas para o exercício de atividades nos casos em que é verificada a existência de hipossuficiência destes individualmente.
O escopo principal da existência da entidade pessoa jurídica é acertadamente trazida por Orlando Gomes, que define tal entidade como a personalização de determinado grupo social que surgiu sob a luz de um interesse social em comum para o exercício de determinada atividade cujo objetivo seria inviável, se desenvolvidos individualmente.
A sociedade é o exemplo da entidade supracitada mais comum atualmente. Ao defini-la, é possível perceber a convergência de características desta, com aquelas apresentadas pela entidade denominada pessoa jurídica:
“Atividades econômicas de pequeno porte podem ser exploradas por uma pessoa (natural), sem maiores dificuldades. Na medida, porém, em que se avolumam e ganham complexidade, exigindo maiores investimentos ou diferentes capacitações, as atividades econômicas não mais podem ser desenvolvidas, com eficiência por um indivíduo apenas. O seu desenvolvimento pressupõe, então, a aglutinação de esforços de diversos agentes, interessados nos lucros que elas prometem propiciar. Essa articulação pode assumir aradas formas jurídicas, dentre as quais a de uma sociedade”. (COELHO, 2007, p, 89)
Composta de uma forma geral por sócios, estes são, em síntese, os autores de todos aqueles atos que ensejam o desenvolvimento da sociedade, com o objetivo primordial de preservar seus interesses individuais. Desta forma, verifica-se a divisão patrimonial entre aqueles pertencentes à pessoa jurídica e aqueles pertencentes a cada sócio que a compõe, delimitado assim os direitos e deveres pertencentes a um e a outro e partilhando ao fim os resultados alcançados, conforme preceitua o artigo 981 do Código Civil (2002): “Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício da atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.”.
Tendo como obrigação responder pelas ações próprias da empresa, a responsabilidade dos sócios está ligada à espécie de sociedade que se relaciona. Desta forma, a responsabilidade dos sócios divide-se em solidária, limitada e ilimitada, conforme cláusula prevista em contrato social ou ainda a não integralização de capital social.
Para a administração, conforme preceitua o Código Civil (2002), os sócios possuem funções preestabelecidas em um contrato social. Estas, por sua vez, podem ir desde a inserção de capital para o desenvolvimento econômico da pessoa jurídica até mesmo às funções diretamente relacionadas à administração da entidade jurídica frente ao meio social que se encontra e órgãos competentes que a fiscaliza.
2.1. OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS DO SUJEITO PASSIVO
A relação tributária envolve de um lado o Estado, impositor de norma tributária, cujo cumprimento é imposto ao sujeito passivo da obrigação em tela. Sua natureza é obrigacional e possui como escopo “obter recursos para satisfazer, através do processo de serviço público, as necessidades coletivas” (ROSA JÚNIOR, 2007, p. 397), através de atividades financeiras.
A Sociedade, como pessoa jurídica, ocupa na relação tributária o polo passivo, por alcançar vantagem econômica configurando, portanto, como contribuinte, tendo em vista a sua relação direta com a situação que constitua o fato gerador , conforme art. 121, parágrafo único, inciso I, do Código Tributário Nacional (1966):
“Art. 121. Sujeito Passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte. Quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua respectivo fato gerador.”
O Código Tributário Nacional (1966) divide a obrigação tributária em principal e acessória, de acordo com o meio através do qual o Estado obterá os recursos exigidos através de lei.
Para o cumprimento de tais obrigações, o CTN traz como sujeito passivo da obrigação tributária, além do contribuinte, no inciso II, do artigo 121 supramencionado, a figura do responsável, categoria do sujeito passivo cuja obrigação é cometida pelo legislador a fim de viabilizar a eficiente fiscalização e arrecadação dos tributos. Insta salientar que tal responsabilidade, foco principal do presente estudo, apenas é atribuída à pessoa diversa daquela que constituiu o fato gerador através de lei formal:
“Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação” (Código Tributário Nacional, 1966).
A responsabilidade tributária é, por sua vez, dividida em modalidades, de acordo com o momento do surgimento da obrigação do responsável e o momento da ocorrência do fato gerador. Sendo a pessoa jurídica o contribuinte e polo passivo direto pela obrigação tributária, os sócios são apresentados como “responsável de terceiros” pelo CTN, tendo em vista a sua vinculação jurídica com o contribuinte, possuindo o dever de praticar determinados atos em nome e de interesse de determinada pessoa.
O rol de “responsáveis de terceiros”, conforme aduzido por Marcelo Alexandrino (2009, p.) 125 e corroborado pelo art. 134 e 135 do CTN é exaustivo e não admite qualquer pessoa responsável diversa daquelas minuciosamente elencadas. Sua responsabilidade, por sua vez, é imputada de acordo com sua atuação, seja regular cumprimento de suas atribuições legais, seja por excesso de poder.
O mencionado artigo, em seu conteúdo, atribui a responsabilidade a terceiros nos casos em que o cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte restou impossibilitada por motivo alheio e o fato gerador da obrigação tributária está a este terceiro vinculado:
“Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: […].”
O rol apresenta como responsáveis de terceiros figuras legalmente responsáveis pelo contribuinte diretamente relacionadas ao contribuinte, a exemplo dos pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; figuras responsáveis, ainda que de forma temporária, como o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio e o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; e finalmente os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas, momento oportuno para a quitação de todos os débitos relacionados à empresa.
Impende aqui salientar que os débitos tributários ora discutidos em que a responsabilidade pode ser atribuída a terceiros só poderá ser aplicada nos casos em que o caráter moratório e a impossibilidade de adimplemento for verificada pelos responsáveis principais da obrigação:
“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos e empregados;
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”. (Código Tributário Nacional, 1966).
Preservando o Princípio da autonomia patrimonial, sabe-se que o patrimônio da sociedade não se confunde com o patrimônio daqueles que a compõe, não sendo no presente caso os sócios os titulares das obrigações e deveres inerentes à pessoa jurídica devidamente registrada na Junta Comercial.
Entrementes, tal princípio não deixa de delegar aos sócios constituintes responsabilidades pela sociedade, conforme justificado por Fábio Ulhôa Coelho (2011, p. 38):
“A razão de ser do desprestígio da autonomia da pessoa jurídica pode-se pesquisar em dois fatores: na utilização fraudulenta do expediente, como meio de se furtar ao cumprimento de deveres legais ou contratuais; e na natureza da obrigação imputada à pessoa jurídica.”
Desta forma, caso os sócios não cumpram suas obrigações imputadas ou ainda ajam de forma fraudulenta, principalmente frente a credores, seu patrimônio pessoal poderá a ser oferecido para adimplemento de obrigações da sociedade da qual faz parte.
As obrigações sociais são de responsabilidade dos sócios de acordo com o tipo societário do qual faz parte, relacionando-se dentro de um limite ou ainda sem qualquer limite, podendo configurar como responsabilidade limitada ou responsabilidade ilimitada: em determinadas condições, os sócios respondem sem qualquer limitação, arcando com o valor integral da dívida da sociedade. Em outras, eles respondem pelas obrigações sociais dentro de um limite, relacionando ao valor do investimento que se propuseram a realizar (COELHO, 2011, p. 47).
Como obrigação principal, para a formação da sociedade, os sócios estão obrigados a investir, com recursos que viabilizem o exercício da atividade econômica a ser desenvolvida, conforme disposto em contrato social previamente assinado.
Para a organização e com o intuito de se manter o bom funcionamento da sociedade, há a figura do administrador ou sócio-gerente, cuja atribuição é administrar a empresa e manifestar a vontade da pessoa jurídica (COELHO, 2011, p. 411), observando, obviamente, os deveres de diligência e lealdade, configurando perante terceiros como corresponsáveis pela sociedade.
Por ser a sociedade uma pessoa jurídica, a responsabilidade por seus atos praticados recaem não apenas sobre si, mas também sobre as pessoas que, na condição de seu representante, os praticam. Em relação às obrigações tributárias, tal premissa não seria diferente.
No caso de inadimplemento e ajuizada uma execução fiscal com o fim de reaver o crédito tributário, a Fazenda pública está legitimada a recorrer aos meios possíveis para que o débito seja adimplido podendo, inclusive e em sendo o caso, requerer a constrição de bens do executado e, na falta deste, constrição de bens de seus responsáveis tributários, caso seja verificado que o inadimplemento é decorrente de atos praticados por estes últimos.
Entretanto, a Fazenda Pública não está legitimada a realizar livre escolha para a perseguição de patrimônio de terceiro (responsável tributário) sem que seja verificado relevante e explícito impedimento de cumprimento da obrigação tributária pelo contribuinte por culpa ou dolo de ato praticado por seu responsável tributário.
À luz do artigo 135 do CTN, as obrigações tributárias que recaem sobre uma sociedade devem ser cumpridas por aqueles a quem tal tarefa foi imposta. Sendo assim, ao sócio-gerente é atribuída a responsabilidade do pagamento dos tributos devidos pela sociedade.
Ocorre que, a atribuição de tal responsabilidade não é direta e, em caso de inadimplência da sociedade e havendo a cobrança do quantum devido através de um processo judicial (execução fiscal), cabe ao exequente (União Federal, Estado e Município) apresentar provas de que a responsabilidade deve ser atribuída ao sócio gerente daquela sociedade, para que seja verificado o excesso de mandado ou infração à lei, ao Contrato Social ou ao Estatuto daquela sociedade, classificando assim a responsabilidade do sócio gerente como subjetiva.
Sobre a responsabilidade imposta ao responsável pela empresa e as consequências destas, há a necessidade de apresentação de provas pelo exequente de que a responsabilidade subjetiva deve ser priorizada nos casos em que é verificada a prática pessoal de atos com dolo ou fraude. Existem reiteradas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), corte que julga em última instância matéria infraconstitucional, sobre o assunto:
“Acórdão: AGRESP 401306/MG: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL, 2001/0192130-4. Fonte: DJ. Data: 16/09/2002. Pg. 00153. Relator Min. FRANCISCO FALCÃO (1116).
Ementa: TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL, RECURSO ESPECIAL. SÓCIO-GERENTE. RESPONSABILIDADE PESSOAL PELO NÃO PAGAMENTO DE TRIBUTO. AUSÊNCIA DE PROVA DE INRAÇÃO A LEI OU ESTATUTO:
Nega-se provimento ao agravo regimental, em face das razões que sustentam a decisão recorrida, sendo certo que a jurisprudência desta Corte é no sentido de que o sócio-gerente de sociedade só pode ser responsabilizado pelo não pagamento de tributo respondendo com o seu patrimônio, se comprovado, pelo Fisco, ter aquele agido com dolo ou culpa, com infração à lei, do contrato social ou estatuto e que redunde na dissolução irregular da sociedade. Ademais, o não pagamento de tributo, de per si, não caracteriza violação à lei, mormente quando verificado que a sociedade continua em pleno funcionamento, como na hipótese vertente.”
Dos julgados acima transcritos, observa-se que a responsabilidade tributária do sócio, seja gerente ou não, não se limita apenas às hipóteses em que os atos (ou a omissão destes) sejam praticados (ou não) com dolo com por infração à lei. Para a imputação de responsabilidade por substituição, basta que haja a equiparação dos atos praticados (ou não) ao não cumprimento da responsabilidade atribuída ao sócio da empresa. Desta forma, para fins executivos, basta que seja verificado a relação direta entre a gerência social e o cumprimento do débito tributário já vencido para que a responsabilidade do gerente social passe a configurar como responsabilidade objetiva e não mais subjetiva.
2.2 PRESUNÇÃO DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR
Os responsáveis tributários de uma pessoa jurídica possuem, dentre outras atribuições, a obrigação de praticar os atos de gestão interna e externa da empresa, sob pena de lhe serem imputadas pessoalmente as consequências de possíveis omissões e/ou práticas indevidas.
Exemplo corriqueiro da falta ou da má administração de uma pessoa jurídica é a simples transferência de domicílio fiscal da empresa, sem a devida comunicação aos órgãos competentes, nem mesmo alteração no seu contrato social, ou, ainda, sem distrato social e sem a devida averbação na junta comercial. Tal situação é considerada com uma tentativa dos administradores de burlar a execução de prováveis débitos.
Diante disto, reiteradas decisões presumem aí a dissolução irregular da empresa, já que esta não possui localização precisa para os órgãos fiscalizadores competentes e, portanto, indiretamente não mais existe para a sociedade. Sendo assim, de acordo com o Código Comercial, caso uma empresa opere ou deixe de operar sem o seu devido registro na junta comercial do estado (órgão fiscalizador), a responsabilidade é solidária entre todos os sócios que compõem a sociedade.
Em matéria tributária, enfoque dado ao presente estudo, tal premissa é reforçada pelo artigo 135 do Código Tributário Nacional, onde admite e reitera a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal para os sócios, ampliando desta forma a legitimidade passiva de uma execução fiscal e permitindo a citação do administrador da sociedade na qualidade de responsável para responder pela dívida tributária, conforme dispõe o art. 4° da Lei n° 6.830/80, in verbis:
“Art. 4º – A execução fiscal poderá ser promovida contra:
I – o devedor;
II – o fiador;
III – o espólio;
IV – a massa;
V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e
VI – os sucessores a qualquer título”.
O ponto determinante de discussão entre doutrinadores gira em torno de prováveis discrepâncias entre o redirecionamento de uma execução fiscal para os administradores e a regra geral estabelecida no art. 1016 do Código Civil: “Os administradores respondem solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa no desempenho de suas funções.”.
A doutrina discute a possibilidade do redirecionamento de uma execução fiscal, tendo em vista a ausência de título executivo contra os administradores, os quais sequer participaram do processo administrativo. Tal posicionamento é o de Humberto Theodoro Júnior (2001, p.256):
“Sendo a execução fiscal regulada pela Lei no. 6.830 puro procedimento executivo, continua, a meu ver, inadmissível, em feito da espécie, pretender a Fazenda o acertamento de responsabilidades de terceiros ou coobrigados que não figuraram no processo administrativo e contra quem não se formou o título executivo, que é a Certidão de Dívida Ativa.”
O questionamento principal trazido pelo doutrinador é exatamente a impossibilidade de defesa do administrador, o qual não participa do processo administrativo o qual originou o tributo exequendo e está sujeito à constrição de seus bens, não respeitando desta forma, formalmente, o princípio do contraditório e da ampla defesa.
Embora existam questionamentos como estes, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que os sócios administradores são responsáveis, por substituição, pelos créditos correspondentes às obrigações tributárias da empresa, quando comprovada a prática destes de atos ou fatos ocorridos com a atuação com excesso de poder, infração a lei, contrato social ou estatutos.
Sendo assim, resta evidente a possibilidade de presunção de dissolução irregular de uma sociedade e consequente redirecionamento do cumprimento de uma obrigação tributária para os seus administradores, desde que sejam observados todos os requisitos para tal ocorrência. Importante ainda salientar que tal redirecionamento pode ocorrer a qualquer tempo, mesmo que finalizado o processo administrativo que deu origem à Certidão de Divida Ativa (CDA).
Em respeito ao Princípio do Contraditório e da Ampla defesa, havendo o redirecionamento da execução fiscal, os administradores podem defender-se por meio de embargos para provar que a dissolução ocorrida não é presumida e não foi feita em desrespeito à lei, a qual explicita os trâmites para a dissolução de uma empresa. Não o opondo, seu patrimônio pessoal será atingido como consequência da ilegalidade cometida.
Desta forma, a simples mudança de endereço de uma empresa, sem a devida comunicação oficial, já é fato suficiente para a responsabilização direta do cumprimento da obrigação tributária aos sócios administradores, os quais deverão recorrer aos meios cabíveis para descaracterizar as hipóteses apresentadas pela Fazenda Pública que ensejaram o redirecionamento.
A Turma Recursal de Juiz de Fora – Minas Gerais, por exemplo, deu provimento a um recurso da União Federal e determinou o prosseguimento da execução contra os sócios da empresa executada, tendo em vista que a empresa não foi localizada no endereço constante dos registros da Junta Comercial do Estado, conforme certidão emitida pelo Oficial de Justiça.
A simples situação apresentada leva à presunção de que a sociedade foi dissolvida de irregularmente e consequentemente autoriza o redirecionamento da execução para os sócios, que responderão pela dívida pessoalmente, caso não recorram para provar a improcedência do fato certificado pelo Oficial de Justiça.
Em seu decisum, a relatora ressalta ainda que a responsabilização dos administradores da empresa pelas dívidas fiscais não é automática, tendo em vista que há a necessidade de comprovação de que os atos praticados (ou não) que ensejaram o redirecionamento sejam contemporâneos aos administradores que efetivamente estavam envolvidos.
No caso em análise, a mudança de domicílio fiscal restou comprovada através da certidão emitida pelo Oficial de Justiça e pela ausência de qualquer comunicação de alteração nos órgãos competentes fiscalizadores estaduais ou federais, inobservando, desta forma, os artigos 1.150 e 1.151 do Código Civil, o que faz presumir a sua dissolução irregular e legitima a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal.
3. ÓBICE AO ADIMPLEMENTO EXEQUENDO
3.1 DISSOLUÇÃO IRREGULAR – MOTIVOS ENSEJADORES
Conforme já explicitado, a forma mais conhecida de dissolução irregular da sociedade é aquela em que a empresa deixa de operar suas atividades no endereço informado aos órgãos competentes, sem que seja realizada a sua baixa nas repartições competentes, presumindo-se assim que esta continua a desempenhar suas atividades, agora de forma irregular, já que não houve nem o seu devido encerramento, nem as devidas alterações cadastrais.
Todos os atos de gestão de uma empresa são de competência de realização daqueles que a representam. São estes os chamados administradores e, na maioria das vezes, tal posto é ocupado justamente por um dos sócios da empresa. Este, por sua vez, foi legitimado a ocupar o referido posto por deliberação dos demais sócios e o ato fora devidamente registrado no estatuto a empresa. A referida figura é denominada sócio gerente.
Caso tais administradores, no exercício de suas funções, a desempenhem de forma indevida, com dolo ou culpa, a estes é imputada pessoalmente a responsabilidade solidária ou subsidiária pelas consequências advindas destes atos.
Dentre as hipóteses de responsabilidade solidária ou subsidiária dos sócios e administradores de empresas, o ordenamento jurídico brasileiro contempla a responsabilização dos sócios por atos próprios.
Sobre tal responsabilização, acertadamente exemplifica Fábio Ulhôa Coelho (2010, p.415):
“O limite da responsabilidade dos sócios pelas obrigações da limitada é o total do capital social subscrito e não integralizado (CC art.1.052). Se Antônio, Benedito e Carlos contratam uma sociedade limitada, com capital subscrito de R$ 100.000,00, arcando, respectivamente, com 50%, 30% e 20% desse valor, cada um deles é responsável pela soma das quantias não integralizadas. Se Antônio integraliza R$ 30.000,00 (de sua quota de R$ 50.000,00), Benedito, R$ 20.000,00 (da quota de R$ 30.000,00), e Carlos também R$ 20.000,00, então o total do devido à sociedade pelos sócios é R$ 30.000,00. Esse é o montante que os credores da sociedade podem cobrar, do sócio, para satisfação de seus direitos creditícios.”
Tal responsabilização é direta, não há a necessidade de se almejar a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, vez que tal pessoa não é a responsável por atos a que não deu causa. Desta forma, não há que se mencionar a hipótese de desconsideração da personalidade jurídica, não havendo que se falar em desconsideração da personalidade jurídica.
Exemplo claro de tal assertiva é o redirecionamento de uma execução fiscal para o sócio gerente, uma vez que para estes casos, a simples mudança de endereço e a presunção de sua inatividade não são suficientes para considerar uma sociedade como dissolvida irregularmente.
A atribuição de responsabilidade aos sócios gerentes também é claramente verificada no artigo 135 do Código Tributário Nacional, onde demonstra a que a responsabilização por créditos tributários, apesar de ser pessoalmente atribuída ao sujeito passivo da obrigação tributaria, não é exclusiva deste, admitindo-se, portanto, a responsabilidade aos sócios:
“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos e empregados;
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”
3.2 DESNECESSIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
De mais a mais, entende-se como dissolvida a sociedade que obedece a um dos requisitos elencados no artigo 1.033 do Código Civil. In verbis:
“Artigo 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer:
I – o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado;
II – o consenso unânime dos sócios;
III – a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado;
IV – a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de 180 (cento e oitenta) dias;
V – a extinção, na formada lei, de autorização para funcionar.”
Para que se concretize da devida forma, a dissolução deve obedecer a requisitos preestabelecidos, conforme estabelece o §2º do artigo 51 do Código Civil:
“Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que está se conclua.
§1º – Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação de sua dissolução.”
Partindo de tal premissa, não há que se considerar a dissolução de uma sociedade por mera inatividade desta, tendo em vista que, estando desta forma, a qualquer momento, por deliberação dos sócios, a empresa pode ser reativada.
A dissolução irregular de uma sociedade é o encerramento das atividades que constituem seu objeto, sem que haja a necessidade de liquidação dos seus ativos e passivos na forma prevista no Código Civil e na legislação específica a cada caso, ou seja, é caracterizada pela inoperância das atividades da empresa. Sendo assim, é a cessação das atividades da empresa, sem que haja a baixa no registro da Junta Comercial e órgãos competentes.
Por inúmeros motivos uma sociedade pode ser dissolvida irregularmente, seja por motivos subjetivos, quando os sócios daquela empresa não mais demonstram interesse em desenvolver atividade fim para a qual se reuniram, até a motivos objetivos, sendo o mais conhecido a sua falência, por ausência de capital, na maioria das vezes.
Não há como deixar de mencionar que, por deliberação unânime ou por ato autônomo dos sócios, a hipótese de dissolução da empresa é almejada apenas com o escopo de burlar o adimplemento de obrigações imputadas àquela pessoa jurídica. São exatamente nestes casos em que a responsabilização dos sócios ou do sócio administrador é direta, e não mais indireta.
De qualquer forma, sabe-se que os cumprimentos das obrigações da sociedade devem ser feitos antes do enceramento de suas atividades. Caso não ocorra, presumir-se-á a sua dissolução irregular, responsabilizando diretamente os sócios pelas consequências dos atos a que deram causa. Esse é o atual entendimento do Tribunal de Justiça, que reconhece a legitimidade passiva destes sócios em processos executivos.
A possibilidade de constrição de bens pessoais dos sócios administradores é, portanto, consequência da negligência dos atos dos sócios administradores, que, em tempo, não comunicaram aos órgãos competentes o encerramento, ainda que temporário, das atividades, para que, no período de dormência em que a empresa se encontra novas relações obrigacionais não surgissem e nem mesmo foram cobradas, devido a possível momento crítico subjetivamente existente.
Os sócios da empresa devem atuar com cautela igual ou superior à que devem empregar quando registram a existência da sociedade, sob pena de responder, solidária ou subsidiariamente, com seu patrimônio pessoal, pelas obrigações inicialmente imputadas à sociedade que faz parte.
O fato de a dissolução irregular da sociedade empresária acarretar a responsabilidade pessoal dos sócios pelas dívidas da empresa se assemelhar ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, tendo em vista que ambos, por consequência, acabam por responsabilizar diretamente os sócios que a compõe por atos tidos como fraudulentos, claramente não se confundem.
O primeiro instituto está diretamente relacionado à responsabilização direta do sócio gerente de uma empresa por ato que deu causa através do abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, e a confusão patrimonial, situações únicas que justificariam a desconsideração, através de reconhecimento por decisão judicial. O segundo instituto relaciona-se estritamente aos casos em que o sócio gerente, no exercício de suas atividades como tal figura, negligencia seus atos gerenciais relacionados à comunicação dos mesmos aos órgãos fiscalizadores.
Pela tênue diferença entre tais institutos, não são raras às vezes em que a responsabilidade direta, solidária ou subsidiária dos sócios e administradores acaba sendo confundida com a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, tendo em vista a tênue linha que as diferencia.
Com a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, como penalidade imposta à sociedade, chega-se à responsabilização dos sócios ou administradores, a qual também pode ocorrer em outras situações que não se confundem com a teoria da desconsideração, conforme já mencionado.
Tal diferenciação dos dois institutos é feita por Marcelino de Paula Mattos (2010, p.123):
“Por outro lado é certo que a norma legal prevê a forma para a dissolução de sociedade empresarial, e a sua inobservância poderá acarretar prejuízo a terceiros, caso restem obrigações pendentes. Nesses casos, na impossibilidade de se localizar bens para solver as dívidas da pessoa jurídica, deve o magistrado a requerimento da parte, deferir a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade devedora, tudo com vistas a alcançar os bens dos sócios que agiram com manifesto intuito de fraudar credores.”
Certo é que notoriamente o Superior Tribunal de Justiça já vem reconhecendo a importância da aplicação comedida da Teoria da desconsideração da Personalidade Jurídica. Seu posicionamento é de que não se podem extrapolar os limites constitucionais impostos pelos princípios da legalidade, do devido processo legal e da ampla defesa.
Sobre o assunto, resta evidente o cabimento do redirecionamento de uma execução fiscal para o(s) sócio(s) gerente(s), ante a mudança inesperada do endereço da empresa executada, através da aplicação da Teoria da Desconsideração da personalidade jurídica:
“EXECUÇÃO. SOCIEDADE LIMITADA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. RECURSO IMPROVIDO.
Havendo indícios de desativação irregular da pessoa jurídica, o que impede o credor de receber seu crédito, é perfeitamente aplicável a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sendo então necessária a justa responsabilidade dos sócios, através de seus bens pessoais, nos termos do artigo 50 do Código Civil de 2002. “‘“. O acórdão recorrido manteve a decisão que deferiu pedido de desconsideração da personalidade jurídica ao fundamento de que "a inércia da devedora aliada a desatualização da ficha cadastral junto à JUCESP, bem como a suposta inexistência de bens, conduz à conclusão de que houve dissolução de sociedade de forma irregular, hipótese capaz de caracterizar fraude e infração da lei e do contrato, justificando a desconsideração da personalidade jurídica da empresa e permitindo a responsabilização dos sócios pelas dívidas sociais, sobretudo porque não localizados bens que respondam pela dívida", não cabendo a este Tribunal o reexame de fatos e provas para julgar em sentido contrário ao que foi decidido pela Corte de origem (…)” (AI 637095, Relator (a): Min. Joaquim Barbosa, julgado em 08/10/2010, publicado em DJe-198 divulgado 19/10/2010 publicado 20/10/2010).
Prova é que, neste sentido, o STJ firmou entendimento de que o redirecionamento da Execução Fiscal para o sócio-gerente da empresa executada é cabível apenas quando demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa. Neste cenário, depois de reiteradas decisões com o referido assunto, é que emergira a Súmula 435 do STJ:
“Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
A referida Súmula limita a responsabilidade a sócio-gerente, qualquer diretor, administrador ou representante de pessoa jurídica de direito privado, quando este tem relação com a situação e/ou com a gestão à época de surgimento do fato gerador, podendo ser responsabilizada pessoalmente pelo inadimplemento e pagamento do tributo.
A Súmula traz em seu teor a presunção relativa justamente para a abertura de possibilidade de defesa da empresa executada ou do sócio gerente, os quais podem apresentar provas que desconstituam tal presunção, segundo entendimento jurisprudencial.
Tal entendimento insurge ante a necessidade de garantia do Princípio do Contraditório e Ampla Defesa, através do qual aquele que se achar prejudicado por um redirecionamento de processo executivo, já que doutrinadores e profissionais interpretam tal Súmula em sentido amplo, pode vir a impugnar tal medida, desde que comprovados os equívocos existentes.
É nesse diapasão que não são aceitos dados cabais para a verificação de presunção de dissolução irregular, ante simples mudança de endereço. A certidão emitida pelo Oficial de Justiça que atesta que a empresa devedora não mais funciona no endereço constante dos assentamentos da junta comercial é aceita como prova, tendo em vista que a figura a figura do Oficial de Justiça.
“cumpre a função de executar as ordens emanadas pelos juízes (mandados judiciais), por isso, comumente são chamados de “longa manus” do magistrado, ou seja, as mãos deste. Sua função é muito importante, posto que o oficial de justiça realize atos materiais necessários para regular a tramitação dos processos, dando a ele efetividade, possibilitando seu bom andamento e garantindo a resolução dos conflitos da população” (CINTRA, 2010, p. 87).
Assim, a presunção de dissolução irregular de uma empresa executada, desde que efetivamente comprovada, é o suficiente para o requerimento de redirecionamento de uma execução fiscal para os sócios gerentes que a compõem.
Tal constatação gera a presunção da prática de atos abusivos ou ilegais, uma vez que o administrador que assim procede age em infração à lei comercial, impedindo qualquer meio constritivo em bens da empresa.
4. A LEI DE EXECUÇÃO FISCAL
Promulgada em 22 de setembro de 1980, a execução fiscal tributária, regida pela lei n. 6.830, regula a execução da dívida ativa da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e respectivas autarquias, aplicando-se subsidiariamente ao CPC.
A execução fiscal é a propositura de qualquer ação relativa ao débito constante em título executivo fiscal o que enseja a propositura de ação executiva pelo credor, a fim de reaver o crédito tributário, cabendo a Fazenda Nacional, a capacidade e a competência para cobrar e promover a execução daquele que o deve, garantindo o interesse do credor e a defesa do devedor.
Assim, o sujeito passivo da obrigação tributária reveste-se na pessoa do contribuinte e do responsável, podendo a Ação de Execução ser promovida contra estes. A pessoa jurídica muitas vezes é o sujeito passivo da obrigação tributária.
A cobrança da Fazenda Pública, ou Fisco, pode ser feita extrajudicialmente (amigável) ou judicialmente. A cobrança amigável faz-se no âmbito da Administração e a outra, em Juízo, através da execução judicial do crédito tributário, inscrito como dívida ativa. A execução fiscal, para cobrança da dívida ativa, alicerça-se no título executivo, emitido pelo próprio Fisco e denomina-se CDA – Certidão de Dívida Ativa.
A dívida ativa tributária é o crédito da Fazenda Pública proveniente de obrigação legal relacionada a tributos e multas. Também constitui dívida ativa da Fazenda Pública qualquer valor (entenda-se qualquer crédito) que, com fundamento em lei, deva ser cobrado pela União, Estados, Distrito Federal e suas autarquias e Municípios.
Regularmente inscrita, no órgão e por autoridade competente, depois de esgotado o prazo final para pagamento fixado pela lei ou por decisão final, em processo administrativo regular, a dívida ativa goza da presunção relativa de certeza e liquidez.
Para o § 3º do artigo 2º da LEF, a inscrição é o ato de controle administrativo da legalidade, para apurar a liquidez e certeza do crédito, tributário ou não, da Fazenda Pública, realizado por autoridade competente. A doutrina dominante, com rara divergência, tem-se manifestado favoravelmente à inscrição, após a apuração da liquidez e certeza.
O órgão competente para determinar a inscrição como dívida ativa da Fazenda Publica é o órgão jurídico, por intermédio de seus procuradores, que deverão se ater apenas à apreciação da parte formal, da legalidade e legitimidade do ato.
Os créditos da União são apurados e inscritos, na Procuradoria da Fazenda Nacional, pelos Procuradores da Fazenda Nacional. Os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias deverão fazê-lo por órgão jurídico próprio, através de seus procuradores, ou seja, de advogados especializados do Poder Público.
O sujeito ativo da execução fiscal está descrito, de forma exaustiva, no artigo 1º da LEF, regendo esta a execução judicial para a cobrança da dívida ativa Fazenda Pública, que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e respectivas autarquias, aplicando-se subsidiariamente o Código de Processo Civil.
A execução fiscal ou a ação de execução fiscal é uma ação especial de cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, que tem o seu próprio direito. A inscrição da dívida deve ser feita, pelo órgão jurídico competente – a Procuradoria, por meio do Procurador, que mandará inscrever ou não o crédito como dívida ativa.
A certidão relativa a esses créditos constitui título executivo extrajudicial e enquadra-se nos moldes fixados pelo artigo 585, inciso VII, do CPC. Ao não efetuar o adimplemento de sua dívida fiscal em tempo hábil, estando assim vencido, o Fisco está apto a formalizar o título executivo, com a inscrição do crédito tributário em Dívida Ativa, quando então são exigíveis, após a comprovação de sua de certeza e liquidez e podem ser cobrados em juízo mediante a propositura de uma ação executiva, sem necessidade de ajuizamento de prévio processo judicial prévio, para o reconhecimento desses créditos como devidos.
Desta forma, verifica-se então que o procedimento utilizado para que o Fisco cobre o que lhe é devido é feito através de um Processo de Execução Fiscal, com base na lei 6.830 de 22.09.1980.
Conforme já explicitado, o sujeito passivo da obrigação tributária reveste-se na pessoa do contribuinte e do responsável, podendo a Ação de Execução ser promovida contra estes.
Corriqueiramente, a pessoa jurídica muitas vezes é o sujeito passivo da obrigação tributária, e quando não lograr êxito em sua localização para o adimplemento de suas obrigações fiscais e comprovada a arbitrariedade em sua administração a fim de burlar as obrigações fiscais, aos sócios gerentes da empresa a responsabilidade tributária é redirecionada, com o intuito de coibir o uso indevido da pessoa jurídica, impossibilitando que os sócios e responsáveis não usem de forma fraudulenta para garantir seus interesses pessoais.
O problema maior surge para se determinar o polo passivo da execução fiscal, face o interesse do Fisco em ver ampliado a gama de sujeitos passivos, estendendo para além do contido na lei suas prerrogativas.
A Lei de Execução Fiscal em seu artigo 4º estabelece quais os sujeitos passivos da execução fiscal, que sujeita além do contribuinte (devedor), o fiador, o espólio, a massa falida, o representante legal e os sucessores, o responsável tributário, capaz de responder por dívidas tributárias, através da execução fiscal:
“Art. 4º – A execução fiscal poderá ser promovida contra:
I – o devedor; […]
V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado;”
A diferença entre a figura do responsável tributário e a pessoa do devedor é perfeitamente verificada tanto na legislação tributária quanto na legislação processual civil, a qual é aplicada de forma subsidiária nos casos em que a legislação tributária for omissa. O artigo 568 e incisos do Código de Processo Civil assim preceituam:
“Art. 568. São sujeitos passivos na execução:
I – o devedor, reconhecido como tal no título executivo;[…]
V – o responsável tributário, assim definido na legislação própria”.
Ocorre que a respeitável diferença a se verificar é que o legislador processual não exigiu que o responsável tributário tivesse seu reconhecimento constante no título executivo, assim como o devedor. Como bem explica Fabio Ulhôa Coelho (2007, p. 163):
“No tocante aos débitos da sociedade enquadráveis como divida ativa, de natureza tributaria ou não tributaria (Lei 6.830/80), os administradores, sócios ou não, respondem por inadimplemento da sociedade limitada. É o que dispõe o art. 135, III do CTN. Sendo ato administrativo e, portanto, presumivelmente verdadeiro, a Certidão da Divida Ativa emitida contra a sociedade pode ser executada diretamente no patrimônio particular do administrador, a quem cabe demonstrar, por embargos do devedor, que o inadimplemento não teria importado descumprimento de lei ou de contrato.”
A respeito do sujeito passivo da pessoa jurídica na execução fiscal, configura-se quando a Fazenda não localiza a empresa executada, resta então o redirecionamento da execução para o sócio, com fundamento na Súmula 435, STJ.
Verifica-se que o Fisco possui mecanismo muito eficiente para cobrar daqueles que o devem, estando sempre bem respaldado de provas, documentos e jurisprudências que possam através da ação de execução satisfazer seus créditos.
A responsabilidade do sócio-gerente da executada decorre do quanto estatuído no artigo 4º, inciso V, da Lei 6.830/80, segundo o qual a Execução Fiscal poderá ser promovida contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas tributárias ou não, de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado”.
Conjugando o mencionado dispositivo legal com o art. 135, III, do Código Tributário Nacional, tem-se que o sócio-gerente, o diretor ou o responsável pela pessoa jurídica que tenham agido com excesso de poderes, infração de lei ou contrato social, poderão ser chamados a integrar o polo passivo da execução fiscal, na condição de substitutos tributários.
5. O POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O posicionamento que o Superior Tribunal de Justiça tem adotado acerca da desconsideração da pessoa jurídica, redirecionando a execução para a pessoa dos sócios, relaciona-se ao fato de que o mero inadimplemento não constitui infração legal. A adoção do redirecionamento da execução fiscal somente é cabível quando for demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa.
“AgRg no AgRg no REsp 1043617 / RS, Ministro HUMBERTO MARTINS (1130), T2 – SEGUNDA TURMA, 26/08/2008, DJe 18/09/2008 TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – REDIRECIONAMENTO – DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE – CERTIDÃO DE OFICIAL DE JUSTIÇA – PROVA SUFICIENTE PARA AUTORIZAR O REDIRECIONAMENTO – DETERMINAÇÃO DE RETORNO DOS AUTOS À INSTÂNCIA DE ORIGEM PARA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES.
1. O Tribunal a quo, quando da apreciação da apelação cível, entendeu pela impossibilidade de redirecionamento da execução fiscal, por não ter havido violação do artigo 135 do CTN, bem como não ter ocorrido a dissolução irregular da sociedade.
2. Em recurso especial interposto pela União, reconheceu-se a dissolução irregular da sociedade, com fundamento na certidão do oficial de justiça de fl. 17, e determinou-se o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios.
3. Necessário retorno dos autos para apreciação da responsabilidade individual, sob pena de supressão de instância.
Agravo regimental improvido.”
Nesse diapasão, o Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado favorável à Fazenda Nacional acerca da desconsideração da pessoa jurídica quando caracterizar que houve dissolução irregular da sociedade, quando se verifica que houve confusão patrimonial na pessoa dos sócios para com a pessoa jurídica, quando há época do débito o sócio fazia parte da administração.
Desta forma, não há como se vislumbrar que o encerramento das atividades de uma empresa de forma legal sob o prisma tributário, justamente porque os seus sócios, pessoas naturais gestoras e representantes legais da pessoa moral (sociedade), extinguiram a pessoa jurídica e repartiram entre si o seu capital social e patrimônio (maiores garantias do ente tributante), em franco e flagrante detrimento do crédito tributário do Fisco que resta impossibilitado então de exigir da empresa contribuinte aquilo que lhe era devido.
Tal conduta lesiva perpetrada pelos sócios de uma empresa executada acarreta em prejuízo ao crédito do Fisco e consubstancia a causa de suas responsabilidades pelo pagamento da dívida remanescente, nos moldes expressos e cristalinos do CTN, como se segue:
“CTN: Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:[…]
VII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I – as pessoas referidas no artigo anterior;”
Disto posto, entender de forma diversa do quanto declinado é negar vigência às normas de responsabilidade tributárias do CTN e mais, é premiar a conduta ilegal e lesiva dos sócios da empresa executada, conferindo-lhes enriquecimento sem causa, repudiado pelo ordenamento jurídico pátrio.
Em verdade, o redirecionamento da execução fiscal encarta hipótese de responsabilidade tributária de terceiros (sócios, que não ostentam condição de contribuinte na relação jurídico-tributária) por ato ilícito que impede o cumprimento da obrigação tributária pelo próprio contribuinte (empresa).
Desta forma, uma vez que os sócios, agentes da conduta ilegal de liquidação irregular da sociedade executada, não são contribuintes, nem substitutos tributários, nem detinham qualquer vínculo com a obrigação tributária, obviamente que seus nomes não poderiam constar da Certidão da Dívida Ativa, posto que, seja quando do lançamento do tributo, seja quando da emissão do título executivo extrajudicial, seja ainda quando da propositura da ação de execução, tais sócios não estavam obrigados a responder pelo crédito ora cobrado.
Uma vez que a relação jurídica entre o Fisco e os sócios, na condição de responsáveis tributários nos moldes dos arts. 134, VII e 135, I, do CTN, somente nasce com a prática do ato ilegal de liquidação irregular da empresa, haja vista que antes disso a obrigação tributária somente existe entre o Fisco e pessoa jurídica, não havia, à época do lançamento tributário e da subsequente emissão da CDA, motivo fático e jurídico para executar os sócios (e nesse ponto é importante destacar que indicar os nomes dos sócios no título executivo é efetivamente ajuizar ação contra eles), sob pena, inclusive, de que, uma vez citados sem qualquer motivo para que respondessem pelos créditos tributários, fossem tidos pelo próprio juízo como partes ilegítimas.
De fato, o Fisco não pode, sem que os sócios tenham dado causa à suas responsabilidades tributárias diretas, relacioná-los previamente como sujeitos passivos da execução de crédito tributário constituído contra a sociedade. Assim, advindo a condição para a responsabilização dos sócios pela dívida (liquidação irregular da empresa), a única via que de fato dispõe o Fisco é o redirecionamento aos sócios no curso da execução fiscal, por petitório fundamentado.
Desta forma, uma vez que o redirecionamento fundado nos arts. 134, VII e 135, I, do CTN advêm de fato posterior ao lançamento do crédito e à própria emissão da CDA, o caso não é de substituição desta, haja vista que o título não foi emitido eivado de qualquer vício, mas sim perfeitamente, decorrendo sim, a modificação do polo passivo da demanda, de ulterior ato ilegal praticado por terceiros.
Consoante dispõe o artigo 4º, inciso V, da Lei 6.830/80, a Execução Fiscal poderá ser promovida contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas tributárias ou não, de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado”.
Conjugando o mencionado dispositivo legal com o art. 135, III, do Código Tributário Nacional, tem-se que o sócio-gerente, o diretor ou o responsável pela pessoa jurídica que tenham agido com excesso de poderes, infração de lei ou contrato social, poderão ser chamados a integrar o polo passivo da execução fiscal, na condição de substitutos tributários.
O responsável, também denominado sujeito passivo indireto, assim está definido no art. 121, do CTN:
“Art. 121. O sujeito passivo da obrigação tributária diz-se: […]
II. responsável quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa em lei".
O art. 135, também do CTN, assim dispõe:
“São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes das obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração à lei, contrato social ou estatuto:(…)
III. os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”
Por seu turno, a empresa que deixa de funcionar no endereço indicado no contrato social arquivado na junta comercial, desaparecendo, é presumivelmente considerada como desativada ou irregularmente extinta, justificando a responsabilização dos sócios.
Em relação ao tema, cumpre destacar a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO COM EFEITOS MODIFICATIVOS – CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL REFERENTE À ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO – EXECUÇÃO FISCAL – DISSOLUÇÃO IRREGULAR COM FUNDAMENTO EM CERTIDÃO DE OFICIAL DE JUSTIÇA – SÓCIO-GERENTE – REDIRECIONAMENTO – INTERPRETAÇÃO DO ART. 135, INCISO III, DO CTN – POSSIBILIDADE.[…]
3. Em matéria de responsabilidade dos sócios de sociedade limitada, é necessário fazer a distinção entre empresa que se dissolve irregularmente daquela que continua a funcionar.
4. Em se tratando de sociedade que se extingue irregularmente, impõe-se a responsabilidade tributária do sócio-gerente, autorizando-se o redirecionamento, cabendo ao sócio-gerente provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder.
5. A empresa que deixa de funcionar no endereço indicado no contrato social arquivado na junta comercial, desaparecendo sem deixar nova direção, comprovado mediante certidão de oficial de justiça, é presumivelmente considerada como desativada ou irregularmente extinta,
6. Embargos de declaração que se acolhe, com efeitos modificativos, para anular o acórdão anteriormente proferido e, em nova análise, dar provimento ao recurso especial.” (EDcl no REsp 897798 / SC, Relatora Ministra ELIANA CALMON, Data do Julgamento 04/11/2008, data da publicação/fonte DJe 24/11/2008)
Desta forma, a dissolução irregular da sociedade é ato ilícito hábil a ensejar a responsabilização dos sócios com poderes de gerência, eis que se reveste da qualidade de ato ilegal, na medida em que faz presumir a distribuição indevida de receitas entre os sócios, deixando à míngua os credores.
6. A SÚMULA 435 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O Superior Tribunal de Justiça editou no dia 13/05/2010 a Súmula nº 435 que dispõe: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”. (Grifo nosso)
Tal Súmula surgiu com o escopo de uniformizar entendimentos sobre o artigo 135 do Código Tributário Nacional, o qual atribui aos administradores a responsabilidade direta por fatos e consequências decorrentes de atos por eles praticados. In verbis: "São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos".
Nesse diapasão, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que a dissolução irregular da sociedade sem comunicação aos órgãos oficiais caracteriza "infração à lei" possibilitando a cobrança das dívidas dos sócios administradores, mediante o redirecionamento da ação executiva em nome destes.
Sendo assim, a referida súmula pacificou o entendimento sobre a dissolução de empresas que deixam de funcionar em seus domicílios fiscais e não comunicam essa mudança de modo oficial, passando tal ato a ser considerado irregular.
O precedente mais antigo que ensejou a criação desta Súmula é de 2005, referente ao Recurso Especial n. 738.502, interposto pela Fazenda Nacional ao STJ contra os proprietários da empresa Fransmar Cozinha Industrial Ltda, de Santa Catarina.
No recurso, acatado pelos ministros do STJ, conforme o voto do relator, ministro Luiz Fux, os proprietários da empresa executada argumentaram a impossibilidade de responsabilização de terceiros, ainda que sócios, cobre dívida da empresa.
O simples inadimplemento não foi o motivo para a responsabilização dos sócios-gerentes. Entretanto, como a empresa deixou de funcionar no local informado nos órgãos competentes fiscalizadores, presumir-se-ia que tal empresa dissolveu-se irregularmente, caracterizando assim infração à lei e possibilitando a cobrança das dívidas dos administradores.
Tais fatos podem ser perfeitamente observados através da ementa do referido recurso:
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO PARA O SÓCIO-GERENTE. POSSIBILIDADE.
1. É assente na Corte que o redirecionamento da execução fiscal, e seus consectários legais, para o sócio-gerente da empresa, somente é cabível quando reste demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa. […]
2. In casu, consta dos autos certidão lavrada por Oficial de Justiça (fl. 47 verso), informando que, ao comparecer ao local de funcionamento da empresa executada, o mesmo foi comunicado de que esta encerrara as atividades no local a mais de ano, o que indica a dissolução irregular da sociedade, a autorizar o redirecionamento da execução.
3. Ressalva do ponto de vista no sentido de que a ciência por parte do sócio-gerente do inadimplemento dos tributos e contribuições, mercê do recolhimento de lucros e pro labore, caracteriza, inequivocamente, ato ilícito, porquanto há conhecimento da lesão ao erário público.
4. Recurso especial provido, para determinar o prosseguimento da ação executória com a inclusão do sócio-gerente em seu polo passivo. […]”
Embora a referida Súmula estabeleça limites à sócio-gerente ou representante de pessoa jurídica, insurge a necessidade de que haja relação direta entre os personagens mencionados, o fato gerador da obrigação tributário e o ato irregular praticado, no que tange à imperícia na gestão da empresa à época. Responsabilizando-os pessoalmente pelo pagamento do tributo. A lei, que é fonte do direito, assim dispõe.
Fato é que é impossível formalizar a dissolução de uma empresa em débito com o fisco, tendo em vista que, para que seja dada a baixa em seu registro nos órgãos fiscalizadores, é imprescindível a quitação prévia de todos os tributos. Por isso, o redirecionamento da execução fiscal originariamente movida contra a pessoa jurídica não deve ser feita de forma automática.
O teor da Súmula impede o redirecionamento automático. “Presume-se dissolvida irregularmente”, diz o enunciado e ainda acrescenta: “sem comunicação aos órgãos competentes”. Evidente tratar-se de presunção relativa a comportar prova em sentido contrário, a qual obviamente será feita por quem se achar prejudicado com a medida, através de embargos e munido de provas que desconstituam a presunção.
Desta forma, resta claro que o redirecionamento para os sócios-gerentes deve comunicado ao sócio responsabilizado, a fim de que seja garantido o direito ao contraditório e a ampla defesa aplicável, também, no âmbito administrativo (art. 5°, LV, da CF), in verbis:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
Conforme já elucidado, tal discussão vem sendo feita, erroneamente, em sede de embargos do executado, já que tais pessoas não configuram como executados originais e sequer são regularmente mencionadas no título executivo – Certidão de Dívida ativa, não sendo, portanto sujeito passivo de tributo. Os embargos de terceiros é o melhor meio de impugnação, conforme prevê o art. 1046 do Código de Processo Civil, tendo em vista a grave moléstia com constrição judicial:
“Art. 1.046. Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, sequestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer Ihe sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos”.
Disto posto, resta evidente a importância de tal Súmula na defesa de execuções fiscais, já que em inúmeros casos ocorre o redirecionamento da ação para os sócios-gerentes sem que haja a necessidade de motivação legal.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A responsabilização de obrigação tributária diretamente ao sócio da pessoa jurídica a ela relacionada surge como uma forma de sanção para aquele que teria a obrigação de cumprir algo, e o seu não cumprimento gera uma lesão no mundo fático, havendo a necessidade deste responder pelo seu não cumprimento.
A lei é clara, e está ao alcance de todos, visto que ninguém pode se escusar de segui-la. O Estado é aquele que possui poderes para coibir o não cumprimento da lei, cobrando daquele que é o responsável pelo seu descumprimento.
Na esfera jurídica tributária, o sujeito passivo da obrigação tributária responderá na pessoa do responsável ou do contribuinte, através de ação de execução fiscal pelo não cumprimento da obrigação tributária.
A pessoa jurídica da sociedade limitada tem personalidade própria, mas quando configurada, que em sua gestão o sócio administrador agiu com excesso de poderes, infração a lei, estatuto ou contrato social, a responsabilidade pelos seus atos recairá sobre este.
A obrigação do sócio e administrador de responder por dívida originariamente do contribuinte jamais surge direta e automaticamente, pois a ocorrência do fato gerador do tributo só obriga o contribuinte a adimplir com o tributo. A regra da responsabilidade tributária não se confunde, de modo algum, com a regra matriz da incidência de qualquer tributo: tal responsabilidade tem estrutura própria e parte de um pressuposto de fato específico de responsabilidade, sem o qual não há essa atribuição.
O que ocorre é que o sócio gerente, devidamente qualificado como tal, pode responder solidariamente com seu patrimônio, o que, por consequência, acaba por ampliar o rol de garantidores da satisfação do crédito tributário. Para isto, faz-se necessário que se comprove que o sócio gerente tenha agido com dolo, fraude ou má-fé no exercício da sua administração, quando estava ocupando função de direção da sociedade.
O simples inadimplemento da obrigação tributária, não enseja responsabilidade do sócio, mas atos que caracterizem que praticados por este, tenham o intuito de infringir a lei com o seu inadimplemento.
De acordo com o fato de que os atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, o contrato social ou os estatutos, aos quais se reporta o art. 135, III, do CTN, ocasionou na insolvência da pessoa jurídica, impende salientar que em uma sociedade, tanto os sócios quanto os administradores têm deveres e responsabilidades. Isso se justifica pela necessidade de zelar pelo satisfatório funcionamento da atividade empresária.
Para que sejam cumpridos tais deveres, é mister que haja efetiva fiscalização dos atos da sociedade e de seus componentes. Esta fiscalização deve pautar-se na lei e no próprio contato social, sendo indicado que seja desempenhada por órgão específico: o conselho fiscal.
Sobre as questões processuais pertinentes ao redirecionamento, tendo em vista que a responsabilidade do sócio não é objetiva, impende que seja apurada, já na esfera administrativa, não apenas a ocorrência do fato gerador, mas também, o próprio ato “ilícito” que fez com que o débito possa ser exigido do terceiro, oportunizando aos responsáveis o exercício do direito de defesa. Cabe tal ato, portanto, ao exequente provar o ato ilícito praticado e, inclusive, na mesma oportunidade, indicar o real responsável tributário.
Conclui-se então que a dissolução irregular da empresa é caracterizada através dos indícios de dolo ou fraude ou excesso de poderes, legitima o redirecionamento da execução para os sócios ou administradores, cabendo a estes o ônus da prova de que não faziam parte da sociedade à época do fato.
O procedimento utilizado pelo Fisco para cobrar aqueles que o devem é o procedimento utilizado pela Lei 6.830/80, denominada Lei de Execução Fiscal, utilizando o Código de Processo Civil de forma subsidiária naquilo que couber, fundamentando ainda as diligências para reaver créditos tributários em decisões reiteradas do Tribunal de Justiça.
É este o posicionamento atual do STJ nos casos em que o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da empresa, é cabível. Saliente-se que apenas quando reste demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa.
Sendo assim, o sócio-gerente que deixa de manter atualizados os registros empresariais e comerciais, em especial quanto à localização da empresa e à sua dissolução, viola a lei (arts. 1.150 e 1.151, do CC, e arts. 1º, 2º, e 32, da Lei 8.934/1994, entre outros). A não localização da empresa, em tais hipóteses, gera legítima presunção iuris tantum de dissolução irregular e, portanto, responsabilidade do gestor, não havendo necessidade de atribuir a responsabilidade imediata do adimplemento dos créditos tributários exequendos aos demais sócios, como tenda induzir a Fazenda Nacional em algumas execuções fiscais.
Bacharel em Direito pela UNIVERSO Universidade Salgado de Oliveira
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