Resumo: O presente trabalho possui como objetivo abordar a importância dos tratados de cooperação jurídica internacional firmados pelo Brasil no âmbito da Operação Lava Jato, dialogando com Sérgio Mourão Corrêa Lima e José Francisco Rezek– autores estes que, por sua vez, compõem a base teórica deste trabalho – identificando as funcionalidades dos referidos mecanismos e os resultados práticos alcançados tanto no âmbito das investigações, quanto nos âmbitos político (diplomático) e econômico, em que pese a referida Força Tarefa tenha obtido repercussão internacional, tamanha a dimensão dos danos patrimoniais constatados, muito em razão, também, do processo de globalização e de expansão pelo qual empresas investigadas estão passando, razão pela qual mais de 100 países já se disponibilizaram a colaborar com o Ministério Público Federal brasileiro, visto que, em se tratando do maior caso de corrupção da história do país, toda e qualquer informação relacionada ao caso pode se mostrar útil e relevante no processo de responsabilização dos envolvidos em tais escândalos de corrupção, seja no poder público ou na iniciativa privada.
Palavras-chave: Tratados Internacionais. Combate à corrupção. Operação Lava Jato. Direito Penal. Direito Internacional Público.
Resumen: El presente trabajo tiene como objetivo abordar la importancia de los tratados de cooperación jurídica internacional firmados por Brasil en el marco de la Operación Lava Jato, dialogando con Sérgio Mourão Corrêa Lima e José Francisco Rezek – autores que, a su vez, componen la base teórica de este trabajo – identificando las funcionalidades de los trabajos Estos mecanismos y los resultados prácticos alcanzados tanto en el ámbito de las investigaciones, como en los ámbitos político (diplomático) y económico, en que pese a la referida Fuerza Tarea haya obtenido repercusión internacional, tamaña la dimensión de los daños patrimoniales constatados, en razón de que el proceso de globalización y de expansión por el cual las empresas investigadas están pasando, por lo que más de 100 países ya se han ofrecido a colaborar con el Ministerio Público Federal brasileño, ya que, al tratarse del mayor caso de corrupción de la historia del país, Cualquier información relacionada con el caso puede mostrarse útil y en el proceso de responsabilización de los involucrados en tales escándalos de corrupción, ya sea en el poder público o en la iniciativa privada.
Palavras-clave: Tratados Internacionais. Combate a la corrupción. Operación Lava Jato. Derecho Penal. Derecho Internacional Público.
Sumário: Resumo. Introdução. 1 – Conceito de Tratados Internacionais. 2 – A Relevância dos acordos de cooperação internacional no âmbito da Operação Lava Jato. 2.1 – As Convenções Internacionais de combate à corrupção. 2.2 – Os acordos de cooperação jurídica internacional firmados pelo Brasil no combate à corrupção. 2.3 – Resultados da cooperação jurídica internacional nas investigações da Força Tarefa. Considerações finais. Referências.
INTRODUÇÃO
O Direito internacional é originário das mais variadas fontes, como por exemplo, costumes, a jurisdição dos tribunais internacionais, princípios, acordos internacionais, cumprindo destacar, porém, não haver relação de verticalização entre eles. Ocorre que, modernamente, os tratados internacionais passaram a receber uma importância especial, em razão de suas peculiaridades como fonte de Direito Internacional Público consistindo, já no contexto deste trabalho, num contrato bilateral firmado entre Estados, de cooperação jurídica no âmbito de investigações de matéria penal, tendo repercussão prática imediata na Operação Lava Jato, como será constatado ao longo deste trabalho.
Neste contexto, inicialmente buscar-se-á abordar o conceito de tratados internacionais, identificar suas funções, particularidades, de modo a permitir a compreensão de sua aplicabilidade prática no âmbito das investigações de nível internacional da Força Tarefa.
Em seguida, será abordada a relevância dos referidos acordos de cooperação jurídica internacional na Operação Lava Jato, identificando os benefícios de sua celebração entre Estados, mecanismos de cooperação por eles instituídos e os reflexos imediatos de tais contribuições no rumo das investigações e na condução das persecuções penais já em curso.
Posteriormente, far-se-á considerações acerca das Convenções Internacionais de Combate à Corrupção, que por sua vez foram as fontes de Direito Internacional percussoras de uma série de outros instrumentos normativos, como os tratados de cooperação jurídica internacional firmados pelo Brasil nos últimos 20 anos.
Por fim, encerrar-se-á este estudo abordando os resultados da referida cooperação jurídica internacional no âmbito da Operação Lava Jato, que somente foi possível por meio dos acordos firmados entre autoridades brasileiras e estrangeiras, trazendo dados concretos e atualizados sobre os êxitos da Força Tarefa.
1. CONCEITO DE TRATADOS INTERNACIONAIS
Uma conceituação amplamente aceita pela doutrina consiste na afirmação de que tratados internacionais são acordos celebrados por escrito entre Estados e regido por normas de Direito Internacional, sejam eles inseridos em um instrumento único, quer em dois ou mais instrumentos conexos, e qualquer que seja a sua destinação específica, ou seu objeto. Tal definição de tratados internacionais foi elaborada pela Convenção de Viena de 1969, cujo objetivo primário era chegar a um denominador comum quanto ao conceito e as funções precípuas dos chamados tratados internacionais.
Quanto ao conceito de tratado internacional, José Francisco Rezek entende que “tratado é o acordo formal, concluído entre sujeitos de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos jurídicos.”[1]
Conforme dito anteriormente, tratados internacionais podem ser entendidos, também, como contratos firmados entre Estados, no qual, de modo bilateral, os pactuantes se obrigam a determinada contraprestação em favor do outro, seja lá qual for o objeto deste contrato (de isenção fiscal relativa a compra/venda, importação/exportação de produtos, intercâmbio de informações, etc).
Nesta toada, Sérgio Mourão Corrêa Lima[2] esclarece que:
“Tal como as pessoas físicas no plano interno, os Estados, no plano internacional, também podem celebrar contratos. Quando celebrados entre nações, esses contratos são chamados Tratados Internacionais. Por intermédio destes, os países assumem obrigações uns para com os outros.”
Verifica-se aqui, certa similitude com o Direito Civil, na medida em que se demanda, na celebração de um contrato, que as partes, por liberalidade, e livre de qualquer vício relacionado ao ato de aceitação, decidam por se obrigar a determinada conduta.
É justamente o que ocorre com os tratados internacionais no âmbito do combate à corrupção, conduzido com mãos de ferro pela Operação Lava Jato, já adentrando ao mérito do presente trabalho, visto que, em razão dos diversos elementos de informação obtidos, apontando a prática de atos de corrupção em vários países, despertou um interesse internacional em contribuir com as investigações, conforme será abordado nos capítulos seguintes.
2. A RELEVÂNCIA DOS ACORDOS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL NO ÂMBITO DA OPERAÇÃO LAVA JATO
Os acordos internacionais de cooperação no combate à corrupção, firmados no âmbito da Operação Lava Jato revelaram-se como um mecanismo extremamente importante, em que pese tenha proporcionado o alcance de diversos objetivos, das mais distintas naturezas.
Um dos benefícios consistiria, por exemplo, na repatriação de recursos desviados irregularmente para paraísos fiscais, em contas nominais de investigados na operação Lava Jato, ou de pessoas a eles diretamente ligados. Com a colaboração dos países signatários, que consistiria no fornecimento de informações bancárias, seria possível o cruzamento de dados com a Receita Federal, em que uma auditoria seria realizada, traçando um comparativo de tais informações com as declarações de imposto de renda, por exemplo, identificando eventuais fraudes no recolhimento de tributos.
Tais acordos internacionais possibilitam que os países signatários façam intercâmbio de dados relativos a débitos tributários, movimentação de recursos, acesso a dados bancários de investigados sem que, para isso, seja necessária a expressa autorização do Poder Judiciário dos demais países, isso desde que haja investigação em curso, devendo o país interessado requerer por via administrativa tais informações à Autoridade Central[3].
Além disso, os acordos internacionais de cooperação, como por exemplo, o firmado entre Brasil e Turquia, promulgado pelo Decreto nº 9.065, de 31 de maio de 2017, contribuem de modo significativo na obtenção de elementos de informação e provas concretas em face dos investigados e réus, o que reflete diretamente na estratégia e postura processual dos mesmos. Explica-se.
As colaborações premiadas, regulamentadas pela Lei 12.850/2013, não são a regra no processo, muito pelo contrário, são acordos de caráter excepcional, cujo contexto é desfavorável ao investigado/réu.
Com o avanço das investigações e a incessante troca de informações entre os países signatários dos acordos de colaboração jurídica, o Ministério Público Federal passou a dispor de provas cada vez mais robustas acerca dos ilícitos praticados, como por exemplo, ter acesso a depósitos realizados no exterior, bem como sendo possível rastrear a origem de tais recursos.
Nesse sentido, o Coordenador-geral da operação, o procurador da República Deltan Dallagnol salientou[4] em uma entrevista que
“[…]os pedidos de cooperação de vários países do mundo, permitiram que fosse possível seguir as pegadas do dinheiro ilegal, além de ser uma das principais características do novo modelo de investigação implementado pela Lava-Jato”.
Com isso, diante de uma situação extremamente delicada, muitos advogados passaram a adotar a colaboração premiada no intuito de salvaguardar da maneira mais eficiente possível os interesses dos clientes, visto que, em razão do conjunto probatório reunido com o auxílio de informações prestadas por outros países, a possibilidade de condenação em gravosas penas era cada vez maior.
Mas a título de esclarecimento, no que consistiriam, então, as colaborações ou delações premiadas[5]? Vejamos.
“Para incentivar os criminosos a colaborar com a Justiça, várias leis trouxeram a possibilidade de se conceder benefícios àqueles acusados que cooperam com a investigação. Esses benefícios podem ser a diminuição da pena, a alteração do regime de seu cumprimento ou mesmo, em casos excepcionais, isenção penal. Essa colaboração é extremamente relevante na investigação de alguns tipos de crime, como por exemplo: no de organização criminosa, em que é comum a destruição de provas e ameaças a testemunhas; no de lavagem de dinheiro, o qual objetiva justamente ocultar crimes; e no de corrupção, feito às escuras e com pacto de silêncio.
Há duas formas de colaboração premiada. Na primeira, o criminoso revela informações na expectativa de, no futuro, tal cooperação ser tomada em consideração pelo juiz quando da aplicação da pena. Na segunda, o criminoso entra em acordo com o Ministério Público, celebrando, após negociação, um contrato escrito. No contrato são estipulados os benefícios que serão concedidos e as condições para que a cooperação seja premiada.”
Abordada a questão conceitual da delação premiada, cumpre ressaltar que diversos tabloides[6] já veicularam matérias a respeito da amplitude internacional da Operação Lava Jato, sempre destacando a importância dos acordos firmados entre Brasil e diversos países, no intuito de obter informações e provas aptas a instruir as investigações, como por exemplo:
“Internacionalização da Lava Jato
Recentemente, a Operação Lava-Jato firmou mega acordos de colaboração com cerca de 37 países do mundo. Nessa lista de países, estão países como: Estados Unidos e Suíça, que já divulgaram publicamente as suas investigações. Dentre os países, também se encontram: Suécia, Dinamarca, Noruega e Itália, que possuem obras suspeitas, além de negócios e já fizeram a solicitação de provas ao Brasil. O aprofundamento das investigações da força-tarefa da Lava-Jato poderá proporcionar o compartilhamento de provas documentais, como também, a quebra de sigilos telefônico, bancário e de e-mails de envolvidos em esquemas de corrupção.
Após quase três anos de investigação, o Ministério Público Federal já lida com cerca de 159 pedidos de cooperação com as autoridades estrangeiras para que se possa efetuar instrução de ações penais que são relacionadas à Lava-Jato”.
Em razão disso, muito se fala da importância dos acordos internacionais firmados por autoridades brasileiras, através do Ministério Público Federal com autoridades estrangeiras, no curso das investigações da Operação Lava Jato. Como visto, tal afirmação de fato encontra respaldo na realidade fática. Isto porque, grande parte do conjunto probatório colhido ao longo das investigações que, por sua vez, possibilitaram que diversos acordos de colaboração premiada, foi obtida através da cooperação jurídica internacional, assumindo, portanto, papel de grande importância no caso Lava Jato.
2.1. AS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS DE COMBATE À CORRUPÇÃO – O PONTA PÉ INICIAL NA COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL
Abordada a importância dos acordos de cooperação internacional firmados com autoridades estrangeiras no âmbito da Operação Lava Jato, imperioso se faz ressaltar sua origem, cuja inspiração é proveniente, em grande parte, de convenções internacionais cujo objetivo era justamente incentivar a criação de instrumentos normativos cujo objeto seria a responsabilização por atos de corrupção. Falamos aqui de dois diplomas internacionais de extrema relevância:
A) CONVENÇÃO INTERAMERICANA CONTRA A CORRUPÇÃO – 29 de março de 1996.
Realizada em 29 de março de 1996, em Caracas, capital venezuelana, contou com a assinatura dos Estados os quais eram membros da Organização dos Estados Americanos (OEA), tendo o governo brasileiro ratificado por meio do decreto presidencial n° 4410, em 07 de outubro de 2002.
Historicamente, esta convenção foi pioneira no reconhecimento da internacionalização da corrupção, tendo traçado um prognóstico dos efeitos devastadores da mesma nos âmbitos econômico e institucional de um estado, buscando então, em suas disposições, traçar diretrizes a serem seguidas no desenvolvimento de disposições normativas capazes de dificultar ou, na melhor das hipóteses, impedir a prática de atos de corrupção, sobretudo no âmbito internacional.
B) CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO – 31 de outubro de 2006.
Essa Convenção da qual o Brasil é país signatário desde a ratificação, em 31 de janeiro de 2006, também traz em seus artigos 49 e 50, diretrizes relativas aos esforços a serem empreendidos no combate à corrupção a nível internacional, traçando diretrizes para a fixação me metas e desenvolvimento de mecanismos de cooperação, troca de informações e estímulo à assistência mútua e gratuita, de coleta e transferência de dados e evidências, úteis às eventuais investigações relativas à prática de atos de corrupção.
Conforme prevê o art. 49 da referida convenção[7]:
“Art. 49. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de celebrar acordos ou tratados bilaterais ou multilaterais em virtude dos quais, em relação com questões que são objeto de investigações, processos ou ações penais em um ou mais Estados, as autoridades competentes possam estabelecer órgãos mistos de investigação. Na falta de tais acordos ou tratados, as investigações conjuntas poderão levar-se a cabo mediante acordos acertados caso a caso. Os Estados Partes interessados velarão para que a soberania do Estado Parte em cujo território se efetua a investigação seja plenamente respeitada”.
Como se pode observar, a convenção visava desde o princípio estimular os países a instituir, entre si, mecanismos aplicáveis no âmbito investigativo relacionado a atos de corrupção, facilitando a troca de dados e informações, agilizando o procedimento e tornando menos árdua a tarefa de responsabilização penal dos investigados.
De modo ligeiramente mais detalhado, o art. 50 traça algumas diretrizes quanto aos meios pelos quais as disposições do artigo anterior deveriam se realizar, no entanto, sem abandonar o caráter sugestivo, a fim de não cercear o poder de negociação entre os países signatários, em nítida contrariedade ao próprio propósito da convenção, qual seja, aproximar os países e estimular a cooperação internacional.
Estatui o art. 50[8] da Convenção:
“1. A fim de combater eficazmente a corrupção, cada Estado Parte, na medida em que lhe permitam os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico interno e conforme às condições prescritas por sua legislação interna, adotará as medidas que sejam necessárias, dentro de suas possibilidades, para prever o adequado recurso, por suas autoridades competentes em seu território, à entrega vigiada e, quando considerar apropriado, a outras técnicas especiais de investigação como a vigilância eletrônica ou de outras índoles e as operações secretas, assim como para permitir a admissibilidade das provas derivadas dessas técnicas em seus tribunais.
2. Para efeitos de investigação dos delitos compreendidos na presente Convenção, se recomenda aos Estados Partes que celebrem, quando proceder, acordos ou tratados bilaterais ou multilaterais apropriados para utilizar essas técnicas especiais de investigação no contexto da cooperação no plano internacional. Esses acordos ou tratados se apoiarão e executarão respeitando plenamente o princípio da igualdade soberana dos Estados e, ao pô-los em prática, cumprir-se-ão estritamente as condições neles contidas.
3. Não existindo os acordos ou tratados mencionados no parágrafo 2 do presente Artigo, toda decisão de recorrer a essas técnicas especiais de investigação no plano internacional se adotará sobre cada caso particular e poderá, quando seja necessário, ter em conta os tratados financeiros e os entendimentos relativos ao exercício de jurisdição pelos Estados Partes interessados.
4. Toda decisão de recorrer à entrega vigiada no plano internacional poderá, com o consentimento dos Estados Partes interessados, incluir a aplicação de métodos tais como interceptar bens e fundos, autorizá-los a prosseguir intactos ou retirá-los ou substituí-los total ou parcialmente.”
Além disto, faz-se mister apontar um dos mais importantes instrumentos de cooperação internacional, qual seja, a Convenção Multilateral de Assistência Mútua Administrativa em Matéria Tributária, promulgada em 29/08/2016, na forma do Decreto n° 8.842. Conforme informações constantes no site da Receita Federal[9]
“Com a entrada em vigor da Convenção no Brasil, a partir de 1º de outubro de 2016, completam-se os passos necessários, do ponto de vista legal, para a implementação de diversas formas de assistência administrativa em matéria tributária entre os signatários — o intercâmbio de informações para fins tributários, nas modalidades a pedido, espontâneo e automático, as fiscalizações simultâneas e, quando couber, a assistência na cobrança dos tributos.
A Convenção alcança a assistência administrativa para prevenção e combate a ilícitos tributários relativos aos períodos iniciados a partir de 1º de janeiro de 2017, sem prejuízo da previsão expressa de que duas ou mais partes contratantes possam acordar sua aplicação em relação a períodos anteriores.”
Feitas as devidas menções às convenções internacionais, cujo objetivo era estimular a cooperação entre países na no desenvolvimento de instrumentos normativos voltados ao combate à corrupção, passa-se à apreciação dos resultados práticos de tais esforços das organizações internacionais.
2.2 OS ACORDOS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL FIRMADOS PELO BRASIL NO COMBATE À CORRUPÇÃO – AS DIMENSÕES DA OPERAÇÃO LAVA JATO
Conforme abordado em tópico anterior, constata-se que as investigações da Operação Lava Jato, em razão da própria expansão internacional das empresas investigadas, como Petrobras, OAS, Odebrecht, inevitavelmente passa a demandar maiores esforços por parte das autoridades brasileiras na obtenção de informações relevantes. Isto porque, muitas vezes, esbarra-se na burocracia e em relações de soberania com outros estados.
Ocorre que as celebrações das mais importantes convenções internacionais sobre o tema, até então, demonstraram ter atingido seu escopo, qual seja, estimular a cooperação jurídica entre os estados. Uma maneira eficaz encontrada pelo governo brasileiro, já voltado para o combate à corrupção no âmbito da maior operação de combate à corrupção da história do país, foi o firmamento de acordos de cooperação com diversos países, os quais possibilitam a troca de dados e informações de modo simplificado, menos burocrático e informatizado, trazendo celeridade ao processo, bem como estabelecendo cenário de bom relacionamento diplomático entre os países participantes.
Alguns dos mais importantes acordos internacionais em matéria penal firmados pelo Brasil com diversos outros países, senão vejamos:
CANADÁ[10]: Acordo de Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá, celebrado em Brasília, em 27 de janeiro de 1995.
CHINA[11]: Acordo entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China sobre Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal.
COLÔMBIA[12]: Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Colômbia em Matéria Penal.
COREIA DO SUL[13]: Acordo entre a República Federativa do Brasil e a República da Coréia sobre Assistência Judiciária Mútua em Matéria Penal.
CUBA[14]: Acordo de Cooperação Judicial em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Cuba.
ESPANHA[15]: Acordo de Cooperação e Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha.
Convênio sobre Cooperação em Matéria de Combate à Criminalidade[16] entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha.
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA[17]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América.
FRANÇA[18]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa.
HONDURAS[19]: Tratado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Honduras sobre Auxilio Jurídico Mútuo em Matéria Penal.
ITÁLIA[20]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Italiana.
MÉXICO[21]: Acordo de Assistência Jurídica Internacional em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e os Estados Unidos Mexicanos.
NIGÉRIA[22]: Acordo de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Federal da Nigéria.
PANAMÁ[23]: Acordo de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e a República do Panamá sobre Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e o Governo do Panamá.
PERU[24]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Peru.
PORTUGAL[25]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Portuguesa.
REINO UNIDO DA GRÃ-BRETANHA E IRLANDA DO NORTE[26]: Tratado de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte.
SUÍÇA[27]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da Confederação Suíça.
SURINAME[28]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Suriname.
TURQUIA[29]: Acordo sobre Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e a República da Turquia.
UCRÂNIA[30]: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da Ucrânia.
Conforme pode se observar, muito em razão das convenções internacionais de combate à corrupção, que fomentaram o diálogo entre os Estados no que tange à essa temática, diversos acordos internacionais de cooperação jurídica foram firmados, o que, inegavelmente, se mostra sobremaneira benéfico à Operação Lava Jato, cuja abrangência se mostrou intercontinental, que agora se vê, mais do que nunca, num cenário favorável e que conduz a um combate eficaz e ferrenho à corrupção.
Aqui, pode-se ter uma noção aproximada da expansão da Operação Lava Jato[31]:
“A Operação Lava Jato, deflagrada no Brasil em março de 2014, já provocou desdobramentos e investigações em outros 40 países, segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil. A Lava Jato investiga uma rede de corrupção e lavagem de dinheiro que envolve as maiores empreiteiras e grandes empresas de infraestrutura do Brasil, a estatal petrolífera Petrobras e inúmeros agentes públicos e políticos.
De acordo com a Procuradoria-Geral da República, a chamada força-tarefa da Operação Lava Jato (um grupo de investigadores destacados para atuar no caso) já tratou de pedidos de cooperação internacional (ativos e passivos) para investigações nesses 40 países. O Ministério Público enviou até o momento 123 pedidos de cooperação para ao menos 34 países. Não houve recusa de nenhum país em cooperar com as investigações. Na outra ponta, os procuradores e a Justiça brasileira receberam 28 pedidos de cooperação, vindos de 18 países. Há casos de países que constam tanto na lista de cooperação ativa quanto passiva, o que explica o total de 40 focos internacionais de investigação.”
Como se pode perceber, a atuação e a importância da Operação Lava Jato não se limitam ao território e ao interesse do governo brasileiro, mas comprovadamente também demonstra relevância no cenário internacional, na medida em que se constata a quantidade de pedidos de cooperação jurídica, bem como o número de tratados internacionais já firmados, consolidando cada vez mais a ideia de que a corrupção é uma chaga global, e que demanda esforços em conjunto, por parte dos Estados, no seu combate.
2.3. RESULTADOS DA COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL NAS INVESTIGAÇÕES DA FORÇA TAREFA
Ainda com relação aos resultados obtidos ao longo das investigações da força-tarefa, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, durante um encontro ministerial sobre corrupção, promovido pela OCDE (Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em Paris, informou que o governo brasileiro, em virtude dos acordos internacionais, obteve êxito em recuperar aproximadamente 1 bilhão de Euros (R$4,2 bilhões) desviados para o exterior.
Em um breve pronunciamento[32], trouxe alguns dados concretos, revelando que “graças ao apoio de instituições internacionais, foi possível realizar 600 buscas, seis procedimentos civis de improbidade administrativa contra 34 pessoas físicas e 16 pessoas jurídicas, além da demanda de 5,5 bilhões de euros em indenizações. Foram feitas, ainda, 200 acusações, 137 prisões, 103 demandas de colaborações internacionais do Brasil a outros países, 49 acordos de parcerias jurídicas e cinco programas de clemência. Foi possível a instauração de 44 procedimentos criminais. Desses, 17 resultaram em 84 acusados condenados em primeira instância pelos crimes de corrupção, fraude fiscal, organização criminal e lavagem de dinheiro.”
Outras matérias[33] veiculadas sobre a Força-tarefa também se voltam à tentativa de contabilizar os prejuízos causados pela corrupção aos cofres públicos:
“Os números da Lava Jato são todos monumentais e impressionantes. A rede de propinas e crimes chega a R$ 6,4 bilhões, segundo os investigadores. O bloqueio de bens dos réus já totaliza a cifra de R$ 3,2 bilhões. O Ministério Público Federal pede o ressarcimento de R$ 38,1 bilhões pelos crimes cometidos, incluindo nesse montante a aplicação de multas milionárias às empresas envolvidas.”
Depreende-se, então, que muito embora hajam sido dedicados grandes esforços na obtenção de indícios e provas de atos de corrupção no curso da investigação, há de ser exaltado o êxito na recuperação de quantitativos expressivos, muito em razão das permutas de dados e informações fornecidas por demais autoridades estrangeiras, frente aos tratados de cooperação jurídica vigentes, mostrando a eficiência e a importância destes mecanismos normativos internacionais no plano do direito penal interno.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pode se perceber, os valores que giram em torno da corrupção são absurdos. Tal afirmação se torna ainda mais alarmante ao se considerar o dano a direitos difusos causados pela corrupção. Isso porque, diante de um déficit de desenvolvimento humano, que compreende diversos outros fatores, como expectativa de vida, infraestrutura, grau de escolaridade mínima, etc., percebe-se que o Brasil poderia, caso dispusesse de mecanismos eficientes à época para obstar o corriqueiro emprego ardiloso de meios fraudulentos ao fisco e à probidade administrativa, ter em mãos ativos que certamente, se direcionados por meio de investimentos às demandas sociais mais gritantes, certamente seria alçado, em pouco tempo, a uma das grandes potências mundiais.
O prejuízo causado pela corrupção, esta encabeçada por um grupo relativamente pequeno de executivos, parlamentares, e demais agentes do poder público, chega à casa dos bilhões de reais (valores estes até então rastreados ao longo das investigações). Quantitativos estes os quais, muito provavelmente, o rastreamento seria inviável, não fossem os acordos internacionais que contribuíram na obtenção de provas, que por sua vez, forçaram diversos investigados e réus a colaborar, visando benefícios, possibilitando, então, seguir o rastro do dinheiro público desviado e encaminhado irregularmente para o exterior.
Assim, conclui-se este trabalho destacando a importância dos tratados internacionais de cooperação jurídica no combate à corrupção no âmbito da Operação Lava Jato, que ainda está longe de se concluir, mas caminha à passos largos para a responsabilização dos envolvidos e, sobretudo, na vitória sobre a probidade e a justiça.
Acadêmico de Direito na Faculdade de Direito de Vitória FDV
Graduado em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo, especialista em política internacional pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, Mestre em direito Internacional e comunitário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Doutor em direitos e garantias fundamentais na Faculdade de Direito de Vitória – FDV, Coordenador Acadêmico do curso de especialização em direito marítimo e portuário da Faculdade de Direito de Vitória – FDV, Professor de direito internacional e direito marítimo e portuário nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito de Vitória – FDV.
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