Resumo: Na Região do Oriente Médio pode-se constatar que os diferentes povos dispõem de recursos de água limitados. Dentre estes a região que abrange Israel e o Território Palestino é uma das mais afetadas. Desde a criação do Estado de Israel, em 1948, a divisão dos recursos hídricos têm se tornado um dos principais temas dentro de uma agenda de negociação abrangente para a resolução dos conflitos. Alguns autores defendem que a determinação de fronteiras geopolíticas deve ser realizada levando-se em consideração as fronteiras hídricas, contudo, isso só será possível após um acordo de cooperação efetivo entre os Estados Ribeirinhos. Pretendo com isso estabelecer um panorama geral da situação, a princípio com a formação de Israel, depois definir as atividades voltadas à distribuição da água dos Estados Ribeirinhos, quando estas influenciam no conflito palestino israelense, com um estudo específico das consequencias da invasão israelense à Cisjordânia entre Abril e Agosto de 2002. Com base no texto de Ze’ev Schiff, “Israel-PA Cooperation in Water – the One Exception”, pretendo desenvolver o tema da cooperação, assim como utilizar as argumentações de Maher Bitar, em seu texto “Water and the Palestinian-Israeli Conflict: Competition or Cooperation?” para discutir uma possível cooperação dentre estes povos.
Palavras-Chave: Direitos humanos, recursos hídricos, oriente médio, cooperação.
Abstract: In the region of the Middle East different people have limited water resources. Among those, the region that includes Israel and the Palestinian Territory is one of the most affected. Since the creation of Israel in 1948, the division of water resources have become a major issue in a comprehensive negotiating agenda for conflict resolution. Some authors argue that the determination of geopolitical boundaries should be undertaken taking into consideration the water boundaries, however, this is only possible after an agreement effective cooperation among the riparian states. I intend therefore to establish a general overview of the situation, beginning with the creation of Israel after setting activities focused on the distribution of water from bordering states, where they influence the Israeli Palestinian conflict, with a specific study of the consequences of the Israeli invasion of West Bank between April and August 2002. Based on the text of Ze’ev Schiff, “Israel-PA Cooperation in Water – The One Exception”, I intend to develop the theme of cooperation, so as to use the arguments of Maher Bitar, in his text “Water and the Palestinian-Israeli Conflict : Competition or Cooperation? “to discuss a possible cooperation among these people.
Introdução
Desde o século treze, até 1916, o Império Turco-Otomano controlava todo o Oriente Médio. Com sua derrota na Primeira Guerra Mundial, a Grã-Bretanha e a França assumem o controle sobre a região, a qual foi dividida em distintos Estados-nacionais: Iraque, Síria, Jordânia, Líbano e Palestina. Um ano mais tarde, na Declaração de Balfour, os ingleses prometiam aos judeus um lar na Palestina.
Em 1922, a Liga das Nações havia aprovado a idéia da criação de um Estado judeu na região da Palestina, embora não se cogitasse ainda a formação de um Estado independente e soberano. Esta idéia só surgiu mais tarde. A imigração de judeus se intensifica. Só que, até aquele momento, a população nativa – os árabes – não havia sido consultada.
A Alemanha de Hitler declarou que era chegada a hora da “solução final”, que significava a total aniquilação dos judeus. Com isso, aumentou o número de judeus que fugiam para Israel.
Durante a Segunda Guerra Mundial, foram mortos seis milhões de judeus; milhões tiveram suas riquezas roubadas; sua cultura e sua sociedade foram mutiladas. Este holocausto, quase inacreditável, reforçou a idéia do movimento sionista, que pregava a criação de um Estado nacional para os judeus.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a ONU propõe a divisão da Palestina em dois Estados: um Estado árabe e outro Estado judeu. Os países árabes rejeitaram a proposta. Em 14 de maio de 1948, Ben Gurion assina a proclamação que cria o Estado de Israel. Os ingleses se retiram e, imediatamente, o Egito, o Iraque, a Jordânia, o Líbano e a Síria se revoltam contra o novo Estado.
Para os judeus, a Palestina é a terra prometida. Levaram para lá todo o seu potencial financeiro e tecnológico e começam a construir um país. Mas, a região já estava ocupada por uma sociedade de cultura e tradição tão antigas quanto às dos recém-chegados. Para os palestinos, é uma grande injustiça permitir que sua terra seja ocupada por um povo que nunca foi proprietário da terra.
Água – Uma das fontes do conflito
A Escassez de água é uma ameaça global, e torna-se intensa em algumas áreas como o é o caso de Israel e Palestina. Há de se levar em conta que por convenção, de acordo com estudo de hidrologistas, até 1.000 milhões de metros cúbicos, por pessoa, é considerado um caso de escassez de água [2]. Considera-se ainda que uma disponibilidade abaixo dos 500 metros cúbicos equivale a escassez absoluta.
Dentro de uma perspectiva local, além da discussão sobre as disputas territoriais na região da Palestina, os conflitos pela água entre as comunidades palestinas e judias ganham também destaque. Dispondo de uma reserva anual média de, aproximadamente, 1.200 metros cúbicos por pessoa, o Oriente Médio é a região do mundo mais atingida pela pressão da falta de água. Os Palestinos, sobretudo em Gaza, experimentam algumas das crises mais agudas de escassez de água do mundo inteiro — têm apenas cerca de 320 metros cúbicos por pessoa.[3] Esta situação é agravada pela disputa entre os povos judeus e árabes na região por abastecimento de água, que tem início desde a imigração da última à histórica Palestina, esta ainda sob tutela Britânica. Contudo, como um conflito em si, torna-se evidente não só pela criação do Estado Judeu, mas também a partir da criação do Movimento Nacional Palestino, em meio à década de 1960 e recorrente ocupação Israelense aos Territórios Palestinos na Guerra dos Seis Dias.
A região Palestina localiza-se sobre a Bacia do Rio Jordão, uma fonte regional de água doce. Tal Bacia conta, além do próprio Rio Jordão, com o Lago Tibérias, historicamente conhecido Mar da Galiléia, e seus afluentes mais intensos, os rios Yarmouk e Jabbok, ambos vindos do leste e com curso dentre diversos Estados vizinhos e tem como delimitação a foz do Rio Jordão no Mar Morto, ao extremo sul da Região.
Geograficamente, nesta bacia, a escassez de água é característica e é causada por múltiplos fatores e afeta, de maneira mais séria, Israel, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.. A maior precipitação da região, 1.000 milímetros, ocorre somente em uma pequena área a norte. As partes leste e sul da região apresentam características de terras semi-áridas a áridas, recebendo somente 50 a 250 milímetros de chuva por ano. Estima-se que a quantidade total de água renovável disponível na região seja de 2.4 bilhões de metros cúbicos por ano, ao passo que a utilização de água, em média, chega a 3 bilhões de metros cúbicos.[4] O déficit resultante é suprido extraindo-se água, sem capacidade de reposição, do lençol freático e de outras formações geológicas.
O principal aqüífero do território, o Aqüífero Montanhoso, constitui a principal fonte de água potável da região. Nascido em terras palestinas, na Cisjordânia, cobre a área central do território Árabe e corre pelo chamado corredor Israelense. Sua exploração intensiva tem início com os assentamentos judeus entre os anos de 1920 e 1930, mas potencializa-se entre 1948 e 1967 e após a Guerra dos Seis Dias, que tem como resultado o aumento considerável do estado de Israel: foram conquistadas áreas do Egito, Faixa de Gaza, Península de Sinai, região da Jordânia, a Cisjordânia, o setor oriental de Jerusalém, partes pertencentes à Síria e às Colônias de Golan, colocando a região quase totalmente sob a ocupação Israelense. Dessa maneira, sua exploração tornou-se também um dos principais pontos de discórdia entre estes dois povos.
Em meados à década de 1970, a exploração na região norte e leste deste aqüífero chega ao limite, basicamente com problemas de absorção e salinização. A qualidade da água sofre alterações sensíveis à utilização humana, conforme palavras declaradas pelo Ministro do Meio-Ambiente Israelense durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento que aconteceu no Rio de Janeiro em 1992, “A rápida infiltração de água salina no Aqüífero (…) constituí um grande perigo” [5], contribuindo para o aumentando do nível da tensão na região,
Existe ainda uma outra fonte de água, o Aqüífero Costeiro, de onde derivam somente 15% da água utilizada na região.
Princípios e conceitos importantes
Para maior entendimento da situação, faz-se necessário descrever alguns conceitos e definições internacionais acerca do tema hídrico.
O princípio mais influente dentro da perspectiva regional do Oriente Médio é o principio do uso eqüitativo e razoável da água. Por definição tem-se a utilização de um curso da água por um Estado situado a montante não pode prejudicar as populações dos Estados que estejam à jusante. Este Princípio foi primeiramente estabelecido na Convenção para Utilização do Curso de Águas Internacionais, em 1997, pela Organização das Nações Unidas, para garantir à todas as populações o acesso à água e o desenvolvimento por ela estabelecido.
“O uso eqüitativo e razoável significa a preservação do curso d’água para que outros Estados por ele banhados também possam se valer dos benefícios que ele proporciona, garantindo a outras populações o acesso à água e ao desenvolvimento econômico.”[6]
Outro princípio é a obrigação de não causar danos tranfonteiriços
“…como uma forma de garantir a utilização de um curso d’água internacional por parte de um Estado, de forma soberana em seu território, e, ao mesmo tempo, impedir que este uso acarrete danos para outros Estados”.[7]
Especificamente no caso Palestino-Israelense, a utilização deste princípio torna-se um ponto obstante, uma vez que as fronteiras territoriais, ao longe de guerras e resoluções internacionais, são alvo de argumentações e discordância.
Somado a esses princípios, um conceito importante a ser considerado é o conceito econômico de oferta e demanda em relação a água, de Homer Dixon, que argumenta que o aumento populacional eleva a demanda do recurso natural, o qual, por sua vez, não acompanha o a oferta disponível geograficamente. A pressão pela utilização do recurso torna-se ainda mais forte o que propicia tensões homéricas, principalmente quando se trata se um recurso natural necessário à sobrevivência humana como é o caso da água[8].
Em sua análise, Armando Yahn Filho descreve a teoria de Homer Dixon como subdividida em três fatores de escassez: oferta, demanda e causas estruturais.
“A escassez pela oferta (também chamada de “mudança ambiental”) é conseqüência da degradação e do esgotamento dos recursos naturais renováveis. A escassez pela demanda está associada ao crescimento populacional ou ao aumento do consumo dos recursos. Por fim, a escassez estrutural está ligada à distribuição desigual dos recursos no globo, de modo que algumas populações habitam áreas onde há predominância de determinados recursos enquanto outras são privadas deles”.[9]
De acordo com o próprio Dixon[10], a probabilidade do crescimento da violência aumenta assim que o balanço de poder se afasta do Estado e se aproxima de grupos de contestação. A capacidade do Estado em responder estes grupos, diz Dixon, é a chave para a detenção ou explosão da violência. Como resposta a sociedade deve agir de duas maneiras: através da utilização racional e eficiente desses recursos ou pela diminuição de sua dependência do mesmo.
Dixon ainda argumenta que alguns Estados tornam-se fracos perante a escassez de alguns recursos naturais. A sociedade aumenta sua pressão sobre o governo e perante a incapacidade de responder a estas demandas, o que pode culminar na perda da legitimidade do Estado.
De acordo com os estudos de Arun Elhance sobre a escassez hídrica, aplicando estas teorias sob o aspecto internacional
“…os problemas econômicos, ambientais, políticos e de segurança, criados pelo aumento da escassez de água, por falta de cooperação entre os Estados ribeirinhos,(…) , podem criar sérias instabilidades domésticas e conflitos dentro de um ou mais Estados ribeirinhos, cujos efeitos, provavelmente, podem se espalhar para os países vizinhos.”[11]
Sob esta perspectiva analítica, o caso Palestino-Israelense faz-se um ponto de conversão dos aspectos citados, uma vez que reúne em si, obviamente diante de outros fatores políticos, econômicos e sociais, todos os indicadores defendidos pelos teóricos.
Água e política local
Considerando que a chamada “Nação Palestina” encontra-se em fase de desenvolvimento econômico, ou mais precisamente de subsistência populacional, dependendo basicamente da produção agrícola e de fontes de desenvolvimento primários, a água é um fator decisivo para o desenvolvimento econômico e social da população local, além do fator humanitário[12] ainda não considerado neste estudo.
Israel, por sua vez, uma nação reconhecida internacionalmente, tem como perspectiva econômica um desenvolvimento industrial cristalizado, também tendo a água como um agente econômico essencial para seu progresso. Mais uma vez o fator humanitário, o direito a água aos cidadãos é defendido perante a escassez do bem natural.
Uma vertente a ser explorada é o fato da legitimidade governamental da região. Como abordado por Dixon, um governo enfraquecido só aumenta a propensão populacional de apoio a movimentos que desenvolvem as necessidades básicas para a sobrevivência da população. O caso Palestino pode ser enquadrado dentro desta perspectiva, já que como governo reconhecido, há uma lacuna entre o sistema político e econômico e o social. Assim como em outras partes do mundo, grupos não-estatais acabam agindo em substituição ao Estado em ações sociais, em um assistencialismo que nem sempre está ligado ao desenvolvimento político. Com isso as ações políticas e econômicas são feitas paralelamente entre os líderes sociais e pelos governantes em si. Grupos de contestação são uma realidade dentro do Território Ocupado Palestino, o que propicia uma ruptura social e política e que tem como violência sua principal ferramenta de protesto.
Há de se observar que mesmo que tendo como objetivo a reconquista territorial, tais grupos palestinos, como Hammas e Fattah, acabam tomando proporções políticas adjacentes, tais como a luta por condições dignas de sobrevivência, envolvendo a água como fator essencial e também econômico, colocando a água como condição para o desenvolvimento agrícola e industrial. As soluções aconselhadas, como a utilização racional ou diminuição da dependência são improváveis dentro de uma visão macro e microeconômicas e impossíveis dentro de uma perspectiva humanitária.
A tensão torna-se ainda mais volátil e violenta quando os fatores defendidos por Dixon são coincidentes com conflitos religiosos, territoriais e étnicos, como acontece na região da Palestina e Israel[13]. O caso do Oriente Médio é um conglomerado de vértices conflituosas que tendem à expansão quando colocadas sob mesma perspectiva. Os recursos hídricos são uma causa em si, que fortificam e elevam o conflito Palestino-Israelense. Ainda deve-se ser levado em conta o reconhecimento sob o Território Ocupado Palestino como um Estado pela vizinha Israel. O fato da não negociação bilateral entre dois Estados reconhecidos e assim a consideração parcial das leis e princípios internacionais acaba afetando as negociações sobre a Bacia do Jordão e a decisão sobre o compartilhamento de águas na região. Entretanto, o fato da escassez absoluta da região também é um fator decisivo que pode ser tido como mais uma vértice decisiva para o conflito, ou, como será desenvolvido à frente, uma esperança à cooperação.
Os Recursos Hídricos Padecem à Guerra
Em 1953 Israel torna público seu primeiro plano de água, conhecido como Plano Johnston este defendia o interesse do Estado na construção de uma rede de distribuição entre todo o território, coletando água das áreas possíveis e levando-a até onde é necessária para a sobrevivência de sua população[14].
O CNA pode transportar mais de um milhão de metros cúbicos de água por dia e é responsável pela distribuição das águas do Rio Jordão por todo o território Judeu. O fluxo hídrico inicial era de cerca de 195 mmc, com alteração desta média na década de 1970 para 350 mmc, chegando a 420-450 mmc durante os anos 1980. [15]
De acordo com o Grupo Palestino de Hidrologia, em 1953, o Rio Jordão dispunha, em média, de 1.250 milhões de metros cúbicos anuais de água, quantidade a qual sofreu relativa mudança após a construção no Canal Nacional de Água Israelense (CNA), concluído em 1964. Cerca de 60% das águas do Jordão são dissipadas para este Canal.
Devido a importância estratégica dessas instalações de captação e distribuição de água, durante os ataques a ambos territórios, essas facilidades hídricas são constantes alvos, uma vez que suprindo um bem necessário à vida, como a água, a possibilidade do dito “inimigo” padecer aumenta.
Como forma de exemplificar os danos causados às propriedades hídricas durante os ataques armados na região, compensa estudar o caso da incursão ocorrida entre Abril e Agosto de 2002, como ação da mais recente Intifada, com as perdas pontuadas pelo Palestinian Hydrology Group, órgão responsável pelo setor e distribuição aqüífera no Território Palestino.
Uma chance à Cooperação
“À época do Velho Testamento, havia duas maneiras de resolver as disputas por água, que sempre foram escassas em nossa região. A primeira era lutar por ela. A outra maneira era colocar conjuntamente, sobre a boca da fonte, uma pedra tão grande que eram precisos cinco pastores para levantá-la, criando a necessidade de cooperação”.[16]
Conforme até agora apresentado, a água tem sido um ponto de discórdia entre Israel e a Palestina. Contudo, quanto toma-se como perspectiva o fato de que água é um bem que gera interdependência entre os atores, pode-se chegar a um ponto de convergência, e porque não dizer cooperação. Esta visão tem potencial para ser aceita como um impulso inicial para uma possível gestão conjunta frente ao bem escasso, assim como influenciar outros aspectos dentro do conflito entre os povos.[17]
Inúmeros estudos, artigos e estatísticas demonstram a discrepância existente na distribuição de água entre os territórios de Israel, Cisjordânia e Gaza. Movimentos ambientalistas e humanitários, governamentais, não-governamentais, instituições pró e contra o estabelecimento do Estado Palestino, além da população e governos locais, dentre outros, são os principais interessados em estudar a realidade da região.
Esta realidade pode ser considerada um ponto positivo perante qualquer outra tentativa de cooperação na região. Conforme defende Johan Galtung em seus estudos para a paz, entender as causas da violência e encontrar meios para eliminá-las abre precedentes reais para a instituição da paz, ou dentro de uma visão realista, a efetivação do não-conflito.
A peculiariedade deste conflito pela não aceitação do reconhecimento recíproco dentro do mesmo território, expõe dois governos irredutíveis a qualquer tipo de negociação[18]. Como resultado, o tema hídrico acaba por tomar um aspecto secundário e periférico dentro das conversações primárias estabelecidas durante o ciclo de negociações de Oslo que correram durante a década de 1990. Estes acordos tinham como foco o término dos conflitos, a abertura das negociações sobre os territórios ocupados, a retirada de Israel do sul do Líbano e a questão do status de Jerusalém.
A Declaração de Princípios de Oslo diz em seu anexo III
“… a criação de um Comitê Econômico de Cooperação, por uma governança conjunta pela água com o objetivo de especificar o modelo cooperativo na governança pela água na Cisjordânia e na Faixa de Gaza…”
Assim como
“…a preparação de propostas sob a forma de estudos e planos sobre o direito da água de cada parte, da mesmo forma sobre a utilização conjunta e equitativa do recurso natural…”
Esta Declaração de Princípios determinou uma estrutura inicial para a cooperação, quando explicita a utilização razoável e eqüitativa dos recursos conjuntos, como é o caso da água. A capacitação destes princípios dá-se pela iniciativa, em 1994, da criação de uma Comissão Hídrica Conjunta. Esta comissão chegou a regular questões como a proteção dos sistemas de água e esgoto, contudo, um dos fatores que não possibilitou futuras negociações dentro deste Comitê foi o poder de veto concedido a Israel.
Conversações para se chegar a um acordo final formam parte de um processo global de negociação, mas, considerando o impasse político e a continuação da violência, o impasse pode não ser concluído tão cedo quanto toda a sociedade internacional espera. Não obstante, israelenses e palestinos já concordam que é indispensável manter a cooperação sobre sua água partilhada.
Apesar de todo o conflito, o colapso de Oslo e a resultante Intifada, especialistas da área hídrica locais e regionais tem mantido contato, assim como encontros esporádicos que podem ser interpretados como uma forma de reconhecimento entre ambos os lados da interdependência da água.
Dentro de uma perspectiva a longo termo, e como dá-se como fato a subdivisão territorial e hídrica entre Israel e Palestina, estes devem levar a existência do recurso, assim como a interdependência sob um olhar cooperativo. Como uma forma de tornar viável tais premissas ambos os lados devem buscar uma Governança Conjunta quando coloca-se como primazia as leis internacionais estabelecidas, com as respectivas necessidades e densidades populacionais levadas em conta. Ainda como parte desta tentativa de coexistência, deve-se levar em conta os desafios e as conseqüências do crescimento populacional e econômico de ambos os lados, como poluição, desperdício, dessalinização, e projetos de conscientização populacional.
Caso políticas unilaterais continuem em ambos os lados do território, a tendência de perpetuação da crise local, agravadas com casos de poluição, salinização, e stress hídrico; é ser fortalecida e efetiva. Este panorama só aumentara a dificuldade dos atores em administrarem seus direitos sobre este bem natural, escasso e danificado.
A última Intifada, com início em 2000, comprometeu o processo de paz anteriormente estabelecido. A falta de confiança entre os dois lados aprofundou-se à medida que os acordos selados no passado tornaram-se irrelevantes perante as ações violentas na região. Todo este aspecto torna ainda mais difícil a propensão governamental de administração conjunta em quaisquer que sejam os recursos interdependentes no território. Existe somente um campo, o qual mesmo com todas as ações militares, as relações ainda persistem. Este campo e a distribuição de água e a infra-estrutura ligada a esta.
Uma prova de desta exceção e revelada por Ze’ev Schiff em sua tese Israel-PA Cooperation in Water – the One Exception. O autor descreve a assinatura de uma declaração conjunta, em 31 de Janeiro de 2001, em Erez, numa primeira tentativa de reunião da Comissão Hídrica Conjunta desde o inicio da Intifada em Setembro de 2000, a qual definia que a água e a infraestrutura ligada a ela deveria ser excluída do ciclo de ataques recentes.
Esta declaração continha as promessas de ambos os lados de tomarem as atitudes necessárias para fornecer água e tratamento de esgoto na Cisjordânia e Faixa de Gaza e reparação imediata dos danos ocasionais nestes sistemas. Os dois lados deixaram claro, em um apelo às suas populações, que o sistema hídrico dos dois povos são interdependentes e que servem ambos, e com isso, quaisquer danos causados a este sistema os afetariam com mesma intensidade.
Como forma de garantir o fornecimento de água, à população foi requisitado que fizessem o que estivesse ao seu alcance para evitar danos a canos, estações de tratamento, equipamentos e sistemas elétricos.
Um exemplo desta cooperação aconteceu na região de Belém, quando o servidor central de água sofreu danos pelas incursões, e funcionários da Mekrot, empresa Nacional de Distribuição de Água Israelense, foram chamados para reparar os danos. Mesmo com pressão dos assentados judeus para serem atendidos primeiro, decidiu-se pela urgência pela água dos 150.000 residentes palestinos de Belém à pequena comunidade de judeus, e como resultado de uma análise justa e cooperativa, o aqueduto de Belém reparado primeiro.
Conclusão
Por ser um recurso natural compartilhado, que desconhece fronteiras políticas, e escasso, a água se insere nas Relações Internacionais como um fator de Conflito e Cooperação.
O conflito é inerente ao recurso dividido. São poucos os casos de divisão da água os quais não são necessárias regras para a conquista da estabilidade. Certamente a interdependência supri mais aos elementos de conflitos do que de cooperação, caso os atores envolvidos não coloquem-se atentos às necessidades primárias da população.
Algumas áreas a cooperação são implícitas pelo desenvolvimento econômico e políitico, como em regiões como América do Norte e Ásia. Contudo, dentro do caso estudado, a cooperação deve ser tomada sob a perspectiva de sobrevivência dos dois povos na mesma região. Técnicos do setor, como geólogos e hidrologistas são a peça-chave na construção de um comitê interdependente que pode dar ao até então conflito, uma nova perspectiva de cooperação.
Há de se considerar, entretanto, que dentro de uma região ainda abalada por conflitos fronteiriços e volência intermitente, essa cooperação torna-se um fator de desconfiança entre os dois governos. Cada região e suas ideologias terão que reconsiderar o fato da sobrevivência humana antes de qualquer discrepância política.
Graduada em Relações Internacionais e especializada em Direito Internacional pela PUC-SP e mestranda também em Direito Internacional pelo Instituto de Estudos Internacionais da Universidade de Genebra, na Suíça. Atualmente trabalha como Consultora de Direitos Humanos e Políticas Públicas do Projeto GAVVIS de Proteção á Vítima de Violência Doméstica, da Universidade de Taubaté.
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