Os negócios da Administração Pública. Contratação direta por inexigibilidade

Resumo: O presente estudo tem seu enfoque na área do Direito Administrativo, especificamente no tange aos negócios celebrados pela Administração Pública com ênfase particular no exame da contratação direta por inexibilidade de licitação. Objetivando, demonstrar a importância do tema inserimos capítulos que abordam a previsão constitucional dos deveres de boa administração, mandamento a ser compulsoriamente observado pelos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.


Sumário: Introdução. 1. Evolução histórica da licitação pública no brasil. 2. Conceito de licitação pública. 3. A finalidade da licitação pública. 4. A principiologia inerente a licitação pública. 4.1. O princípio da legalidade. 4.2. O princípio da impessoalidade. 4.3 – O princípio da moralidade. 4.4. O princípio da formalidade. 4.5. O princípio da igualdade. 4.6 – O princípio da publicidade. 4.7. O princípio do julgamento objetivo. 4.8. O princípio da competitividade. 4.9. O princípio da proporcionalidade. 4.10. O princípio do sigilo na apresentação das propostas. 4.11. O princípio da adjudicação compulsória ao vencedor. 4.12. O princípio da vinculação ao instrumento convocatório. 5. O dever de licitar. 6. O objetivo da licitação. 7. A inexibilidade de licitação. 7.1. A hipótese de fornecedor exclusivo. 7.2. A hipótese de notória especialização e serviço de natureza singular. 7.3. A hipótese de contratação de profissionais de setor artístico.  8. O processo de justificativa pela contração direta. Conclusão. Referências bibliográficas.


INTRODUÇÃO


Com esta sucinta análise, buscaremos demonstrar que os ajustes firmados pela Administração Pública, a margem do procedimento licitatório encontram subsídio legal, recebendo a denominação de contratações diretas.


Sem prejuízo, exploraremos com maior afinco a modalidade de contratação direta, autorizada pela inexibilidade de licitação prevista no art. 25 da Lei nº. 8.666/1993.


Igualmente, empregaremos esforço na tentativa de demonstrar que a contratação direta, não autoriza e nem poderia autorizar o desvio de finalidade inerente aos negócios da Administração Pública, cuja proteção se verifica no plano Constitucional com destaque especial ao art. 37 daquela Lei Fundamental.


Com a mesma determinação, adentraremos os meandros da princípiologia própria aplicada ao procedimento licitatório com o deliberado propósito de evidenciar a blindagem encarregada de assegurar a lisura, legalidade, moralidade e transparências nas contratações diretas ajustadas pela Administração Pública.


Sem pretensão de esgotar o tema, pontuaremos as hipóteses autorizadas por lei a inexigir a realização prévia do procedimento licitatório com especial atenção aos casos em que a concretização da competição, demonstra-se impossível, situação que aliada à outras, constituem a principal finalidade da licitação pública.


Com assistência da melhor doutrina, desvendaremos o emblemático e polêmico mundo dos negócios públicos, marginais a contratação convencional, com a ousada missão de desmistificar os dogmas e receios existentes sobre o tema, inclusive, tirando das sombras a essencial razão de ser do instituto, objeto de nosso estudo, e sua importância ao interesse público, por excelência, finalidade última a ordem administrativa, hoje, existente.


1.  A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LICITAÇÃO PÚBLICA NO BRASIL


José Cretella Júnior tece alguns apontamentos a histórica evolução do instituto jurídico da licitação.


Vejamos:


“No decorrer do século passado e primeira metade deste, o principio que informava o instituto da licitação (denominada, então, de concorrência) era o interesse financeiro do Estado em obter o preço mínimo. A boa execução dos trabalhos ou a qualidade do material fornecido parecia bastante garantido pelas minuciosas especificações constantes dos contratos, assim como pelo rigor das penas cominadas aos empreiteiros e fornecedores que tentassem burlar o interesse público.” (2001, p. 387).


No entanto, foi o Decreto nº. 2.926, de 14 de maio de 1882, normatizador das arrematações dos serviços a cargo do então Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, que atribui as licitações às primeiras feições no direito público brasileiro.


Contudo, apenas com o advento do Decreto nº. 4.536, de 28 de janeiro de 1922, que instituiu o Código de Contabilidade da União é que o procedimento licitatório restou consolidado no âmbito da Administração Pública Federal.


Em 1967, com a edição do Decreto-lei nº. 200, de 25 de fevereiro de 1967, que estabeleceu a reforma administrativa federal, o procedimento licitatório foi finalmente sistematizado no âmbito da União.


O Decreto-lei nº. 2.300, de 21 de novembro de 1986, instituiu, pela primeira vez, o Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos Administrativos, reunindo normas gerais e especiais relacionadas à matéria.


Já a Constituição de 1988, por sua vez, representou um notável progresso na institucionalização e democratização da Administração Pública no Brasil, a partir daí a licitação recebeu status de princípio constitucional.         


Para Cretella:


“(…) antes, o que mais interessava era o preço baixo, ao passo que em nossos dias a Administração propende nem sempre a aceitar a proposta mais econômica tão-só, mas entende que o contrato seja celebrado com a pessoa mais apta em executá-lo.” (2001, p. 388).


E é assim, pois o poder-dever de licitar está intimamente ligado aos princípios da indisponibilidade e supremacia do interesse público que são princípios norteadores da atividade estatal.


O art. 37, XXI da Constituição Federal foi regulamentado pela lei 8.666, de 21 de junho de 1993, em vigor atualmente, que disciplina as licitações e contratos da Administração Pública. Ápice da lisura e transparência administrativa relacionada aos negócios da Administração.


Foi à lei 8.666/1993 que estabeleceu as modalidades de licitação: concorrência, tomada de preços, convite, leilão e concurso, verdadeiro avanço na gestão dos negócios do Poder Público, prestigiando a transparência, acessibilidade, e idoneidade do procedimento licitatório. Aliás, o modelo brasileiro de aquisição e gestão de negócios públicos, destaca-se em modernidade e democracia. 


O processo de evolução normativo no campo dos negócios da Administração Pública é um marco sem termo, adequando-se e modificando-se de acordo com as necessidades sociais, culturais e econômicas de cada tempo.   


A inteligência do legislador está sempre trabalhando para aperfeiçoar o instituto da licitação pública.


Por último, a lei 10.520, de 17 de julho de 2002, instituiu no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios a modalidade de licitação denominada pregão, corroborando as necessidades da Administração Pública em aperfeiçoar o processo de contratação de produtos e serviços comuns, assim entendidos aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado, possibilitando a seleção da melhor proposta em menor espaço de tempo, homenageando o princípio constitucional da eficiência. 


2. O CONCEITO DE LICITAÇÃO PÚBLICA


O conceito de licitação restou sinteticamente consignado no art. 3º da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.


Vejamos:


“Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.


Depreende-se daí, portanto, que a licitação corresponde a um procedimento administrativo formal[1], submisso ao princípio constitucional da isonomia, destinado à seleção da proposta mais vantajosa para celebração do futuro contrato desejado pela Administração.


Segundo Marçal:


“a licitação é um procedimento administrativo disciplinado por lei e por um ato administrativo prévio, que determina critérios objetivos de seleção da proposta de contratação mais vantajosa, com observância do princípio da isonomia, conduzido por um órgão dotado de competência específica.” (2006, p. 316).


Para Gasparini:


“[…] a licitação pode ser conceituada como o procedimento administrativo através do qual a pessoa a isso juridicamente obrigada seleciona, em razão de critérios objetivos previamente estabelecidos, de interessados que tenham atendido à sua convocação, a proposta mais vantajosa para o contrato ou ato de seu interesse.” (2009, p. 478).


Já para Celso Antônio:


“licitação – em suma síntese – é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na idéia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bem cumprimento das obrigações que se propõem assumir.” (2001, p. 469).


Para Di Pietro:


“[…] pode-se definir a licitação como o procedimento administrativo pelo qual um ente político, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições ficadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para celebração do contrato” (2001, p. 291).


Celso Ribeiro, com pena de ouro também prestou sua contribuição à conceituação de licitação pública, vejamos:


“a licitação é um procedimento de direito administrativo a que, em geral, os entes públicos estão sujeitos como medida prévia à escolha dos seus contratos, que podem ser públicos ou privados. Trata-se de um precedente necessário de todo os contratos administrativos, com o fim de proporcionar à Administração a proposta mais vantajosa e dar oportunidade a todos de oferecerem seus serviços ou mercadorias ao Estado.” (2001, p. 128).


De arremate, invocamos as lições de Meirelles:


“licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos.” (2005, p. 82).


A doutrina é harmônica ao conceituar o instituto da licitação pública, este último, inclusive, propõe que a licitação é um procedimento administrativo vinculado, pois se devolve através de uma sucessão ordenada de atos que vinculam tanto a Administração quanto os particulares.


Concordamos. De fato, parece-nos que o procedimento licitatório se alinha com a concepção de ato administrativo vinculado, pois na presença do instrumento convocatório, não há espaço ao subjetivo do administrador público, de modo que, estará compelido a observação daqueles termos.[2]


Portanto, o ato de promover, ou não promover a licitação pública é que pertence ao campo da discricionariedade, pois o administrador não é obrigado a celebrar ajuste, porém se desejar fazê-lo estará vinculado aos termos do instrumento convocatório que, por sua vez, estará vinculado à legalidade estrita.


Do mesmo modo, o instrumento convocatório, deverá ser orientado pelos demais princípios básicos próprios da Administração Pública e, também, pelos princípios singulares aplicáveis exclusivamente aos procedimentos licitatórios, em especial, o princípio da vinculação instrumento convocatório.  


Assim chegamos ao termo em que licitação pública constitui um procedimento administrativo, formal e vinculado, em que à Administração Pública, garantindo o amplo acesso de particulares ao certame, seleciona a proposta mais vantajosa a satisfação do interesse público. 


3. A FINALIDADE DA LICITAÇÃO PÚBLICA


Assim como o conceito, a finalidade de procedimento licitatório também restou consignada no art. 3º da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.


Examinemos:


“Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.


O exame literal do dispositivo colacionado revela sua dupla finalidade. Viabilizar a melhor contratação e possibilitar a aderência ao certame daqueles que tenha interesse em contratar com a Administração.


Assim, inclusive, é a doutrina de Gasparini:


duas são as finalidades da licitação. De fato, a licitação visa proporcionar, em primeiro lugar, às pessoas a ela submetidas, a obtenção da proposta mais vantajosa, e, em segundo lugar, dar igual oportunidade aos que desejam contratar com essas pessoas […].” (2009, p. 479).


Segundo Celso Ribeiro:


os fins da licitação são, em primeiro lugar, evidenciar de forma objetiva qual a melhor contratante dentre os concorrentes; em segundo lugar, honrar o princípio da igualdade […] ”(2001, p. 139).


Para Celso Antônio:


a licitação visa a alcançar duplo objetivo: proporcionar às entidades governamentais possibilidades de realizarem o negócio mais vantajoso (pois a instauração de competição entre ofertantes preordena-se a isto) e assegurar aos administrados ensejo de disputarem a participação nos negócios que as pessoas governamentais pretendam realizar com os particulares.” (2001, p. 471).


Desse modo, a estrutura proposta na lei nº. 8.666/1993 blindou as relações jurídicas comerciais da Administração, prevalecendo sempre o interesse público, pois o contrato será celebrado com quem, de fato, oferecer maiores vantagens à entidade pública licitante.


A interpretação teleológica do dispositivo conduz ao termo em que a escolha da melhor proposta deve ocorrer calcada em critérios objetivos, antecipados no instrumento de convocação, cujo deliberado propósito é possibilitar a qualquer interessado a participação no certame, franqueando a todos idênticas possibilidades e condições de contratação junto a Administração.


Assim a licitação pública é uma solução que atende aos princípios Constitucionais de boa administração, possibilitando a Administração a obtenção da coisa que satisfará o interesse público ao mesmo tempo em que estará preservando o princípio da isonomia, permitindo aos particulares o estabelecimento de concorrência na tentativa de satisfazer o órgão licitante.


Com pena de ouro, Celso Ribeiro consigna em seu Curso de Direito Administrativo que “não fora a licitação poderíamos cair no pleno arbítrio da autoridade administrativa, com todas as seqüelas para o relacionamento entre a Administração e o administrado, que deve ser justo, correto e eficiente.” (2001, p. 130).


Concordamos. Os negócios da Administração Pública devem ser precedidos de procedimento licitatório, de modo que, a transparência no manejo da coisa comum seja preservada. É o que se espera em um Estado Democrático de Direito.


4. A PRINCIPIOLOGIA INERENTE A LICITAÇÃO PÚBLICA


Os princípios incidentes sobre o procedimento licitatório foram tarjados na lei das Licitações e Contratos Administrativos. 


São eles: o princípio da legalidade; o princípio da impessoalidade; o princípio da moralidade; o princípio da igualdade; o princípio da publicidade; o princípio da probidade administrativa; o princípio da vinculação ao instrumento convocatório e o princípio do julgamento objetivo, além de outros que lhe são correlatos.


A doutrina enumera outros: o princípio da competitividade; o princípio da formalidade; o princípio do sigilo na apresentação das propostas e adjudicação compulsória ao vencedor.


Kildare de Carvalho nos lembra que “vale notar, inicialmente, que esses princípios não são os únicos em Direito Administrativo, fixando os publicistas inúmeros outros” (2003, p. 465).


Consenso doutrinário a cerca dos princípios informadores do procedimento licitatório, de fato, não há. A doutrina é bastante segregada, nesse sentido. A existência de tal embate entre os estudiosos só acentua ainda mais a relevância da principiologia inerente ao procedimento licitatório.


Com efeito, os princípios constituem o suporte que sincronizam a atual ordem constitucional ao sistema infraconstitucional. E é assim, porque a lei deve respeitar os princípios sob os quais se alicerçou a Constituição.


Vejamos, nesse sentido, o que ensinou Celso Ribeiro:


“não devemos confundir os fins da licitação com os princípios que informam. Estes são bem mais amplos. Por principio deve-se entender aquelas regras fundamentais que devem presidir a todo o procedimento licitatório.” (2001, p. 131).


Determinação ainda mais evidente quando tratamos da coisa pública, pois a Administração é raiz do estratagema Constitucional.


Meirelles caminha conosco:


“[…] é que deverão se pautar a todos os atos e atividades administrativas de todo aquele que exerce o poder público. Constituem, por assim dizer, os fundamentos da ação administrativa, ou, por outras palavras, os sustentáculos da atividade pública.” (2001, p. 82).


Diógenes (2009, p. 06) igualmente oportuno lembra que “constituem os princípios um conjunto de proposições que alicerçam ou embasam um sistema e lhe garantem a validade.”


Assim a Constituição de 1998, consignou e sistematizou esses princípios, vejamos:


 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência […]”.


A lei nº. 8.666/1993, atendendo a Constituição, tarjou que a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.


Assim, o agente público somente estará respeitando a Constituição e a lei, se, em todos os atos, que levar a feito, respeitar os princípios tarjados no art. 37 da Constituição, assim como os princípios infraconstitucionais consignados na lei nº. 8.666/1993. 


4.1. O princípio da legalidade


O princípio da legalidade impõe ao administrador público o ônus observar os desígnios da lei. Sendo-lhe, portanto, vedada a execução de qualquer ato não previsto, ou contrário ao comando legal.


Segundo Hely Lopes Meirelles:


“a legalidade é princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e as exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato invalido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.” (2001, p. 82).


Gasparini, no mesmo sentido, ensina que:


“o princípio da legalidade significa estar a Administração Pública, em toda sua atividade, presa aos mandamentos da lei, deles não de podendo afastar, sob pena de invalidade do ato e responsabilidade de seu autor.” (2009, p. 07).


Para Di Pietro “segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite.” (2001, p. 68).


Assim o manejo da coisa pública demonstra-se incompatível com a liberdade e a vontade pessoal do agente público. Ao particular, por outro lado, é licito fazer o que a lei não proíbe, porém a Administração Pública somente é licito fazer o que a lei expressamente autoriza. Assim, o princípio da legalidade para Administração Pública assume a envergadura da estrita legalidade.


4.2. O princípio da impessoalidade


Impessoalidade, ou segundo prefere Hely Lopes Meirelles, princípio da finalidade, é o mandamento constitucional que impõe ao administrador público que somente execute ato administrativo objetivando seu fim legal.


Aliás, assim é a doutrina de Meirelles segundo a qual:


o princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988, nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de direito indica expressamente ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.” (2001, p. 83).


A mesma inteligência é esposada por Diógenes Gasparini, ao estabelecer que:


a atividade administrativa deve ser destinada a todos os administrados, dirigida aos cidadãos em geral, sem determinação de pessoa ou discriminação de qualquer natureza. É o que impõe ao Poder Público este princípio.” (2009, p. 09).


Com efeito, o princípio da impessoalidade estabelece que a conduta do administrador público deva ser neutra, de modo que, não favoreça, ou beneficie este, ou aquele. Se o agente público levar a feito qualquer ato administrativo, desviando-se do mandamento constitucional de impessoalidade e compromisso com a finalidade ficará então sujeito a pena do art. 316 do Código Penal Brasileiro.


4.3. O princípio da moralidade


O princípio da moralidade não é simples de esculpir, alias sua conceituação doutrinária é altamente controvertida, pois está intimamente ligada a idéia de moral, que é um conceito altamente subjetivo.


Ocorre que, os atos e a atividade administrativa, segundo Gasparini, precisam obedecer não apenas a lei, mas também a própria moral. O ato, embora, tenha observado o rito da legalidade, pode facilmente desviar-se da moral.


Segundo Meirelles:


“a moralidade administrativa está intimamente ligada ao conceito de bom administrador, que, no dizer autorizado de Franco Sobrinho, “é aquele que, usando de sua competência legal, se determina não só pelos preceitos vigentes, mas também pela moral comum. Há que conhecer, assim, as fronteiras do licito e do ilícito, do justo e do injusto […].” (2001, p. 84).


O princípio da moralidade administrativa, em outras palavras, impõe ao administrador público que no manejo da coisa comum, mantenha o equilíbrio, a temperança e o bom senso, abstendo-se de realizar extravagâncias. De fato, é o princípio que impõe ao administrador o dever de boa gestão, cautela e zelo na gerência da coisa pública.


4.4. O princípio da formalidade


É o princípio que impõe à Administração a imprescindibilidade de obediência ao procedimento e as fases estabelecidas à validade do ato pela lei. Sua regular observância constitui direito público subjetivo.


Assim o procedimento, em matéria de licitação, adotado pela Administração, seja no exercício do poder discricionário, ou por determinação da lei deverá ser previamente conhecido pelos interessados e sob pena de nulidade deverá ser observado.


Para Meirelles:


“o princípio do procedimento formal é o que impõe a vinculação da licitação as prescrições legais que a regem em todos os seus atos e fases. Essas prescrições decorrem não só da lei, mas também, do regulamento, do caderno de obrigações e até do próprio edital ou convite, que complementa as normas superiores, tendo em vista a licitação a que se refere. “(2001, p. 257).


Já Gasparini ensina que:


o princípio formal, observável no procedimento da licitação, é decorrência do princípio de igual nome que caracteriza o Direito Administrativo, ao qual se submete a Administração Pública em todos os seus atos e comportamento e, portanto, quando promover qualquer certamente licitatório. Se assim não fosse, bastaria afirmar que sua irrestrita observância nas licitações é decorrência da própria lei federal das Licitações e dos Contratos Administrativos.” (2009, p. 09).


A formalidade exigida, porém não se confunde com o formalismo inútil e desnecessário, pelo contrário, o que se pretende é assegurar a lisura e a transparência do procedimento mediante a prática de atos coordenados e previamente definidos em lei, jamais tumultuar o processo com extravagâncias. Assim não há que se falar em anulação do procedimento por mera imperfeição formal.


Imperioso, contudo, destacar que a violação do procedimento, ou a não observância da forma exigida à validade dos atos administrativos aplicados ao procedimento licitatório impõe a anulação do certame e do conseqüente contrato administrativo, responsabilizando-se aquele que deu causa ao vício de legalidade.


É assim também para Meirelles:


“procedimento formal, entretanto, não se confunde com ‘formalismo’, que se caracteriza por exigências inúteis e desnecessárias. Por isso meso, não se anula o procedimento diante de meras omissões ou irregularidades formais na documentação ou nas propostas desde que, por sua irrelevância, não causem prejuízo à Administração ou aos licitantes.” (2001, p. 257).


O princípio da formalidade constitui, portanto, a expressão constitucional do justo e devido processo legal, aplicado aos negócios públicos, refletindo a austeridade do legislador.


4.5. O princípio da igualdade


A igualdade entre os licitantes é assegurada pelo não estabelecimento de privilégio, ou discriminações no procedimento licitatório. 


Meirelles ensina que:


a igualdade entre os licitantes é princípio impeditivo da discriminação entre os participantes do certame, quer através de cláusulas que, no edital ou convite, favoreçam uns em detrimento de outros, quer mediante julgamento faccioso, que desiguale os iguais ou iguale os desiguais.” (2001, p. 258).


Para Diógenes:


“todos iguais em face da lei também o são perante a Administração Pública. Todos, portanto, tem o direito de receber da Administração Pública o mesmo tratamento, se iguais. Se iguais nada pode discriminá-los. Impõe-se aos iguais, por esse princípio, um tratamento impessoal, igualitário ou isonômico. É o princípio que norteia, sob pena de ilegalidade, os atos e comportamentos da Administração Pública direta e indireta. “(2009, p. 20).


O desrespeito ao princípio da igualdade atenta contra a Lei e consubstancia desvio de poder e finalidade, maculando o dever de boa administração.


Seguindo essa linha, uma vez mais, invocamos os ensinamentos de Meirelles:


“o desatendimento a esse princípio constitui a forma mais insidiosa de desvio de poder, com que a Administração quebra a isonomia entre os licitantes, razão pela qual o Judiciário tem anulado editais e julgamentos em que se descobre a perseguição ao favoritismo administrativo, sem nenhum objetivo ou vantagem de interesse público.” (2001, p. 258).


Conduta, por sua vez, tipificada no art. 90 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.  Lesionar o princípio da igualdade no procedimento licitatório constitui crime, portanto. 


Bem por isso, Diógenes fomenta que:


“todos iguais em face da lei também o são perante a Administração Pública. Todos, portanto, tem o direito de receber da Administração Pública o mesmo tratamento, se iguais. Se iguais nada pode discriminá-los. Impõe-se aos iguais, por esse princípio, um tratamento impessoal, igualitário ou isonômico. É o princípio que norteia, sob pena de ilegalidade, os atos e comportamentos da Administração Pública direta e indireta.” (2009, p. 20).


O princípio da igualdade, contudo, não inibe a instituição de requisitos à participação dos interessados no certamente, desde que, compatíveis com o objeto a ser contratado.


Marçal comunga do mesmo entendimento:


“a incidência do princípio da isonomia sobre a licitação desdobra-se em dois momentos. Em uma primeira fase, são fixados os critérios de diferenciação que a Administração Pública adotará para escolher o contratante. Em uma segunda fase, a Administração verificará quem, concretamente, preenche mais satisfatoriamente as diferenças.” (2006, p. 318).


Assim também é o entendimento de Meirelles:


“[…] não configura atentado ao princípio da igualdade entre os licitantes o estabelecimento de requisitos mínimos de participação no edital ou convite, porque a Administração pode e deve fixá-los sempre que necessários à garantia da execução do contrato, à segurança e perfeição da obra ou serviço, à regularidade do fornecimento ou ao atendimento de qualquer outro interesse público.” (2001, p. 258).


O legislador, porém proibiu o estabelecimento de tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciário, ou entre empresas nacionais e estrangeiras.


O princípio da isonomia, aplicado ao procedimento licitatório, igualmente, merece ser examinando a teor da Lei Complementar nº. 123/2006 que institui o regime geral aplicado às microempresas e as empresas de pequeno porte, possibilitando a concessão de tratamento diferenciado a essas organizações privadas, sem macular o princípio da igualdade.


Novamente, Marçal esposa entendimento compatível conosco, esclarecendo que:


“[…] há equivoco em supor que a isonomia veda a diferenciação entre os particulares com a Administração Pública. Quando a Administração escolhe alguém para contratar, está efetivando uma diferenciação entre os interessados. Não se admite, porém, a discriminação arbitrária. A licitação consiste em um instrumento jurídico para afastar a arbitrariedade na seleção do contratante.” (2006, p. 318).


Assim, parece-nos que a desigualdade não é repelida, o que se repele é a desigualdade injustificada.


O tratamento diferenciado, nesse caso, se justifica pela necessidade do Estado fomentar a atuação dessas empresas, mas obviamente não justifica eventual contratação a preços superiores aos praticados no mercado.


4.6. O princípio da publicidade


O princípio da publicidade é caro à Administração Pública e está presente na consecução dos atos administrativos, objetivando a transparência no trato da coisa comum.


Assim também é o entendimento de Meirelles:


“a publicidade dos atos da licitação é princípio que abrange desde os avisos de sua abertura até o conhecimento do edital e seus anexos, o exame da documentação e das propostas pelos interessados e o fornecimento de certidões de quaisquer peças, pareceres ou decisões com ela relacionadas. É em razão desse princípio que se impõem a abertura dos envelopes da documentação e proposta em público e a publicação oficial das decisões dos órgãos julgadores e do respectivo contrato, ainda que resumidamente.” (2001, p. 258).


Logo, todos os atos do procedimento licitatório deverão, lógica e naturalmente, serem levados ao conhecimento público e, em especial, a todos os interessados no objeto da licitação.


Para Marçal (2006, p. 320) o princípio da publicidade “[…] visa a garantir a qualquer interessado as faculdades de participação e fiscalização dos atos da licitação.”


De fato, o procedimento licitatório, observará o princípio da publicidade, que estará presente desde a abertura do certamente até seu efetivo exaurimento, que se dá com a celebração do contrato.


Não há licitação sigilosa, portanto.


4.7. O princípio do julgamento objetivo


O instrumento convocatório deve estabelecer com objetividade os critérios de julgamento do certamente, por exemplo, licitação melhor técnica e preço.


Segundo Meirelles (2001, p. 259) “julgamento objetivo é o que se baseia no critério indicado no edital e nos termos específicos das propostas.”


Inadmissível a mera referência genérica do julgamento a ser feito, ou a simples remissão a dispositivo de Lei, mister a indicação expressa do tipo eleito. 


Assim é a doutrina de Marçal:


“o ato convocatório tem de conter critérios objetivos de julgamento que não se confundem nas preferências, ou escolhas dos julgadores. O julgamento das propostas subordina-se obrigatoriamente àqueles critérios.” (2006, p. 320).


Logo, o instrumento convocatório deve ser preciso e suficientemente claro, para que os interessados conheçam previamente os critérios de julgamento que serão aplicados. Os critérios de definição da melhor proposta, por outro lado, também indicam o tipo de licitação, antecipando as expectativas da Administração Pública na busca da melhor contratação.


Meirelles, nesse sentido, ensina com coerência que:


“é princípio de toda licitação que seu julgamento se apóie em fatores concretos pedidos pela Administração, em confronto com o ofertado pelos proponentes dentro do permitido no edital ou convite. “(2001, p. 259).


Inexiste espaço ao subjetivismo intencional do julgador, bastando ao interessado cumprir os requisitos previamente estabelecidos no instrumento convocatório.


Outra vez, pontual é o esclarecimento de Meirelles ao destacar que o princípio do julgamento objetivo:


“visa a afastar o discricionarismo na escolha das propostas, obrigado os julgadores a aterem se ao critério prefixado pela Administração, com o que se reduz e se delimita a de valoração subjetiva, sempre presente em qualquer julgamento.” (2001, p. 259).


As regras de julgamento objetivo devem atender a critérios de clareza e individualidade. É vedado a Administração Pública tecer qualquer juízo valorativo, atendo-se exclusivamente aos critérios pré-estabelecidos.


4.8. O princípio da competitividade               


A competitividade, aliada a supremacia do interesse público e a transparência, constituem o espírito central da licitação, assim enganam-se aqueles que subjugam o procedimento licitatório, por achá-lo um instituto de direito falido e inócuo, sensível a fraude a ao favoritismo ilegal.


Isto porque, diante a consciência que abriga a essência do procedimento licitatório, a blindagem constitucionalmente, de fato, traduz a melhor concepção de probidade e zelo no trato da coisa pública, permitindo o acesso ao procedimento licitatório indistintamente a todos particulares que satisfazerem as condições previamente estabelecidas no instrumento convocatório. Digam-se, condições mínimas de admissibilidade, tudo para preservar o caráter universal do procedimento.


Marçal, a luz de reiterados julgados emanados pelo Superior Tribunal de Justiça, leciona que:


“as regras do procedimento licitatório devem ser interpretadas, de modo que, sem causar qualquer prejuízo a Administração e aos interessados no certame, possibilitem a participação do maior número de concorrentes, a fim de que seja possibilitado se encontrar, entre várias propostas, a mais vantajosa.” (2006, p. 319).


Com a mesma autoridade é a doutrina de Diógenes:


“a lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública, estabelece que é vedado aos agentes públicos admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo da licitação ou que estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicilio dos proponentes ou de qualquer outra circunstancia impertinente ou irrelevante ao objeto do contrato. Aí está consubstanciado o princípio da competitividade. Nada, por esse princípio, deve comprometer, restringir ou frustrar a disputa entre os interessados em contratar com a entidade pública, em tese, obrigada a licitar […].”(2009, p. 490)


Portanto, o princípio da competitividade, antes de tudo, revela a necessidade de equilibrar três fins igualmente relevantes. A concretização do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa a Administração Pública e a competição entre os interessados.


4.9. O princípio da proporcionalidade


O princípio da proporcionalidade é de todo compatível com o procedimento licitatório, assim como também é em relação às contratações diretas, pois impõe a Administração Pública a temperança, ou seja, a necessidade de equilibrar a segurança jurídica, a transparência, a isonomia, o formalismo às necessidades de caráter excepcional decorrentes das adversidades do convívio social.


Outro não é o entendimento do mestre, Marçal:


“a obrigatoriedade da licitação prévia à contratação é subordinada à observância do princípio da proporcionalidade. Há casos em que licitação é impossível ou que sua realização seria incompatível com a satisfação das necessidades coletivas.” (2006, p. 351).


E é assim, pois o princípio da proporcionalidade sugere a idéia de bom senso no trato da coisa comum, na realização dos negócios da Administração, sempre objetivando a finalística satisfação do interesse público.


4.10. O princípio do sigilo na apresentação das propostas


O sigilo da proposta de preços é a única fase do certamente, autorizada por lei, a constituir exceção ao princípio da publicidade.


O legislador ao permitir a existência fática de tal exceção, assegurou a lisura e a ampla competição do certame, possibilitando a Administração Pública proceder à seleção da melhor proposta, objetivo central do procedimento licitatório.


O sigilo é obrigatório e o conteúdo das propostas somente pode ser conhecido após a formal abertura dos envelopes. Devassar o conteúdo de proposta apresentada constitui crime contra o procedimento licitatório, inclusive, punível nas formas do art. 94 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, sem prejuízo ao ato de improbidade administrativa capitulado no art. 10, inciso VIII, da Lei nº. 8.429/1992.


Segundo Meirelles (2001, p. 258) “é em razão desse princípio que se impõem a abertura dos envelopes da documentação e proposta em público […].”


Com efeito, é de todo razoável afirmar então que a Administração e os proponentes apenas tomarão conhecimento universal do conteúdo dos envelopes, por ocasião da sessão pública.


O rigorismo perseguido com o sigilo na apresentação da proposta assegura a ampla competição e se alinha ao princípio da isonomia entre os participantes.


De fato, o ponto nuclear do procedimento licitatório é a não ocorrência de fraude que permita a um participante conhecer antecipadamente o conteúdo de proposta apresentada por outro concorrente.


Para Meirelles:


“o sigilo na apresentação das propostas é consectário da igualdade entre os licitantes, pois ficaria em posição de vantagem proponente que viesse a conhecer a proposta de seu concorrente antes da apresentação da sua. Daí o necessário sigilo, que há de ser guardado relativamente em todas as propostas, até a data designada para a abertura dos envelopes ou invólucros que as contenham, após a habilitação das proponentes.” (2001, p. 258/259).


O sigilo das propostas se justifica, visando o interesse comum. Bem por isso, exigi-se sua apresentação em envelopes lacrados e somente abertos em sessão pública. Apenas o conteúdo das propostas e até que sejam abertos os envelopes é que pode permanecer em sigilo. 


Além do mais, compete a Administração preservar a igualdade entre as proponentes. De modo que, guardando o sigilo das propostas até o memento da sessão pública estará cumprindo sua missão, mantendo a lisura, preservando a igualdade e os demais deveres de boa administração, presentes em todas as Constituições livres e democráticas. 


4.11. O princípio da adjudicação compulsória ao vencedor


Segundo Meirelles (2001, p. 260) “o princípio da adjudicação compulsória ao vencedor impede que a Administração, concluído o procedimento licitatório, atribua seu objeto a outrem que não o legítimo vencedor.”


O princípio da adjudicação compulsória não obriga a Administração Pública a efetuar a contratação e não constitui direito ao vencedor do certamente em ser contrato, porém garante ao vencedor o direito de não se preterido ao celebrar negócio com a Administração e, portanto, se a entidade pública for celebrar o negócio então terá que ser com o vencedor do certamente.


As aulas de Meirelles (2001, p. 260) indicam que “[…] o direito do vencedor limita-se a adjudicação, ou seja, à atribuição a ele do objeto da licitação, e não ao contrato imediato.”


Conhecido o resultado do julgamento e realizada a adjudicação, não poderá a Administração Pública dar inicio a nova licitação, revogar a anterior ou protelar a contratação, exceto se interesse público assim requerer.


Portanto, a adjudicação compulsória é o ato administrativo que entrega o objeto da licitação ao vencedor, produz importantes efeitos jurídicos, constituindo-se em ato jurídico declaratório perpetrado pela licitante que proclama o vencedor do certamente e aquele que deverá vir a ser contratado.


4.12. O princípio da vinculação ao instrumento convocatório


Marçal leciona que:


“o procedimento licitatório é disciplinado por Lei, mas também por atos administrativos normativos. O ato convocatório da licitação define o objeto, estabelece pressupostos de participação e regras de julgamento.” (2006, p. 317).


Eventuais erros ou irregularidades constantes do instrumento convocatório podem ser corrigidos, desde que assegurada à mesma publicidade verificada na publicação inicial. O edital é a Lei interna da licitação e antecipa o objeto que será contratado, os requisitos para habilitação dos licitantes, os prazos, o tipo de licitação e a modalidade a ser seguida.


Portanto, o edital convocatório estabelece os limites da competência discricionária da Administração Pública, vinculando – à previamente.


Assim também é o entendimento esposado por Meirelles (2001, p. 259) “o edital é a lei interna da licitação, e, como tal, vincula a seus termos tanto os licitantes como a Administração que o expediu.”


Diógenes, por sua vez, leciona que:


 “o princípio da vinculação ao instrumento convocatório, previsto no art. 3º do Estatuto Federal Licitatório, submete tanto a Administração Pública licitante como os interessados na licitação, os proponentes, à rigorosa observância dos termos e condições do edital ou da carta-convite.” (2009, p. 488).


A seu turno, o juízo de conveniência e oportunidade exercido pela Administração Pública precede a publicação do instrumento convocatório, não há que falar em discricionariedade, após a divulgação do instrumento. Daí em diante os atos emanados no curso do procedimento licitatório passam a ser vinculados.  


Para Marçal:


“ao produzir e divulgar o ato convocatório a Administração Pública exercita juízos de conveniência e oportunidade sobre o objeto a ser contratado, os requisitos de participação, os critérios de seleção do vencedor. Esses critérios objetivos constantes do ato convocatório devem ser observados ao longo do procedimento, com cunho vinculante para os participantes e também pela própria Administração Pública.” (2006, p. 317).


O princípio da vinculação ao instrumento convocatório, portanto, significa dizer que estabelecida as regras, tornam-se obrigatórias para aquele certame, durante todo o procedimento, tanto para a Administração quanto para os licitantes.


5. O DEVER DE LICITAR


Segundo Celso Ribeiro “a Constituição de 1988 não inovou substancialmente esta matéria, a não ser no seu aspecto formal, avocando – a em seus pontos fundamentais para o se o seu próprio texto.” (2001, p. 132/133).


Arremata o mestre enfatizando que:


“atualmente temos um principio constitucional que a impõe de forma genérica na contratação de obras, serviços, compras e alienações, deferida à legislação ordinária tão-somente a tarefa de tecer ressalvas a esse princípio, obviamente não gratuitas, nem desarrazoadas, sob pena de inconstitucionalidade.” (2001, p. 135).


O dever de licitar destaca-se como matéria altamente relevante na ordem dos negócios da Administração.


Com efeito, a licitação constitui-se em um procedimento administrativo formal, destinado à seleção da proposta mais vantajosa à entidade pública. Portanto, o dever de licitar impõe-se, por excelência, a Administração Pública, direta e indireta.


Assim é a inteligência do art. 37, XXI da Constituição Federal.  Vejamos:


“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:


XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”


Atendendo a determinação constitucional, a Lei de Licitação e Contratos Administrativos, estabeleceu:


“Art. 1o  Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.


Parágrafo único.  Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. “


E, mais:


“Art. 2o  As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.


Parágrafo único.  Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada.”    

Assim a União, Estados, Distrito Federal, Municípios, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta, ou indiretamente pela administração direita estão obrigadas a proceder à realização de seus ajustes com particulares, por intermédio de licitação, respeitados os princípios gerais da administração pública, além daqueles especialmente aplicados ao procedimento licitatório e, sobretudo, o interesse público.


Gasparini destaca que:


“a Constituição Federal, com redação que lhe deu a Emenda Constitucional nº. 19/1998, ao anunciar no art. 37, XXI, a obrigatoriedade da licitação para Administração Pública, direta e indireta, não retirou ninguém dessa compulsoriedade […].” (2009, p. 509).


Portanto, os ajustes firmados entre a Administração Pública, direta e indireta, compreendendo os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta, ou indiretamente pela administração pública com particulares para obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses de dispensa e inexibilidade.


6. O OBJETO DA LICITAÇÃO


O objeto do procedimento licitatório é a coisa que a Administração Pública, deseja adquirir, alienar ou contratar. 


Destarte, o art. 2º da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, perfeitamente, sintetizou o objeto da avença pública. Ou seja, as obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, constituem a essência dos desígnios da Administração.


Meirelles (2001, p. 260) endossa nosso entendimento, esclarecendo que “o objeto da licitação é a obra, o serviço, a compra, a alienação, a concessão, a permissão e a locação que, afinal, será contratada com o particular.


Desse modo, a indicação e definição precisa do objeto a ser licitado constituem pressuposto de validade e condição de legitimidade do certame.


As aulas de Meirelles, novamente, corroboram ao nosso entendimento:


“licitação sem caracterização de seu objeto é nula, porque dificulta a apresentação das propostas e compromete a lisura do julgamento e execução do contrato subseqüente. Daí por que a lei declarou expressamente que as obras e serviços somente serão licitados quando houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados […].”(2001, p. 260).


Gasparini, não menos magistral, esclarece que:


“o objeto da licitação de ser descrito no edital, ou na carta convite de modo sucinto e claro, consoante disposto no art. 40, I, da lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública. Quando se tratar de compras o objeto deve, nos termos do art. 14 dessa lei, ser adequadamente caracterizado, e, se tratar de obras ou serviço, deve estar calcado em projeto básico aprovado pela autoridade competente.” (2009, p. 499).


Assim a perfeita descrição do objeto a ser licitado pela Administração Pública é extremante importante para o procedimento licitatório, para execução do futuro contrato a ser celebrado e, sobretudo, para possibilitar o acesso e a ampla concorrência ao certame, de modo que, os particulares poderão dimensionar a real necessidade da entidade pública, decidindo se entram, ou não na disputa.


Desse modo, não é exagerado reiterar que a precisa descrição do objeto a ser licitado constitui pressuposto lógico de validade da licitação.


Segundo Gasparini:


“essa descrição sucinta e clara do objeto da licitação, que não é outra coisa senão a definição do objeto, não pode faltar, sendo, portanto, condição de legalidade do edital e, por via de conseqüência, da licitação e do contrato.” (2009, p. 499).


Portanto, o momento em que a Administração Pública elabora o edital convocatório, ou não carta convite e delimita o objeto a ser contratado, é curial a validade do certame, requisitando técnica, cuidado e equacionamento.


7. A INEXIBILIDADE DE LICITAÇÃO


A inexibilidade de licitação, assim como a dispensa constituem exceções a compulsoriedade de realização do procedimento de licitatório, consagrado no art. 37, inciso XXI da Constituição Federal.


Vejamos:


“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:


XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”


Para Marçal:


“a Constituição escolheu a presunção de que prévia licitação produz a melhor contratação, entendida como aquela que assegura à maior vantagem possível à Administração Pública, com observância do princípio da isonomia, mas a própria Constituição se encarregou de limitar tal presunção, facultando a contratação direta (sem licitação) nos casos previstos por Lei.” (2006, p. 350).


Coerente, portanto, estabelecer que o interesse público, a finalidade e a eficiência motivaram a vontade do legislador Constituinte ao excepcionar a contratação direta.  Assim as obras, serviços, compras e alienações segundo a Lei Fundamental em algumas hipóteses poderão ser negociadas diretamente.


A Lei nº. 8.666, de 21 de junho de 1993, regulamentou no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, os casos em que os negócios da Administração Pública, poderão ser executados sem o respectivo procedimento licitatório, ou seja, as hipóteses de dispensa de licitação enumeradas taxativamente no art. 24 e as hipóteses de inexibilidade de licitação exemplificativamente tarjadas no art. 25 ambas do Codex de Licitações de Contratos Administrativos.


Concentramos nossos estudos nas hipóteses de inexibilidade de licitação, destacando que se enganam aqueles que subjugam o procedimento de contratação direita por inexibilidade assegurado à Administração Pública, por achá-lo um instituto de direito falido, sensível à fraude e ao favoritismo ilegal. Isto porque, o rigor imposto pela lei ao procedimento de contratação direta é ainda mais rigoroso que o próprio procedimento licitatório e, portanto, sob a consciência que abriga à essência da segurança jurídica dos negócios públicos a blindagem é a mesma.


Para Marçal:


“a chamada contratação direta – aquela não precedida de um procedimento licitatório formal, não significa ausência de respeito aos princípios básicos que orientam a atuação administrativa. Permanece o dever de realizar a melhor contratação possível, dando tratamento igualitário a todos os possíveis contratantes.” (2006, p. 351).


A inexibilidade de licitação segundo a inteligência do art. 25 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos ocorrerá sempre que inviável a competição e, portanto, a realização de procedimento licitatório.


Vejamos o texto legal art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição […].


Ora, se a essência do procedimento licitatório está contida na possibilidade isonômica de competição, viabilizando a seleção da proposta mais vantajosa a satisfação dos interesses da Administração Pública. De fato, inexiste razão para realização de licitação nos casos de impossibilidade de competição.


Meirelles ensina que:


“ocorre a inexibilidade de licitação quando há impossibilidade jurídica de competição entre os contratantes, quer pela natureza específica do negócio, quer pelos objetivos sociais visados pela Administração.” (2001, p. 266).


Para Gasparini:


“a inexibilidade da licitação é a circunstância de fato encontrada na pessoa que se quer contratar, ou com quem se quer contratar, que impede o certame, a concorrência; que impossibilita o confronto das propostas para os negócios pretendidos por quem, em princípio, está obrigado a licitar, e permite a contratação direta, isto é, sem a prévia licitação. Assim ainda que a Administração desejasse a licitação, esta seria inviável ante a absoluta ausência de concorrentes. Com efeito, onde não há disputa ou competição não há licitação.” (2009, p. 551).


Já segundo Marçal:


“o art. 25 da Lei nº. 8.666/1993, a inexibilidade de licitação deriva da inviabilidade de competição, fórmula verbal não explicitada pela Lei. O art. 25 contém três incisos, de cunho exemplificativo, cujo exame é essencial para formular o conceito de viabilidade de competição.” (2006, p. 354).


As lições de Di Pietro (2001, p. 302) em igual sentido assevera que “nos casos de inexigibilidade, não há possibilidade de competição, porque só existe um objeto ou uma pessoa que atenda às necessidades da Administração; a licitação é, portanto, inviável”.


Portanto, sempre que impossível à instalação do certamente, calcada na ausência de competição, caracterizada estará à hipótese de inexigibilidade de licitação.


Inexistindo a possibilidade de concorrência, torna-se inútil o certame e absurda a sua exigência.


A seguir, examinaremos com maior cuidado as hipóteses trajadas no art. 25 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que, impõe a Administração Pública, a celebração de negócios a margem do procedimento licitatório, por excelência.


Sem prejuízo, convém destacar que as hipóteses de inexigibilidade de licitação enumeradas na lei, não se constituem in numerus clausus, portanto, aquela lista é meramente sugestiva. A lei admite outras possibilidades, bastando, para tanto, a inviabilidade da licitação.


Assim é a doutrina de Celso Antonio:


“(…) sempre que se passa detectar um induvidosa e objetiva contradição entre o atendimento a uma finalidade jurídica que incumbe à Administração perseguir para o bom cumprimento de seus misteres e a realização de certame licitatório, porque este frustraria o correto alcance do bem jurídico posto sob sua cura, ter-se-á de concluir que está ausente o pressuposto jurídico da licitação e, se esta não for dispensável com base em um dos incisos do art. 24, deverá ser havida como excluída com supedâneo no art. 25, caput.” (2001, p. 491).


Sem embargos, examinaremos também o processo de justificativa exauriente do procedimento de inexibilidade de licitação. Segundo, Diógenes a justificativa constitui um dossiê elaborado pela Administração Pública para sustentar o ato de contratação direta. Tal dossiê deve observar disposições contidas no art. 26 e seguintes do Codex de Licitações e Contratos Administrativos, sob as penas do art. 89 do mesmo diploma.


Com efeito, a justificação pela contratação direta por inexibilidade de licitação, é de vital importância a Administração Pública e, sobretudo, para o administrador. Isto é, o administrador deverá demonstrar indubitavelmente que a contratação direta por inexibilidade, deu-se por imprescindibilidade, inviabilidade de competição e interesse público.


7.1. Hipótese de fornecedor exclusivo


É de todo razoável que, existindo apenas um fornecedor para atender as necessidades da Administração Pública, a Lei a autorize a celebração da contratação diretamente.


Com efeito, tal previsão restou consignada no inciso I, do art. 25 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.


Vejamos:


“Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:


I – para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes.”


Diógenes (2009, p. 553) acentua que “a licitação só tem razão de ser nas hipóteses em que se pode instaurar uma competição entre os licitantes interessados em negociar com a entidade, em princípio, obrigada a licitar.”


Já para Marçal:


“a inviabilidade de competição pode resultar da ausência de pluralidade de alternativas de contratação para a Administração Pública. Quando existe única solução e um único particular em condição de executar a prestação, a licitação seria imprestável.” (2006, p. 354).


Destarte, quando se fala em fornecedor exclusivo, não há espaço para licitação, sob pena de produzir ônus desnecessário aos cofres públicos. Logo vedado ao administrador público executar a licitação.


Para Diógenes a exclusividade pode ser absoluta, ou relativa:


“É absoluta quando no país só há um fornecedor ou único agente (produtor, empresa ou representante comercial) para prover os interesses da Administração Pública. Este é o fornecedor exclusivo. (2009, p. 553) […] relativa quando no país há mais de um fornecedor, empresa ou representante comercial, mas na praça há apenas um.” (2009, p. 554).


Meirelles comunga do mesmo entendimento:


“a lei considera inexigível a licitação para aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor ou vendedor exclusivo, porque seria inútil licitar o que não é possível de competição de preço ou de qualidade.” (2001, p. 267).


Cabe ressaltar ainda que, uma vez constituída a hipótese que determina a contratação direita por inexibilidade de licitação, embora, parece-nos incongruente, a Administração Pública estará impedida de optar por esta, ou aquela marca. No entanto, considerando que o fornecedor é exclusivo, logo não conseguirá a Administração negociar com outro, parece-nos desnecessário limitar a discricionariedade gestor à marca do objeto pretendido pela entidade contratante.


Para Meirelles (2001, p. 268) “marca poderia ser conveniente, justificando a inexibilidade de licitação.”


Todavia, a inteligência do legislador veio na contramão, limitando a discricionariedade da Administração, inclusive, impondo a necessidade de instruir o processo de justificativa com a comprovação da condição de fornecedor exclusivo, por intermédio de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local, ou seja, as Juntas Comerciais, ou entidades equivalentes.


7.2.  Hipótese de notória especialização e serviço de natureza singular


Aqui nos deparemos com a hipótese em que a Administração Pública, necessita da melhor contratação, porém em viés de qualidade técnica, “know-how.” 


Vale ressaltar que, a melhor contratação, que a entidade pública deve perseguir, necessita aliar qualidade ao preço.


No entanto, nem sempre a contratação mais econômica será a melhor contratação. Por vezes, a Administração necessitará, por exemplo, efetuar a contratação de profissional de solar especialização, notadamente que almejando o melhor resultado em prol dos interesses públicos, situação que impõe a realização da contratação direta, desde que observada a paridade de preços costumeiramente praticados no mercado. Isto é, não é essa modalidade de contratação direita, passaporte para o superfaturamento dos negócios públicos.


Dispensar a licitação por inexibilidade, nesse caso, pressupõe que a Administração Pública busca a contratação de profissional singular, de natureza ímpar, altamente gabaritado e notadamente reconhecido, porém que jamais se submeterá a procedimento licitatório prévio. A singularidade é tal ordem que o serviço se destaca dos demais ofertados por empresas, ou profissionais militantes do mesmo ramo, tornando-se único. 


Vejamos a inteligência da Lei:


“Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:


II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação.”


Para Meirelles os:


“serviços técnicos profissionais especializados, no consenso doutrinário, são os prestados por quem, além de habilitação técnica e profissional, exigida para os técnicos profissionais em geral, aprofundou-se nos estudos, no exercício da profissão, na pesquisa cientifica, ou através de curso de pós-graduação ou de estágios de aperfeiçoamento. Bem por isso, Celso Antônio considera-os singulares, posto que marcados por características individualizadoras, que os distinguem dos oferecidos por outros profissionais do mesmo ramo.” (2001, p. 268).


O art. 13 do Codex de Licitações e Contratos Administrativos apresenta a lista de serviço técnico profissional especializado, assim considerados para os fins de inexibilidade de licitação nos termos do art. 25, inciso II do mesmo diploma.


Vejamos a seguir a inteligência do dispositivo:


“Art. 13.  Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:


I – estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;


II – pareceres, perícias e avaliações em geral;


III – assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;


IV – fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;


V – patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;


VI – treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;


VII – restauração de obras de arte e bens de valor histórico;


VIII – (Vetado).”


Gasparini ensina que:


“a contratação de serviços técnicos profissionais especializados somente será legítima se tratar de um dos serviços listados no art. 13, e, ainda assim, se de natureza singular, conforme exigido pelo inciso examinado. Por natureza singular do serviço há de se entender aquele que é portador de tal complexibilidade executória que individualiza, tornando-o diferente dos da mesma espécie, e que exige, para sua execução, um profissional, ou empresa de especial qualificação.” (2009, p. 557).


Assim não basta que, o serviço pretendido pela Administração Pública, seja único, pois é imperioso que também esteja listado nas linhas do art. 13, sob pena de impossibilitar a contratação direta por inexibilidade.


Logo, as contratações de serviços técnicos enumerados no art. 13 da Lei nº. 8.666/1993, de natureza singular, com profissionais de notória especialização, desde que não se refiram a serviços de publicidade, prescinde de procedimento licitatório prévio.


Portanto, apenas as contratações de serviços podem ser celebradas diretamente por meio da inexibilidade de licitação, exigindo apenas  a especialização dos serviços, gravados de complexibilidade, essencialidade, relevância e indispensabilidade.


7.3.  Hipótese de contratação de profissionais do setor artístico


A contratação direta por inexibilidade de licitação, de profissionais do setor artístico é a derradeira das hipóteses proposta pela Lei de Licitações e Contratos Administrativos, cuja previsão restou expressamente consignada no art. 25, III daquele Codex.


Vejamos:


“Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:


III – para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.”


Gasparini explica que:


“por força do estabelecido no inciso III do art. 25 do Estatuto Federal Licitatório, é inexigível a licitação para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou por intermédio de empresário, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.” (2009, p. 560).


Vê-se, portanto, que a contratação de qualquer profissional do setor artístico, prescindirá de procedimento licitatório prévio, podendo o artista ser contratado diretamente, ou ainda por meio de empresário.


Contudo, é preciso destacar que, muito embora, a Lei expressamente autorize a contratação de qualquer profissional do setor artístico diretamente por inexibilidade de licitação, existe um problema logístico a ser enfrentado pela Administração Pública.


Ocorre que, a Lei impõe a notoriedade do artista, sendo este consagrado pela critica especializada, ou ainda reconhecido popularmente, situação que deve ser examinada com cuidado e equacionamento.


Vejamos, nesse sentido, as orientações de Meirelles:


“a nova Lei, endossa a doutrina, que equipara os trabalhos artísticos aos serviços técnicos profissionais especializados, prescreve a inexigibilidade de licitação para a contratação de profissionais de qualquer setor artístico, diretamente ou através de seu empresário. O essencial para legitimar a dispensa do procedimento licitatório é que o artista seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.” (2001, p. 269).


Já para Diógenes:


“o dispositivo em apreço não traz grandes dificuldades de interpretação, salvo no que concerne à consagração pela crítica especializada ou pela opinião pública. Qual é essa critica especializada? A local? A regional? A nacional? Cremos que se pode afirmar ser a critica local, regional ou nacional, em razão do valor do contrato. Assim, se o contrato estiver dentro do limite de convite, será local; se estiver dentro do limite da tomada de preço será regional; se estiver dentro de limite de concorrência será nacional. O mesmo deve-se afirmar em relação à opinião pública.” (2009, p. 560).


É assim, pois a Lei impõe sua aplicação no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo, portanto, uma norma abstrata para aplicação em casos concretos, portanto, as singularidades dos executores da norma devem ser objetivo de cuidadosa ponderação, homenageando-se sempre o interesse público.  


8.  O PROCESSO DE JUSTIFICATIVA PELA CONTRATAÇÃO DIRETA


Dispõe a Lei de Licitações e Contratos Administrativos:


“Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.


Parágrafo único.  O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:


I – caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;


II – razão da escolha do fornecedor ou executante;


III – justificativa do preço;


IV – documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados.”


Visto seja, portanto, que sempre que a Administração Pública, se resolver pela contratação direita por dispensa ou inexibilidade de licitação, deverá reduzir a termo sua motivação, justificando-a pormenorizadamente. 


Porquanto, diferentemente não poderia ser, já que no trato da coisa pública, se faz necessária a observância de toda prudência e cautela possível, buscando a preservação de todas as recomendações contidas no art. 37 e seguintes da Constituição Federal e, acima de tudo, almejando o interesse público.


A justificativa do administrador público em se resolver por efetuar a contratação diretamente com o particular, deve compor o expediente administrativo, compulsoriamente remetido a autoridade superior daquela entidade pública para ratificação e publicação na impressa oficial dentro do prazo de 05 (cinco) dias. A observância de tal procedimento é condição de validade e eficácia do ato, sujeitando sua inobservância aos termos da lei de improbidade administrativa.


Leciona Gasparini:


“a contratação com base nas hipóteses de inexibilidade de necessita justificativa, que é o arrazoado preparada e assinado pelo agente responsável pela analise da viabilidade ou não da licitação. Se restar inviável, o processo assim instruído deverá ser levado à autoridade superior para, se for o caso, ratificar e publicar dita justificativa acompanhada o ato de ratificação.” (2009, p. 552).


Meirelles, no mesmo sentido, esclarece:


“a dispensa e a inexibilidade de licitação devem ser necessariamente justificadas e o respectivo processo deve ser instruído com elementos que demonstrem a caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso; a razão da escolha do fornecedor do bem ou executante da obra ou do serviço; e a justificativa do preço. Com esses elementos, a decisão da autoridade competente deverá ser submetida ao superior hierárquico para ratificação e publicação na impressa oficial, no prazo de cinco dias, como condição de eficácia dos atos.” (2001, p. 270).


Portanto, o caminho a ser trilhado pelo administrador público em busca da contratação direta por inexibilidade de licitação é prolixo e altamente burocrático. Emblemática que decorre da blindagem legal ao instituto da contratação direta, notadamente com o viés de desestimular sua prática de forma diuturna, tornando-a escolha do administrador nos casos em que, de fato, o interesse público exigir.


Com efeito, o rigorismo imposto a contratação direta, reflete a preocupação do legislador no manejo da coisa pública, de modo que, os princípios Constitucionais orientadores do exercício da atividade administrativa, foram prestigiados e levados a termo.


Destarte, vale ressaltar que, muito embora, a inexibilidade de licitação estabeleça limites à discricionariedade do administrar público, uma vez que, o cerne da licitação restará prejudicada pela inexistência de competição, ficando, portanto, vedada a realização do procedimento licitatório, não se constitui em autorização para a Administração Pública, contratar desproporcionalmente.


Impõe-se a necessidade de observar o equilíbrio econômico na celebração do negócio.


Porquanto, é defeso a Administração pactuar com a gana extorsiva dos particulares, contratando apenas se mantido os preços usuais praticados no marcado. 


O instituto da contratação direita impõe os mesmos deveres de contratação praticados no procedimento licitatório. Devendo a Administração Pública perseguir sempre o interesse público. 


Bem por isso, Meirelles destaca que:


“em qualquer dos casos de dispensa ou de inexibilidade de licitação, comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou prestador de serviço e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.” (2001, p. 270).


Assim, o administrador público deve garantir a realização da melhor contratação, observando todos os procedimentos legais e formais estabelecidos na lei nº. 8.666/1993, ainda que inexigível a licitação, sob pena de ser responsabilizado pessoalmente, sujeitando-se, inclusive, as sanções previstas nos arts. 89 e seguintes da lei de Licitações e Contratos Administrativos.


Daí a necessidade de instruir pormenorizadamente o processo de justificativa de contratação direita, a fim de atribuir ao ato a segurança jurídica perseguida pelo legislador, afastando assim os malefícios da responsabilização pessoal e da improbidade administrativa.


CONCLUSÃO


A licitação é a regra Constitucional, de modo que, as contratações diretas a cargo da Administração Pública, constituem expressa exceção ao principio da compulsoriedade do procedimento licitatório.


Importa-nos, especificamente, as hipóteses de contratação direta calcada na inexistência de competição prevista no art. 25 da Lei das Licitações e Contratos Administrativos.


A inexibilidade de licitação, ao contrário da dispensa, fulmina a discricionariedade do administrador público, porquanto as situações em que a competição se demonstra impossível e inviável, o administrador público estará diante de uma situação em que o objeto de interesse da Administração Pública deverá ser contratado diretamente com o particular, sendo-lhe defesa à realização do procedimento licitatório, inclusive, sob pena de responsabilidade.


Embora, partilhamos do entendimento que, de fato, a melhor opção é sempre a contratação precedida do respectivo procedimento licitatório, admitimos que haverá casos em que a realização da licitação, sacrificará desnecessariamente o Erário, situação que colide com o interesse público, prevalecendo sempre este último.


As hipóteses de contratação direta por inexibilidade constituem exceção a diretriz Constitucional e, assim sendo, merece tratado cauteloso. Não é a contratação direta e, a toda evidência, não poderia ser palco da imprudência e imoralidade, deixando o administrador público livre para decidir de acordo com o seu subjetivismo.


Assim sendo, a contratação direta, inclusive por inexibilidade de licitação também está sujeita aos limites legais e Constitucionais. Isto quer dizer que o administrador público, igualmente, estará compromissado com os deveres de boa-administração, devendo efetuar a melhor contratação em razão do interesse público.


Insta esclarecer que é apenas o interesse público que motiva a exceção Constitucional, autorizando a contratação direta.


Assim se enganam aqueles que subjugam o procedimento de contratação direita, por inexibilidade, assegurada a Administração Pública, por achá-lo um instituto de direito falido, sensível a fraude a ao favoritismo ilegal. Isto porque, o rigor imposto pela Lei ao procedimento de contratação direta é ainda mais cauteloso que o próprio procedimento licitatório e, portanto, sob a consciência que abriga à essência da segurança jurídica dos negócios públicos a blindagem imposta é a mesma.


Cremos que, as hipóteses de contratação direta, especialmente as por inexibilidade de licitação, convivem em harmonia com os desígnios Constitucionais, com os deveres de boa-administração e com o interesse público, revelando a sapiência do legislador.


Destarte, não nos parece sábio engessar as relações comerciais da Administração Pública, sobretudo, em tempos de globalização, crescimento e incerteza.


Outrossim, não encontramos entendimento diferente nas mais autorizadas doutrinas que consultamos na elaboração do presente estudo. Aliás, parece-nos que pensamento diverso, de certo modo, estaria a negar o óbvio, pois não se cura o enfermo lhe cortando o pé fora, logo o legislador ao excepcionar tais situações, legalmente pré-fixadas, adotou posição coerente, louvável e condizente com o interesse público.


 


Referências bibliográficas

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 14ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2001.

FILHO, Marçal Justen. Curso de Direito Administrativo. 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 9ª edição. Belo Horizonte: Editora DelRey, 2003.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. 5ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2001.

JÚNIOR CRETELLA, José. Curso de Direito Administrativo. 17ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2001.

DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 13ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2001.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2001.


Notas:

[1]Destarte, preferirmos nos filiar à corrente doutrinaria que prefere a mitigação terminológica, assim convenciona-mos empregar a expressão procedimento licitatório, embora, a doutrina também admita o uso  da designação processo, ambas são bem aceitas nas obras administrativistas clássicas, não havendo, portanto, que se falar em impropriedade no uso da designação que adotamos.

[2] Ato vinculado na compreensão de Celso Ribeiro Bastos “são aqueles em que a Administração Pública não dispõe de qualquer liberdade para sua expedição. Para essa espécie de ato a lei regula antecipada e exaustivamente o comportamento a ser seguido pelo agente público. É dizer, a lei estabelece os requisitos e condições para a sua realização.” (2001, p.115).

Informações Sobre o Autor

Emerson Martins Santos

Advogado, graduado em direito pela Faculdade Fapan de São Bernardo do Campo


Equipe Âmbito Jurídico

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