Resumo: A acelerada revolução tecnológica trouxe dentre outras conseqüências, a transformação nas relações de trabalho. A flexibilização e a descentralização do Estado surgem como necessários para a modernização do Direito do Trabalho, com vistas à geração de empregos. Contudo, a flexibilização e a própria modernização devem ser trabalhadas de forma a não perderem de vistas os princípios gerais contidos na Constituição Federal, no tocante à valorização do homem frente ao capital. Do contrário, qualquer processo de flexibilização que não atenda esta ordem estará em desacordo com a Constituição Federal.
Palavras chaves: avanço tecnológico; tecnologia e o Direito do Trabalho; novas relações de trabalho.
Abstract: The quick technological revolution brings many consequences, include the transformation of labor´s relation. The flexibilization and the decentralization of State appear as necessary to the modernization of Labor`s Law, to create employment. However, the flexibilization and the modernization must work considering the general principles of Federal Constitution, for value the man in front of the capital. Several, any process of flexibilization must not be attend this order will be contrarious of Federal Constitution.
Key words: technological progress, technology and the Labor Law; new labor´s relation
Sumário: I – Introdução: O desenvolvimento tecnológico e a necessidade de reformulação. II – Do significado de avanço tecnológico III – Do avanço tecnológico e sua incidência sobre os princípios do Direito do Trabalho IV – Da Necessidade da Qualificação da Mão-de-Obra V – Conclusões VI- Bibliografia
I – Introdução: O desenvolvimento tecnológico e a necessidade de reformulação.
O Direito do trabalho tem pouco mais de cem anos, sendo fruto em parte das distorções sociais da Revolução Industrial Européia. No Brasil, o Direito do Trabalho positivado manteve-se quase que inerte durante o último século, até que um novo período, principalmente a contar da década de 90, ocorreu várias modificações nas relações de trabalho, principalmente em razão do grande avanço tecnológico ocorrido.
Deste avanço fez surgir de forma mais rápida a visão do velho, do descartável, ao ponto que propostas de alteração das normas trabalhistas surgiram fundamentadas na necessidade de modernizar o Direito do Trabalho de forma a fazê-lo acompanhar as mudanças ocorridas nas relações de trabalho.
Extrapolando-se o limite da norma e atentando-se para o valor, tem-se que toda norma jurídica é criada com determinado propósito. Por exemplo, uma determinada norma visa combater a inflação, outra reduzir o desemprego. O conteúdo de determinada norma jurídica, além de normativo é também fático e axiológico. Para o Direito do Trabalho, a mudança ocorrida nas formas de relação de trabalho fez com que se apresentasse uma aparência de destituição de valor da norma jurídica trabalhista, a ponto da Consolidação das Leis do Trabalho ser vista como algo obsoleto, para não dizer ultrapassado.
Como resultado dessa acelerada revolução tecnológica, o fenômeno da globalização tem proposto a liberalização das economias nacionais e a expansão dos mercados, com graves e profundas repercussões no Direito do Trabalho, as quais serão analisadas no decorrer desse estudo.
Seguindo, o mundo atual passa por uma fase de transição, resultante, dentre vários fatores, da necessidade das empresas se adequarem a métodos eficientes de competição econômica em um cenário de livre fluxo de mercados. Soma-se a esse fator a profunda revolução tecnológica, e, de outro, a constante necessidade do combate ao desemprego. Ao mesmo tempo em que as empresas tentam reduzir os seus custos e melhorar a qualidade de sua produção, tem-se a redução também no número de empregos, e a solução liberalizante que se apresenta é deixar que o mercado de trabalho se auto-regule, sem a interferência do Estado na relação de trabalho.
Nesta nova economia, o sistema de proteção ao trabalho vem cada vez mais sendo apontado como um entrave ao livre desenvolvimento do país. Por este motivo, a tese da flexibilização ganha hoje generalizada aplicação em qualquer ramo da ordem jurídica que necessite adaptar-se à realidade atual. Um dos fundamentos criados para a flexibilização é o seguinte: sendo verdade que o Direito é reflexo da sociedade, também é verdade que aquele deva acompanhar a evolução desta. Particularizando para o Direito do Trabalho, tem-se que ele deve transformar-se de forma a regular as novas relações de trabalho que estão surgindo.
É neste sentido que os princípios estão perdendo força e importância em sua aplicação. Destarte, os sistemas jurídicos regem-se por princípios tais como liberdade, igualdade, democracia, etc., princípios estes que, em virtude de se reportarem a valores essenciais, desempenham o papel de fundamento das normas jurídicas, ganhando maior destaque para os ordenamentos jurídicos, tendo em vista o exame de suas funções e presença no corpo das constituições contemporâneas. Contudo, esses mesmos princípios muitas vezes esbarram nas exigências de mercado, que parece não estar muito preocupado com a dignidade da pessoa humana e sim com a busca incessante do lucro, a cada dia de forma mais rápida e a menor preço.
Dentro desse contexto, é possível até ser afirmado que o princípio contido no artigo 7º da C.F. , que trata da condição mais benéfica ao trabalhador, da valorização do trabalho contido no artigo 170 ou no artigo 193, todos do texto constitucional, acabam caindo por terra frente ao crescimento do desemprego, do sub-trabalho, da redução do salário e da inexistência de políticas públicas de qualificação profissional, que é o quadro que aparece desenhado para as próximas décadas no Brasil. Ou seja, ou os princípios não se concretizam ou a Constituição Federal é superada pelas exigências do mercado.
Por outro lado tem-se em face das novas relações de trabalho, num plano mais específico para o Direito do Trabalho. A necessidade de sua renovação é colocada como algo absoluto, sob pena dele destituído de valor, sem deixar de ter como norteadores os princípios constitucionais estabelecidos. A título de exemplo, pode ser apanhado o elemento pessoalidade. Ou seja, o trabalho sob vínculo de emprego deve ser prestado com o caráter de pessoalidade, pelo próprio trabalhador contratado. No entanto, diante do avanço tecnológico existente, muitos trabalhadores no Brasil já prestam seus serviços via internet, dentro de sua própria casa, sem ao menos conhecer pessoalmente a empresa que o contrata, conhecido como trabalho despersonalizado.
São situações como esta que devem ser sanadas através da chamada flexibilização das normas trabalhistas, que nada mais é que ajustar as leis a uma nova ordem de produção, de maneira a fazer com que essa legislação atenda concretamente os anseios sociais de forma que possa propiciar o incremento da geração de emprego, sem, contudo deixar de atender os princípios constitucionais maiores. Sendo assim, pode ser extraída uma conclusão parcial. Ou seja, que a flexibilização ou a modernização do Direito do Trabalho deve vir através de um processo de atualização do Direito do Trabalho, sempre buscando o atendimento dos princípios constitucionais da valorização do trabalho, da dignidade da pessoa humana, da produção da justiça social, através da elevação do nível de vida do trabalhador e não na busca do barateamento da mão-de-obra, com a conseqüente coisificação do homem.
Caso os estudos em torno da flexibilização não estejam sendo feitos nesse sentido, em face da Constituição Federal, qualquer mudança estará eivada do vício da inconstitucionalidade. Por essa razão defende-se a flexibilização de acordo com os princípios constitucionais atualmente vigentes, sob pena de se ter através desse processo a sobreposição dos interesses meramente econômicos sobre os sociais ou então o trabalho não mais estar voltado à produção de bens sociais e sim à produção de resultados diversos, divorciados dos objetivos perseguidos pelo Estado Democrático de Direito.
II – Do significado de avanço tecnológico
Para uma melhor conceituação de avanço tecnológico, faz-se relevante a análise de todo o processo que tornou necessária a expansão tecnológica, em face da necessidade de aumento de produtividade e da busca da maior eficiência no uso dos recursos naturais e tecnológicos.
Depara-se hoje a humanidade com um novo ciclo de relações de trabalho ou de modo de produção chamado de globalização sócio-econômica, que pode ser conceituada como uma crescente integração internacional da produção, isto é, uma atuação em espaço universal. É ela decorrente dos efeitos da Terceira Revolução Industrial, da formação de blocos econômicos e áreas de livre comércio e da interdependência dos mercados mundiais.
Destarte, um fator considerado essencial para a tendência à globalização é o fator tecnológico. Tecnologia significa a aplicação da ciência a tarefas de ordem prática. Aplicada tanto à produção quanto ao comércio, é o fator diferenciador dos tempos atuais em relação aos momentos econômicos que precederam a globalização.
No caminho do desenvolvimento tecnológico e do processo de globalização , novas formas de competição entre empresas e sistemas econômicos começam a surgir. Essa competição se volta principalmente para a tecnologia dos processos produtivos. Buscaram-se investimentos diretos em regiões mundiais onde as vantagens eram muitas, como por exemplo, mão-de-obra mais barata, embora nem tanto qualificada, beneficiando, portanto os países menos desenvolvidos. No caso, a qualificação da mão-de-obra já passa a ser um fator de menor importância, partindo-se do pressuposto que em um modo de produção altamente tecnificado necessita-se de um menor número de trabalhadores qualificados. Inclusive esta é uma outra questão a ser enfrentada, ou seja, a redução da necessidade de trabalhadores qualificados e também a redução do número de trabalhadores desqualificados.
Para muitos autores, a tecnologia significa a produção sem interferência do fator humano ou, com a mínima interferência possível. A atividade do trabalhador passa a recair sobre o controle do sistema produtivo. Substituem-se as tarefas repetitivas por um processo baseado em modelos de informática. Assim, a atividade do trabalhador, que consistia na materialidade do trabalho ou na habilidade do uso de máquinas e ferramentas, passou a recair sobre o controle do sistema produtivo.
Buscam-se cada vez mais trabalhadores com conhecimentos técnicos, com espírito de iniciativa e capacidade de comunicação, consoante a necessidade imposta pelas características da economia moderna. A esses trabalhadores, sem dúvida que se poderia até mesmo falar em liberalização do mercado de trabalho, no sentido de reduzirem-se as normas de proteção, visto que terão força para negociarem o preço da sua força de trabalho no mercado.Agora, e os demais trabalhadores? Aqueles sem qualificação técnica, utilizados em tarefas outras de menor importância, cujo contingente é maior do que as necessidades do mercado? Como deixar esses trabalhadores jogados à própria sorte?
Sendo assim, é importante frisar a situação em que se encontra o mercado de trabalho no mundo e no Brasil. Quais as necessidades desse mercado. Que tipo de trabalhador haverá em um futuro próximo? Quais as necessidades desses trabalhadores, que será medida de acordo com o seu grau de importância no mercado econômico? Partindo dessas variáveis é que será possível trabalhar com o Direito do Trabalho, de forma a que atenda essa nova situação. Ou seja, a atualização do Direito do Trabalho está vinculada a essa nova realidade econômica, levando-se em conta a elevação dos princípios trabalhistas. Contudo, os princípios trabalhistas passarão por mutações frente às novas formas de produção do trabalho? Não pode ser esquecido que princípio é a essência, a “seiva da árvore” que a nutre, fazendo-a dar frutos, encontrando-se dispostos e formando um todo harmônico, presos a uma finalidade. Caso passem por mutações, a essência do Direito do Trabalho estará sendo transformada.
III – Do avanço tecnológico e sua incidência sobre os princípios do Direito do Trabalho
Os princípios gerais se justificaram na era moderna em face de própria insuficiência das normas jurídicas, seja como meio de preencher lacunas, seja como meio interpretativo da própria norma jurídica[1]. Trata-se de um critério integrativo das normas que compõem um dado sistema jurídico. Sem os princípios não existe sistema ou ordenamento jurídico sistematizável nem suscetível de valoração, fazendo com que as normas jurídicas sejam reduzidas a um amontoado de normas positivas desarticuladas[2].
Desta feita, nota-se que os princípios são na verdade uma das maiores expressões de valor, de finalidade, de integração, razão pela qual fica difícil, por exemplo, trabalhar com uma determinada variação normativa que acabe por produzir a redução ou desqualificação do trabalho frente ao capital. Estar-se-ia criando um descompasso em adotando-se a regra da sobreposição dos fins econômicos sobre os fins sociais, de forma a acabar por gerar uma desarmonia sistêmica.
Princípios são as bases norteadoras de um sistema, são os alicerces, os fundamentos da ciência.
A Constituição Federal estabelece em seu artigo 1º o princípio dos valores sociais do trabalho. Sendo assim, os instrumentos normativos relativos às relações de trabalho devem objetivar a prevalência desse princípio constitucional. Além disso, há uma gama de princípios que a Carta Magna ratifica em seu conteúdo, havendo a dignidade do trabalhador, a valorização do trabalho humano, a justiça social, função social do empregado, busca do pleno emprego, dentre outros que são realmente valiosíssimos e que já foram mencionados neste trabalho.
No mundo do Direito do trabalho, como toda a ciência, existem também princípios peculiares a sua essência. Dentre vários, tem-se o princípio da proteção do trabalhador, sendo corolários os Princípios “in dubio pro operario”, da norma mais favorável, da condição mais benéfica, da primazia da realidade, da integralidade e intangibilidade dos salários, dentre outros. Há também o princípio da continuidade do emprego e o da irredutibilidade do salário. Todos esses diversos princípios devem ser observados, tomando-se como parâmetro as alterações que ocorreram nas relações de trabalho em face em grande parte do avanço tecnológico.
Com o atual avanço tecnológico que se faz presente nos dias atuais, houve a substituição da mão-de-obra humana pelas máquinas, trazendo em parte a redução do número de empregos. A mão-de-obra tornou-se abundante, as funções são desempenhadas por máquinas e o emprego tornou-se cada vez mais escasso e precioso, principalmente nos países chamados de periféricos, incluindo-se nessa classificação o Brasil. Conseqüentemente, os trabalhadores, em busca da sobrevivência, acabam por fazer qualquer acordo e a força de trabalho passa a ser tratada como qualquer outra mercadoria, cuja lei do mercado ( lei da oferta e da procura ), acaba regulando o preço e as próprias condições de trabalho. Outras formas de trabalho surgem ao mesmo tempo e o trabalho sob o crivo do “vínculo de emprego” foi sendo tratado como algo que não responde mais aos anseios e necessidades do novo mundo do trabalho.
Houve a mudança de paradigmas nas formas de relação de trabalho, sendo que com a produção automatizada e reestruturada, outro tipo de trabalhador passou a existir. Trava-se uma dura batalha, com a globalização sendo colocada como uma afronta ao Direito do Trabalho ao eliminar o emprego através da automação e quando da divisão dos empregos ao redor do planeta. Busca-se grandemente a disponibilidade de mão-de-obra qualificada para se ajustar aos novos requisitos de flexibilização do trabalho, sofisticação no atendimento a demanda e à existência de uma infra-estrutura de serviços de apoio ao processo de manutenção das empresas e de globalização intensificada. O grande princípio norteador do Direito do Trabalho, que é o princípio tutelar do trabalhador é apresentado como tendo caducado com o novo modelo de produção da segunda metade do século XX.
O Direito do Trabalho, que foi criado como forma de manter a harmonia social, devido ao avanço tecnológico e a globalização da economia, é tratado como protetor ao extremo, a ponto de servir como um empecilho ao próprio trabalhador. Em nome da manutenção do emprego, defende-se a quebra de qualquer forma de intervenção do Estado nas relações de trabalho. A fim de salvaguardar a população, tenta-se retirar um dos seus instrumentos de proteção. Na busca da sobrevivência, a realidade gritante da substituição do homem pela máquina, é defendida a tese da necessidade do enfraquecimento dos seus princípios e bases a fim de ajudar efetivamente os trabalhadores a sobreviver nessa economia globalizada. Isso se deve ao fato de que a exclusão social agrava-se à medida que avança o processo econômico, com profundos reflexos tanto em países que estão plenamente inseridos no processo de globalização, como naqueles que são meros espectadores da montagem da Nova Ordem Mundial[3].
Atualmente o trabalho humano vem sendo sistematicamente reduzido pelo processo produtivo e no próximo século o trabalho de massa, na economia de mercado, encontrar-se-á cancelado em quase toda nação industrializada do mundo.
É notório que o avanço tecnológico é benéfico para a economia mundial. Entretanto, implicitamente torna-se maléfico para a massa de trabalhadores que perdem seus empregos por serem substituídos pelas máquinas, e isso acarreta uma desintegração da classe de trabalhadores, com indicações para a segmentação.
Ao analisar esse contexto depara-se com um mundo do trabalho marcado pela heterogeneidade em relação a qual não mais se ajusta a legislação trabalhista clássica, de caráter rígido e protecionista. Há um choque entre o avanço tecnológico e os princípios do direito do trabalho, que para tornarem-se compatíveis devem passar por um processo de flexibilização. Agora, seria possível flexibilizar também princípios? O princípio da dignidade humana poderá ser flexibilizado, do direito ao trabalho, da proteção do trabalhador face à sua situação de desigualdade que agora é mais desigualdade ainda?
Existe a necessidade de flexibilização das normas trabalhistas, principalmente frente às novas formas de contratação, que quase regra geral apontam para a precarização das relações de trabalho. O tempo de trabalho passou a ter uma curta duração, podendo ser bimestral, trimestral, com o intuito de acompanhar a economia, dentro do seu processo de constantes mutações; o trabalho por tempo parcial pode até tornar-se a regra geral; a diminuição de salários em troca da garantia de emprego também é um fator que se justifica perante a máxima “é melhor pingar do que faltar”; o crescente desprestígio da estabilidade do emprego frente as necessidades de constantes mudanças do mercado. Não obstante, tudo isso vem de encontro à concretização do princípio da proteção à dignidade do trabalhador?
No direito pátrio, alguns mecanismos de flexibilização podem ser utilizados com respaldo na Carta Magna vigente, sendo através de contratação coletiva e do acordo coletivo. No artigo 7º, VI da Constituição Federal, o princípio da irredutibilidade do salário não é visto como algo absoluto, podendo-se através de acordo ou convenção coletiva reduzir salários ou a duração do trabalho, que se encontra nos incisos XII e XIV do mesmo artigo. Em tais hipóteses o constituinte originário admitiu a mudança por acordo ou convenção coletivos de trabalho justamente para proteger o empregado de um enfrentamento com o seu empregador. Ou seja, em uma primeira leitura dessa forma de encaminhamento a Constituição Federal buscou resgatar o coletivo, que a muito vem sendo destacado, sobrepondo-o ao individual, destoando-se assim dos ideários pregados pela globalização.
Na perspectiva do direito do trabalho flexibilizado, já não se pode dizer que o princípio da norma mais favorável seja o traço de maior relevo à vista da economia atual. Mediante convenção ou acordo coletivo, o salário pode ser reduzido, os períodos de trabalho aumentados ou diminuídos, as formas atípicas de contrato multiplicadas, a garantia da estabilidade modificada, a subcontratação difundida. Conseqüentemente, esse princípio deixa de ser hegemônico e sofre uma quebra ditada pela lei de mercado. O mercado vai determinar qual é a norma mais favorável. Deixar de receber férias, por exemplo, poderá ser visto como favorável ao trabalhador se comparado com o fato que pode ficar desempregado. E’ a chamada visão do mínimo. O trabalhador olha para o mínio e agradece por ainda não ter chegado lá.
A flexibilização, ainda que tida como necessária não pode vir a alterar os princípios norteadores do direito do trabalho, que devem sobreviver. E, a proteção do trabalhador frente ao grande avanço tecnológico ocorrido traduz-se na não transformação da força de trabalho em mercadoria, de forma a fazer com que os princípios constitucionais sejam garantidos, especialmente o contido no artigo 6º, que trata dos direitos sociais[4], do artigo 170, que mostra a ordem econômica sendo fundada na valorização do trabalho humano[5] e do artigo 193, que define os objetivos a serem alcançados pela ordem social[6], todos da Constituição Federal. Em conclusão, a visão do mínimo é inconstitucional. Constitucional é a prevalência do valor do trabalho, enquanto gerando condições concretas de uma vida digna.
Dessa maneira, como enfrentar a tese da flexibilização ou da desregulamentação, ou da não intervenção do Estado nas relações de trabalho com vistas aos objetivos a serem alcançados pelo trabalho, que é a justiça social? Com certeza, é possível afirmar que diante de tais dispositivos constitucionais pode ser afirmado que a flexibilização em demasia ou a desregulamentação podem ser tidas como inconstitucionais. Que a coisificação do trabalhador ou a transformação do trabalho humano em mercadoria também é inconstitucional. Que a lei do mercado não pode fazer do trabalhador uma simples mercadoria desvalorizada ou em crescente desuso sob pena de ser também inconstitucional.
IV – Da Necessidade da Qualificação da Mão-de-Obra
A necessidade de qualificação da mão-de-obra é um ponto marcante para o trabalhador no novo mercado de trabalho, que está cada vez mais sendo marcado pelo avanço tecnológico. Décadas atrás no Brasil, a perda do emprego dava ao trabalhador a condição de desempregado. Atualmente, em algumas situações, a perda do emprego pode gerar o chamado desempregado estrutural, que é aquele trabalhador que perdeu o emprego e que o mercado não mais necessita do trabalho que sabe executar, criando-se uma situação muito pior que a do simples desempregado.
A produção crescentemente automatizada e reestruturada, a remodelação dos produtos, a reorganização da linha de produção passaram a exigir um maior conhecimento técnico dos trabalhadores. A tecnologia traduz-se, freqüentemente, em automação, em produção sem interferência do fator humano, ou com a mínima interferência possível, observando-se a substituição de tarefas repetitivas por processos integrados.
Anteriormente, o desempregado da fábrica poderia encontrar ocupação no comércio ou no setor de serviços, mas esta opção desapareceu consideravelmente no contexto contemporâneo, uma vez que mesmo as atividades simples exigem pelo menos o grau médio de escolaridade. Hoje, no Brasil, já não é mais suficiente um nível de estudo que há uma década atrás resultava aceitável.
A própria atividade industrial automatizada exige que os trabalhadores remanescentes possuam escolaridade suficiente para operacionalizar os maquinários, o que determina um aumento no grau de escolaridade do trabalhador médio e reduz ainda mais o número de vagas.
Para melhor ilustrar tal fato, presencia-se na siderurgia a formação de um segmento particular de “operários-técnicos” de alta responsabilidade, portadores de características profissionais e referências culturais sensivelmente diversas do restante do pessoal operário. Eles se encontram, por exemplo, nos postos de coordenação, nas cabines de operação de altos-fornos, aciaria, vaza contínua e etc. Observa-se fenômeno similar na indústria automobilística, com a criação dos “coordenadores-técnicos” encarregados de assegurar os reparos e a manutenção de instalações altamente automatizadas, assistidas por profissionais de nível inferior e de especialidades diferentes.
Na produção, os paradigmas mediatos deste milênio têm mudado desde a capacitação especializada, já que não se conquista mais um posto de trabalho sem que o pretendente possua uma série de habilidades e conhecimentos sobre os mais variados processos. Pelo contrário, no campo dos profissionais tradicionais (a medicina, advocacia etc.), tende-se a uma especialização, que exige o máximo nível de estudo focalizado, com o apoio de um conhecimento geral limitado.
Dentro desta situação, a informática é o centro básico do qual giram todas as demais atividades e especializações. A exigência de que todos devem saber manejar ferramentas da informática chega a tal ponto que em níveis médios tem-se cobrado o manejo de idiomas distintos do nativo com vistas a facilitar a operacionalização de tais meios.
Ao mesmo tempo em que se aponta para a necessidade de qualificação, tem-se a cada dia a necessidade de um número menor de qualificados, que é explicado pelo avanço tecnológico. E no caso do Brasil, o não incremento de políticas públicas para ser obtida essa qualificação faz criar um exército de desempregados que não são mais desempregados simplesmente e sim estruturalmente desempregados.
O ex-embaixador Samuel Guimarães, analisando os problemas econômicos e sociais que o Brasil vem atravessando afirmou: “ Quem empregaria mão-de-obra desqualificada? Se o país não pode disciplinar o capital, como ter política de emprego? Como estimular os setores que poderiam contribuir com o aumento das exportações, se não pudermos proteger nossa produção? “[7]
Estes e outros questionamentos podem ser formulados e apontam principalmente para a necessidade de investimentos públicos no homem, que é outro ponto que se contrasta com os ideários de uma economia liberalizante.
V – CONCLUSÕES
01. O Direito do Trabalho no Brasil atualmente vem sendo apontado como um entrave ao livre desenvolvimento econômico. Nesse sentido, tenta-se a todo custo destituí-lo dos seus princípios norteadores;
02. A flexibilização não pode ser um processo de redução dos direitos trabalhistas. A modernização do Direito do Trabalho deve ser vista como um processo de atualização constante frente às novas relações de trabalho, não podendo o capital sobrepor ao trabalho;
03. A Constituição Federal deve ser interpretada sistemicamente, de forma a sempre ser buscada a concretização dos valores sociais nela concentrados. Nenhum processo de flexibilização pode ser despojado do atendimento do princípio da valorização do trabalho, que deságua na concretização da dignidade da pessoa humana;
04. As políticas públicas, principalmente a busca da qualificação da mão-de-obra, é de grande importância para o enfrentamento pelo homem das novas necessidades do mercado, tratando-se de uma necessidade básica para o enfrentamento das exigências do mercado.
Doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Professor adjunto da Universidade Estadual de Londrina; Professor titular da Universidade de Marília; Professor titular da Unopar; professor da FACCAR.
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