Resumo: O presente trabalho pretende abordar o tema abandono afetivo, já que as constantes mudanças da sociedade contemporânea e correlatos rompimentos dos vínculos conjugais têm afetado as relações entre pais e filhos, deixando esses últimos de explorar os ganhos provenientes do afeto, maculando, assim, o que se espera de uma convivência saudável entre entes queridos e prejudicando a formação da pessoa humana.
Palavras-chave: dignidade da pessoa humana – abandono afetivo – responsabilidade paterna – reflexos do abandono – paternidade ausente.
Abstract: The present work intends to approach the theme of affective abandonment, since the constant changes of the contemporary society and related ruptures of the conjugal bonds have affected the relations between parents and children, leaving the latter to explore the gains from the affection, thus mulling what Is expected of a healthy coexistence between loved ones and harming the formation of the human person.
Keywords: dignity of the human person – affective abandonment – paternal responsibility – reflexes of abandonment – absent fatherhood.
Sumário: 1. Introdução. 2. A família, o afeto e a figura paterna. 3. Abandono parental no código civil de 2002 e o dever de indenizar. 4. Reflexos do abandono parental. Considerações finais.
1. Introdução
Após a segunda guerra mundial, a dignidade da pessoa humana mereceu maiores atenções jurídicas, deixando de ocupar o espaço de direito natural metapositivo, como Paulo Bonavides sustentou:
“A dignidade da pessoa humana, desde muito, deixou de ser exclusiva manifestação conceitual daquele direito natural metapositivo, cuja essência se buscava ora na razão divina, ora na razão humana, consoante professavam em suas lições de teologia e filosofia os pensadores dos períodos clássicos e medievos, para se converter, de último, numa proposição autônoma do mais subido ter axiológico, irremissivelmente presa à concretização constitucional dos direitos fundamentais” (BONAVIDES, 2011, p. 18).
A intenção no sentido de seguir a tendência mundial e a preocupação com a promoção dos direitos humanos levou o constituinte brasileiro de 1987 a consagra-la no inciso III do Art. 1º, como um dos fundamentos do nosso Estado na Constituição atual.
Definir dignidade é tarefa das mais árduas, podendo a mesma merecer diversos apontamentos de acordo com o caso concreto. Conforme Dias, nos dizeres de Daniel Sarmento, esse elemento basilar do nosso ordenamento jurídico, “[…] representa o epicentro axiológico da ordem constitucional, irradiando efeitos sofre todo o ordenamento jurídico e balizando não apenas os atos estatais, mas toda a miríade de relações privadas que se desenvolvem no seio da sociedade” (DIAS, 2013, p. 65).
A efetivação do mencionado fundamento do nosso Estado depende do respeito e consideração, por parte de todos, aos direitos fundamentais, dentro dos quais a convivência familiar exerce papel preponderante.
Quanto à relação entre a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, no sentido de consagrar valores existenciais mínimos, interessa refletir:
“Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede de vida” (SARLET, 2011, p. 73).
Vê-se, o direito das famílias está intimamente ligado aos direitos humanos fundamentais, já que os mais diversos arranjos familiares visam o ensejo ao afeto, à solidariedade, à união, ao respeito, à confiança, ao amor e, logo, a um projeto de vida comum, criando condições de possibilidades de desenvolvimento pessoal e social de cada integrante da entidade familiar.
A instituição “Família” é milenar, portanto, seu conceito requer que se viaje no tempo pretérito para que se possa entendê-la nos dias atuais.
A família ocidental teve como cerne a estrutura familiar adotada no Império Romano, onde o pater família era quem centralizava todo e qualquer poder em relação a sua prole, bem como em relação à mulher, até então considerada como um ser inferior ao homem.
Guilherme Nogueira da Gama lembra, nesse contexto, que:
“Na estruturação atual, os juristas são unânimes em reconhecer como antecedente remoto da família moderna a estrutura familiar da civilização romana, com as modificações sofridas posteriormente. Notadamente do Direito Canônico e das instituições germânicas. Na época clássica de Roma, a estrutura familiar fundava-se no modelo tipicamente patriarcal, tendo como figura principal da família romana o pater famílias, ou seja, “o ascendente mais velho, ainda vivo, que reúne os descendentes sob a sua autoridade, formando a família’, enfeixando em suas mãos todos os poderes necessários á boa manutenção da família, em caráter autoritário, e não como múnus. Há distinção entre o pater (pessoa sui juris). A família romana daquele período histórico era organizada sob o principio da autoridade. Além da família próprio jure, centrada ao redor da figura do pater famílias, considerava-se por reunião de parentes ágnatos, que descendiam de um mesmo homem” (GAMA, 2008, p. 99).
A família é o porto seguro de qualquer espécie animal, pois a necessidade do ser de unir-se aos demais detém variados motivos como a sexualidade, a proteção, a afetividade, o instituto de sobrevivência e, principalmente, o sentimento do amor.
A Constituição Brasileira de 1988 alçou a família à condição de base da sociedade, cabendo não só ao Estado, mas a todo ser social, a sua proteção, em caráter especialíssimo. Sobre referida proteção por parte do Estado, insta analisar:
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações” (BRASIL, 2016, p. S.N.).
Assim, impõe-se aos administradores públicos, bem como aos integrantes da sociedade brasileira o uso de todos os meios aptos a preservar a família, sob o auspício, além da dignidade da pessoa humana, de princípios como o da proteção integral à criança e ao adolescente, da paternidade responsável, entre outros.
A constatação jurídica da família contemporânea extrapola os limites estabelecidos pela sociedade conservadora, ou seja, a consideração do que seja família depende muito mais das relações psicossociais estabelecidas entre pessoas que comungam dos mesmos ideais e regem-se pelo afeto recíproco, do que de qualquer outra coisa.
2. A família, o afeto e a figura paterna
Não se pode negar que o afeto se encontra intimamente ligado a qualquer relação, principalmente, quando se pensa na familiar. Com efeito, a avaliação do psiquismo humano na construção de suas relações de afeto adquire vital importância ao operador do direto que milita na área da família.
Por isso, a solução de demandas judiciais nas áreas do direito de filiação, passa, necessariamente, pela avaliação de toda a realidade que envolve o fato em análise.
A atenção para o trato com as difíceis questões que atingem a própria estrutura do ser humano são, portanto, imperativas, pois refletem-se diretamente sobre os seus sentimentos, os quais, numa análise mais profunda, fazem emergir feridas da alma impossíveis de serem curadas.
Por isso, invariavelmente, observa-se, na prática, alguns pais se afastarem dos filhos após serem obrigados a pagar pensão alimentícia. Ou seja, agindo como se obrigados a prestar ajuda material, estivessem, de todo, desobrigados de prestar o resto, voltando a fazê-lo apenas de forma tímida, e, em muitos casos, nalguns anos depois do cotejo judicial.
Eis uma constatação usual a todos aqueles militantes das varas de família e que parte de um fenômeno merecedor de reflexão, por ser faceta de um comportamento que evidencia o conflito da perda da identidade do homem, construída ao longo do tempo, por meio de sua função de provedor. Afinal, se ele era apenas o provedor, como historicamente ficou impregnado em seus registros emocionais e de referencial afetivo, agora, com a obrigatoriedade de fazê-lo por ordem judicial, imagina não precisar prestar aos filhos mais nada.
É válido afirmar, o reconhecimento da paternidade e o pagamento de alimentos não bastam para a formação da pessoa, ocupando o afeto um papel incomensurável e imprescindível. A título de exemplo, (GAMA, 2008), uma pesquisa nos arquivos de casos de adolescentes infratores atendidos na Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude da Comarca de Campo Grande, realizada através da análise de 50 casos atendidos no ano de 2007, revelou que 70% dos adolescentes infratores internos nas casas de guarda, tinham ausência parcial ou total da figura paterna, sendo detectado que em apenas 25% dos casos, havia algum tipo de contribuição financeira por parte dos mesmos.
A Paternidade ausente foi a constatação maciça nos casos analisados.
Não se mostra necessário muito esforço para constatar, a função paterna ocupa importante papel na constituição do indivíduo enquanto observador normativo.
Nesse quadrante, o pai, ou aquele equivalente, assumem posição inafastável no sentido de fazer nascer na criança um sentimento de limite daquilo que é certo ou errado, do que deve ou não ser feito.
Por outro lado, é preciso saber, a filiação socioafetiva, como salienta Maria Berenice Dias, “[…] constitui, para todos os efeitos, uma relação plena de filiação. Frente a uma situação plenamente consolidada, a ruptura significativa evidente violação à personalidade dos sujeitos envolvidos” (DIAS, 2013, p. 266).
A afetividade faz com que o relacionamento se fortaleça, sendo revelada, muitas das vezes, por pequenos atos, tais como um simples beijo na testa, um abraço, uma conversa amigável, entre outros.
A sociedade brasileira vivencia, nos dias atuais, um quadro diferente do século XVI, onde os pais têm o privilégio de estarem presentes em vários momentos com seus filhos, não obstante, ainda, por opção profissional, mas por necessidade de sobreviver, principalmente, nos grandes centros urbanos.
A modernidade trouxe a oportunidade de revisitar alguns valores, que até então estavam adormecidos por vários motivos, dentre os quais destaca-se a ausência da afetividade entre pais e filhos, porquanto, é por meio do vínculo afetivo que a instituição familiar pode ser fortalecida.
3. Abandono parental no código civil de 2002 e o dever de indenizar
Após esse breve percurso, resta tratar especificamente da responsabilidade civil e de seus pressupostos para melhor entendimento no que diz respeito às decisões em uma matéria tão subjetiva, como é o caso do abandono afetivo. Isso porque se a responsabilidade civil se faz presente por todos os ramos do direito civil, no direito de família não seria diferente.
No que diz respeito à responsabilidade civil para esta matéria, Maria Berenice Dias pondera que:
“[…] mesmo que o pai apenas visite o filho por receio de ser condenado a pagar uma indenização, é melhor do que gerar no filho o sentimento de abandono. Se os pais não conseguem dimensionar a necessidade de amar e conviver com os filhos que não pediram para nascer, é imperioso que a justiça imponha coactamente essa obrigação. O dano à dignidade do filho deve ser passível de reparação material para que possa ser dissuadida pela firme posição do judiciário, ao mostrar que o afeto tem um preço muito alto na nova configuração familiar” (DIAS, 2013, p. 462).
Sendo assim, a responsabilidade civil, no que tange ao comprovado dano por abandono afetivo nas relações da parentalidade, materializa-se a partir do ato ilícito, com a obrigação de reparar o dano causado a outrem.
É bom lembrar, a responsabilidade civil encontra-se na parte geral do Código Civil, que orienta a concretização de diversos direitos do homem em suas relações patrimoniais e existenciais. Essa responsabilidade tem seus requisitos baseados na conduta comissiva ou omissiva, no dano e no nexo de causalidade.
No que se refere à conduta comissiva e omissiva, trata-se de todo ato ilícito praticado com culpa ou sem culpa, nos termos dos Art. 186 e 187 do Código Civil em vigor. Para Almeida e Rodrigues Júnior:
“[…] no que tange à culpa, discute-se se a não observância de qualquer dos deveres decorrentes do poder familiar previsto em lei caracterizaria ato ilícito. É importante que sejam analisados quais fatores contribuíram para o afastamento do genitor, já que, muitas vezes, o distanciamento é causado pelo ascendente com quem reside a criança, por terceiro que assume o papel de pai ou mãe do menor, entre outros casos de alienação parental. Além disso, certo é que, em alguns casos, a imposição da presença do pai ou da mãe na vida da criança não é aconselhável e fazê-lo somente para que sejam artificialmente efetivados os deveres decorrentes da autoridade parental pode representar risco à saúde psicológica e até mesmo física do menor” (ALMEIDA; RODRIGUES JUNIOR, 2010, p. 586).
No que se refere aos danos reparáveis, podem ser elencados aqueles ocorridos nas relações paterno-filiais. Os danos se dividem em dois, material e moral. O primeiro é aquele que causa um prejuízo patrimonial a vítima, e o segundo se caracteriza por atingir os direitos personalíssimos da pessoa humana, como a dignidade, a liberdade, a honra, enfim, valores que dizem respeito ao bem ou interesse não patrimonial, que lhe cause dor, tristeza, sofrimento, humilhação, depressão.
A prova dessa espécie de dando se dá, geralmente, por meio de laudos médicos, nos quais psicólogos, em parceria com o judiciário, contribuem para que se tome a decisão mais próxima da verdade dos fatos. Nesse âmbito, interessa ponderar:
“[…] sobre a configuração dos elementos constitutivos da responsabilidade civil dos pais por abandono afetivo, a doutrina assevera que se faz necessária a caracterização da ausência contínua e deliberada de afeto por parte do genitor, o que individualizaria o ato ilícito. Após, deve ser analisado o grau de culpabilidade do agente na prática de ilícito, bem como afastadas situações que repeliriam a culpa, como legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular de direito, dever legal de agir, ou mesmo o total desconhecimento da filiação. Ao final, deve ser feito exame do nexo de causalidade entre a conduta ilícita e dano, com auxílio de profissionais de outras áreas (ALMEIDA; RODRIGUES JUNIOR, 2010, p. 580).
O dever de indenizar decorre do abuso de direito, pelo desrespeito à boa fé objetiva ou aos bons costumes.
Algo corriqueiro, nesse sentido, são pais descompromissados que, por motivo de não estarem mais casados, não têm o interesse de assumirem as responsabilidades para com seus filhos, muitas vezes preferindo arcar com a responsabilidade civil.
Considerando os princípios balizadores do nosso ordenamento jurídico, o afeto tornou-se um valor tão importante no Direito de Família que o desafeto paterno passou a ser objeto de litígio e indenização por danos morais.
Desta forma, o cabimento ou não de danos morais por negativa de afetividade por parte dos pais é assunto que gera controvérsias, pois é no afeto que as relações familiares buscam o alicerce do crescimento da personalidade da pessoa humana.
É na família que se encontrará o esteio da vida, refletindo a concretização dos direitos humanos fundamentais para o crescimento comum da criança. Restringir este direito subjetivo inerente a ela, omitindo-se o pai de propor atenção e amor, configurará, então, ofensa a direitos do filho, principalmente, relativos à sua dignidade.
Assim, o dano causado pela ausência afetiva é, antes de tudo, um dano causado à personalidade do indivíduo, repousada na dignidade da pessoa humana.
Ressalte-se, a reparação pela falta de afetividade pelo filho, embora expressa em pecúnia, não busca qualquer vantagem patrimonial em benefício da vítima, outrossim, como cunho pedagógico e compensatório pela ausência de cumprimento obrigacional.
De tal modo, o abandono afetivo seria entendido com um inadimplemento dos deveres jurídicos de paternidade. Como não é possível obrigar ninguém a dar afeto, a indenização por danos morais consistirá em forma reparatória do abandono afetivo. Não estabelecer tal sanção à paternidade biológica consistirá, então, em uma premiação da irresponsabilidade e do abandono afetivo cometido pelo pai.
4. Reflexos do abandono parental
A indenização por conta do abandono parental, até porque, como estudado, não é essa a sua finalidade, não é o bastante para sanar todas as suas correlações, já que, segundo dados do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFam, esse fato social leva, em regra, a consequências como Isolamento-retirada; baixo rendimento escolar; depressão, melancolia e angústia; fugas e rebeldia; regressões; negação e conduta anti-social e; culpa.
Acerca do exposto, importa colar esclarecimentos provenientes do órgão ora citado:
“1) Isolamento-retirada: A criança se isola do que a rodeia, e centra-se nela mesma, não fala com quase ninguém e se o faz, é de forma muito concisa, preferindo estar sozinha no seu quarto, em vez de brincar com outras crianças, mormente se filho único, perdendo o único outro referencial e passando a viver somente com o pai ou com a mãe, sentindo-se literalmente sozinha e abandonada, abandono e vazio a que nos referimos que não pode ser suprido por qualquer figura senão a do próprio pai. 2) Baixo rendimento escolar: Por vezes associado a uma fobia à escola e à ansiedade da separação – a criança não quer ir à escola, não presta atenção nas aulas, mas também não incomoda os seus companheiros, não faz os deveres com atenção, apenas quer sair de casa, a apatia que mostra relativamente às tarefas que não são do seu agrado alarga-se a outras áreas…. e isto é detectado a posteriori, não de imediato, mormente quando na fase das visitações. 3) Depressão, melancolia e angústia: Em diferentes graus, mas em 100% dos casos ocorre e infelizmente é recorrente. 4) Fugas e rebeldia: Produzem-se para ir procurar o membro do casal não presente, por vezes para que se compadeça do seu estado de desamparo e regresse ao lar ou pensando que será más feliz ao lado do outro progenitor. 5) Regressões: Comporta-se com uma idade mental inferior à sua, chama a atenção, perde limites geralmente impostos pela figura paterna, perde o ‘referencial’, e mesmo pode regredir como ‘defesa psicológica’ em que a criança trata de ‘retornar’ a uma época em que não existia o conflito atual, e que recorda como feliz. 6) Negação e conduta anti-social: ocorrem em simultâneo – por um lado a criança, (e mesmo as mães quando em processo de separação ou recém separadas, o que pode levar até mais de 5 anos para ‘superar em parte’) nega o que está a ocorrer (nega que os seus pais se tenham separado apesar da situação lhe ter sido explicada em diversas ocasiões e finge compreender e assimilar e mesmo negar e ignorar mas internaliza), e, por outro lado sente consciente ou inconscientemente que os seus pais lhe causaram dano, o que lhe dá o direito de o fazer também, provocando uma conduta anti-social. 7) Culpa: Por mais de 75% das vezes, a criança se sente culpada, hoje ou amanhã, em regra mais tarde, pela situação, e pensa que esta ocorre por sua causa, pelo seu mau comportamento, pelo seu baixo rendimento escolar, algo cometido, e pode chegar mesmo a auto castigar-se como forma de autodirigir a hostilidade que sente contra os seus pais, inconscientemente (PINHO, 2016, p. S.N.).
Percebe-se, assim, por mais que muitas mães e outros entes queridos “ocupem” o lugar do pai quando da educação e cuidado da criança e do adolescente, não se pode negar, tratar-se a sua falta, de algo irreparável, causando em regra, grandiosos males, conforme supracitamos.
Nesse contexto, escreveram Gisele Carla Weishaupt e Giana Lisa Zanardo Sartori:
“Dessa forma, a mãe pode até exercer função de pai e mãe, porém não deve, em momento algum, negar a identidade do pai nem a sua participação e presença na vida do filho, pois a figura masculina é necessária para um sadio desenvolvimento psíquicoemocional-afetivo da criança ou adolescente” (WEISHAUPT; SARTORI, 2014, p. 21).
Considerações finais
A título de considerações finais, é preciso fazer algumas ponderações.
Após a segunda guerra mundial, a dignidade da pessoa humana passou a ter maiores atenções por todo o mundo, tanto que, seguindo a premissa, a Constituição da República atual consagrou-a como um dos fundamentos do Estado brasileiro.
Tal consagração promoveu diversas alterações por todo ordenamento jurídico e em todos os ramos do direito e, como não poderia deixar de ser, também, no direito de família.
Nesse sentido, quando se pensa na relação familiar, há que se ter consciência que todas as ações devem se circunscrever à pessoa humana, a qual só terá seus valores consagrados a partir de uma leitura voltada à plena consecução dos direitos humanos fundamentais.
A constatação redunda na assertiva de que ter um filho não se restringe ao dever de alimentar, mas, também, naquele de possibilitar seu desenvolvimento humano, com vistas à consecução da dignidade da pessoa humana como evidenciado no decorrer deste texto.
Logo, o sustento é, apenas, uma das parcelas geradas pela paternidade. É certo, a valorização e a manutenção dos vínculos afetivos entre pais e filhos são fundamentais. Para que se preserve não o amor ou a obrigação de amar, o que seria impossível, mas a responsabilidade ante ao descumprimento do dever de cuidar, por sua falta causar traumas diversos às crianças e adolescentes abandonados.
O Poder Judiciário não é, e nunca vai ser, competente para condenar alguém no sentido de obrigar a amar um filho, mas sim, no de fazer cumprir os deveres decorrentes do poder familiar, uma vez que o abandono parental se trata de algo muito grave, merecendo severa atuação deste poder do nosso Estado.
Assim, em sendo o pai condenado a indenizar, não se poderá falar em condenação ao pagamento pecuniário pelo desamor. De outro modo, pelo descumprimento de um dever que lhe é imposto desde o momento em que gerou uma criança.
O aspecto a ser frisado no que toca ao afeto atribuído aos filhos pelos pais é o estímulo ao desenvolvimento de uma mentalidade acerca da paternidade responsável, prevalecendo o caráter educativo e reparador da indenização por danos morais em prol da proteção aos filhos.
Acadêmica em direito pela FADILESTE
Mestre em Direito pela UNIPAC. Especialista em direito público pela Cndido Mendes. Coordenador de Iniciação Científica e professor do Curso de Direito da FADILESTE
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