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Poligamia é crime no Brasil?

O que é Poligamia?

 Para compreender o significado de poligamia, antes de tudo, é importante entender qual é o significado de monogamia.

A monogamia se caracteriza por uma relação que é estabelecida e é desenvolvida com somente um parceiro.

Em termos gerais, em se tratando de uma relação, pode ser compreendida como estabelecida tanto em matrimônio, como fora dele, em um relacionamento estável e duradouro.

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Já a poligamia, por outro lado, é um termo de origem grega, que faz referência a muitos casamentos.

Assim, é possível notar que poligamia é o oposto de monogamia, consistindo no casamento com mais de uma pessoa.

O termo é amplo, uma vez que compreender tanto a situação em que um homem possua mais de uma esposa, quanto a situação de uma mulher que possua mais de um marido.

Contudo, existem terminologias específicas para essas duas situações específicas de poligamia.

Poliginia se refere ao homem que possui duas ou mais mulheres, o que é mais comumente vislumbrado.

Já a poliandria se refere à mulher que possui dois ou mais maridos, o que é uma situação mais incomum de se vislumbrar na sociedade.

A poliandria é mais frequente em sociedades que apresentam matrilinearidade, ou seja, nas quais a descendência é contada em linha materna.

 

Poligamia e traição são a mesma coisa?

Por vezes, algumas pessoas acabam confundindo traição com poligamia. Contudo, se tratam de situações que se diferem.

Uma pessoa que possua um ou mais amantes não está praticando poligamia, mas sim adultério.

O adultério é uma situação em que um sujeito possui um relacionamento paralelo, de maneira oculta, sem o outro parceiro ter conhecimento.

Na relação poligâmica, existe mais de um relacionamento em matrimônio e todos os envolvidos estão cientes sobre o sistema.

Em algumas religiões, inclusive, a poligamia é permitida e, em alguns casos, até mesmo incentivada.

Ademais, a poligamia é permitida pela legislação de alguns países, conforme será abordado a seguir.

Antes de tudo, contudo, resta saber, a poligamia é crime no Brasil?

 

Poligamia é crime?

Na legislação brasileira não há menção direta ao termo poligamia. Contudo, há legislação referentemente à bigamia.

O Código Penal Brasileiro (CP) versa sobre os crimes contra a família em seu Título VII. No capítulo I do referido título, são abordados especificamente os crimes contra o casamento.

Dentre os dispositivos presentes no capítulo, o primeiro que aparece, o do art. 235 do CP, se refere à bigamia.

E a bigamia é crime?

Para solucionar a dúvida, basta analisar o referido dispositivo, conforme segue abaixo:

Art. 235 – Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena – reclusão, de dois a seis anos.

  • 1º – Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou detenção, de um a três anos.
  • 2º – Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime.

Conforme se pode vislumbrar, o texto legal não deixa dúvidas, de modo que a bigamia é considerada crime no ordenamento jurídico brasileiro.

Ademais, importante frisar que a legislação penal o classifica como um dos crimes contra a família e, mais especificamente, contra o casamento.

A pena foi estabelecida como a privativa de liberdade, sendo de reclusão, de dois a seis anos.

Assim, caso um sujeito casado venha a contrair um novo casamento, incidirá no crime de bigamia.

Contudo, embora haja uma expressa previsão acerca do crime de bigamia, não há, no CP, menção expressa ao termo poligamia.

Assim, continua a dúvida: poligamia é crime no Brasil?

Quem compreende um pouco sobre o mundo jurídico, sabe que a ausência expressa de um termo, não significa, necessariamente, que ele não esteja contemplado no dispositivo.

Isso porque, além das normas escritas, é extremamente importante a participação da doutrina e da jurisprudência na configuração do ordenamento jurídico brasileiro.

A doutrina e a jurisprudência têm um papel enorme no entendimento acerca das normas escritas.

Ademais, não se pode esperar que um Código Penal criado em 1940, quando a sociedade brasileira era totalmente outra, esteja perfeito ao tempo atual.

Pode-se esperar, portanto, que o CP não poderia imaginar, à época de sua elaboração, essa possibilidade de formação de arranjos familiares.

Trata-se de um código criado em um tempo no qual o único arranjo familiar previsto era o constituído por um homem, uma mulher e seus filhos.

Contudo, a sociedade moderna trouxe diversas discussões que vêm alterando alguns entendimentos acerca de diversos assuntos relacionados à família e ao casamento.

Neste contexto, a poligamia é um tema que vem aparecendo cada vez mais nos debates atuais jurídicos.

Portanto, não é de se estranhar que a doutrina e a jurisprudência estejam abordando cada vez mais o tema, ante sua presença em discussões e até mesmo em sua materialização na realidade.

Então, como se deve compreender a poligamia? A poligamia é crime no Brasil ou não?

A previsão do crime de bigamia também estaria englobando aquele que comete poligamia e, portanto, também seria uma criminalização à poligamia?

Alguns doutrinadores defendem que, ante a omissão do legislador, a norma que prevê o crime de bigamia poderia ser interpretada extensivamente.

Essa interpretação, caso feita pelo magistrado, estaria entendendo que o crime de bigamia compreenderia também a proibição à poligamia.

Assim, segundo esse entendimento doutrinário, caberia ao julgador estender o alcance do artigo 235 do Código Penal de modo a abranger também a poligamia.

Neste caso, caso um sujeito casado viesse a contrair novos casamentos, ou seja, dois ou mais novos casamentos, este poderia ser punido pelo crime de bigamia.

Deste modo, por interpretação extensiva do magistrado, seria condenado ao crime de bigamia, por cometer a poligamia, e seria submetido à sanção de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Contudo, o entendimento majoritário da doutrina pensa de modo diferente deste, não vislumbrando como mais adequada a aplicação da interpretação extensiva.

Conforme a doutrina majoritária, caso o sujeito, já casado, se casasse mais de uma vez novamente, se configuraria o concurso de crimes.

E o que é concurso de crimes? Como se soluciona isso?

O concurso de crimes ocorre quando, por meio de uma ou mais condutas, um sujeito comete dois ou mais crimes que estejam relacionados entre si.

Existem basicamente três espécies de concurso de crimes: o concurso material, o concurso formal e o crime continuado.

No concurso material, basicamente, o sujeito comete mais de uma ação que resulta em mais de um crime, idênticos ou não estes crimes.

Por exemplo: “A” dispara um tiro de revólver contra “B” e, em seguida, contra “C”. Ambos morrem.

No exemplo acima, há concurso material, pois há duas condutas e dois resultados, que nesse caso são idênticos, resultando em dois crimes de homicídio.

Assim, conforme o art. 69 do CP, pune-se o sujeito pela soma das penas.

No concurso formal, o sujeito comete apenas uma ação e esta resulta em mais de um crime, sejam eles idênticos ou não.

Por exemplo: “A” atropela “B” e “C”. Ambos morrem.

No exemplo acima, há concurso formal, pois há uma conduta apenas, com dois resultados, que nesse caso são idênticos, resultando em dois crimes de homicídio.

Assim, conforme o art. 70 do CP, pune-se o sujeito pela pena mais grave, caso as condutas sejam distintas.

E, por apenas uma das penas, caso iguais. Ademais, em ambos os casos, a pena é aumentada, de um sexto até a metade.

No crime continuado o sujeito, mediante mais de uma conduta, pratica mais de um crime que são obrigatoriamente da mesma espécie e, também, nas mesmas condições de tempo, ação e lugar.

Por exemplo: um funcionário que furta do caixa da loja em que trabalha, toda a semana, o valor de 50 (cinquenta) reais.

A condição do tempo é toda a semana. A ação é o furto. O lugar é do caixa da loja em que trabalha.

Assim, no exemplo acima, há crime continuado, pois há a prática reiterada do mesmo crime, nas mesmas condições de tempo, ação e lugar.

Neste caso, conforme o art. 71 do CP, aplica-se a pena de um só crime, caso idênticos, ou a pena do mais grave, se diferentes, aumentada de um sexto a dois terços.

Assim, retornando ao entendimento doutrinário acerca da poligamia, percebe-se que o entendimento se baseia no crime continuado.

Conforme a maioria dos autores, há concurso de crimes porque o sujeito se casou mais de uma vez após o primeiro casamento.

Assim, comete mais de um delito, um para cada casamento realizado após o primeiro.

Contudo, para a aplicação da pena, nestes casos, dependeria do contexto e da interpretação do magistrado.

Poderia ser classificado como concurso material ou até mesmo como crime continuado.

Assim, poderia ser aplicado, respectivamente, para cada classificação, a soma das penas ou apenas uma delas, aumentada de um sexto a dois terços.

Contudo, apesar dessa diferença de entendimento doutrinário, que será observada na aplicação ao caso concreto pelo magistrado, a opinião com relação à criminalização da poligamia é idêntica.

A doutrina e a jurisprudência entendem a poligamia como crime!

Assim, portanto, a poligamia é crime, seja pela interpretação extensiva do art. 235 que prevê o crime de bigamia, seja pela interpretação de concurso de crimes.

Portanto, embora não exista previsão expressa no Código Penal Brasileiro quanto ao crime de poligamia, ele é entendido como crime.

Países onde é legalizada e/ou onde mais existe poligamia

            Não é atoa que a poligamia é um tema que vem sendo bastante discutido.

Apesar de ser crime no Brasil, conforme já visto, trata-se de uma prática relativamente comum em outros países.

Isso porque algumas religiões permitem e/ou até incentivam essa prática e, inclusive, alguns países não a proíbem.

Assim, para melhor compreender o tema no cenário mundial, abaixo estão listados alguns locais onde a poligamia, sendo criminalizada ou não, é comum.

 

  • Arábia Saudita

Na Arábia Saudita, local é que o berço do profeta Maomé e também do mundo islâmico, a poligamia é uma prática comum.

Mas resta saber: lá a poligamia é crime? A resposta é não.

Conforme as palavras conditas no Alcorão, é permitido casar com quantas mulheres um sujeito venha a querer.

Contudo, o texto religioso afirma que, caso não possa tratar a todas com equidade, o sujeito deve casar-se com uma apenas.

Assim, o que se verifica na Arábia Saudita é a poligamia, não criminalizada pelo Estado e permitida também pela religião.

Contudo, se observa a poligamia na sua forma de poliginia, quando o homem que pode ter mais de uma mulher.

 

  • Tanzânia

A Tanzânia é um país que fica na África Oriental e possui uma população que vive em sua maioria na área rural.

Lá também é permitido legalmente que ocorra a poligamia, contudo existem regras para tanto.

Ocorre que, no momento de realizar-se o registro do casamento, procedimento que é obrigatório, é necessária que seja indicado como monogâmico, poligâmico ou potencialmente poligâmico.

Assim, existe um acordo entre o casal no momento do registro do casamento quanto à possibilidade de poligamia ou não.

 

  • EUA

Nos Estados Unidos da América a poligamia é crime? Sim!

Contudo, mesmo sendo criminalizada, a prática ocorre por ser uma questão de fé para alguns norte-americanos.

Alguns grupos originados da religião da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, a dos mórmons, praticam a poligamia.

A religião já permitiu a poligamia. Contudo, atualmente, ela não é mais aprovada pela Igreja.

Alguns grupos sectários, contudo, acabaram se separando e formando novos cultos religiosos, de modo que em alguns deles a poligamia prossegue.

Nesses cultos em que a poligamia persiste, o casamento com várias esposas é permitido e, não apenas isso, é recomendado pela religião.

Isso porque existe uma promessa de que o homem que possua muitas esposas virá a ser um rei no céu.

Contudo, visto que é uma prática criminalizada nos EUA, a fim de “enganar” a lei, muitos se casam oficialmente somente com a primeira esposa.

As demais, portanto, se “casam” somente em cerimônias religiosas e não legalmente.

Outros, contudo, se casam com a primeira esposa e se divorciam em seguida, para então se casar com a segunda esposa.

Depois, se divorciam novamente e se casam com a terceira esposa e assim sucessivamente, quantas vezes for se casar.

Deste modo, inclusive, todas as mulheres conseguem obter o sobrenome do marido.

E novamente, neste caso, se observa a poligamia na sua forma de poliginia, quando o homem que pode ter mais de uma mulher.

 

  • Sudão

No Sudão a poligamia é crime? Não só não é crime, como é autorizada e até incentivada.

Inclusive, o presidente Omar Hassan al-Bashir, no ano de 2001, solicitou aos cidadãos do país para que contraíssem vários casamentos a fim de aumentar a população.

Segundo o presidente, o Sudão, que é o maior país africano e também o que mais possui recursos naturais, necessitava de mais cidadãos para se desenvolver.

Mais uma vez o que se observa é a poligamia na sua forma de poliginia, quando o homem que pode ter mais de uma mulher.

Uma curiosidade é que, no Sudão, o divórcio é uma opção apenas para os homens.

 

  • Nepal

No Nepal a poligamia é crime? A resposta, neste caso, é sim.

No entanto, mesmo sendo uma prática ilegal, ela ainda existe em algumas comunidades tribais.

Neste país, no entanto, há uma diferença: a poligamia se configura por ser uma prática realizada pela mulher.

Assim, portanto, o que se observa é a poliandria, ou seja, a mulher possui mais maridos.

Neste caso, o motivo é econômico. Ocorre que, como existem poucas terras, os irmãos, por vezes, optam por ter a mesma mulher a ter que dividir os escassos bens da família.

Assim, é comum que algumas mulheres se casarem com irmãos.

 

Mudanças recentes

Conforme as mudanças se apresentam na sociedade, o direito deve acompanha-las.

Assim, visto que a discussão tem cada vez mais aumentado acerca do tema da poligamia, o fenômeno também tem sido mais percebido.

Sendo assim, surgem dúvidas quanto à continuidade da afirmativa legal: a poligamia é crime.

Uma importante alteração na legislação do estado de Utah, nos Estados Unidos da América, no ano de 2021, apresenta um motivo que abarca outra questão relevante.

O que ocorreu em Utah não foi a legalidade ou a descriminalização da conduta. Mas sim a lei passou a categorizar a poligamia como uma espécie de crime de “infração”.

Isso a torna quase que equivalente a uma infração de trânsito. O motivo? Tirar as comunidades que são polígamas da sombra.

Mas como assim?

Bem, líderes de algumas comunidades poligâmicas se utilizavam da legislação que punia mais severamente a poligamia para manter seus membros “acuados”.

Como assim?

Bem, caso ocorresse, na comunidade, algum outro crime ou situação que pudessem denunciar à justiça, os membros teriam de admitir que eram polígamos.

Assim, portanto, para denunciar qualquer crime, violência ou irregularidade, os membros teriam que confessar a poligamia e, portanto, seriam presos e processados.

É possível imaginar uma terceira esposa, por exemplo, que sofre violência doméstica do marido e que não pode denunciar sem ser processada e presa.

Assim, a alteração legislativa também criou uma espécie de delação premiada para esses casos, de modo que garante proteção para quem denunciar crimes cometidos na comunidade.

Também houve um aumento de 15 (quinze) para a pena máxima para alguns tipos de crimes cometidos dentro dessas comunidades.

Trata-se de crimes como de violência doméstica, abuso infantil, casamento com menores, casamento coagido, abuso e tráfico sexual, entre outros.

E a preocupação é real, tendo em vista que existem mais de 30 (trinta) mil pessoas vivendo nessas comunidades só no estado de Utah.

Assim, apesar de o estado continuar não permitindo e não incentivando a prática, houve uma necessidade em diminuir a punição sobre a poligamia a fim de proteger outros bens jurídicos.

O fato de que o poder legislativo quer “tirar das sombras” esses grupos, trata-se justamente do fato de que as transformações da sociedade carecem de uma resposta da lei.

 

Conclusão

Conforme visto no artigo, a Poligamia é crime no Brasil, sendo punida a partir do art. 235 do Código Penal, que criminaliza a bigamia.

No Brasil, diferentemente do que ocorre em outros países, a poligamia não é tão comum.

Contudo, debates tem surgido a respeito do tema, tornando-o muito atual e, consequentemente, importante a sua compreensão.

Assim, entender como o tema é tratado pelo direito brasileiro é extremamente relevante.

 

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