Pablo Ícaro França Guimarães[1]
Beatriz Mariotti Azevedo[2]
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar a divergência jurídica sobre a possibilidade de execução da pena, a partir da condenação em segunda instância, já que em 2016, no julgamento do Habeas Corpus 126.292-SP, o STF mudou o entendimento acerca do tema, até então consolidado na Corte. A decisão traz a baila, se houve ou não a relativização do princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade, resguardados no ordenamento jurídico brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: Execução provisória. Princípio. Presunção de inocência.
ABSTRACT: The objective of this article is to analyze the legal divergence about the possibility of execution of the sentence, from the condemnation in the second instance, since in 2016, in the judgment of Habeas Corpus 126,292-SP, the STF changed the savvy on the subject until then consolidated in the Court. The decision has to be analyzed if had or not there was a relativization of the principle of presumption of innocence or non-guilt, protected in the Brazilian legal system.
KEYWORDS: Provisional execution. Principle. Presumption of innocence.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Presunção de Inocência. 1.1. Presunção de Inocência X Princípio da Efetividade Jurisdicional. 2. Efeito Suspensivo no Recurso Especial e Extraordinário. 3. Habeas Corpus 126.292-SP. 3.1. Identificação das normas que regulamentam a matéria. 3.2. Solução dada pelo Tribunal. 3.3. Discussão da solução. 3.3.1. Discussão da solução com base em decisões divergentes. 3.3.2. Discussão da solução com base em artigos, doutrinas e decisões. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Até fevereiro de 2009 vigorava o entendimento no Supremo Tribunal Federal, que não feria o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade, a execução da pena, a partir da con- firmação da condenação em segunda instância.
No julgamento do HC 84.078, em 05.02.2009, o Supremo mudou o entendimento, tendo em vista que o princípio da ampla defesa e do contraditório alcança todos momentos processuais e recursais, de tal forma que, executar a pena, antes do trânsito em julgado, impli- ca em cerceamento de defesa.
O presente trabalho tem como objetivo trazer à baila a mudança do posicionamento da jurisprudência pelo pleno do STF no HC 126.292-SP, julgado em 17.02.16, em que por maio- ria dos votos (7X4), foi firmada a tese que é possível a execução provisória da pena, a partir da condenação em segundo grau, ainda que pendente recurso especial ou extraordinário.
O habeas corpus supramencionado, foi impetrado em favor de réu condenado à uma pena de 5 anos e 4 meses de reclusão, no regime fechado, por ter cometido o crime de roubo, previsto no Art. 157, §2, incisos I e II, do Código Penal. O Tribunal de Justiça de São Paulo, além de negar seguimento à apelação, expediu o mandado de prisão, para que o réu iniciasse o cumprimento da pena imposta.
Para debater a mudança da jurisprudência, necessário explanar sobre o postulado do princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade, a possibilidade de atribuição de efeitos suspensivos ao recurso especial e extraordinário. Ademais, é de fundamental impor- tância discorrer sobre o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade X princípio da efetividade jurisdicional, mencionada nos votos dos Ministros.
O acórdão proferido pela Corte Suprema foi motivo de muitas críticas por parte dos doutrinadores, juristas, além de contraverter a jurisprudência do próprio Tribunal, mesmo que sua decisão não tenha efeito vinculante, relativiza o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade para muitos estudiosos do Direito.
O postulado da presunção de inocência é uma garantia constitucional do cidadão e como tal, é considerado um direito básico, mínimo e essencial a proteção da liberdade de lo- comoção para impedir abusos ou ilegalidades na prisão.
Os direitos e garantias fundamentais são verdadeiros mandamentos constitucionais, considerados cláusulas pétreas e, portanto, não são passíveis de supressão, o que não significa que sejam absolutos, haja vista que não existem direitos ilimitados. (BARROSO, 2016).
1.1 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA X EFETIVIDADE JURISDICIONAL
Sustenta o Ministro Barroso que, no caso concreto, o princípio do estado de inocência poderia ser usado em um peso menor, visto que em um conflito aparente com o princípio da efetividade das decisões judiciais, este deve prevalecer em detrimento daquele.
A efetividade jurisdicional é dever do Estado e um direito de todo cidadão, ao passo que, para atender ao clamor social por justiça, a relativização de princípios constitucionais fere diretamente o Estado Democrático de Direito, além de causar insegurança jurídica. (SILVEIRA, 2016).
O procedimento do recurso especial e extraordinário estão disciplinados no Novo Código de Processo Civil e de forma expressa, é possível atribuir efeitos suspensivos através do pedido de tutela provisória, previsto no art. 300 NCPC.
Desta feita, privar a liberdade do acusado depois que confirmado sua condenação em segundo instância, além de atentar contra dispositivo expresso, traz insegurança jurídica, tendo em vista a possibilidade de interposição dos demais recursos com efeito suspensivo. (SILVEIRA, 2016).
Em 17 de fevereiro de 2016, o pleno do STF, através do HC 126.292-SP decidiu sobre a possibilidade de execução provisória da pena a partir da confirmação por Tribunal de Segundo Grau. No acórdão foram vencidos os votos dos Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Melo e Ricardo Lewandowski, sendo vencedores os votos de Teori Zavascki, Edson Fachin, Luis Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes.
O caso em epígrafe, refere-se a habeas corpus impetrado em favor do paciente Márcio Rodrigues Dantas, que tem como autoridade coautora, o Ministro Presidente do STJ, Francisco Falcão, que através do HC 313.021-SP, indeferiu o pedido de liminar. Sintetizando, o paciente foi condenado à pena de 5 anos e 4 meses de reclusão no regime fechado, por praticar o delito de roubo majorado, previsto no art. 157, §2, I e II do CP, recorrendo em liberdade. A defesa apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo, e, além de terem seu pleito negado, deter- minaram a expedição do mandado de prisão contra o apelante/paciente. Em favor do apelante, a defesa impetrou habeas corpus no STJ, que foi indeferido pelo Ministro Presidente.
Ocorre que, de acordo com o entendimento dos Ministros vencedores, a Suprema Corte retomou a jurisprudência que vigorou até 2009 e por maioria, alterou o entendimento, decidindo que a presunção de inocência não impede a prisão decorrente de acórdão que confirma sentença penal condenatória.
Sustentam os Ministros que votaram a favor da execução da pena a partir da confirmação pelo Tribunal, que apenas o recurso de apelação tem o efeito suspensivo e que ao réu foi garantido o duplo grau de jurisdição. Ademais, o recurso especial e extraordinário não se presta para discutir matéria fático-probatória e não compromete o núcleo essencial do pressuposto da não-culpabilidade.
3.1 IDENTIFICAÇÃO DAS NORMAS QUE REGULAMENTAM A MATÉRIA
O princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade, tem origem na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1798, prevista no artigo 9º, e afirma que todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado. (JÚNIOR; BADARÓ, 2016).
Em 1948, a Assembleia da Organização das Nações Unidades, também dispôs explicitamente acerca do princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade em seu art.11, “todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenho sido provada de acordo com a lei”, dentre outras coisas.
Assim, posteriormente vários outros diplomas internacionais dispuseram e incorporaram em seus ordenamentos o princípio da presunção de inocência, de tal forma que, merecem destaques o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos, incorporados no ordenamento brasileiro, previstos respectivamente no Decreto n 592, de 6 de julho de 1992 e Decreto n 678, de 6 de novembro de 1992. (JÚNIOR; BADARÓ, 2016).
A presunção de inocência está prevista na Constituição Federal no art. 5, inciso LVII, e dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, posteriormente corroborado pelo Código de Processo Penal, no seu art. 283:
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.
Ademais, como forma de mitigação do princípio da inocência (LENZA, 2015), a Súmula 716 do STF, admite “a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinado, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória”. (TÁVORA; ALENCAR, 2016).
3.2 SOLUÇÃO DADA PELO TRIBUNAL
Por 7×4, o STF denegou a ordem ao HC 126.292 de SP, revogando a liminar concedida pelo Ministro Teori Zavascki (Relator), para que o réu respondesse em liberdade, na Apelação Criminal 0009715-92.2010.8.26.0268, do TJ-SP, tendo em vista a mudança no entendimento da matéria pelo pleno do STF, que considerou não haver ofensa ao princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade, a execução provisória da pena, após confirmação da condenação em sede de segundo grau. Essa foi a solução dada pelo Tribunal Federal.
3.3. DISCUSSÃO DA SOLUÇÃO
A decisão do STF, de acordo com os votos dos Ministros vencedores, em suma, tem como pressuposto, o princípio da efetividade jurisdicional, o alcance do princípio da presunção de inocência e a compatibilidade com a execução da sentença, antes do trânsito em julga- do, a impossibilidade de exame fático-probatória da matéria pelas instâncias Superiores, dentre outros.
A mudança de posicionamento da Suprema Corte, tem gerado polêmica, haja visto que de acordo com a opinião de doutrinadores, juristas e advogados renomados, como Aury Lopes Júnior, “relativiza o princípio da não culpabilidade”, com fundamento na efetividade das decisões judiciais.
O Ministro Barroso, ao comparar o Brasil aos demais países, faz referência ao voto prolatado pela Ministra Ellen Gracie, no julgamento do habeas corpus 85.886, “em país nenhum do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa, aguardando referendo da Corte Suprema”.
Ademais, dentre os argumentos utilizados, muito se discutiu acerca do momento em que a presunção de inocência se exaure. E por maioria, foi estabelecido que, a partir da confirmação da condenação em segundo grau, não há que se falar em análise de fatos e provas, exaurindo-se a presunção de inocência.
Lado outro, os ministros vencidos se ativeram a literalidade da Constituição Federal, diante da disposição expressa contida no Art. 5, inciso LVII e trouxeram a discussão o fato que ainda que o recurso especial e extraordinário não possuírem efeitos suspensivos, aos mesmos podem ser atribuídos, diante do caso concreto.
A discussão trouxe a lume, a segurança jurídica, pilar do Estado Democrático de Direito e princípio inerente a República, que foi posto em xeque, conforme voto da ministra Rosa Weber, haja vista a mudança ocorrida e seus efeitos na população carcerária.
Não obstante toda discussão na decisão do referido habeas corpus 126.292, em 05/10/2016, o STF manteve o posicionamento adotado, que autoriza a execução da pena após a condenação em segunda instância. Trata-se de duas medidas cautelares em ADCs 43 e 44, para declarar a constitucionalidade do art. 283 do CPP, que objetivavam, em suma, reverter o posicionamento da Corte sobre a execução da pena antes do trânsito em julgado. (MAR- QUES, 2016).
3.3.1 DISCUSSÃO DA SOLUÇÃO COM BASE EM DECISÕES DIVERGENTES
A discussão acerca da presunção de inocência chegou até o STF, através do HC 126.292-SP, haja vista ter preenchido o pré-requisito da repercussão geral da matéria, reconhecida pelo relator, Teori Zavascki, muito embora o verbete sumulado de nr. 691 do STF “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”, trata-se de decisão “manifestamente ilegal”, argumentou o relator, devido ao posicionamento consagrado pela Corte no HC 84.078/MG (Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, Dje de 26/02/2010).
A Corte Suprema tinha posicionamento consagrado desde fevereiro de 2010 acerca da presunção de inocência, ocasião que foi pacificado o entendimento que a prisão decorrente de condenação pressupõe o trânsito em julgado da sentença.
Sobre o tema presunção de inocência, o STF cita decisões anteriores, por exemplo, o HC 68.726 (Rel. Min. Néri da Silveira), realizado em 28/06/1991, em que foi assentado que a presunção de inocência não pode impedir a prisão decretada por acórdão, confirmada no recurso de apelação.
Recentemente, em julgamento ocorrido em 08.08.2017, divergiu o STF no HC 136.720, sinalizando uma possível mudança no posicionamento adotado no HC 126.292, objeto da presente análise de caso. Em decisão monocrática pelo Ministro Ricardo Lewandowski, concedeu a ordem, haja vista que, no caso concreto, o réu, servidor público, foi condenado a 8 anos e oito meses de reclusão no regime fechado, pelos crimes previstos no art. 313-A do CP – Inserção de dados falsos em sistema de informações e pelo delito de usura (art. 4° da Lei 1.521/1951).
No julgamento do referido habeas corpus 136.720 PB, ocorreu, conforme o Ministro relator (Ricardo Lewandowski), “verdadeiro reformatio in pejus”, haja visto que, o Tribunal de Justiça da Paraíba, reformou a decisão e reduziu a pena para 3 anos e 9 meses de reclusão, para o crime do art. 313-A CP e seis meses de detenção, para o delito de usura.
Ademais, o TJ-PB fixou regime inicial de cumprimento da pena em regime menos gravoso ao réu, passando do fechado para o aberto e possibilitando a substituição da pena privativa da liberdade pela restritiva de direitos.
Contudo, houve erro material ao publicarem o acórdão, já que constava uma pena de 5 anos de reclusão e 6 meses de detenção, maior do que a efetivamente concedida pelo TJPB, para serem cumpridas inicialmente no regime semiaberto.
A defesa opôs embargos declaratórios e foi rejeitado pelo TJPB, ao argumento que não houve omissão ou contrariedade. Dessa forma, foi impetrado HC 344.503 no STJ com pedido de liminar, o que foi indeferido. Pendente análise do mérito, até a presente data.
Diante do flagrante erro material, a defesa, interpôs o recurso de agravo em recurso especial no STJ – ARE 926.894-PB, e ainda não foi julgado o mérito. Todavia, o Ministro Jorge Mussi, decidiu contrariamente ao réu, fundamentando sua decisão no acórdão do HC 126.292, determinando ao juízo da execução, o início de cumprimento da pena.
Após tamanha teratologia, foi impetrado o habeas corpus 136.720, com pedido de li- minar, objetivando impedir a privação da liberdade do réu, haja vista, flagrante ilegalidade pelo STJ, a ordem foi concedida pelo Ministro Ricardo Lewandowski, de forma monocrática.
Acerca da discussão com base em posicionamentos divergentes do STF, merece atenção um dos quesitos argumentativos utilizado no voto do Ministro Barroso, em que funda- menta fazendo uso da teoria de Robert Alexy, regra de proporcionalidade ou técnica da ponderação. Afirma o Ministro “nos casos de colisão de princípios, será, então, necessário em- pregar a técnica da ponderação”.
Não se trata de colisão de princípios da efetividade jurisdicional x princípio da presunção de inocência. A Constituição Federal é clara ao dispor do princípio da não culpabilidade. Se o cidadão não pode ser declarado culpado até o trânsito em julgado, e o conceito de trânsito em julgado é a sentença que não cabe mais recurso, como é possível prender alguém, se ainda se discutiu a culpa? A prisão somente é possível, nos casos previstos em lei, tratando-se de prisão cautelar. (JÚNIOR, 2016).
3.3.2 DISCUSSÃO DA SOLUÇÃO COM BASE EM ARTIGOS, DOUTRINAS E DECISÕES
Acerca da presunção de inocência discutida no HC 126.292 – SP, destaca-se o parecer emitido por Aury Lopes Júnior e Gustavo Henrique Badaró que menciona como consequência da decisão, a relativização do princípio da não culpabilidade, “ Não é preciso maior esforço para compreender que não se trata como inocente fazendo uma execução provisória da pena despida de qualquer caráter cautelar (e aqui está a relativização admitida e demarcada da presunção de inocência) ”.
Outro argumento utilizado pelos Ministros vencedores, foi a falta de efeito suspensivo, em regra, do recurso extraordinário e especial, o que, em tese, não impedira a execução provisória da pena. Sobre esse argumento, o Ministro Celso de Melo, menciona em seu voto, dado trazido pelo Ministro Ricardo Lewandowski, que informa o percentual de “25,2% de recursos extraordinários criminais providos pela Corte, desde 2006, ano de sua posse no STF, até 2016 e 3,3% providos parcialmente”. Afirma o Ministro Celso de Melo, após análise das estatísticas, que a ele bastava somente 1 recursos ser provido, para não aceitar a execução antecipada da pena, antes do trânsito em julgado.
Para o Ministro Ricardo Lewandowski, a decisão do STF vai causar um grande impacto sobre a população carcerária: “vamos trocar 6 por meia dúzia”. O Ministro faz referência a saída de presos provisórios para a entrada de presos condenados em segundo grau e considera controvertida a decisão assentada no HC 126.292, já que, no RE 592.581 chegou-se à conclusão que o sistema penitenciário brasileiro está falido ou “encontra-se em um estado de coisas inconstitucional”.
O jurista Aury Lopes Junior, entende que é inconcebível a ideia do STF reconhecer o “Estado de Coisas Inconstitucional” do sistema carcerário e permitir a execução antecipada da pena. A decisão é “completamente descomprometida com a situação apontada, agravando-a substancialmente”.
Lênio Luiz Streck, jurista e advogado, logo após a decisão do habeas corpus, publicou em uma revista eletrônica online, a sua total insatisfação com o que foi decidido, haja vista que, “é um exemplo de ativismo judicial: não há fundamento jurídico constitucional que a sustente”. Na sua opinião, o STF feriu gravemente direitos e garantias fundamentais.
O Ministro Luís Roberto Barroso, na fundamentação do seu voto, denegando a ordem do HC 126.292, ou seja, admitindo a execução antecipada da pena, utiliza como um dos seus argumentos, que é preciso mudar o posicionamento do STF, pois assim estaria inibindo a excessiva interposição de recursos com o fito de protelar a decisão. Nesse sentido, para Thiago Bottino, o Poder Legislativo que é o órgão competente para tratar sobre o excesso de recursos, através de Emenda à Carta Federal, tendo em vista sua legitimidade.
Por outro ladro, Oscar Vilhena Vieira, colunista da Folha UOL, comentando a decisão do STF, manifestou favoravelmente, afirmando “é assim que ocorre em grande parte das democracias contemporâneas”. Dessa forma, para o jurista, a Corte acertou ao denegar a ordem, já que, nos demais países, a presunção de inocência finda na condenação em primeiro grau, confirmada pelo Tribunal.
CONCLUSÃO
Após análise da decisão do STF, conclui-se que tal acórdão é violador de direitos e garantias individuais, muito embora bem fundamentado, não obstante o ativismo judicial, a Suprema Corte é “guardião da Constituição e não, seu dono e tampouco o criador do Direito Processual Penal ou de suas categorias jurídicas”. (JUNIOR, 2016).
O texto Constitucional da presunção de inocência não é obscuro ou tampouco dúbio, o que não caberia interpretação contrária ao comando claramente expresso. Dessa forma, erroneamente o STF decidiu, denegando a ordem. (STRECK, 2016). Tanto é, que já deu indícios de mudanças no posicionamento, na decisão do HC 136.720, que aguarda julgamento do mé- rito.
O princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade é um princípio explícito, além de ser um direito e garantia fundamental de todo indivíduo para impedir os abusos do Estado. (NUCCI, 2016). Dessa forma, conforme mencionado em parágrafos anteriores, o princípio do estado de inocência foi incorporado ao ordenamento pátrio e violá-lo, significa violar tratados pelos quais a República Federativa do Brasil é signatária.
Não pode prosperar a justificativa da efetividade jurisdicional em detrimento da relativização ou ponderação do princípio da presunção de inocência, haja visto que não se trata de conflito entre os princípios. Tal argumento é, no mínimo, violador de outros princípios, como o princípio do contraditório, da ampla defesa e do in dubio pro reo.
A Carta Magna de 1988 representa uma conquista jurídica histórica, e ao adotar tal posicionamento, além de desconstituir direitos e garantias que foram duramente conquistados ao longo de séculos de transformações sociais e políticas, representa um retrocesso jurisdicional, (IASP, 2016), vez que, as garantias constitucionais são verdadeiras limitações constitucionais ao poder estatal.
Ademais, ao decidir sobre o habeas corpus, o STF não declarou a inconstitucionalizada- de do art. 283 do CCP, ao qual dispõe “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou (…). (BRASIL, 1941). O artigo supra- mencionado reforça e complementa o princípio da presunção de inocência e não poderia ter sido ignorado pelo Supremo. (STRECK, 2016).
As decisões proferidas no habeas corpus 126.292 e nas ADCs 43 e 44 não tem efeito vinculante, ou seja, não é erga omnes, consequentemente instala a insegurança jurídica, já que, cabe a cada Tribunal, no caso concreto, a análise e decisão. (NASCIMENTO, 2016).
Desta feita, após os argumentos apresentados, chega-se à conclusão que o Legislativo é poder legitimado e competente para alteração da legislação, o que foi equivocadamente realizado pelo Supremo, já que não resta dúvida ao comando expresso, tanto da Constituição da República de 1988, no seu art. 5, inc. LVII, bem como do art. 283 do Código de Processo Penal.
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[1] Especialização em Direito do Trabalho Universidade Anhanguera – Uniderp, Especialista em Ciências Criminais pela PUC-MG, graduado em Direito pelo Instituto Ensinar Brasil.
[2] Advogada, pós-graduanda em Direito do Trabalho pela UCAMPOMINAS, graduada em Direito pela FENORD/IESI.
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