Resumo. O presente trabalho científico aborda a importância dos princípios na hermenêutica jurídica. Passa especificamente sobre a sua aplicabilidade no Direito Tributário, no que tange à limitação dos Poderes Estatais na relação com o contribuinte. Apresenta diversos casos paradigmáticos. Pretende, ao seu final, estimular a reflexão jurídica quanto aos limites da aplicação da proporcionalidade tributária.
Palavras-chave: Tributário – Proporcionalidade – Limitação Estatal
Abstract: This paper addresses the importance of scientific principles in legal hermeneutics. Specific steps on their applicability in the Tax Law, with regard to the limitation of state powers in relation to the taxpayer. Presents several paradigmatic cases. Rather, at the end, encourage discussion about the legal limits of the application of proportionality tax.
Key words: Tax – proportionality – limit state
Sumário:
1. Introdução. 2. O princípio da Proporcionalidade. 3. Princípios Tributários Constitucionais. 4. A Proporcionalidade Tributária. 5. Conclusão. Bibliografia.
1 – INTRODUÇÃO
Vivemos, atualmente, o tempo dos princípios. Nossos Tribunais procuram aplicá-los diretamente nos mais diversos julgados, sobrepujando, em várias ocasiões, textos expressos de lei.
Contudo, não obstante a sua utilização irrestrita, a busca de um conceito vem revelando-se um trabalho árduo para a doutrina. Afirma-se que a quantidade de definições sobre princípio varia na mesma proporção daqueles que buscam dissertar sobre o tema. Conceituá-los, portanto, não é tarefa das mais fáceis.
As definições são várias. Vale citar, a título de amostragem, alguns juristas como Celso Antônio Bandeira de Mello, comumente citado pelos operadores do direito, que em lição sobre o tema, afirma:
“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, dispositivo fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.”
Já para J. J. Gomes Canotilho: princípios são “exigências de optimização abertas a várias concordâncias, ponderações, compromissos e conflitos”, “são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionamentos fáticos e jurídicos”, enquanto as regras são “normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõem, permitem ou proíbem) que é ou não cumprida”, constituem exigências de aplicação.
É certo que a quantidade de divergência tem como causa a diversidade de critérios observados, além do fundamento teórico na elaboração do seu conceito.
Diante deste contexto, existem, ainda, vozes no sentido de que não se deve sequer buscar um conceito jurídico de princípio, mas aceitar e compreender o fato de que vários autores o qualificam de uma forma ou de outra e que, o termo princípio pode se referir a vários fenômenos distintos.
Em torno deste contexto apresentado, o Direito Constitucional contemporâneo acentua a força normativa dos princípios constitucionais.
De acordo com a lição de PAULO BONAVIDES, é na idade do pós-positivismo que tanto a doutrina do Direito Natural como a do velho positivismo ortodoxo vêm abaixo, em decorrência de reação intelectual comandada por RONALD DWORKIN, jurista de Harvard. Os princípios, então, passaram a ser tratados como direito.
Foi, portanto, na doutrina anglo-saxônica que a evolução da teoria dos princípios e a sua inserção no ordenamento normativo recebeu a decisiva contribuição. Dworkin elaborou uma investida ofensiva ao positivismo, (“general attack on positivism”), sobretudo ao modo aberto de argumentação permitido pela aplicação do que o jurista viria a definir como princípios.
Buscando diferenciar princípios de regras, Dworkin elaborou uma distinção quanto a estrutura lógica, baseada em critérios eminentemente classificatórios, em vez de comparativos.
Portanto, para o autor anglo-saxão, princípios possuem uma dimensão de peso, uma vez que, em caso de colisão, não haverá uma declaração de invalidade, assim como se faz com as regras, mas uma ponderação, em que um princípio com peso maior sobrepõe ao outro.
Alexy, partidário das considerações de Dworkin, acrescentou à definição de princípios a expressão “deveres de otimização”, segundo o qual seriam aplicáveis em diversos graus, segundo as possibilidades normativas e fáticas.
Estudioso da jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão, Alexy demonstra que a relação de tensão entre princípios somente será concretizada mediante avaliação do caso concreto.
Neste exato sentido, resumindo o ensinamento deste autor, essa espécie de tensão e o modo como ela é resolvida é o que distingue os princípios das regras: enquanto no conflito entre regras é preciso verificar se a regra está dentro ou fora de determinada ordem jurídica (“problema do dentro ou fora”), o conflito entre princípios já se situa no interior desta mesma ordem (“teorema da colisão”).
Portanto, atualmente, o contexto que melhor se aproxima de uma correta definição de princípio, é aquele que o diferencia do conceito de regra.
Deste modo, ao procurar o conceito de princípio na forma acima descrita, busca-se direcionar o presente estudo para o seu âmago, o dever de proporcionalidade na aplicação dos princípios constitucionais tributários frente o diuturno conflito de interesses entre o contribuinte e o Poder Público.
2 – O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Em verdade, o princípio da proporcionalidade é antiqüíssimo. Paulo Bonavides observa que a sua aplicação clássica e tradicional situou-se estritamente no campo do Direito Administrativo.
Segundo uma parte da doutrina, o seu surgimento teria efeito com a transição do Estado Absolutista para o Estado de Direito, em razão das teorias jusnaturalistas criadas na Inglaterra, entre os séculos XVII e XVIII que determinavam a observância do Poder Público aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, na medida em que o ser humano tem direitos inerentes à sua natureza e anteriores ao surgimento do próprio Estado.
Já a sua evolução decorreu da resposta ao absolutismo predominante pela burguesia européia, em considerável expansão, objetivando a defesa dos direitos e interesses individuais sem a intervenção desmedida do Estado Absolutista. Como resultado trouxe a redução da atuação desmedida do rei frente aos súditos, valendo-se do princípio da proporcionalidade como um eficaz modo de controle e proibição do excesso do poder monárquico frente aos direitos e garantias fundamentais.
Contudo, atualmente, vem sendo no Direito Constitucional que o princípio da proporcionalidade apresenta a sua definição. Apesar da sua magnitude, o tema ainda não recebeu da doutrina constitucionalista um tratamento à altura.
Inexiste na atual Constituição da República disposição expressa ao princípio da proporcionalidade, a não ser de forma implícita no princípio do devido processo legal; diferentemente, por exemplo, à Constituição de Portugal que, consoante Guerra Filho, dispõe em seu artigo 18º sobre a “força jurídica” dos preceitos constitucionais consagrados de direitos fundamentais. Contudo, foi sob as mais diversas influencias na doutrina estrangeira que o princípio da proporcionalidade foi recepcionado por nosso ordenamento jurídico.
Coube ao Supremo Tribunal Federal a introdução do princípio no campo jurisprudencial, ao preceituar, no julgamento do RE 18.331, Relator Ministro Orozimbo Nonato, que:
“o poder estatal de taxar não pode chegar à desmedida do poder de destruir, uma vez que aquele somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade de trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de propriedade, sob pena de caracterizar ‘detournement de pouvoir’”.
E, posteriormente à esta decisão, o princípio da proporcionalidade foi praticamente disseminado em várias outras emanadas nos nossos diversos Tribunais.
No entanto, levada a efeito a sua aplicabilidade, surgia o questionamento de que a regra de proporcionalidade poderia produzir uma certa ascendência do juiz sobre o legislador.
Paulo Bonavides, uma das vozes abalizadas sobre o assunto, pensa que não, ao afirmar o seguinte:
“Com efeito, a limitação aos poderes do legislador não vulnera o princípio da separação, de Montesquieu, porque o raio de autonomia, a faculdade política decisória e a liberdade do legislador para eleger, conformar e determinar fins e meios se mantém de certo modo plenamente resguardada. Mas tudo isso, é óbvio, sob a regência inviolável dos valores e princípios estabelecidos pela Constituição.” (Curso de Direito Constitucional, p. 399, 18ª edição).
É indubitável que essa supremacia principiológica somente guarda fundamento de validade, caso esteja amparada aos postulados da liberdade, da contenção dos poderes do Estado e dos direitos fundamentais.
No campo prático a sua aplicação se restringe apenas à situações em que exista uma relação da causalidade entre os elementos, meio e fim, de maneira que possa examinar os três pontos fundamentais, que sem os quais, certamente, não terá aplicabilidade: o da adequação (o meio ser adequado ao fim); o da necessidade (entre os meios disponíveis e adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do direito fundamental afetado) e o da proporcionalidade em sentido estrito (aqui se faz o juízo de ponderação, investigando se as utilidades trazidas pela realização do fim não for na mesma proporção ao desvalor das restrições trazidas aos direitos fundamentais).
Via de regra, a importância do princípio tem crescido de maneira considerável no Direito Constitucional. A lesão ao princípio assume maior relevância naqueles sistemas hermenêuticos formados pela teoria material da Constitucional, no sentido de que, intimamente ligada ao conceito de Constituição Real, privilegia os interesses sociais, valorizando o objeto propriamente dito em desfavor da forma.
Conclui-se, em um primeiro ponto, que o princípio da proporcionalidade é totalmente consentâneo com a ordem constitucional brasileira, fundamentando a sua aplicabilidade no art. 5o, inciso LIV da Constituição Federal (princípio do devido processo legal).
3 – PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS CONSTITUCIONAIS
A Constituição da República dispôs sobre o Sistema Tributário Nacional reforçando a enumeração dos princípios tributários em nível da cláusula pétrea, limitando a ação de legisladores ordinários no que tange a imposição fiscal.
Como preleciona Aliomar Baleeiro em sua obra Limitações Constitucionais ao poder de tributar, “o sistema tributário movimenta-se sob a complexa aparelhagem de freios e amortecedores, que limitam os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do regime e dos direitos individuais”. É em decorrência deste sistema que os princípios tributários possuem inquestionável importância.
Em verdade, os princípios tributários previstos no corpo da Constituição da República retratam a preocupação do constituinte em regular a atuação do Poder Público em face dos cidadãos, de maneira que sejam impedidos eventuais abusos cometidos em detrimento destes.
Segundo Hugo de Brito Machado:
“Tais princípios existem para proteger o cidadão contra os abusos do Poder. Em face do elemento teleológico, portanto, o intérprete, que tem consciência dessa finalidade, busca nesses princípios a efetiva proteção do contribuinte.”
Os princípios constitucionais tributários vêm, em regra, elencados no Título VI, da Constituição da República. Em muitos casos, são repetições de princípios constitucionais gerais, reiterados pelo sistema tributário, com o objetivo de acentuar sua intensidade e importância.
Segundo parte da doutrina, podem ser separados, didaticamente, em princípios: a) que preservam a segurança jurídica e não-surpresa dos contribuintes (legalidade, anterioridade, noventena e irretroatividade); b) que dizem respeito à justiça tributária brasileira (isonomia, capacidade contributiva, proibição ao confisco); c) que resguardam o pacto federativo (proibição de limitação ao tráfego, uniformidade da tributação, proibição de discriminação em função da origem ou destino, proibição de isenções heterônomas).
O princípio da legalidade tributária carrega o entendimento de que nenhum tributo pode ser majorado ou instituído sem que seja mediante lei, ou seja, só é possível criar-se nova regra de incidência ou majorar-se a base de cálculo ou a alíquota através de lei regularmente instituída.
Em virtude do princípio da anterioridade, o tributo deve ser cobrado no exercício seguinte àquele em que foi publicada a lei que o instituiu. Enquanto a noventena, incluída pela EC 42/03, (art. 150, III, c), descreve que, além de ser publicada no exercício anterior, a lei tem sua eficácia postergada para noventa dias da data em que haja sido publicada.
Já o princípio da irretroatividade prescreve que a lei tributária não pode alcançar fatos geradores ocorridos antes da vigência da lei que houver instituído ou aumentado (art. 150, III, a).
Quanto aos princípios que resguardam a justiça tributária, vale citar o princípio da isonomia tributária, exposto como uma demonstração específica do princípio global da igualdade, é o princípio fundamental da ordem constitucional instituída pela Constituição. Neste ponto, vale citar as definições de Rui Barbosa (a igualdade consiste em tratar igualmente os iguais, e desigualmente os desiguais), e San Tiago Dantas, segundo o qual a igualdade não é uniformidade de tratamento jurídico, mas tratamento proporcionado e compensado, de seres vários e desiguais.
Paralelamente à igualdade, menciona-se o princípio da capacidade contributiva. Por ele, sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. Isto quer dizer que o Estado deve garantir suas necessidades de natureza econômica, sem impossibilitar a subsistência dos contribuintes, exaurindo-lhes recursos além do devido.
O princípio da vedação ao confisco afirma que os tributos não poderão incidir sobre parcela considerável do fato imponível, de modo que o Estado absorva parcela considerável dos meios de produção.
Quanto aos princípios que resguardam pacto federativo, vale citar o princípio da vedação a limitações ao tráfego de pessoas e bens, que estabelece que os entes da Federação não podem, por meio de tributos, impor limitações ao tráfego, interestadual ou intermunicipal, de pessoas ou bens.
Pelo princípio da uniformidade geográfica da tributação, a Federação deve ser uma unidade geográfica, política e econômica, razão pela qual, a União não pode instituir tributo que não seja uniforme em todo território nacional e, quanto a tributação da renda das obrigações da dívida pública dos Estados, Distrito Federal e Municípios e a tributação da remuneração e proventos dos servidores públicos, é vedada a adoção de níveis superiores para a tributação das obrigações federais e da remuneração dos servidores federais.
Já em função do princípio da vedação à discriminação da origem ou do destino, a Constituição afirma que os Estados, Distrito Federal e Municípios não podem estabelecer disparidade tributária entre bens e serviços, em razão da procedência ou destino.
Por fim, o princípio da proibição de isenções heterônomas, estabelece que a União não pode instituir isenções de tributos de competência estadual, distrital ou municipal, a não ser em casos previamente especificados no texto constitucional, como aquele previstos ao ICMS (art. 155, § 2º, XII, e, f) e ao ISS (art. 156, § 3º, I).
Vale registrar que, em virtude da natureza desta obra, não serão mencionados a existência de outros princípios, (que melhor seriam definidos como regras) em virtude da sua pertinência a alguns impostos específicos, como o da não-cumulatividade, relativo ao IPI e ao ICMS e ao da progressividade, que diz respeito ao ITR, IPTU e IR.
Elencados, portanto, os princípios tributários expressos na Constituição, o próximo ponto irá destacar a proporcionalidade, qualificado por alguns, como Humberto Ávila, como verdadeiro postulado, por se situar em posição superior aos princípios e que, segundo diversas decisões oriundas do Supremo Tribunal Federal, tem o seu campo de aplicabilidade na resolução dos conflitos entre os diversos princípios constitucionais.
4 – PROPORCIONALIDADE TRIBUTÁRIA
Conforme visto acima, o direito tributário é marcado no Brasil por ter uma forte carga principiológica e conceitual. Os princípios, assim como os conceitos, são inúmeros. Utilizamos necessariamente, como forma de resolução dos conflitos, o princípio da legalidade, da anterioridade, da vedação ao confisco; assim como os conceitos de base de cálculo, isenção, remissão e assim por diante.
No entanto, por diversas vezes, tal aparato entra em conflito. É perfeitamente possível a entrada de um princípio em um campo de atuação de outro. Por exemplo, até que ponto deve ser utilizado o princípio da legalidade, quando o tributo aplicado é um convite ao confisco, não obstante a sua previsão expressa na norma.
Com fundamento nestas imperfeições, a proporcionalidade tributária vem ganhando cada vez mais aplicações na área fiscal. Apesar da ainda incipiente base teórica, os Tribunais vêm, paulatinamente, aplicando-o nos mais diversos julgados.
Para que possamos introduzir a análise, interessante mostrar, inicialmente, a sua aplicabilidade em alguns julgados do Supremo Tribunal Federal.
Em um caso, a Excelsa Corte analisou a constitucionalidade de uma lei estadual editada pelo estado do Paraná. Previa a regra que todas as transportadoras deveriam transportar botijões de gás vendidos à vista do consumidor, munidas de uma balança especificamente aprovada pelo Inmetro. Inobstante o nítido caráter protetivo do consumidor veiculado pela regra, as empresas de transporte se queixaram da infringência a sua liberdade de iniciativa e do livre exercício da atividade econômica.
O Supremo Tribunal Federal ao analisar e julgar a questão declarou a lei inconstitucional, porque seria desproporcional.
Outro caso julgado pelo STF onde os Ministros utilizaram do significado da proporcionalidade, foi na ADI nº 551/RJ, quando invalidou o artigo 57, §§ 2º e 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, ao se vislumbrar desproporção entre a violação da norma tributária e a multa. Vale salientar que nestes dispositivos, as multas alcançavam o patamar de duas a até cinco vezes o valor do tributo não pago. Os Ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio votaram no sentido de reconhecer a necessidade de existir um equilíbrio entre o valor da multa e a natureza da infração tributária. Já o Ministro Sepúlveda Pertence, declarou expressamente uma certa dificuldade em qualificar o que seja confiscatório, no sentido exato de sua proporcionalidade em relação ao tributo.
Outra aplicação da proporcionalidade foi na Representação no. 1.077 de 1984. Neste caso, discutia-se a constitucionalidade de dispositivos constantes da Lei nº 383/80, do Estado do Rio de Janeiro, que elevava os valores da taxa judiciária naquela unidade federada, fixando em 2% sobre o valor do pedido o quantum devido pelo jurisdicionado. Em seu voto, o relator, Ministro Moreira Alves desenvolveu a idéia de equivalência razoável entre o custo de serviço e a prestação cobrada, e entendeu que a ausência de limites quanto à fixação do valor da taxa judiciária levaria, na hipótese de causas acima de determinado valor, a uma soma exorbitante e, portanto, desproporcional ao custo real da atuação do Estado em favor do contribuinte.
Por outro lado, em relação às sanções tributárias, no julgamento do RE 239.634, os Ministros entenderam que a multa moratória fixada em 20% do valor do imposto devido, não se mostra abusiva ou desproporcional, inexistindo ofensa aos princípios da capacidade contributiva e da vedação ao confisco.
Diante destes casos paradigmáticos, mister reanalisar a questão e o entendimento que se deve ter a respeito do significado da proporcionalidade, excluída a análise de eventual concordância ou não com as decisões do Supremo Tribunal Federal.
Consoante inicialmente explanado, o primeiro é a adequação. Ou seja, deve-se perquirir se o Estado utilizou estas medidas para proteger os cidadãos. Nos primeiros casos, o Supremo entendeu que a medida seria desproporcional por submeter os jurisdicionados à medida impertinente ou arbitrária. Enquanto no último, entendeu a Colenda Corte que o percentual da multa é apto a obrigar o pagamento do tributo sem atingir o patrimônio do contribuinte.
Em segundo lugar, considerando que é dever do Estado a proteção dos seus cidadãos, caso exista a possibilidade dos mesmos serem protegidos de uma outra forma, menos restritiva, deve ser escolhida esta última. Segundo Humberto Ávila, o Estado não deve apenas proteger um princípio, mas deve proteger a realização de outros princípios. Todos devem ser garantidos ao mesmo tempo. Assim, existindo mais de um meio para atingir um fim, deve-se escolher aquele meio que, para atingir um fim, provoca menos efeitos negativos relativamente aos outros princípios, que também têm que ser garantidos. O Supremo projetou a existência de outros meios. E, nas primeiras decisões acima narradas vislumbrou outras hipóteses, passíveis de utilização, que resguardariam melhor a aplicabilidade de outros princípios.
Por fim, analisou a Colenda Corte a proporcionalidade em sentido estrito. Segundo Ávila, nas hipóteses em que o Poder Público utiliza uma medida para promover um fim, a realização deste fim deve ser analisada, porque ela gera um valor e este tem que ser avaliado. Diz a Constituição que devemos proteger o contribuinte, pois o seu texto determina expressamente que o Poder Público deve adotar medidas para sua proteção. A apuração da proporcionalidade em sentido estrito exige do seu intérprete, a interface entre as vantagens advindas da utilização da medida e as desvantagens causadas pela adoção da mesma medida e a sua comparação. Nos primeiros casos, entendeu a Corte Suprema que existem perdas maiores que ganhos. O que indica uma desproporção entre estes valores, de forma que a adoção da medida pelo Estado está mais restringindo a ordem constitucional do que a promovendo.
Ao analisar estas questões, chega-se ao ponto de que a proporcionalidade não vem a ser exatamente um princípio, mas um critério para a aplicação dos princípios e um meio de se evitar entre eles, a sua colisão.
Segundo Humberto Bergmann Ávila, a proporcionalidade é um postulado que se aplica quando houver um conflito concreto entre princípios. Por exemplo, há que se ponderar proporcionalmente entre proteger o consumidor e a liberdade de iniciativa, como no caso dos botijões. Outrossim, entre a capacidade contributiva do cidadão e a vedação ao confisco dos tributos.
Portanto, a proporcionalidade deve ser aplicada quando houver colisão concreta entre princípios e cabe ao Poder Público adotar uma medida para a promoção de um deles. Claro que se não houver esta hipótese, não se cogita a aplicação da proporcionalidade.
5 – CONCLUSÃO
A proporcionalidade, qualificada por muitos como verdadeiro princípio, possui origens que remontam o Direito Germânico. Após a sua plena aplicabilidade naquela região, ganhou adeptos em toda Europa e também no Brasil, possibilitando que estes países construíssem uma doutrina e uma jurisprudência sobre o tema em questão.
Quanto à concepção atual da proporcionalidade, é importante observar que a doutrina brasileira vem expondo a sua divisão em três repartições, a saber: a) princípio da adequação; b) princípio da necessidade ou da exigibilidade; c) princípio da proporcionalidade em sentido estrito ou máxima do sopesamento.
No Brasil, a aplicação do postulado da proporcionalidade pelos Tribunais, já demonstram uma fundamentação de conteúdo, ao ponto de serem várias as decisões judiciais que citam expressamente a necessária observância da proporcionalidade nos pontos relativos aos conflitos entre princípios e garantias fundamentais.
Mais especificamente, no campo fiscal, a colisão entre princípios é assaz freqüente, conforme acima demonstrado, sendo comum a discussão entre os seus diversos conceitos e campo de aplicabilidade; por isso torna-se indispensável a correta compreensão do postulado da proporcionalidade para dirimir as questões que causam, sobretudo, impacto na ordem jurídica nacional.
Desta forma, em fase embrionária inicia-se na doutrina o estudo da análise das causas e efeitos. Imprescindível será uma nova abordagem hermenêutica do caso, uma vez que os princípios, ao contrário das regras, não entram em conflitos abstratos.
Observa-se, por derradeiro, que o postulado da proporcionalidade é cada vez mais utilizado na fundamentação das decisões do Supremo Tribunal Federal, que busquem a resolução de casos impactantes, que envolvem necessariamente os conflitos entre princípios e garantias fundamentais. Contudo, tais decisões demonstram que ainda há um longo caminho a percorrer na real definição do autêntico sentido do postulado da proporcionalidade.
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