Resumo: Propõe-se uma análise sobre o tema, a partir do seu surgimento, do seu conceito, a constituição do seu vínculo segundo a lei, seus efeitos (de ordem pessoal e de ordem patrimonial) e seus princípios, tanto os que possuem relação direta com os direitos da infância e juventude quanto os que são aplicáveis nas medidas protetivas. Ressaltamos as causas de inexistência, anulabilidade e nulidade, verificamos os diversos tipos de adoção e suas características, trazemos o papel dos Órgãos Públicos, como o Ministério Público, o Conselho Tutelar e as equipes multidisciplinares. Por fim, demonstramos as diversas diferenças existentes entre a teoria e a prática da adoção, confrontando ambos. Demonstramos a relação que há entre a família, a sociedade e o Estado com as crianças e os adolescentes, debatendo elementos de estudo e reflexão a respeito de como efetivamente mudar essa realidade a fim de alcançar o verdadeiro equilíbrio através de uma nova “cultura de adoção”. Demonstramos o inevitável preconceito ainda existente com relação a tal instituto e a falta de consciência muitas vezes do próprio adotante ao esquecer que a adoção é acima de tudo um pleno e nobre ato de amor. No desenvolvimento de nosso estudo utilizamos a pesquisa bibliográfica, investigando a legislação e o ordenamento jurídico a respeito do tema com o intuito de verificar a aplicabilidade dos mesmos. Com relação ao estudo de material trazemos principalmente doutrinas, artigos científicos, revistas periódicas, textos extraídos da internet que abordam o tema em análise, e demais fontes escritas para maior aprofundamento do conteúdo abordado. Vale ressaltar ainda os diversos entendimentos jurisprudenciais que trazem uma maior compreensão de como a adoção em suas várias vertentes está sendo abordada nos tribunais do nosso país.
Palavras chave: Adoção, Aplicabilidade das leis, Nova “cultura de adoção”.
Abstract: This research presents the adoption in Brazil, with legislation that has numerous ways to protect children and adolescents and a totally different reality theory. In proposing a stiff examination on the subject we quote the first appearance of the adoption concept, constitution of their bond according to law, its effects (personal and patrimonial order) and its principles, both those that have a direct relationship with the rights of children and youth and those who apply the protective measures. We emphasize the causes of nonexistence, nullity and void, we find different types of adoption and its features, bring the role of public agencies, and the prosecutor, the Guardian Council and multidisciplinary teams. Finally we demonstrate the many differences between theory and practice of adoption, confronting both. We demonstrate the relationship that exists between the family, society and the state with children and adolescents, discussing elements of study and reflection on how to effectively change this reality in order to achieve true balance through a new “culture of adoption”. We demonstrate the inevitable bias that still exists with respect to such instrument and the lack of awareness often the adopter’s own forget that adoption is above all a full and noble act of love. In developing our study we used the literature, investigating the law and the law on the subject in order to verify the applicability of the same. Concerning the study of material mainly bring doctrines, papers, periodicals, texts from the internet that address the topic under review, and other written sources for greater depth of content covered. It is worth noting the various jurisprudential understandings that bring a greater understandings of how the adoption in its various aspects are being addressed in the courts of our country.
Keywords: Adoption, Applicability of laws, new “culture of adoption”.
Sumário: 1. Introdução; 2. A adoção e suas origens; 3. Adoção e arrependimento; 4. Princípios que concernem os direitos da infância e juventude; 5. Dos princípios aplicáveis às medidas protetivas; 6. Filho de criação ou afetivo, adoção simulada e outros tipos de adoção; 7. Adoção por homossexuais; 8. Adoção internacional; 9. O papel dos órgãos públicos; 10. Teoria versus realidade; 11. Conclusão. Referências
1 Introdução
A aplicabilidade de algumas leis no Brasil traz a imagem de demagogia (condução do povo a uma falsa situação). Demagogias jurídicas e legislativas vivem diariamente se confrontando com a realidade de um país que não possui controle demográfico, política populacional, planejamento familiar, e uma sociedade que não discute efetivamente todas essas relações, transformando o Estado, a família e a sociedade “rivais” de si mesmos. A falta de interação entre o que acontece na realidade e o que se diz teoricamente é notável e clara.
As contradições o tempo todo são encontradas, é o que percebemos em um país com as mais diversificadas etnias enquanto os interessados em adotar um filho continuam idealizando crianças que não são encontradas nos abrigos. É a voz do preconceito e a falta de conhecimento da nossa realidade social
Enquanto as crianças e os adolescentes são sujeitos de direitos e possuidores da condição política de prioridade absoluta, na prática, por não possuírem consciência total em relação aos seus direitos são confrontados com a realidade do abandono e do esquecimento. Nesse espaço, a sociedade tem sido apenas mera expectadora, com o Estado possuindo um verdadeiro sistema desestruturado e fracassado.
De acordo com o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), dados do ano de 2010 afirmam que no Brasil existem 26.138 pretendentes aptos para adotar, enquanto que 4.364 crianças e adolescentes estão disponíveis, as razões são: destituição do convívio familiar, entrega pelos seus próprios pais ou por serem órfãos.
Neste contexto, é notável a necessidade de mudanças nas políticas públicas do Estado, na conduta das instituições, das famílias e dos próprios cidadãos, como meios que facilitem a "proteção especial" prevista constitucionalmente.
Destarte, o presente estudo se propõe a apresentar a adoção no Brasil demonstrando a legislação que dispõe de inúmeras formas de proteção para a criança e ao adolescente e uma realidade totalmente oposta.
A partir do debate com elementos de estudo e reflexão, trazemos soluções que possam alcançar um verdadeiro equilíbrio entre a família, o Estado e a sociedade, demonstrando o papel e a responsabilidade de cada um com as crianças e os adolescentes.
Por fim, através da investigação da legislação e do ordenamento jurídico, como a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil, entendimentos jurisprudenciais e às demais leis pertinentes ao assunto percebemos que estamos diante de uma realidade que apresenta um enorme abandono material, moral, espiritual, afetivo e social para com as crianças e adolescentes a serem adotados.
2 A adoção e suas origens
Adotar, do latim adoptare, implica justamente na escolha. Podemos dizer que sua origem segundo Washington de Barros Monteiro se deu na era romana, época na qual o indivíduo sem descendência buscava realizar o sonho de ter seu filho para cumprir o dever de continuar seu nome e garantir o culto espiritual da família.
A adoção passou a ser vista como a opção de continuar o ciclo familiar daquelas famílias que não possuíam quem garantisse o culto doméstico. Através de uma crença existente naquela época afirmavam serem os vivos governados pelos mortos. Com base nisso, os ancestrais falecidos ofereciam preces e sacrifícios para que pudessem proteger seus descendentes. A adoção, assim, veio a ser a responsável por perpetuar a família e sua religiosidade.
Podemos citar Roma como um dos países mais importantes quanto a adoção, sendo um instituto bem utilizado na época, era apresentado de duas formas: ad rogatio (adrrogação – adotavam as pessoas sui juris, ou seja, aquelas que não dependiam de outrem, incluindo os seus dependentes. Pertencia ao direito público, portanto, possuía forma solene e levava em consideração o interesse do Estado) e adoptio (adoção – eram adotadas apenas as alieni juris, ou seja, sob o poder familiar e pertencia ao direito privado).
Vale ressaltar que o romano apesar de ter dado caráter técnico a adoção, trouxe uma característica mais marcante e importante que é a relação de afetividade, o encontro de almas que se dá quando um pai encontra e toma para si uma criança fazendo dela seu filho.
Tal instituto teve maior índice enquanto cultuavam os mortos, ao desaparecer essa base religiosa acabou entrando em declínio. Na Idade Média houve certo esquecimento e foi trazida de volta pelos franceses com novos fundamentos e nova regulamentação com base no código de Napoleão. A partir daí foi atingindo as legislações modernas e o mundo.
Dessa forma, “A adoção é ato solene pelo qual se aceita em lugar de filho aquele que por natureza não é tal…” (“Adoptio est actus solemnis quo in loco filii vel nepotis adscicitur qui natura talis non est…”). Assim, percebemos um dos grandes valores entre os seres humanos, amar ao próximo.
De acordo com Lídia Weber:
“A questão não é recente. O abandono de crianças esteve presente na história da humanidade desde tempos imemoriais. Para solucionar este grave problema, foram realizadas as mais dolorosas e terríveis (como o infanticídio e as Rodas dos Expostos) até as mais altruístas e sublimes. Diversas ações humanitárias tinham o objetivo de proporcionar o acolhimento dessas crianças, e as mais diferentes culturas tentaram encontrar códigos sociais que refletissem outros tipos de agrupamentos familiares que não aqueles ligados estritamente aos laços de sangue. A adoção como é compreendida atualmente, é uma maneira de acolher uma criança (sem família) e transformar em filho (a). No entanto, a adoção apresentou diferentes significados ao longo dos tempos e das sociedades”.[1]
A adoção no Brasil teve com o Código Civil de 1916 a instituição do tema e todas as exigências originárias. Ao entrar em desuso se reergueu com a Lei nº 3.133, de 18 de maio de 1957, reduzindo a idade do adotante para 30 anos (era 50) e a diferença de idade entre adotantes e adotado por 16 anos. Também estabeleceu o quinquênio de casamento para adotar e dispôs sobre o consentimento do adotando, o direito ao nome, à sucessão e ao desfazimento do vínculo. Todavia, sem o resultado esperado acabou continuando em desuso.
Em 1965 a Lei nº 4.655 instituiu a legitimação adotiva, forma mais ampla da adoção, pela qual o adotado ficava quase equiparado aos direitos e deveres do filho legítimo, salvo nos casos de sucessão hereditária. Em 1969, a Lei nº 6.697, instituiu o chamado Código de Menores, trazendo um inicial avanço sobre a adoção. O Código de Menores passou a acolher a Teoria da Proteção Integral do Menor.
A Constituição Federal de 1988 dispôs apenas da adoção, no artigo 227, § 5º, sem distinguir qualquer de suas formas atuais, trazendo que: "A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”.
Para dar maior ênfase e suprir o disposto na Constituição regulando a matéria de maneira mais específica, foi editada a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que, dispôs sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), revogou até então o Código de Menores, consolidando a Teoria da Proteção Integral do Menor (art. 1º). Em seguida encontramos o Código Civil de 2002 trazendo várias disposições sobre o tema e a atual Lei nº 12.010 de 3 de agosto de 2009, trazendo diversas alterações na Lei 8.069/90.
Segundo Oliveira (2010), adoção é “um ato jurídico que estabelece relações civis de paternidade e filiação”.
Com base em Orlando Gomes:
“A adoção é um ato jurídico que estabelece, independentemente do fato natural da procriação, o vínculo da filiação. Trata-se da ficção, que permite a constituição, entre duas pessoas, do laço de parentesco do primeiro grau em linha reta”. (2001, p. 108)
Arnoldo Wald (2001) traz o conceito de que “a adoção é uma ficção jurídica que cria parentesco civil. É um ato jurídico bilateral que gera laços de paternidade e filiação entre pessoas para as quais tal relação inexiste naturalmente”. Afirma também que há autores que definem a adoção como um instituto que oferece ao filho adotivo status igual ao do filho biológico.
Sob o prisma legalista, a adoção pode ser conceituada como a atribuição de direitos de filho próprio a um filho de outra pessoa, passando ele a ter direitos e deveres, inclusive sucessórios de um filho natural. Lembrando que todos os vínculos com pais e parentes consanguíneos serão eliminados, com exceção dos impedimentos matrimoniais que continuarão existindo. Ressaltamos que o vínculo da adoção é constituído por sentença judicial e não pode ser revogado.
Ao falar de adoção não podemos esquecer que a sua maior característica é o pleno ato de amor, ato incondicional, como são a maternidade e a paternidade. De acordo com Diniz (2007) é “dar filhos àqueles a quem a natureza negou para melhorar a condição moral e material do adotado”.
Nesse sentido, a referida autora apresenta o conceito de adoção como o ato jurídico solene pelo qual alguém estabelece irrevogável e independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que geralmente lhe é estranha.
Segundo Gustavo Rodrigo Picolin:
“O instituto da adoção é uma modalidade artificial de filiação pela qual se aceita como filho, de forma voluntária e legal, um estranho no seio familiar. O vínculo criado pela adoção visa imitar a filiação natural, ou seja, aquele oriundo de sangue, genético ou biológico, razão pela qual, também é conhecida como filiação civil. No que tange sua conveniência, muito se discute: em relação à criança ou ao adolescente carente ou abandonado, é inafastável, todavia, quanto àquele que não se encontra numa das situações acima elencadas, há quem diga que possibilita a fraude fiscal, tráfico de menores, etc”[2].
Picolin traz ainda o conceito de adoção segundo Antônio Chaves:
“Ato sinalagmático e solene, pelo qual, obedecidos os requisitos da lei, alguém estabelece, geralmente com um estranho, um vínculo fictício de paternidade e filiação legítimos, de efeitos limitados e sem total desligamento do adotando de sua família de sangue.”[3]
De acordo com Carolina Passos Israel:
“A adoção é a modalidade artificial de filiação que busca imitar a filiação natural, este ato civil nada mais é do que aceitar um estranho na qualidade de filho, pois não resulta de uma relação biológica, mais de manifestação de vontade ou de sentença judicial. A filiação natural repousa sobre o vínculo de sangue enquanto a adoção é uma filiação exclusivamente jurídica que se sustenta sobre uma relação afetiva. A adoção é, portanto, um ato jurídico que cria relações de paternidade e filiação entre duas pessoas e este ato faz com que uma pessoa passe a gozar do estado de filho de outra pessoa”.[4]
A psicóloga e psicoterapeuta Cintia Liana afirma que:
“A adoção é o processo de acolher, afetiva e legalmente, uma criança ou adolescente que seja percebido e sentido como verdadeiro um filho. O filho adotado, gerado por outra pessoa, passa a ocupar no universo afetivo e familiar do adotante o lugar de filho legítimo.
Adotar não é um gesto de caridade, apesar de fazer bem a todos os envolvidos nela, quem o faz é por desejo de ser pai e mãe, por vontade de se ter um filho. O amor que existe e experimentado entre as pessoas envolvidas na adoção é igual aquele sentido por parentes consanguíneos, mas ainda podemos acrescentar na relação de adoção alguns requintes de consciência, pois os pais adotivos, quando têm seus filhos, vão em busca deles com consciência de que os querem e não se trata de "um golpe do destino", de uma gravidez indesejada. É a busca por seu filho tão desejado.
Todo vínculo de amor é conquistado pela convivência e pelo respeito e não pela herança genética”[5].
Luiz Schettini Filho nos traz uma reflexão importante sobre o tema ao afirmar que,
“[…] o filho adotado não vem de fora; vem de dentro, do mesmo modo que o filho, biologicamente gerado, vem de dentro e não de fora. Se a adoção se efetiva, em muitos casos, como consequência de transtornos biológicos, fisiológicos ou psicológicos, a geração biológica de um filho nem sempre ocorre dentro dos padrões ideais de expectativa. Isso nos leva a pensar que, certamente, não seria estranho, usar a mesma expressão para as duas situações: tanto os que têm filhos biológicos quanto os que os têm por adoção geram, verdadeiramente, seus filhos. A inexistência dos laços genéticos não invalida as relações parentais.”[6]
Como podemos perceber pelos diversos conceitos de adoção, ela vem a ser não apenas um ato legalizado em lei, mas um ato repleto de caridade, amor e respeito ao próximo.
Primeiramente ressaltamos a garantia de que a adoção só será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando com fundamentos em motivos legítimos (artigo 43 do Estatuto da Criança e do Adolescente).
É, portanto, necessário que a adoção passe pelo judiciário para que cada caso seja visto com o cuidado e com a devida concordância, pela legislação imposta para a matéria. Após o juiz ouvir os órgãos de defesa dos direitos do adotando, como o Ministério Público, por exemplo, e sendo encerradas todas as etapas processuais formará sua opinião, apresentando se a adoção trará benefícios e vantagens para o adotante ou não. A decisão então poderá ser deferida ou negada.
A adoção só produzirá efeitos após o trânsito em julgado, a exceção se dá caso o adotante falecer no curso do processo antes de prolatada a sentença. A adoção poderá ser deferida tendo efeito retroativo à data do óbito.
Com relação aqueles que podem adotar, citamos inicialmente os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil (artigo 42, do ECA). Assim, tanto os solteiros, como os divorciados e viúvos podem adotar. A lei não menciona o sexo nem a opção sexual do adotante, sendo possível assim que o homossexual também adote.
Aqueles que são casados ou vivem em união estável podem adotar sem que seja necessariamente o casal, ou seja, não há proibição para que apenas um dos dois adote. Assim, podemos considerar que se não é proibido, consequentemente é permitido. Para isso basta o consentimento do cônjuge ou companheiro, é o que menciona o artigo 165 do ECA para deferimento da adoção. Tal anuência poderá ser dispensada caso seja requerida por um dos cônjuges ou companheiro, provando no curso do processo a separação de fato.
Para se candidatar como adotante é necessário o preenchimento dos requisitos estabelecidos em lei. A capacidade inicial se dá para aqueles que sejam capazes e tenham no mínimo 18 anos de idade, visto que o menor não teria a responsabilidade necessária com o adotado.
Com base no art. 39, § 1º do Estatuto da Criança e do adolescente, adoção é ato irrevogável, devendo ser utilizada quando forem esgotados todos os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do artigo 25 da mesma lei. Assim, o vínculo jurídico gerado pela família biológica jamais volta a se estabelecer, mesmo que os adotantes falecessem (artigo 49 do Estatuto da Criança e do adolescente). Porém, é gerada a dúvida se órfão o filho, os pais consanguíneos poderiam pela adoção fazer dele filho novamente. A doutrina vem sendo rígida quanto a questão, visto que a lei determina que os ascendentes e os irmãos do adotando estejam impedidos de adotar (artigo 42, § 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente), a adoção poderá sim ocorrer, caso os pais adotivos tenham falecido, não há proibição legal quanto a isso.
Quanto a idade máxima do adotante, a lei não traz nenhum limite. O limite se dá apenas com relação ao adotando, que deve ter no máximo dezoito anos à data do pedido de adoção, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes (art. 40, ECA). Nos casos que o adotando seja maior de dezoito anos, será aplicado o art. 1.619 do Código Civil: “A adoção de maiores de 18 (dezoito) anos dependerá de assistência efetiva do poder público e de sentença constitutiva, aplicando, no que couber, as regras gerais da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do adolescente”.
Os efeitos da adoção se dividem em efeitos de ordem pessoal e efeitos de ordem patrimonial, ambos possuem efeito ex nunc, pois o início ocorre com o trânsito em julgado da sentença, com exceção do adotante que faleça no curso do procedimento, nesse caso haverá força retroativa à data do óbito e terá efeito ex tunc (primeira parte do artigo 1.628 do Código Civil). Valendo lembrar que nessa situação o adotado sendo seu filho será considerado herdeiro.
Inicialmente a adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-se de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais (artigo 41 do Estatuto da Criança e do Adolescente). É o que chamamos de relação de parentesco.
Ressaltamos que a condição de filho é originada no nascimento ou no ato jurídico da adoção e a lei não traz nenhuma diferença entre ambos. Portanto, após o vínculo gerado serão atribuídos ao adotado as mesmas obrigações e os mesmos direitos que possui o filho biológico, estando sujeito ao poder familiar transferido do pai natural para o adotante. A partir desse momento ele está apto a gozar de todos os direitos como filho, assegurados em lei, como também o dever de prestar aos pais obediência e respeito, assim como os serviços próprios de sua idade e condição.
Por fim, quanto aos efeitos de ordem pessoal temos o direito que o adotando tem de possuir o sobrenome dos adotantes. Com base na Lei n. 12.012/2009, artigo 47, § 5º: “A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a modificação do prenome”. O § 6º do mesmo artigo afirma “caso a modificação de prenome seja requerida pelo adotante é obrigatória a oitiva do adotando, observando as disposições nos §§ 1º e 2º do artigo 28 da mesma lei.”
Assim, será levado em consideração o estágio de desenvolvimento da criança ou do adolescente, sua compreensão quanto à medida e seu consentimento em audiência caso tenha mais de 12 anos de idade.
Vale lembrar que a decisão judicial concede na adoção novos laços gerados pelos novos parentes, tanto em linha reta como em linha colateral. A averbação em cartório traz novo registro de nascimento e não apenas o nome de seus novos pais, mas também o de seus novos avós maternos e paternos, sem precisar do consentimento destes.
O novo registro poderá ser lavrado no cartório do Registro Civil do Município da residência do adotante caso ele assim escolha. A sentença irá conferir ao adotado o nome do adotante, podendo qualquer um deles pedir a modificação do prenome. A exceção só ocorre caso um dos cônjuges adota o filho um do outro, caso que manterá os laços de filiação entre o adotado e o cônjuge ou companheiro do adotante e os seus parentes.
Inicialmente falamos da obrigação que possui o adotante de sustentar o adotado enquanto durar o poder família (artigo 1.634 do Código Civil), inclusive o dever de prestar alimentos (artigos 1.694, 1.696 e 1.697 do Código Civil).
Quanto ao direito de herança, terá direito dos seus ascendentes e colaterais até o 4º grau, e estes possuem o direito de suceder-lhes em caso de morte, mantidos os critérios legais. De acordo com o artigo 41, § 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente será recíproco o direito sucessório entre o adotado, e colaterais até o 4º grau, levando em consideração a observação da ordem de vocação hereditária.
Com base no artigo 1.973 do Código Civil: “Sobrevindo descendente sucessível ao testador, que não o conhecia quando testou, rompe-se o testamento em todas as suas disposições, se esse descendente sobreviver ao testador”. O entendimento do STF é que entre os descendentes sucessíveis para efeito de rompimento do testamento, será incluído o filho adotivo, o qual é equiparado ao filho.
Temos também como efeitos a possibilidade de promoção da interdição e inabilitação do pai ou mãe adotiva ou vice versa (artigo 1.768, do Código Civil).
Há o direito do adotante de administração e usufruto dos bens do adotado menor (artigos 1.689; 1.691 e 1.693 do Código Civil) para utilizar com as despesas referentes a educação e manutenção, já que o pai ou a mãe natural podem ter perdido esse direito ao perder o poder familiar. Temos também a responsabilidade civil do adotante pelos atos cometidos pelo adotado, menor de idade (artigos 932, I, 933 e 934 do Código Civil).
Existe ainda entre outros efeitos, a possibilidade do adotado propor ação de investigação de paternidade, é o que acontece quando o filho sente a necessidade de saber qual sua verdadeira filiação com a finalidade de descobrir sua identidade genética ou biológica.
Podemos citar casos de mães que escondem a gravidez da família entregam seus filhos para adoção e depois se arrependem, ou aqueles que após adotarem acabam se arrependendo, porém, vale lembrar que a adoção dá à criança e ao adolescente adotado todos os direitos e deveres de um filho biológico, inclusive direito a herança, e desligamento de qualquer vínculo com pais e parentes, havendo exceção quanto aos impedimentos matrimonias, é o que dispõe o artigo 41 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
De acordo com Elson Gonçalves de Oliveira:
“Adoção é ato muito sério, que não poderá vir somente de uma frágil impulsão do coração ou da fantasia da mente. Corre o risco de arrependimento mais cedo ou mais tarde. E as consequências certamente serão desastrosas tanto para os adotantes quanto para os adotados. Os pretensos adotantes não deverão deixar se levar pelo primeiro impulso. É preciso amadurecer a ideia. Não resta dúvida de que o coração e a fantasia sejam fortes impulsores do ato de adotar, contudo não poderão sobrepor à razão.” (2010, p. 136 e 137)
É ideal, portanto, que os adotantes tenham consciência dos hábitos e costumes que muitas vezes possuem as crianças e os adolescentes que são adotados. É a convivência com caráter duradouro e sincero que passa a fortalecer os laços entre pais e filhos.
A educação é um importante passo nessa conquista, a preparação deve existir não apenas para os adotados, mas, também para todos aqueles que pretendem adotar. É preciso que seja levada em consideração traumas e desgastes emocionais e psicológicos que podem surgir em ambas as partes.
Quanto aos casos de inexistência existem três: a falta de consentimento do adotado e do adotante; a falta de objeto (caso o adotante não possa exercer o poder familiar por incapacidade) e a falta de processo judicial com a intervenção do Ministério Público.
Quanto às anulabilidades da adoção podemos citar: falta de assistência do pai, tutor ou curador, ao consentimento do adotado relativamente incapaz (artigo 171, I, do Código Civil); ausência de anuência da pessoa sob cuja guarda se encontra o menor ou interdito; consentimento manifestado apenas pelo adotado relativamente incapaz (artigo 171, I, do Código Civil); vício resultante, como o dolo por exemplo (artigo 171, II, do Código Civil); por último citamos a falta de consentimento do convivente do adotante ou cônjuge e do consorte do adotado, porém há julgados que não carecem de tal anuência.
Com relação a nulidade da adoção, poderá ocorrer caso o adotante não possua mais de 18 anos (artigo 1.618, caput, CC) não havendo diferença de pelo menos 16 anos de idade entre o adotado e o adotante (artigo 1.619, CC); se duas pessoas sem serem marido e mulher ou convenientes acabem adotando a mesma pessoa (artigo 1.622, parágrafo único, CC); também haverá nulidade caso o curador ou tutor não tenha prestado contas e por fim se o vício resultar de simulação (artigo 167, CC) ou fraude à lei (artigo 166, VI).
Vale ressaltar que a ação de impugnação da adoção terá causa na anulabilidade ou nulidade da adoção, posteriormente se tornará uma ação de nulidade da adoção, será meramente declaratória e não produz efeito constitutivo, visto que não há necessidade de cortar o vínculo de filiação que já se iniciou sendo ineficaz ou poderá ainda se tornar uma ação de anulação causada pelo adotante ou até mesmo pelo adotado que pretende exterminar o laço que os envolve de parentesco civil.
Quanto a legitimação ativa nessa ação, encontramos o adotado, o adotante, parentes das partes, legatários ou sucessores. É exigida a intervenção do MP (artigo 82, II, CC) já que envolve estado da pessoa. O tempo prescricional pelo adotado é de 10 anos de acordo com alguns julgados (artigo 295, CC) contados da morte do adotante.
Quanto ao juízo competente na ação de anulação será disposto nas leis de organização judiciária local, podemos citar como posição ordinária os juízos da Vara de Família, podendo ser também o juízo da Vara de Infância e Juventude.
4 Princípios que concernem os Direitos da Infância e Juventude
Princípios são normas que obrigam aqueles a quem a elas estão sujeitos. Encontramos com relação a infância e juventude diversos princípios que buscam melhores aplicações aos questionamentos que envolvem as crianças e os adolescentes em nosso país.
4.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
Inicialmente princípio é uma norma jurídica emanada do corpo geral das regras, traz o objetivo de certo diploma jurídico. Dessa forma, ao ler um artigo de uma lei e compreende-lo é necessário um conhecimento sobre o seu objetivo, ou seja, o que aquele tipo de regra quer atingir, e é através do entendimento dos princípios que são verdadeiras bases que isso acontece.
Ao falarmos da dignidade da pessoa humana, podemos envolve o conceito de direitos fundamentais (direitos humanos positivados em nível interno) e direitos humanos (no plano de declarações e convenções internacionais), formando a unidade de todos os direitos aos quais os homens se reportam. É um princípio que oferece a base do Estado Brasileiro, encontra-se no art. 1º, III da Constituição Federal ao lado de valores fundamentais.
Ao falar da dignidade da criança, levamos em consideração o verdadeiro cumprimento do que dispõe o artigo 227 da Magna Carta, quando de forma expressa determina a ela o seu direito a convivência familiar, ou seja, digno é então, entre muitas características, viver em família.
Ao tirar da criança esse tão importante direito é notável a grande violação a um direito indisponível, o qual deverá ser objeto de tutela do Ministério Público e da Magistratura. Vale lembrar que as crianças abrigadas possuem investigação através de um procedimento judicial ou inquérito civil presidido pelo promotor da infância e juventude, levantando causas de sua institucionalização e as possibilidades de retorno à família de origem. Ao respeitar o mandamento constitucional, os aplicadores da lei devem destituir o poder familiar que há sob aquela criança e encontrar uma família adotiva para garantir sua educação e criação com principalmente muito amor.
Porém, ressalta-se que na prática não são todos os juízes e promotores que se sensibilizam para agir com toda força e determinação de suas atribuições e competências, ainda são na verdade muito visíveis os casos de falta de interesse quando o assunto são as crianças e os adolescentes.
Atualmente a sociedade tem passado a se importar ainda mais com fóruns regionais e juizados especiais, dando ênfase as causas que envolvam relações de consumo e as varas tradicionais.
4.2 Princípio da proteção integral
De acordo com esse princípio a criança e o adolescente deve encontrar no poder público toda assistência e apoio necessário para atendimento de seus interesses. É preciso que sua criação seja dada em um meio e condições sadias. Essa assistência envolve todas as suas necessidades, sejam elas de alimentação, de vida familiar e social, de educação, saúde, entre outras.
Segundo Bittencourt este princípio:
“Estabelece primazia em favor das crianças e adolescentes em todas as esferas de interesse. Seja no campo judicial, extrajudicial, administrativo, social ou familiar, o interesse infanto-juvenil deve preponderar. Não comporta indagações ou ponderações sobre o interesse a tutelar em primeiro lugar já que a escolha foi realizada pela nação através do legislador constituinte.” (2010, p. 36)
Ressalta-se ainda que com base no princípio da proteção integral outras normas do ECA defendem a família como aquela que assegura condições sadias de desenvolvimento para a criança.
Nesse sentido, Bittencourt afirma:
“A prioridade para a criança e o adolescente determina que a balança penda sempre para a tutela deste antes dos demais ou deste em prejuízo dos demais. Ainda que outros interesses legítimos possam ser opostos ao da criança, esta tem verdadeiro direito subjetivo, que deve ser defendido em detrimento dos interesses, ainda que legítimos, dos demais.
Neste diapasão, pode-se lembrar que a prioridade absoluta está irmanada com a doutrina da proteção integral, que consagra a proteção da criança e de seu entorno, sua família, sua comunidade. Todavia, havendo conflito intrafamiliar de interesses, quando a criança é submetida à violação de direitos fundamentais preservados vai impor a submissão dos interesses de seus genitores.” (2010, p. 38)
A doutrina da proteção integral também encontra refúgio no art. 3º, 2, da Convenção sobre os Direitos da Criança, dispondo assim que: “Os Estados Partes comprometem-se a garantir à criança a proteção e os cuidados necessários ao seu bem-estar, tendo em conta os direitos e deveres dos pais, representantes legais ou outras pessoas que a tenham legalmente a seu cargo e, para este efeito, tomam todas as medidas legislativas e administrativas adequadas”.
Encontramos na Constituição Federal em seu art. 6º a proteção a infância como direito social, assim: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
É notável, portanto, que todos esses direitos são extremamente necessários para o desenvolvimento físico, psíquico e mental das crianças e dos adolescentes.
4.3 Princípio do melhor interesse da criança
Tal princípio coloca as crianças e os adolescentes em posição jurídica superior quando seus direitos se afrontam com o de pessoas adultas, assim, a proteção da criança determina que as vontades dos adultos possam até ser contrariadas, mesmo nos casos que envolvam seus genitores e parentes. Visto que por estarem em formação devem possuir condições favoráveis de crescimento e desenvolvimento.
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança dispõe sobre o Princípio do melhor interesse da criança, em seu art. 3º encontramos: “Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”.
Lembramos também da Constituição Federal que em seu art. 227 traz a garantia para a criança a convivência familiar e comunitária. Assim deve ser dada a atenção especial mantendo a criança em sua família de origem ou em uma nova família (substituta, através da adoção).
Antigamente esse princípio foi muito distorcido ao consagrar o domínio absoluto do Juiz de Direito sobre a criança, antes do Estatuto da Criança e do Adolescente. Após a Constituição Federal de 1988 e a criação do Estatuto em 1990 esse princípio passou a ser interpretado com a doutrina da proteção integral e com as limitações impostas à atividade do judicial.
Vale ressaltar que na realidade o preconceito demagógico ainda é muito forte quando o assunto a ser tratado é as crianças e adolescentes em nosso país. Causa clara disso é o abandono crescente em abrigos ao acreditarem que a reintegração familiar é muitas vezes impossível.
Em alguns casos de reintegração é notável a falta de condições das mais diversas para manter a criança em sua família de origem, assim, deve entrar o Estado e as devidas políticas públicas para oferecer as necessárias soluções. A demora que muitos passam em instituições faz com que muitos deixem de ser protegidos e passam a ser traumatizados.
Com base nas palavras de Sávio Bittencourt:
“Todas as chances são dadas a pessoas adultas e pouquíssimas à criança. A criança está em insegurança jurídica absoluta. É exatamente isso que ocorre quando para se destituir o poder familiar de uma mãe se espera em demasia e a mão covarde da condescendência permite que ela não se esforce para ter o filho em sua companhia. Para se romper o vínculo, exige-se segurança absoluta. Mas para chegarmos a esta constatação, precisávamos invariavelmente traumatizar a criança com anos de espera ou tentativas desastradas de reintegração que geram novos dilacerantes abandonos. Para a mãe segurança jurídica absoluta, para a criança insegurança absoluta. Não é necessário, julgar e condenar o adulto, que é reconhecidamente fruto de uma circunstância social injusta. O que não pode ocorrer é que, em função deste fato, se permita o padecimento da criança, que é o principal sujeito de direitos para a Constituição Federal, numa espécie de martírio solidário. Na dúvida, que se erre em favor da criança. Pode salvar sua vida e dar uma chance de ser realmente amada”. (2010, p. 43)
Portanto, para a efetivação dos direitos das crianças e adolescentes é necessária muita coragem nas atitudes dos Promotores de Justiça e Juízes, os quais devem trazer melhores soluções para aqueles que já são tão beneficiados pela lei, porém, esquecidos pela prática.
5. DOS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS ÀS MEDIDAS PROTETIVAS
Com base na doutrina da Proteção Integral, o art. 100 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe de princípios aplicáveis nas medidas protetivas que buscam garantir o cumprimento integral dos direitos da infância e juventude. Tais medidas são aplicáveis quando seus direitos forem violados ou ameaçados por ação ou omissão da sociedade, do Estado, dos pais ou responsáveis, ou por consequência de suas condutas. São medidas dispostas no art. 101 do ECA:
“I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II – orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III – matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;
IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
VII – acolhimento institucional;
VIII – inclusão em programa de acolhimento familiar;
IX – colocação em família substituta”
Vale ressaltar que para que seja aplicada qualquer dessas medidas será levado em consideração os princípios, a atribuição, competência, determinação e execução dos devidos órgãos e instituições que tratem das crianças e dos adolescentes.
Afirma que a criança e o adolescente são detentores da tutela da legislação, possuindo direito oponível até mesmo sobre o Estado e a família de origem. Porém, na prática esse princípio vem sendo desrespeitado e afastado da realidade dos que devem ser protegidos por ele.
5.1 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORITÁRIA
Determina que a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma que tutele as crianças e os adolescentes deve dar ênfase à proteção integral e prioritária aos seus direitos.
5.2 PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SOLIDÁRIA DO PODER PÚBLICO
Com base na lei a verdadeira efetivação dos direitos assegurados as crianças e aos adolescentes pela Lei e pela CF possui responsabilidade primária e solidária nas três esferas de governo, sem prejuízo da municipalização dos atendimentos realizados por programas de entidades não governamentais. É possível até a utilização de instrumentos processuais como a ação civil pública, a ação popular e o mandado de segurança coletivo para que sejam cobrados os devidos direitos e interesses da infância e juventude.
Vale lembrar que a esfera de poder mais próxima do exercício da cidadania é o município, sendo assim o prestador primário preferencial dos cuidados administrativos que envolvam os direitos das crianças e dos adolescentes, não afastando os mesmos deveres e obrigações do Estado e da União. É necessário ressaltar ainda que tais responsabilidades não são apenas do poder executivo, mas também do judiciário, legislativo, das defensorias públicas, do Ministério Público, entre outros órgãos que devem dar verdadeira atenção e importância a essa prioridade constitucional.
5.3 PRINCÍPIO DO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Como já foi citado anteriormente, esse princípio trata da intervenção prioritária aos interesses e direitos das crianças e adolescentes que são juridicamente mais importantes que os demais presentes na situação.
5.4 PRINCÍPIO DA PRIVACIDADE
Esse princípio possui relação direta no que diz respeito a intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada, evitando assim a exposição nociva da vida íntima e da imagem das crianças e dos adolescentes. Dessa forma, é proibida qualquer situação que atente ao contrário.
Vale ressaltar que a privacidade não pode se tornar argumento para omissão de informações à sociedade civil e aos órgãos públicos com relação ao atendimento de seus direitos.
5.5 PRINCÍPIO DA OITIVA OBRIGATÓRIA E PARTICIPAÇÃO
Proporciona a criança e ao adolescente a possibilidade em separado ou na companhia dos pais, responsável ou de pessoa indicada serem ouvidos e participarem de atos destinados a aplicação de medidas protetivas ou definir sua situação jurídica.
5.6 PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PARENTAL
De acordo com esse princípio a intervenção no campo da infância e juventude deve ocorrer pelos pais, assumindo com responsabilidade seus deveres e evitando danos psicológicos ou físicos para as crianças e adolescentes.
5.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E ATUALIDADE
Com base constitucional, o princípio da proporcionalidade possui relação com o conjunto de normas protetivas e a ponderação de valores, evitando que a reação jurídica a uma lesão de direito seja excessiva e possua medidas desnecessárias. É preciso que a medida tomada não seja, portanto, exagerada nem inadequada e resolvida no tempo de sua necessidade.
5.8 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO PRECOCE
O maior objetivo desse Princípio é proporcionar a rápida solução para os problemas que afastam a convivência familiar, fazendo assim a reintegração ou colocação em família substituta. Assim, as autoridades competentes devem imediatamente agir quando tomarem consciência de lesão ou ameaça aos direitos da criança e do adolescente.
5.9 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA
Tal intervenção deverá ocorrer exclusivamente pelas autoridades e instituições que possuem ação em defesa à proteção da criança e do adolescente, sua intenção é garantir a celeridade e simplicidade dos procedimentos que tenham relação com as crianças e adolescentes.
Vale lembrar que na área da infância e juventude é necessária expressa disposição legal, não sendo possível assim a realização de analogia para novas competências administrativas.
5.10 PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DA FAMÍLIA
Segundo esse princípio prevalece a noção de que as crianças e os adolescentes devem ser mantidos ou reintegrados em suas famílias naturais ou extensas, caso não seja possível é que deverão ser colocados em família substituta.
5.11 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA INFORMAÇÃO
Com base nesse princípio os pais ou responsáveis devem ter informação sobre os seus direitos, dos motivos que causaram a intervenção e a forma que ela acontece. Vale também para dirigentes de acolhimento institucional ou familiar que devem ter consciência sobre a razão e conteúdo das medidas administrativas e judiciais realizadas em defesa da criança ou adolescente sob sua guarda.
6. Filho de criação ou afetivo, ADOÇÃO SIMULADA E OUTROS TIPOS DE ADOÇÃO
É uma denominação que não decorre da lei, não possuindo direitos de filiação que pudessem ser determinados por ela. Porém, há uma forte relação com a adoção, visto que ambos envolvem caráter socioafetivo. Filho de criação ou afetivo, portanto, é aquele que é criado por alguém com os mesmos carinhos e cuidados que se cria um filho, porém, não há o registro que o tenha como legítimo nem a efetiva adoção.
Muitas vezes a falta de condição financeira faz com que muitas famílias acabem trazendo para suas casas crianças “para criar”, assim, as relações de afeto, amor, carinho, cuidado e dedicação vão se tornando cada vez maiores apesar da posse irregular de filho, caracterizada por não possuírem direitos a sucessão e ao nome da família, o que ocorre de forma diferente daqueles que possuem garantias da filiação legal.
Vale lembrar que para solucionar essa situação encontramos resposta no art. 33, § 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente afirmando que a guarda se destina a regularizar a posse de fato da criança ou adolescente, podendo ser deferida, incidentalmente ou liminarmente no procedimento de adoção e tutela, com exceção na adoção por estrangeiros. Dessa forma, não podemos deixar o filho de criação ou afetivo sem justificativa da lei.
A filiação biológica deixou de ser vista com superioridade após diversas transformações na nossa sociedade e as relações baseadas no afeto, na gratidão e no carinho passaram a ter mais força e espaço nos ambientes familiares. Falar em filho de criação ou afetivo é falar em um filho que recebe todos os cuidados de um filho consanguíneo, porém, para que ele seja efetivamente reconhecido como filho bastaria a legalização da adoção.
Podemos citar os seguintes julgados tratando do tema:
“FILHO DE CRIAÇÃO – ADOÇÃO – SOCIOAFETIVIDADE. No que tange à filiação, para que uma situação de fato seja considerada como realidade social (sócio afetividade), é necessário que esteja efetivamente consolidada. A posse do estado de filho liga-se à finalidade de trazer para o mundo jurídico uma verdade social. Diante do caso concreto, restará ao juiz o mister de julgar a ocorrência ou não de posse de estado, revelando quem efetivamente são os pais. (…)”. (TJ-RS – Ap. Cív. 70007016710 – 8ª Câm. Cív. – Rel. Des. Rui Portanova, – Julg. em 13-11-2003)
“DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E MATERNIDADE. VÍNCULO BIOLÓGICO. VÍNCULO SÓCIO AFETIVO. PECULIARIDADES. A "adoção à brasileira", inserida no contexto de filiação sócio afetiva, caracteriza-se pelo reconhecimento voluntário da maternidade/paternidade, na qual, fugindo das exigências legais pertinentes ao procedimento de adoção, o casal (ou apenas um dos cônjuges/companheiros) simplesmente registra a criança como sua filha, sem as cautelas judiciais impostas pelo Estado, necessárias à proteção especial que deve recair sobre os interesses do menor. – O reconhecimento do estado de filiação constitui direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser exercitado sem qualquer restrição, em face dos pais ou seus herdeiros. – O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, estabelecido no art. 1º, inc. III, da CF/88, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, traz em seu bojo o direito à identidade biológica e pessoal. – Caracteriza violação ao princípio da dignidade da pessoa humana cercear o direito de conhecimento da origem genética, respeitando-se, por conseguinte, a necessidade psicológica de se conhecer a verdade biológica. – A investigante não pode ser penalizada pela conduta irrefletida dos pais biológicos, tampouco pela omissão dos pais registrais, apenas sanada, na hipótese, quando aquela já contava com 50 anos de idade. Não se pode, portanto, corroborar a ilicitude perpetrada, tanto pelos pais que registraram a investigante, como pelos pais que a conceberam e não quiseram ou não puderam dar-lhe o alento e o amparo decorrentes dos laços de sangue conjugados aos de afeto. – Dessa forma, conquanto tenha a investigante sido acolhida em lar "adotivo" e usufruído de uma relação sócio afetiva, nada lhe retira o direito, em havendo sua insurgência ao tomar conhecimento de sua real história, de ter acesso à sua verdade biológica que lhe foi usurpada, desde o nascimento até a idade madura. Presente o dissenso, portanto, prevalecerá o direito ao reconhecimento do vínculo biológico. – Nas questões em que presente a dissociação entre os vínculos familiares biológico e sócio afetivo, nas quais seja o Poder Judiciário chamado a se posicionar, deve o julgador, ao decidir, atentar de forma acurada para as peculiaridades do processo, cujos desdobramentos devem pautar as decisões. Recurso Especial provido”. (STJ; REsp 833.712; Proc. 2006/0070609-4; RS; Terceira Turma; Relª Min. Fátima Nancy Andrighi; Julg. 17/05/2007; DJU 04/06/2007; Pág. 347).
Vale ressaltar a importância do afeto nas relações entre as pessoas e nas diversas construções de modelos de família na nossa atualidade. O afeto talvez seja apontado como o principal fundamento das relações familiares. Mesmo não constando a palavra afeto no texto constitucional como um direito fundamental, podemos dizer que decorre da valorização constante da dignidade humana.
O amor é inevitavelmente para o ser humano ou para sociedade organizada algo muito importante, é o sentimento mais nobre despertado entre as relações. Muitos acreditam que o amor deve ser a mais estimada de todas as coisas existentes, pois, jamais se esgota, sempre é possível amar mais e melhor.
Com base no artigo 1.596 do Código Civil, os filhos havidos ou não da relação de casamento ou por adoção terão qualificação e direitos autênticos assegurados, sendo vedadas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Podemos também incluir na essência desse artigo os filhos havidos fora do casamento registrados pela mãe como se fossem de seu marido, como pelo pai como se fosse de sua esposa. Tal adoção poderá ocorrer com o consentimento tácito do cônjuge, o qual com o passar do tempo terá laços ainda mais fortes de afetividade com a criança ou o adolescente.
A adoção à brasileira, por sua vez, é um tipo de simulação irregular e fraudulenta, de modo que o indivíduo registra um filho alheio como se seu fosse. Para que pudesse ser caracterizada como uma adoção legal, precisaria ter efeitos jurídicos plenos, processamento e julgamento judicial.
Porém, a facilidade de receber diretamente da mãe biológica uma criança, acaba fazendo com que essa seja uma prática cada vez mais utilizada no nosso país. Muitos desconhecem as consequências desse tipo de adoção, podemos citar a sanção criminal do Código Penal em seu art. 242 ao afirmar que dar parto alheio como próprio; registrar filho de outrem como seu filho; substituir ou ocultar filho recém-nascido alterando direito inerente ao estado civil: Pena de reclusão, de dois a seis anos.
Citamos ainda as sanções civis como uma possível anulação do registro de nascimento simulado e a perda da criança, visto que a anulação acarreta a caracterização de nascimento irregular.
De acordo com o entendimento de Maria Berenice Dias, ao analisar o art. 1.604 do Código Civil afirma:
“Ainda que dito dispositivo legal excepcione a possibilidade de anulação por erro ou falsidade, não se pode aceitar a alegação de falsidade do registro levado a efeito pelo autor do delito. Assim, o registro de filho alheio como próprio, em havendo o conhecimento da verdadeira filiação, impede posterior anulação”. (2007, p. 436)
Assim, com relação a manter a paternidade socioafetiva a jurisprudência tem se afirmado que deve existir sem a anulação do registro de nascimento da criança. Porém, vale ressaltar a importância de analisar cada caso para que a solução a ser tomada seja realmente a melhor para a criança.
Outro tipo de adoção que merece destaque é a adoção intuiti personae na qual a mãe entrega seu filho em mãos ao adotando, acreditando que este será um bom pai ou uma boa mãe, proporcionando todo carinho, amor, cuidado, atenção e educação para sua formação.
Apesar de não encontrar base jurídica, tal modalidade de adoção não poderá ser negada sob a argumentação de descumprir a lista de inscritos para adotar, visto que a lei dispõe aos pais o direito de nomear tutor ao filho (art. 1729, CC) e a adoção depende do consentimento dos pais (art. 45, ECA). Vale ressaltar que este direito não é absoluto, pois, ao apresentar o pedido de adoção o juiz poderá deferir caso o adotante possua reais condições de adotar ou indeferir caso não possua, fazendo assim com que a criança retorne ao rol de quem esteja inscrito para adoção. Afinal, não será deferida colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer razão, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado (art. 29, ECA).
Na adoção póstuma a adoção ocorre quando a pessoa falecida tenha demonstrado em vida a vontade de adotar e laço de afetividade com a criança, é regulamentada pelo ECA em seu artigo 42, § 6º, é admitido ao adotante após inequívoca manifestação de vontade caso venha falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença. O documento que comprove tal vontade poderá ser uma declaração firmada por instrumento público, de força probatória ou uma carta idônea assinada pelo adotante.
A adoção de maiores ainda é controversa, pois, pois há aqueles que discordam, por acreditarem no ataque na finalidade do instituto de formar o indivíduo já que na maioridade isso não ocorre mais, além do possível interesse patrimonial envolvendo situações econômicas, como a herança por exemplo. Outros acreditam que essa é apenas uma desculpa repleta de preconceitos na defesa da herança e dos direitos sucessórios.
Vale ressaltar que para o amor não há limite de idade, e os adolescentes também possuem todos os direitos inerentes a criança, ou seja, carinho, educação, convivência familiar, entre todos os outros.
7 Adoção por homossexuais
Apesar da atualização da nova Lei, não foi disponibilizada a adoção por casais homossexuais, visto que a união estável só é reconhecida entre homem e mulher (art. 1.723, CC e art. 226, §3°, CF).
Diante disto, a Jurisprudência, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul trazem importantes mudanças no nosso ordenamento, reconhecendo a união entre homossexuais e consequentemente o reconhecimento dos mesmos como uma entidade familiar, sob a forma de união estável homoafetiva, para fins de partilhamento dos bens e previdenciários.
Posto isto, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul nos traz um acórdão pioneiro, admitindo a adoção por casal formado por duas pessoas do mesmo sexo, dispondo a ementa:
“Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurado aos direitos das crianças e dos adolescentes. Caso em que o laudo especializado comprova o saudável vínculo existente entre as crianças e as adotantes”.
Segundo a advogada Chyntia Barcellos em matéria ofertada pela Revista Jurídica Consulex[7], está evidente que as instâncias superiores do Judiciário estão atentas a um dos princípios fundamentais em que se baseia o Estado Democrático de Direito, que é a dignidade da pessoa humana (art. 1°, III, CF), e ao direito que cada cidadão possui de construir sua entidade familiar, devendo melhor corresponder a sua realização pessoal, através da hermenêutica extensiva da norma inserta no art. 226, § 3º, da Constituição Federal de 1988.
Em contrapartida, a problemática ocorre por muitos juízes e tribunais utilizarem-se da falta de reconhecimento legal da união homoafetiva para negarem a habilitação conjunta dos parceiros para a adoção, inclusive para consentir a dupla paternidade ou maternidade, como requerido em processo judicial.
Necessitamos então, que a lei não seja apenas uma força que obrigue as condutas dos seres humanos, mas sim uma força que tenha como uma de suas bases o bem-estar das novas relações sociais, a conscientização da população em geral para o melhor interesse da criança e do adolescente.
Ao entendimento de Rachel Rezende Bernardes, também em matéria disponível na Revista Jurídica Consulex, a sensibilidade e o bom senso dos seres humanos permitirão adequar a frieza e objetividade da legislação aos acontecimentos cotidianos e ao subjetivismo de cada história de vida. Dessa forma, afirma:
“Aplicar a Lei de forma fria e literal é ignorar o que de mais importante existe em cada relação: o amor. Interpretá-la de forma isolada da realidade é deixar em segundo plano o bem-estar do menor; é exigir que a vida seja um roteiro previsível e ensaiado. A vida não é feita com linhas tão retas; há inúmeros traços curvos e os operadores do direito precisam estar atentos a tudo isso. Cada caso é um caso; cada história é única! Não se pode ignorar as inúmeras criatividades da vida e a espontaneidade de como surgem as relações humanas. Não se pode desatar um laço de afetividade, um vínculo de coração, para se defender uma legislação. Independente de interpretações, quando interesse do menor está em jogo, não se pode buscar teses jurídicas vencedoras. Afinal, o que importa é que seja assegurado a cada criança deste país o direito a ter esperanças de um futuro melhor. Aí, sim, ganharemos todos.”[8]
Não podemos esquecer que a família brasileira sofre problemas que afetam sua estrutura, seja ela de classe baixa, média ou alta. A sociedade altamente individualista, regada da falta de valores torna essa estrutura ainda mais abalada, consequentemente o Estado é inoperante e politicamente egocêntrico.
Lembramos então o artigo 43 do ECA ao afirmar que a lei determina que a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e ter fundamentos em motivos legítimos. Portanto, se a criança ou o adolescente realmente pode encontrar um lar em que seja educada e amada, não há porque se pensar em preconceitos arcaicos de uma sociedade preenchida com tantas atitudes hipócritas de abandono a verdadeira causa que busca o bem maior daqueles que mais precisam.
De acordo com as palavras do saudoso Sávio Bittencourt:
“Não se pode conceber a proibição da adoção por homoafetivos genericamente, pelo fato de simplesmente terem esta orientação, por significar um preconceito tolo e desarrazoado. Não são homoafetivas as pessoas que atiraram seus filhos pelas janelas ou nas ruas, rios e lagoas, como a mídia nos informou nos últimos tempos. Não são homoafetivas as pessoas que alugam seus filhos para uso de adultos pervertidos e tarados, como nos revelou à sociedade a CPI da pedofilia. Os gays ou os não gays podem ser boas ou más companhias para as crianças, dependendo de fatores não vinculados obrigatoriamente à sua orientação sexual. O que importa para a criança é o cuidado, que traduz o afeto que se tem por ela. Em um país de crianças abandonadas em abrigos, aos milhares, se dar luxo macabro do preconceito, além de criminoso, é burrice”. (2010, p. 146)
O que deve ser observado quanto ao adotante é o seu comportamento, social, ético, psicológico, perante o adotado. A sua opção sexual não será a determinante de ser aceito como pai ou não de uma criança ou um adolescente, mas sim seu interesse de amar e educar, proporcionando um lar equilibrado e feliz para uma boa convivência e formação familiar.
Temos que ressaltar que as diversas transformações na sociedade atual trouxeram em suas nuances diversos modelos de família, seja de casais do mesmo sexo ou de casais do sexo oposto. Enquanto o Estado não protege casais formados de pessoas do mesmo sexo, acaba não observando um critério tão importante com relação aos laços familiares que é a ligação afetiva.
Ao falar da adoção por homossexuais vários questionamentos são colocados em tese, uma das questões julgadas com imenso preconceito é a questão psicológica, porém, não existem pesquisas afirmando que um menor adotado por um casal homoafetivo se torne também um homossexual, também não há existência de números que indiquem que a formação psicológica do adotado seja afetada no futuro como adulto.
Outro ponto que merece destaque é o aspecto sócio econômico, não se pode permitir que uma criança originada de família pobre possa estar disponível a entrar na criminalidade, na marginalidade, no tráfico de drogas ou na prostituição do que oferecer o direito de ser cuidado, amado, educado. Não se pode deixar um preconceito devido a opção sexual ser maior que o bem estar do adotado que antes vivia preso ao abandono da sociedade.
Dessa forma, trata Maria Berenice Dias:
“Impedir significativa parcela da população que mantém vínculos afetivos estéreis de realizar o sonho da filiação revela atitude punitiva, quase vingativa, como se gays e lésbicas não tivessem condições de desempenhar as funções inerentes ao poder familiar.
Também acaba negando a milhões de crianças o direito de sair das ruas, de abandonar os abrigos onde estão depositadas, sonegando o direito a um lar e a chance de chamar alguém de pai ou de mãe. É dever não só da família e da sociedade, mas é também dever do Estado proteger, com absoluta prioridade, o cidadão de amanhã.
É função do Estado proteger essas crianças. Não se pode deixar o preconceito vencer e simplesmente impedir a adoção por duas pessoas que mantêm uma família homoafetiva. Está na hora de acabar com a hipocrisia, com a onipotência do legislador que pensa que a lei tem o poder mágico de impedir que a vida aconteça e que as pessoas persigam o sonho de ter um LAR: Lugar de Afeto e Respeito”.
O que importa verdadeiramente é o fato de amar e ser amado, o fato da criança ou o adolescente ser visto como um ser importante dentro do seu ambiente familiar, independente do modelo de família que ele esteja inserido, já que inúmeros são os modelos atualmente.
Ao negar a opção e a possibilidade de uma criança ter todos seus direitos fundamentais efetivados como a educação, alimentação, lazer, entre outros, nos vemos diante de uma notável negação de dignidade. Não se pode negar o que é de mais precioso na constituição do individuo como pessoa.
Por mais que as inúmeras instituições tentem ao máximo se dedicarem as questões que envolvam as crianças e os adolescentes, sabemos que diversas são as dificuldades dos vários abrigos que existem em todo nosso país, e inevitavelmente tantos são os direitos corrompidos daqueles que mais precisam do nosso reconhecimento.
Ao manter uma postura preconceituosa diante dos homossexuais, a sociedade deixa de oferecer mais um ambiente familiar a uma criança ou adolescente que vive entre várias razões a espera de um tratamento que possa privilegiar honestamente seus melhores interesses. Optar pelo preconceito é uma postura bem mais que atrasada, é ir contra a realidade de tantos que vivem esquecidos nos cárceres do abandono.
Na Segunda Guerra Mundial, inúmero era o número de crianças órfãs em diversos países como a Itália, Japão, Alemanha, entre outros. Muitas famílias norte americanas sensibilizadas com essa situação passaram a ter iniciativa de adotar, antes tida como uma prática irregular, a adoção internacional passa a ser praticada e levada para todos os povos.
A diferença com relação a adoção nacional é que envolve pessoas de soberanias diversas, tanto o adotante quanto o adotado possuem residência em países diferentes. Com base na sua natureza possui relação com os princípios do Direito Internacional Privado.
Com base no conceito de Tarcísio Costa podemos afirmar:
“A adoção internacional é uma instituição jurídica de proteção e integração familiar de crianças e adolescentes abandonados ou afastados de sua família de origem, pela qual se estabelece, independente de fato natural de procriação, um vínculo de paternidade e filiação entre pessoas radicadas em distintos Estados: a pessoa do adotante com residência habitual em um país e a pessoa do adotado com residência habitual em outro”. (1998, p. 58)
De acordo com o art. 51 do ECA é considerada adoção internacional aquela que a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no Artigo 2 da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 1, de 14 de janeiro de 1999, e promulgada pelo Decreto nº 3.087, de 21 de junho de 1999. Para que ela seja deferida são necessários alguns requisitos, são eles: a colocação em família substituta como solução adequada ao caso concreto; que tenham sido esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros mencionados no art. 50 do ECA e em se tratando de adoção de adolescente, este foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, que se encontre preparado para a medida, mediante parecer elaborado por equipe interprofissional, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 28 do ECA.
Vale ressaltar que os brasileiros que residem no exterior possuem preferência aos estrangeiros em casos que a adoção internacional envolva criança ou adolescente brasileiro. As Autoridades Centrais Estaduais e Federal interveem nesse tipo de adoção.
O bem estar do adotando é uma questão de diversas opiniões e polêmica, visto que alguns acreditam que o adotado ao residir em outro país passa a não ter amor a pátria onde nasceu, esquecendo de sua história e muitas vezes sequer consegue se expressão no idioma da pátria de origem. Outros acreditam que o sentimento histórico, patriótico e até mesmo linguístico não pode ser maior ou atrapalhar a dignidade que possuem as crianças e os adolescentes de seus direitos a convivência familiar, alimentação, educação, saúde, entre outros.
Com base no ECA em seu art. 3º, a criança e o adolescente disfrutam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata a Lei, assegurando por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
É importante lembrar a responsabilidade da família, da sociedade e do Estado de assegurar à criança (até 12 anos incompletos) e ao adolescente (12 a 18 anos), com absoluta prioridade o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Colocando todos a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. É o que dispõe o art. 227 da Constituição Federal. Portanto, é notável que se o Estado não consegue proporcionar para a criança ou adolescente todos os direitos que possuem, justo será que a um brasileiro seja dada a responsabilidade de cuidar daquele que está em formação.
A regra na adoção internacional é a adoção por brasileiros e a exceção é que o estrangeiro residente fora do Brasil possa adotar. Quanto a adoção de estrangeiro que reside em território nacional a legislação a ser aplicada será a mesma que trata da adoção por brasileiros.
Encontramos entendimento de Maria Berenice Dias sobre o assunto afirmando que ao falar de adoção de estrangeiro por brasileiros concede ao adotado a condição de brasileiro nato, pois não admite a Constituição qualquer discriminação referente à filiação, mesmo que decorra da adoção.
De acordo com o artigo 2 da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, com relação à proteção das crianças, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 1, de 14 de junho de 1999, e promulgada pelo Decreto nº 3.087, de 21 e junho de 1999 (Art. 51, ECA), é considerada pela lei adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal é residente ou domiciliado fora do Brasil. Vale ressaltar que deverá ser comprovado que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto; que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira, após consulta aos cadernos mencionados no art. 50 do ECA; ao se tratar de adoção de adolescente, ele será consultado por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante parecer realizado por equipe interprofissional, observando o que dispõe o artigo 28, §§ 1º e 2º do ECA.
Vale frisar que os brasileiros que residem no exterior possuem preferência aos estrangeiros nos casos que envolvam crianças ou adolescentes brasileiros. Tal tipo de adoção terá a intervenção das Autoridades Centrais, Estaduais e Federal.
9. O papel dos Órgãos Públicos
Inicialmente ao falar do Ministério Público lembramos sua responsabilidade de defender direitos sociais tão desejados e necessários para o fim da exclusão social no nosso país. Na Constituição Federal em seu artigo 127 está disposto que seu dever é de defender os interesses coletivos e os individuais indisponíveis do cidadão.
Quanto as disposições no ECA, podemos citar o artigo 201, V, ao propor o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos as crianças e aos adolescentes. Na prática é utilizado um procedimento administrativo pelo qual o Ministério Público investiga as situações de risco das crianças e dos adolescentes, buscando esclarecer os fatos e adequar as medidas judiciais essenciais para sua devida proteção.
Ao enfrentar de modo particular cada caso de criança abrigada em nosso país, o promotor que se encontra na posição de defensor de seus direitos fará um procedimento investigatório para descobrir as razões pelas quais ela é abrigada e se é possível a reintegração da mesma à sua família de origem, sendo impossível essa hipótese, a criança ou o adolescente ficará disponível para a adoção.
Porém, ressaltamos que na realidade a prática é bem diferente, muitas crianças institucionalizadas não possuem nenhum procedimento administrativo nem qualquer ação judicial proposta, ou seja, aquelas que envolvam representação ou ação de suspensão ou destituição familiar. São crianças que vivem sob a falta do cuidado estatal, cego e inoperante.
A reintegração deveria ser tratada com bastante atenção de forma efetiva pela instituição de abrigo e pelo conselho tutelar, porém, a realidade está longe do sonho desejado e legalizado pelo ECA, encontramos conselhos desestruturados, despreparados, desmotivados e instituições de abrigo que acreditam ser necessário apenas abrigar os milhares de crianças e adolescentes em todo o país.
O Ministério Público por sua vez, deve entre suas atribuições tomar as providências necessárias para que conselhos tutelares e abrigos funcionem verdadeiramente como a lei determina, concretizando assim seu digno papel social.
Por fim, vale lembrar que com a Lei 12.010/09 foi criado um procedimento que o juiz acompanha a institucionalização da criança ou adolescente com a participação do promotor de justiça, é o que dispõe os artigos 18 e 101 do ECA. Com a intenção de proporcionar o cuidado fundamental com a criança ao investigar sua situação pessoal de forma individualizada esse procedimento veio para todas as crianças e adolescentes institucionalizados antes ou depois da vigência da lei, com base no que traz o princípio da isonomia.
Uma das funções mais importantes do Ministério Público é propor a ação de destituição do poder familiar, sem ele muitas crianças e adolescentes ainda vivem presos juridicamente a famílias que não possuem sequer contato.
Com base nisso, o artigo 101, §§ 9º e 10º da lei 12.010/09, dispõe:
“§ 9o Em sendo constatada a impossibilidade de reintegração da criança ou do adolescente à família de origem, após seu encaminhamento a programas oficiais ou comunitários de orientação, apoio e promoção social, será enviado relatório fundamentado ao Ministério Público, no qual conste a descrição pormenorizada das providências tomadas e a expressa recomendação, subscrita pelos técnicos da entidade ou responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar, para a destituição do poder familiar, ou destituição de tutela ou guarda.
§ 10. Recebido o relatório, o Ministério Público terá o prazo de 30 (trinta) dias para o ingresso com a ação de destituição do poder familiar, salvo se entender necessária a realização de estudos complementares ou outras providências que entender indispensáveis ao ajuizamento da demanda“
Criados por lei para garantir aos municípios a efetiva política de atendimento as crianças e aos adolescentes, o Conselho Tutelar deve ser procurado pela população em caso de suspeita ou denúncia de violação dos direitos de crianças e adolescentes a vida, ao esporte, ao lazer, a profissionalização, cultura, saúde, alimentação, educação, dignidade, ao respeito, liberdade e a convivência familiar e comunitária.
Ao ser comprovada a denúncia o conselheiro tutelar deve avisar aos demais órgãos como as Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente e os Centros de Defesa da Criança e do Adolescente, as instâncias do Poder Judiciário (Ministério Público e os Juizados da Infância e Juventude).
O conselheiro tutelar entre suas atribuições atende denúncias, devendo estar atento à realidade de sua comunidade, provendo orientações, prevenindo situações que coloquem em risco os direitos das crianças e dos adolescentes. Dessa forma, caso a cidade não possua estruturas públicas destinadas ao lazer deles, por exemplo, como parques, praças e quadras de esportes, os conselheiros tutelares podem acionar as instâncias responsáveis para a construção de espaços que atendam a essa necessidade da população.
A comunidade em processo eleitoral conduzido pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente é a responsável por escolher os conselheiros tutelares. Para concorrer ao cargo é preciso que o cidadão atenda a três requisitos estabelecidos pelo Estatuto: ter reconhecida idoneidade moral, idade superior a 21 anos e residir no município.
É de extrema importância a sociedade conhecer o funcionamento dos Conselhos Tutelares e ter consciência que são órgãos a disposição da população para serem buscados sempre que alguma violação de direitos for cometida. Ao sofrer alguma agressão física ou moral, ser vítima de abuso ou exploração sexual, submissão ao trabalho infantil, estar fora da escola por falta de vagas ou ainda não ter acesso à rede básica de saúde, temos exemplos de violações de direitos que envolvem as crianças e os adolescentes em nosso país.
A equipe multidisciplinar é uma equipe interprofissional, formada por psicólogos, assistentes sociais e pedagogos, tanto do Juizado da Infância e da Juventude, quanto dos profissionais que atuam nas unidades de acolhimento. Visam uma minuciosa avaliação da situação de cada criança ou adolescente acolhido em períodos que não sejam superiores a 6 meses. Tal iniciativa é tomada para que sua manutenção em instituições não ultrapasse o período de dois anos.
Este dispositivo é uma conquista com relação ao caráter transitório da medida que trata os abrigos. Com a inserção dessa nova regra todo o sistema de proteção deverá funcionar de modo a avaliar permanentemente a necessidade daquela criança ou adolescente permanecer na instituição. Haverá uma revisão permanente desses casos.
Pelo antigo sistema não havia previsão quanto à duração na permanência de abrigos, resultava assim a demora na solução de muitas crianças e adolescentes que acabavam crescendo dentro das instituições. Ao fixar um tempo máximo e obrigar a justificar caso ultrapassem o prazo faz com que o direito da convivência familiar seja visto com verdadeira prioridade.
Ao falarmos da equipe multidisciplinar encontramos várias funções, entre elas podemos citar: a preparação de forma precedente e gradativa dos postulantes à adoção e do adotando, acompanhando também posteriormente caso a adoção se concretize; ouvir sempre que possível a opinião das crianças ou dos adolescentes sobre os pedidos de colocação em família substituta, assistindo os mesmos na sua oitiva em audiência para coleta de seu consentimento e o acompanhamento do estágio de convivência, assim como a elaboração de relatórios que tratem da constituição do vínculo adotivo e seus resultados na adoção.
Vale ressaltar que ao ser ouvida a opinião da criança, será levada em consideração seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão, por fim, o juiz que irá considerar. Poderá sua opinião ser contrária ao seus interesses, caso isso ocorra será com atenção especial oferecida pela participação da equipe técnica que será encontrada a melhor solução para o caso de cada criança.
Essa nova redação encontrada no artigo 28, § 1º da Lei nº 12.010/09 prevê a atuação dos serviços que auxiliam assessorar a Justiça da Infância e da Juventude, passando a ouvir a criança e o adolescente sobre a adoção. Em apenas outras três oportunidades o Estatuto fala expressamente à necessidade da atuação da equipe interprofissional (arts. 161, §1º, 161, § 1º, 167, caput e 186, §4º), demonstrando a importância por parte do legislador em oferecer a oitiva do adotando pela equipe técnica e apenas pela autoridade judiciária.
Quanto ao consentimento do adolescente, deverá ser levada em consideração para maiores resultados a Constituição Federal, visto que a manifestação de um adolescente que é um ser em formação não poderá ser levada como um valor absoluto e decisivo para a melhor solução de seu caso. Caso isso não aconteça, o dispositivo citado emanciparia os adolescentes acima de 12 anos de idade, o que notavelmente é um absurdo.
Dessa forma, ao trazer no artigo 28, § 2º da Lei 12.010/09 que ao se tratar de maiores de 12 anos de idade, será necessário seu consentimento colhido em audiência, faz com que haja a realização de um ato específico pelo juiz com a presença do Ministério Público. A lei anterior visava apenas o adolescente ser ouvido para a adoção, hoje é válido para demais formas de colocação em família substituta.
10 TEORIA VERSUS REALIDADE
Ao falar de adoção independente do nível social, há algo que infelizmente tem se mantido presente nesse tema, um verdadeiro inimigo que deve ser eliminado tanto dos que pretendem adotar quanto dos que são adotados, é o que chamamos de preconceito. Aquele revestido de hipocrisia e egoísmo sem medida, aquele que prefere o abandono social e afetivo esquecendo o amor incondicional e sincero.
Entre os questionamentos e pensamentos individualistas encontramos a curiosidade sobre a origem do adotado e a necessidade de semelhança dos traços físicos do adotante ou até mesmo traços vistos pela sociedade como padrões a serem desejados. É como se a criança fosse praticamente um objeto de consumo e os “consumidores” buscassem aquele que mais se adequasse aos seus desejos, é o olhar sob a “embalagem” que determina a primeira impressão se você vai levar ou não o “produto”.
Verdadeiros são aqueles que ouvem a voz interior da consciência e da fé, afinal, adotar é um gesto nobre, de alto valor.
Ao falar do Estatuto da Criança e do Adolescente temos consciência da importância de questões colocadas e legalizadas para melhor atender as necessidades da infância e da adolescência no Brasil, garantindo seus direitos fundamentais. Porém, a teoria tão desejada é muitas vezes a fantasia de um país com tantas leis e pouca resolução na prática.
Encontramos na educação uma imensidão de problemas desde a falta de estrutura física a falta de profissionais qualificados, qualidade pedagógica e educacional. Esquecem muitas vezes da importância do desenvolvimento das crianças e adolescentes.
De acordo com Luiz Cláudio Amerise Spolidoro, Juiz de Direito aposentado e Advogado:
“O grande elemento do mundo moderno é a desarmonia moral, pois a educação não tem sido suficiente em razão da forma como o processo moral é aprendido. Alguns pais relegam às escolas a educação de seus filhos, enquanto as escolas replicam no sentido de que, se a educação familiar, a escola pouco pode fazer. Voltamos, assim, ao ponto de partida, isto é, a atuação para com os jovens é ato conjunto da família, da sociedade e do Estado. Como todos os jovens estão desestruturados, não se alcança nenhum resultado. A comunicação entre esses três elementos e as crianças e os adolescentes é desajustada, uma vez ausente a capacidade para receber, interpretar, responder e transmitir as mensagens que a eles gerarão maiores escolhas.”[9]
Notamos, portanto, que ambas as esferas andam em torno do mesmo caminho, o verdadeiro declínio que une a falta de responsabilidade de pais, do poder público e da sociedade em geral. Não adianta agirem separadamente, é preciso e essencial para a sua real eficácia a união em prol dos mesmos interesses, tendo consciência de tudo que envolve a efetiva proteção as crianças e aos adolescentes.
Ao entrar na esfera da saúde os problemas se iniciam antes mesmo do nascimento, notamos isso pela falta de atendimento de qualidade pré-natal, pelas inúmeras mortes relacionadas ao parto e pós-parto. Citamos também a mortalidade infantil, a desnutrição, o imenso desrespeito a dignidade do ser humano presente na falta de atendimento público; enorme deficiência no acompanhamento psicológico; a falta de atendimento especializado entre outras dificuldades e problemas que necessitam de solução imediata.
Ainda afirma Luiz Cláudio Amerise Spolidoro:
“Neste nosso Brasil morrem crianças pelas mais variadas causas, o que identifica que o homem em sociedade se tornou um Ser impiedoso, e por que não dizer, o homem de hoje, objeto de abandono material, afetivo e moral enquanto criança e adolescente. É o ciclo se cumprindo em repetição, sem oposição de controle […].”[10]
A consciência inicial de solucionar e denunciar alguns desses problemas devia ser concretizada pelos diversos órgãos que são verdadeiras ferramentas para a nossa sociedade, é o caso por exemplo do Conselho Tutelar, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, a Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Adolescência, entre outros.
A falta de desejo na luta dos direitos das crianças e dos adolescentes faz com que a omissão e o silêncio se tornem algo “comum” e “normal” para grande parte da nossa sociedade. É preciso apagar as indiferenças, a inconsciência, a ignorância, o preconceito, exigir força para a resolução do poder público. A necessidade é cada vez maior de conscientizar a sociedade, de modo que todos entendam a importância de cada um na efetiva fiscalização e cobrança do poder público e de suas diversas nuances de competência.
Afirma Renato Barão Varalda (2008), a sociedade brasileira ainda não tem plena consciência de sua responsabilidade na luta contra a violação dos direitos de crianças e adolescentes.
A existência de ONGs, entidades, fundações, instituições, grupos com interesse na ação social, agentes comunitários, voluntários, entre outros, fazem com que tenhamos melhor percepção na importância pela luta em busca de melhores condições, seja na educação, saúde, cultura, lazer, esporte, na proteção da integridade física e moral, na família, dignidade, liberdade, respeito, entre outros diversos valores e direitos das crianças e adolescentes do nosso país.
Não podemos culpar uma ou outra parte da sociedade separadamente, pois, o que há na verdade é um rompimento na responsabilidade de todos envolvidos, ou seja, age com culpa direta ou indireta, de forma inclusive muitas vezes omissa a sociedade, a família e o Estado. Assim, vivem submetidos as crianças e os adolescentes do nosso país, incapazes de lutarem por seus direitos, vão sendo esquecidos a margem da indiferença.
Vale lembrar que muitas famílias estão diariamente descumprindo o ECA, é o que vemos com a crescente desestruturação familiar, um terrível resultado de crianças e adolescentes que vivem nas ruas, sendo muitas vezes vítimas dos próprios genitores omissos, entram em dependências químicas, na prática de atos infracionais e perdem totalmente a perspectiva.
Dessa forma, nos traz Renato Barão Varalda:
“Caso se verifique omissão da família (o que muitas vezes resulta em prejuízo à própria segurança da sociedade), o Estado deveria punir os pais ou responsáveis que descumpriram as obrigações decorrentes do poder familiar, por meio da infração administrativa prevista no art. 249, ECA. Ocorre que essa infração prevê como sanção o pagamento de multa, sendo, portanto, inviável diante da situação econômica desfavorecida de muitas famílias e do consequente prejuízo aos próprios filhos, que se privariam de receber necessidades mínimas à garantia dos direitos fundamentais básicos.”[11]
Ao buscar alternativas para resolução das crianças e adolescentes em nosso país devemos ter incialmente consciência da responsabilidade de cada esfera e a necessidade de todas elas perceberem que em nosso país deve existir e se difundir uma nova visão a respeito da adoção.
Ao entrar nesse tema, vemos todos os dias pessoas que cogitam adotar, mas, infelizmente permitem que a barreira do preconceito seja capaz de trazer dúvidas, seja dentro da própria família, entre amigos ou através da própria mídia, nos bombardeando diariamente com uma série de informações inadequadas.
Não existem razões para que a adoção seja vista pelo olhar do constrangimento, a adoção é uma dádiva. A filiação biológica que antes era vista como objeto necessário para as relações de boa convivência entre pais e filhos passou a ser observada como um inevitável mito, é o resultado do que vemos nos milhares de abrigos lotados de filhos biológicos que não foram adotados por seus genitores. Observamos o mesmo em outras situações corriqueiras em nosso país, como os adolescentes que foram educados e criados por seus genitores e vivem usando e vendendo drogas, matando e roubando todos os dias.
Segundo Sávio Bittencourt (2010, págs. 153,154):
“Deste vício inicial surgem muitas incompreensões que vão sendo tomadas como verdades eternas, sabedoria ancestral, que seguem a lógica falsa da prudência, apontando seu dedo torto para problemas inexistentes. São miragens míopes, que os moribundos do deserto da falta de afetividade pensam ser reais. Como os sedentos e esfomeados na areia escaldante, as pessoas que estão privadas de conviver com o amor pleno têm também delírios: enxergam oásis inexistentes de vidas absolutamente seguras, longe de qualquer risco ou improviso. E com a visão entorpecida por esta ingênua pretensão, continuam sua viagem trôpega pelo deserto de afeto”. (2010, p. 153 e 154)
Para que se alcance o sonho da maternidade e da paternidade basta amar, e o amor compreende a paciência, o diálogo, a confiança, o respeito. É através da convivência que os vínculos afetivos se desenvolvem e se tornam maiores a cada dia.
É preciso que a sociedade se conscientize da nova concepção que deve existir quanto ao modo de ver a adoção. Enquanto muitos ainda optam por escolher crianças que não preenchem requisitos desejados, milhares vão sendo esquecidas em instituições que tiram a cada dia a expectativa de um futuro melhor, é o que acontece com as crianças portadoras de necessidades especiais por exemplo.
A discriminação com as crianças mais velhas ainda tem sido infelizmente um fator determinante quando o assunto a ser tratado é a adoção, pensar que a adoção traz problemas futuros é uma das razões responsáveis pela desistência de muitos candidatos. Visto que as diversas razões que as pessoas adotam são de caráter social, físico e emocional.
É importante ressaltar que as mudanças introduzidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente trouxeram para a sociedade um novo paradigma em relação aos cuidados que devem existir quando o assunto a ser tratado é a infância e a juventude. Da mesma forma a Constituição Federal trouxe avanços fundamentais quando passou a considerar a criança e o adolescente como sujeitos de direito; pessoas em condições peculiares de desenvolvimento e detentores de prioridade absoluta.
Porém, infelizmente vivemos em um país que teoricamente dispõe de inúmeras formas de proteção a criança e ao adolescente e a dura realidade que os envolve de abandono, solidão, desamparo, marginalização e exclusão. Entre várias questões que devem ser observadas pela sociedade é a satisfação que deve ser proporcionada a criança que procura um lar e não a satisfação de um lar que procura uma criança.
Descaracterizar paradigmas e mitos da sociedade, promover políticas públicas em favor das crianças e adolescentes em situação de risco (abandono ou conflito com a lei) é o início de uma grande batalha que busca a vitória da infância e juventude vitimada pelas mais diversas questões sociais e econômicas.
As famílias sem filhos precisam de acompanhamento, orientação e informação, para que encontrem na legislação brasileira e nas instituições, lugares que vislumbrem a possibilidade de tornarem real o desejado exercício da maternidade e da paternidade através da adoção.
Segundo Bittencourt:
“Em resumo estamos ainda cainhando entre uma concepção preconceituosa e equivocada para uma nova cultura, mais justa e eficaz no resguardo do direito fundamental da criança objeto, propriedade mal disfarçada de sua família biológica que pode por diversas vezes sonegar direitos essenciais sob o bleneplácito das autoridades públicas, incluindo defensores públicos, promotores de justiça e juízes de direito. Para esta família, em nome do princípio da proteção integral, garantindo toda a segurança jurídica com a compreensão sem fim daquelas que justamente mal desenvolvidas e com disparidades sociais. Nelas há um sistema compensação ideologicamente instituído no inconsciente coletivo, que determina uma demasiada tolerância com a conduta dos pobres, que passam a ser sujeitos de direito especiais, socialmente autorizados a doses de transgressões da lei cotidianas, em práticas inicialmente ilícitas que vão sendo toleradas até se imporem como realidade irreversível”. (2010, pág. 44)
A sociedade precisa entender imediatamente que a finalidade principal da adoção na atualidade é propagar uma “cultura de adoção” que destitua os mitos, preconceitos e tabus ainda presentes na nossa sociedade, acompanhando a aceitação das mais diversas formas de famílias. A diversidade deve ser vista como um modo de avanço da sociedade.
É preciso avançar na educação, as próximas gerações devem ser despidas de preconceitos, tendo consciência e capacidade para amar o diferente, acolher e defender cada criança ou adolescente que seja privado de uma família.
É um verdadeiro desafio construir uma nova cultura da adoção, porém o resultado é quem vai decidir a enfrentar o imenso número crianças e adolescentes sem famílias no Brasil. Pois, este é sem dúvidas um direito inalienável da criança e do adolescente e um dever ético, moral e solidário de todos nós.
11 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente o presente trabalho trouxe através de suas diversas pesquisas bibliográficas um maior conhecimento a respeito do tema além da visão crítica quanto ao assunto abordado. A adoção vem a ser um tema discutido desde a antiguidade e atualmente em suas diversas vertentes tem sido muitas vezes alvo de polêmicas e discussões calorosas.
Com o passar dos anos novas entidades familiares foram surgindo e se modificando, antes a família era caracterizada principalmente pela construção através do matrimônio, hoje, muitas são baseadas nas relações afetivas geradas espontaneamente pelos indivíduos. As famílias em suas mais diversas formas e vertentes, mas, com o intuito em comum, que é a união, o amor, o respeito, e os demais direitos fundamentais que todos nós possuímos.
Dotada de nova personalidade, o forte movimento feminista e a revolução sexual fazem com que a família contemporânea passe a enfrentar discriminação e preconceito. Ao ter caráter não meramente reprodutivo, a família passa a ser campo de acolhimento da afetividade.
Nesse contexto, a adoção vem a ser uma solução efetiva ao oferecer as crianças e aos adolescentes um lar onde possam encontrar educação, amor, atenção, respeito, união, carinho e compreensão. Valendo lembrar que o amor nas suas diversas relações é sempre conquistado, e todos os pais, adotivos ou biológicos devem verdadeiramente adotar seus filhos.
A adoção não pode ser vista como um mero instituto legitimado em lei, pois é acima de tudo um ato nobre que visa proporcionar lares e famílias aqueles que estão dispersos em meio ao abandono, esquecimento e angústia. São tantas vezes reféns de medos e de uma história anteriormente traumatizada.
É necessária imediata consciência das três esferas existentes no nosso país para que todos os direitos constitucionalmente assegurados as crianças e aos adolescentes sejam respeitados e realmente aplicados. Precisamos dar um basta a teoria que ocupa tantos espaços legislativos e nos proporciona uma realidade tão rudimentar preenchida de mitos, hipocrisias, discriminação e preconceito.
Portanto, concluímos o quanto é essencial para a nossa sociedade que se intensifiquem as reflexões sobre uma mudança de cultura quanto ao esplendoroso tema que é a adoção, para que todas as crianças e adolescentes, de todas as idades, sexo, cor de pele, portadoras ou não de necessidades especiais possam ter a oportunidade e realmente encontrar uma família que afaste o mundo do egoísmo e da indiferença e os ofereça o mundo do respeito e do amor.
Independentemente das interpretações dadas em nosso ordenamento jurídico sabemos que o que deve ser visto com total importância e ênfase é o interesse do menor e do adolescente e não vertentes jurídicas vencedoras. Não podemos simplesmente ignorar as mais diversas relações humanas apenas por questões legislativas ou preconceituosas, o conceito que importa de verdade nesse contexto é o bem estar psicológico, social e afetivo da criança e do adolescente.
Por fim, ressaltamos que o Estado, a sociedade e a família devem agir em conjunto e harmonia, proporcionando o devido cuidado e proteção para todas as crianças e adolescentes em nosso país.
Acadêmica de Direito
Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba, Especialista em Direito Processual Civil e Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Mestrando em Desenvolvimento pela UEPB/UFCG, professor das disciplinas de Direito Processual Civil e Teoria Geral do Processo do Centro de Ensino Superior Reinaldo Ramos (CESREI), professor da Disciplina de Direito Processual Civil e Juizados Especiais da UNESC Faculdades, professor de cursinhos preparatórios para concursos e para o Exame da OAB . Advogado Militante e Palestrante
possui graduação em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba 2003 e mestrado em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba 2007. Atualmente é professor do Centro de Ensino Superior Reinaldo Ramos professor da União de Ensino Superior de Campina professor – Lexus – Curso Preparatório para Carreira jurídica advogado – Soares Advocacia e Consultoria Professor Assistente II – dir. privado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e coordenador da União de Ensino Superior de Campina. Tem experiência na área de Direito com ênfase em Direito Civil atuando principalmente nos seguintes temas: dignidade humana direito de família afetividade adoção e direitos humanos
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