A tecnologia assusta ainda a muitos.
Depois de Edison Aparecido Brandão ter realizado o primeiro interrogatório através de vídeo-conferência no Brasil em 1996; depois de alguns já estarem utilizando, inclusive em audiências, o sistema de “viva voz” (que dispensa o teclado do computador para editar textos); depois da adoção em alguns órgãos judiciários da microfilmagem de processos arquivados; depois de já estar-se tornando cada vez mais comum o chamado “livro jurídico eletrônico”; ainda há muita restrição ao uso da informática e principalmente da internet no ambiente forense no nosso país.
Essa a razão deste modesto estudo.
Para tanto, entendo necessário mostrar primeiro o inteiro teor da Lei 9.800, de 26 de maio de 1999, que “permite às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais”, a qual ainda permanece desconhecida por muitos, mal compreendida por outros quanto ao seu grande alcance e inaplicada pela quase unanimidade.
Diz o diploma legal, na sua íntegra:
Art. 1º – É permitida às partes a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita.
Art. 2º – A utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.
Parágrafo único. Nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material.
Art. 3º – Os juízes poderão praticar atos de sua competência à vista de transmissões efetuadas na forma desta Lei, sem prejuízo do disposto no artigo anterior.
Art. 4º – Quem fizer uso de sistema de transmissão torna-se responsável pela qualidade e fidelidade do material transmitido, e por sua entrega ao órgão judiciário.
Parágrafo único. Sem prejuízo de outras sanções, o usuário do sistema será considerado litigante de má-fé se não houver perfeita concordância entre o original remetido pelo fac-símile e o original entregue em juízo.
Art. 5º – O disposto nesta Lei não obriga a que os órgãos judiciários disponham de equipamentos para recepção.
Art. 6º – Esta Lei entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.”
Ficou conhecida como “lei do fax”, quando, na verdade, fala, além do próprio fax em “outro similar”, como é o caso do correio eletrônico (“e-mail”).
Diferencia, para seus efeitos, os atos processuais em: a) atos sujeitos a prazo, b) atos não-sujeitos a prazo.
Quanto aos primeiros, diz que, remetido o “material” dentro do prazo, devem “os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término”.
Sobre os segundos, determina que “os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material”.
Sobre o que seja “material” pode ser evidentemente texto, foto, mapa etc.
Quando reza, no art. 3º, que “os juízes poderão praticar atos de sua competência à vista de transmissões efetuadas na forma desta Lei, sem prejuízo do disposto no artigo anterior”, quer dar a conhecer que o Juiz dará seguimento ao processo normalmente, sem aguardar que o original seja entregue, isso, evidentemente, se ainda estiver a parte dentro do prazo de sua entrega.
Naturalmente que, se ultrapassados os mencionados prazos, sem a providência do remetente, o “material” será tido como não remetido, devendo ser desentranhado do processo.
É importante a ressalva do art. 4º: “Quem fizer uso de sistema de transmissão torna-se responsável pela qualidade e fidelidade do material transmitido, e por sua entrega ao órgão judiciário”.
Assim, não é menos certo que, ocorrendo falha na remessa do “material”, a responsabilidade é única e exclusiva do remetente.
Muito importante observar que a lei fala na entrega do original do “material” para validade da remessa anteriormente feita.
Entretanto, como se sabe que toda interpretação deve fazer chegar a resultados lógicos e razoáveis, entendo que, em caso de “material” remetido via correio eletrônico, a entrega do original pode ser validamente substituída pela aposição, nos prazos acima mencionados, de assinatura ou rubrica do remetente em todas as folhas do “material” que já estará junto ao respectivo processo.
Em se interpretando gramaticalmente (a pior das formas de interpretação e que gera verdadeiros monstrengos jurídicos), ou seja, pela necessidade absoluta de entrega do original, sem a opção acima, o advogado, promotor de justiça ou defensor público, deverá entregar na secretaria o original e esta lhe entregará, em contrapartida, simultaneamente o “material” anteriormente remetido, numa verdadeira “permuta desnecessária de papéis”.
Adotando-se a opção que sugeri na Comarca de Juiz de Fora, isso significará economia, além de evitar-se a entrega pelo advogado, promotor de justiça ou defensor público do original que será exatamente igual ao “material” que já está no processo, cuja única diferença é não ter a assinatura ou rubrica do remetente.
Alguns têm procurado regulamentar esse serviço através de atos normativos, enquanto que outros entendem que a própria lei basta para produzir os resultados desejados.
Acredito, no entanto, que muito mais importante do que tudo é seguirmos pelo caminho que se abre à nossa frente, com apoio de todos os interessados na prestação jurisdicional e assim estaremos fazendo avançar a qualidade dos serviços judiciários.
E, uma palavra final deve ser dita àqueles que não aceitam a remessa de petições via correio eletrônico (e há quem pense assim), ou seja, que devemos respeitar seu direito de entender como achar melhor.
Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora – MG
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