Resumo: A revelia da Constituição Federal, o Estado continua usando a reserva do possível como uma desculpa frequente para justificar sua omissão na efetivação das políticas públicas.
Palavras chaves: Justiça, dignidade humana, direitos fundamentais, políticas públicas.
Palabras llaves: En Español: Justicia, dignidad humana, derechos fundamentales, políticas públicas
A Constituição Federal de 1988 – Chamada de constituição Cidadã, considerada internacionalmente uma das mais avançadas do mundo, está perto de completar 24 anos. O país que acabava de sair de um regime de ditadura militar, promulgava em 05 de outubro de 1988 uma constituição de dar inveja aos países do primeiro mundo, sobre tudo os mais avançados. A Nova carta Magna nascia sob a proteção de Deus como afirma o preâmbulo da mesma, e para fazer jus a este auspício, estabelece em seu artigo 1º O Estado Democrático de Direito e dentre seus fundamentos no inciso III- a dignidade da Pessoa Humana.
Sem dúvida é este o mais relevante postulado ético e jurídico da Constituição Federal do Brasil. É impossível pensar a ideia de justiça sem levar em consideração este princípio.(…) “A pessoa representa o fim último da sociedade, que por sua vez lhe está ordenada.”
Pelo simples fato de ser humano, a pessoa é detentora de dignidade, é essencialmente um atributo da pessoa humana: pelo simples fato de “ser” humana, esta merece todo respeito. Entendimento pacificado há tempos no meio teológico, filosófico e jurídico.
Entretanto o Estado tem se mostrado cada vez mais negligente com este fundamento constitucionalizado, ou por outra, com este compromisso assumido constitucionalmente.
A Carta Magna de 1988 garantiu ao Cidadão brasileiro direito à vida. No entender do Professor André Ramos Tavares, diretor do Instituto Brasileiro de Estudos Constitucionais; “o direito à vida deve ser entendido em duplo sentido. Primeiro, como direito a permanecer vivo. Em segundo, direito a um nível de vida adequado. A manutenção da vida do indivíduo se faz por meio da prestação positiva do Estado principalmente no que se refere à segurança pública, bem como a proibição do homicídio. Já a garantia de mínimas condições de vida, para uma existência digna, faz-se por meio de direitos, tais como alimentação adequada, moradia, vestuário, saúde, educação, cultura e lazer.”
Não há dúvida, direito à vida trata-se do direito fundamental mais importante, logo goza do pressuposto da aplicabilidade imediata, ou seja, não depende de nenhuma outra lei para que possam ser efetivado. Interligado diretamente aos direitos sociais, direitos estes que objetivam possibilitar melhores condições de vida aos mais fracos. Entre eles o direito a saúde.
Tais direitos estão conectados com o direito de igualdade, valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais favoráveis na conquista da igualdade real, o que naturalmente, cria condições mais compatível com o exercício efetivo da liberdade.
Mas o Estado encontrou um jeito para se furtar ao cumprimento de tais direitos – “reserva do possível” .
O direito a uma vida digna depende de implementação de políticas publicas, que por sua vez depende de disponibilidade financeira – a então chamada reserva do possível. A válvula de escape mais utilizada pela administração pública para, o não cumprimento deste e de outros direitos fundamentais, reside justamente no argumento de que não há verbas para implementá-los.
O STF já decidiu que o Estado “deve aparelhar-se para a observância irrestrita dos ditames constitucionais, não cabendo tergiversar mediante escusas relacionadas com a deficiência de caixa” (AgRegimental no RE 384.201-3/SP).
Vivemos num Estado Democrático de Direito, sob a égide de uma das constituições mais avançadas do mundo. Mas os direitos ali elencados estão longe de se tornarem reais; haja vista a pergunta feita a familiares de pacientes em hospitais públicos, “o paciente tem vida útil?” Um sim ou um não vai determinar toda tratamento do paciente, sem que a família se dê conta da diferença da resposta. Afinal são muitos amontoados em corredores no mesmo estado, num país em que se privatizou as riquezas e globalizou a miséria sobre a proteção da “Reserva do Possível”.
A “Reserva do Possível” todavia não atinge os polpudos salários dos representantes legais do povo, aliado a corrupção, subjuga o país numa democracia meramente formal, onde impera a má distribuição de recursos.
A continuar assim, permaneceremos infringindo um dos fundamentos da nossa lei, a dignidade da Pessoa Humana, angustiados pela dúvida, se em algum tempo seremos capazes de construir uma sociedade livre, justa e solidaria; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, cor idade e quaisquer outras formas de discriminação. Utopia? Não. São estes os objetivos fundamentais previstos na Constituição em vigor no seu artigo 3º.
Norberto Bobbio em seu livro a Era dos Direitos p.25, alertou para uma questão que cabe bem na presente reflexão: “Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-lo, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados(…)”
Advogada pela Universidade de Itaúna/MG, Especialista em Direito Processual pela Facinter, Mestrando em Direitos Fundamentais pela Universidade de Itaúna em disciplina isolada
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