Responsabilidades da indústria do gás natural pelos danos causados ao meio ambiente

Resumo: O trabalho em tela aborda as conseqüências jurídicas nas esferas cível, penal e administrativa a que a indústria do gás natural está sujeita em casos de danos ambientais. Aborda, ainda, o papel da ANP e dos órgãos ambientais na prevenção dos danos e na fiscalização das atividades desta indústria e a possível responsabilização dos mesmos pelos danos decorrentes de suas atividades.

Sumário: 1. Introdução; 2. Exigibilidade do estudo de impacto ambiental e do licenciamento ambiental para as atividades da indústria do gás natural; 3. Independência das responsabilidades penal, civil e administrativa; 4. Responsabilidade penal ambiental; 5. Responsabilidade administrativa ambiental; 6. Responsabilidade civil ambiental; 7. O papel da ANP frente à questão ambiental; 8. Conclusão; Referências Bibliográficas.

1. Introdução


Nos últimos anos, especialmente, a partir da abertura do mercado de petróleo e gás natural pela Emenda Constitucional nº 9/95, a indústria do gás natural tem despontado no cenário energético brasileiro e este crescimento se deve, principalmente, às inúmeras vantagens ambientais que podem ser auferidas pelos diversos usos do gás natural, seja nas indústrias, residências, transporte ou geração de energia.


De fato, a utilização do gás natural apresenta significativas vantagens ambientais quando comparado a outros combustíveis fósseis e a outros recursos energéticos, como a energia nuclear e hidrelétrica, mas apesar de todas essas vantagens, não se pode deixar de considerar que as atividades exercidas pela indústria do gás natural são consideradas potencialmente causadoras de danos ambientais significativos, estando, portanto, sujeitas ao controle ambiental por parte dos órgãos e entidades ambientais.


 Tendo em vista a importância da preservação ambiental nas atividades da indústria do gás natural, o trabalho em questão irá abordar, de forma genérica, as conseqüências jurídicas nas esferas cível, penal e administrativa a que esta indústria está sujeita em razão dos danos causados ao meio ambiente nas hipóteses de falta de licença ambiental, prática de processos produtivos inadequados e de danos ambientais causados por acidentes. Esta ultima hipótese se refere aos danos causados exclusivamente em razão do cumprimento das regras impostas nas licenças ambientais.


Ao final, será analisado, sucintamente, o papel da ANP e dos órgãos e entidades ambientais na prevenção dos danos e na fiscalização das atividades exercidas pela indústria do gás natural e a possível responsabilização dos mesmos pelos danos ambientais decorrentes de suas atividades.


2. Exigibilidade do estudo de impacto ambiental e do licenciamento ambiental para as atividades da indústria do gás natural


Considerando que os danos ambientais são muito difíceis e, não raramente, impossíveis de serem reparados, a prevenção constitui elemento de fundamental importância[1].


Dentre os princípios que regem o Direito Ambiental, o princípio da prevenção e o princípio da precaução destacam-se como os mais importantes, dos quais decorrem todos os demais. 


O princípio da prevenção reza que devem ser adotadas medidas efetivas para evitar o dano ambiental mesmo no caso de haver apenas um simples risco de danos graves e irreversíveis ao meio ambiente. O princípio da precaução, por sua vez, vai mais além e preconiza que a prevenção deve ocorrer não apenas em caso de certeza do risco do dano ambiental, mas, também, quando existe a dúvida científica do risco do dano ambiental[2].


São estes dois princípios que fundamentam a exigibilidade do Estudo de Impacto Ambiental – EIA e do próprio processo de licenciamento ambiental para as atividades potencialmente ou efetivamente causadoras de danos ambientais significativos, como é o caso das atividades da indústria do gás natural.


O prévio Estudo de Impacto Ambiental e o processo de licenciamento ambiental constituem instrumentos da política nacional do meio ambiente que irão estabelecer condições, restrições e medidas de controle ambiental para que seja causado o menor impacto possível ao meio ambiente.


O Estudo de Impacto Ambiental antecede processo de licenciamento ambiental e consiste em analisar, prévia e sistematicamente, os efeitos danosos que possam resultar da implantação, ampliação ou funcionamento de atividades com potencial de causar significativa degradação ambiental e, caso seja necessário, propor medidas para adequá-las aos pressupostos de proteção ambiental.


Tem previsão na Constituição Federal que, em seu art. 225 § 1º, estabelece que:


Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.


 § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incube ao poder público:


IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.


O prévio Estudo de Impacto Ambiental deverá ser realizado por uma equipe multidisciplinar que deverá fazer avaliações técnicas – científicas das conseqüências que a implantação do empreendimento irá causar no meio ambiente do ponto de vista de diversas áreas como a da Biologia, Geografia, Economia, Sociologia etc.


Ao final, deverá ser apresentado um documento contendo os resultados dos estudos técnicos e científicos de avaliação de impacto ambiental  denominado Relatório de Impacto Ambiental – RIMA.


Este relatório deverá ser sempre divulgado e submetido à consulta pública e, em determinados casos, discutido em audiências públicas.


Em síntese, o Estudo de Impacto Ambiental apresenta quatro etapas fundamentais, quais sejam, fase preliminar de obtenção de informações, fase de elaboração de estudos ambientais por equipe técnica multidisciplinar, fase de apreciação dos trabalhos da equipe multidisciplinar pelo órgão ambiental competente e, por fim, a fase de discussão e aprovação dos estudos ambientais pelo órgão ou entidade responsável pelo licenciamento[3].


O Licenciamento Ambiental, por sua vez, consiste num procedimento administrativo destinado a licenciar a instalação, ampliação, modificação e operação de atividades e empreendimentos que utilizam recursos naturais ou que sejam potencialmente danosas ao meio ambiente.


Para o processo geral de Licenciamento Ambiental, no qual se inserem as atividades da indústria do gás natural que não sejam as de exploração, desenvolvimento e produção, é necessária a concessão de duas licenças preliminares antes de ser concedida a licença final. São elas: a Licença Prévia (LP), destinada à fase de planejamento da atividade, e a Licença de Instalação (LI), que autoriza o início da implementação, de acordo com as especificações constantes do projeto executivo aprovado.


A licença final, autorizando o início das atividades, denomina-se Licença de Operação (LO). 


O processo de Licenciamento Ambiental das atividades de exploração, desenvolvimento e produção de Petróleo e Gás Natural é regulado por normas específicas: A atividade sísmica requer Licença de Operação, antecedida do Estudo de Impacto Ambiental, conforme impõe o Decreto 99274/90 e CONAMA nº 237/97; a perfuração requer a Licença Prévia para Perfuração – Lper e o Relatório de Controle Ambiental – RCA; Produção para Pesquisa exige a Licença Prévia de Produção para Pesquisa e o Estudo de Viabilidade Ambiental – EVA; Desenvolvimento exige a Licença de Instalação e o Estudo ou Relatório de Impacto Ambiental e a atividade de Produção requer a Licença de Operação e o Projeto de Controle Ambiental – PCA, todas estas conforme estabelece a resolução do CONAMA 23/94[4].


É importante destacar que as licenças ambientais estabelecem as condições para que a atividade ou o empreendimento cause o menor impacto possível ao meio ambiente. Portanto, qualquer alteração deve ser submetida a novo processo de licenciamento, com a solicitação de Licença Prévia.


O exercício de atividade sem a prévia licença ambiental ou o desenvolvimento de atividades em desacordo com as regras impostas pelo licenciamento, gera para a indústria do gás natural responsabilidades nas esferas administrativa e penal e, em caso de danos ao meio ambiente e/ou a terceiros, a responsabilidade civil.


3. Independência das responsabilidades penal, civil e administrativa


Uma mesma conduta danosa ao meio ambiente poderá ou não ensejar a responsabilização do agente nas esferas cível, penal e administrativa. Isto é assim, pois cada uma dessas espécies de responsabilidade possui fundamentos diversos e independentes[5].


A ocorrência de um dano, por si só, gerará a obrigação de repará-lo. (Responsabilidade Civil).


Se este mesmo dano tiver sido causado em razão do descumprimento de uma norma administrativa, gerará, também, a imposição de sanção administrativa. (Responsabilidade Administrativa)


Se a ocorrência desse dano for tutelada penalmente, gerará a imposição da sanção penal. (Responsabilidade Penal).


A possibilidade dessa tríplice responsabilização tem fundamento, em matéria ambiental, no art. 225 § 3º da Constituição Federal, que dispõe que:


 Art. 225. § 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. 


4. Responsabilidade penal ambiental


Consoante o que foi acima exposto, a indústria do gás natural exerce uma atividade potencialmente causadora de danos ambientais significativos, só podendo exercer certas atividades após a concessão da licença ambiental por parte do Poder Público. Com a obtenção da licença ambiental ela deve exercer a sua atividade de acordo com as normas legais e regulamentares, renovar a licença quando a primeira estiver vencida e se submeter a um novo processo de licenciamento ambiental no caso de alterações.


Exercer alguma atividade sem a devida licença ambiental ou em desacordo com as regras administrativas ambientais, conforme a Lei nº 9.605 de 12.02.98 – Lei dos Crimes Ambientais, gera para a indústria do gás natural a responsabilidade penal.


A tipificação deste crime está presente no art. 60 da referida Lei que dispõe que:


Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar, ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes.


O crime previsto neste dispositivo legal não exige a concretização do dano ambiental. O simples risco causado pela atuação da indústria do gás natural sem a devida licença ambiental ou com a licença, mas contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes gera a responsabilidade penal.


Havendo dano, será responsabilizada pelo crime do art. 54 desta mesma lei que reza que:


Art. 54 Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. (sublinhamos)


No entanto, não é qualquer dano que gera a responsabilização penal, apenas aqueles que ultrapassam os limites padrões de proteção e conservação do meio ambiente[6].


Importante destacar que no âmbito do Direito Penal a responsabilidade é sempre subjetiva, ou seja, fundada na culpabilidade do agente[7]. Portanto, se o dano for causado por acidente, ou seja, quando ele ocorre mesmo quando a indústria do gás natural exerce a sua atividade com a licença ambiental e de acordo com as normas legais, adotando todas as medidas preventivas, não é cabível a responsabilidade penal.


No entanto, se o dano for causado quando ela estiver agindo em desacordo com as regras administrativas ambientais, estará agindo com dolo eventual[8] e deverá ser responsabilizada pelo crime do art. 54.


De acordo com o art. 2º da Lei 9.605/98, poderão ser responsabilizadas pelos crimes tanto a pessoa jurídica com as pessoas físicas autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato, que poderão ser o diretor, o administrador, o membro do conselho e de órgão técnico, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica. Destacando que este rol não é taxativo[9].


No tocante às sanções penais, podem ser aplicadas as penas privativas de liberdade, restritivas de direito e multa.


As penas privativas de liberdade, por sua natureza, só poderão, evidentemente, ser aplicadas as pessoas físicas e a pena de multa não tem um caráter inibitório e nem reparatório, mas apenas sancionador.


Em relação às penas restritivas de direito elas se mostram adequadas tanto para as pessoas físicas quanto para as pessoas jurídicas.


São aplicáveis à pessoa física as penas de: prestação de serviços à comunidade que consiste na realização de tarefas gratuitas junto a parques, jardins públicos e unidades de conservação, e no caso de dano das coisas particulares, públicas ou tombadas, na restauração desta, se possível; interdição temporária de direitos que consiste na proibição de contratar com o Poder Público, receber incentivos fiscais e outros benefícios, bem como participar de licitações, pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos, e de três anos na hipótese de crimes culposos; suspensão parcial ou total de atividades quando não obedecerem às determinações legais; prestação pecuniária que consiste no pagamento de dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social; e recolhimento domiciliar (arts. 8º e segs da Lei 9.605/98).


No que diz respeito às pessoas jurídicas, são aplicáveis as seguintes penas restritivas de direito: suspensão total ou parcial das atividades; interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade que aplicável nas hipóteses de funcionamento sem a devida autorização, em desacordo com a concedida ou com violação de disposição legal ou regulamentar; proibição de contratar com o Poder Público e de obter subsídios, subvenções ou doações pelo prazo máximo de dez anos (arts. 21 e 22 da Lei 9.605/98).


A pena de prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consiste no custeio de programas e projetos ambientais, execução de obras de recuperação de áreas degradadas, manutenção de espaços públicos e contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas (art. 23 da Lei 9.605/98).


5. Responsabilidade administrativa ambiental


A responsabilidade administrativa da indústria do gás natural surge quando há infração das normas ambientais administrativas.


A este respeito, o art. 70, caput da Lei 9.605/98 dispõe que: “Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”.


Vale destacar que, a responsabilidade administrativa existe ainda que não tenha ocorrido dano ambiental, ou seja, o simples ato de contrariar as normas administrativas gera a responsabilidade para o infrator, independentemente da ocorrência de danos ambientais[10].


Essas infrações são apuradas pelos órgãos administrativos competentes em processo administrativo próprio, estando assegurado o contraditório e a ampla defesa.


A indústria do gás natural, ao cometer alguma infração administrativa, poderá sofrer algumas das sanções estabelecidas no art. 72 da Lei. 9.605/98 que são: advertência; multa simples; multa diária; apreensão dos instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; destruição ou inutilização do produto; embargo de obra ou atividade; restritiva de direitos. Os estados e municípios no exercício de sua competência suplementar podem acrescentar outros tipos de sanções.


A multa simples somente poderá ser aplicada em caso de responsabilidade subjetiva, ou seja, só poderá ser aplicada se o agente estiver agido com dolo ou culpa[11].


As multas administrativas possuem um caráter inibitório, o que é bastante elogiável, pois está se privilegiando o caráter de prevenção dos danos ambientais.


A aplicação das multas poderá ser suspensa se o infrator se comprometer a adotar medidas para reparar a degradação ambiental. Após o cumprimento das obrigações assumidas, o infrator deverá pagar apenas 10% do valor inicialmente cominado[12].


Ainda poderão ser aplicadas as seguintes sanções administrativas: perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito; suspensão das atividades e redução das atividades[13].


6. Responsabilidade civil ambiental


A responsabilidade civil, quanto ao seu fundamento, pode ser objetiva ou subjetiva.


A responsabilidade subjetiva tem como pressupostos os seguintes elementos: a ação ilícita (comissiva ou omissiva), o dano, que pode ser moral ou material, o nexo de causalidade e, principalmente, a perquirição da culpabilidade do agente, ou seja, para que o agente responda pelo dano que causou a outrem, por infringir a norma legal, é necessária a análise do elemento subjetivo que impulsionou o seu comportamento, devendo reparar o dano causado somente se tiver agido com dolo ou culpa[14].


A responsabilidade objetiva, por sua vez, tem como pressupostos apenas a ação (que não precisa ser necessariamente ilícita, tendo em vista o risco da atividade), o dano e o nexo de causalidade entre a ação do agente e o dano, desprezando-se a perquirição acerca da culpabilidade do agente[15]


A responsabilidade civil ambiental, de acordo com a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) é objetiva. A este respeito dispõe o § 1º do art. 14 da referida lei:


Art. 14. § 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente. (sublinhamos)


A obrigação de indenizar ou de recuperar os recursos ambientais degradados representa a materialização do princípio do poluidor-pagador, imputando ao responsável pelos danos o ônus oriundo dos custos sociais das atividades econômicas[16].  


Sendo a responsabilidade civil ambiental objetiva, a indústria do gás natural estará obrigada a reparar tanto os danos ocorridos quando ela atua sem a devida licença ambiental ou contrariando as normas por ela impostas, quanto os danos ocorridos quando ela age em estrito cumprimento às normas impostas pela licença ambiental.


Do ponto de vista da responsabilização da indústria do gás natural, será irrelevante analisar a licitude ou não da atividade, pois isto teria apenas o condão de afastar a culpabilidade do agente o que é totalmente desnecessário para a teoria da responsabilidade objetiva[17].


No entanto, isto se mostra importante, pois se o dano ocorrer diante da licitude da atividade, deve-se analisar se os órgãos ou entidades públicas ambientais responsáveis pela emissão das licenças ambientais também podem ser co-responsabilizados.


A teoria da responsabilidade civil do Estado adotada pelo Brasil, consoante o que preconiza a maior parte da doutrina nacional, é a teoria do risco administrativo, segundo a qual o Estado responde objetivamente (sem análise da culpabilidade) pelos danos que sua atividade cause a terceiros, exigindo-se, apenas, a conduta do agente (positiva ou negativa), o dano e o nexo de causalidade[18].


Com base nisso, estando presentes os pressupostos da responsabilidade objetiva, quais sejam, a conduta (estabelecimento das normas impostas pela licença ambiental concedida), a ocorrência do dano e a relação causal entre a conduta do agente e o dano (dano causado em razão do cumprimento das normas impostas pela licença), desprezando-se a culpabilidade, podemos concluir pela responsabilidade solidária do ente público responsável pelo licenciamento ambiental.


De acordo com este entendimento, os seguintes doutrinadores dispõem:


Paulo Affonso Leme Machado:


Para compelir, contudo, o Poder Público, a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar, e ordenar a saúde ambiental nos casos em que haja prejuízo para as pessoas, para a propriedade ou para os recursos naturais mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular.  MACHADO (2002).


Vera Lúcia Rocha Souza Jucovsk:


O licenciamento de atividade pela Administração acarreta a sua solidariedade na indenização, de conformidade à teoria objetiva se houver dano ou sacrifício especial ao meio ambiente. JUCOVSK (2000).


Importante ressaltar que aqueles que responderem objetivamente pelos danos têm o direito de regresso contra os responsáveis que agiram com dolo ou culpa.


7. O papel da ANP frente à questão ambiental


De acordo com a Lei nº 9.478/97, cabe a Agência Nacional do Petróleo – ANP fazer cumprir as boas práticas de conservação e uso racional do petróleo, dos derivados e do gás natural e de preservação do meio ambiente. 


A ANP atua na preservação do meio ambiente no momento em que exige a licença ambiental como requisito para a obtenção de autorizações e concessões para as atividades da indústria do gás natural; realiza convênios com universidades e outras instituições para o desenvolvimento de projetos de pesquisa e estabelecimento de padrões para a segurança operacional da indústria do gás natural e na busca de novas tecnologias e procedimentos que apóiem o desenvolvimento do uso racional dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente; apura responsabilidades para a definição de causas operacionais em incidentes[19].


A ANP também edita portarias que estabelecem regras de conduta, monitoram e fiscalizam a indústria do gás natural no sentido de controlar, evitar e prevenir acidentes e promover o uso adequado dos recursos naturais[20].


Aos órgãos e entidades ambientais cabe estabelecer padrões e princípios gerais; realizar o Estudo de Impacto Ambiental, o processo de licenciamento ambiental e emitir a respectiva licença ambiental e realizar o controle e a inspeção das atividades da indústria do gás natural[21].


8. Conclusão


Com base no que acima foi exposto, podem-se deduzir as seguintes conclusões:


As atividades e os empreendimentos da indústria do gás natural enquadram-se nos considerados potencialmente causadores de danos ambientais significativos, estando sujeitos ao prévio Estudo de Impacto Ambiental e ao processo de licenciamento ambiental.


Se ela agir sem a devida licença ambiental ou em caso de prática de processos produtivos inadequados, independente da ocorrência de danos, deverá responder penal e administrativamente.


Se causar dano, mesmo que esteja agindo licitamente, estará sujeita a responsabilidade civil objetiva.


Por fim, concluímos que os entes públicos responsáveis pelo licenciamento ambiental também poderão ser solidária e objetivamente responsabilizados pelos danos causados em razão do cumprimento das normas impostas pela licença concedida.


Referências Bibliográficas

ANTUNES, Paulo de Bessa. Proteção Ambiental nas Atividades de Exploração e Produção de Petróleo: Aspectos Jurídicos. Ed. Lúmen Júris, Rio de Janeiro 2003.

CARNEIRO, Ricardo. Direito Ambiental: Uma Abordagem Econômica. Ed. Forense, Rio de Janeiro 2001.

JUCOVSK, Vera Lúcia Rocha Souza. “Responsabilidade Civil do Estado por Danos Ambientais no Brasil e em Portugal”. In Revista de Direito Ambiental, nº 17, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo 2000.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Ed. Malheiros, São Paulo 2003.

MARCONDES, Ricardo Kochinski et Darlan Rodrigues Bitterncourt. “Lineamentos da Responsabilidade Civil Ambiental” in Revista de Direito Ambiental, nº 03, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo 1996.

SAMPAIO, Francisco José Marques. Evolução da Responsabilidade Civil e Reparação de Danos Ambientais. Ed. Renovar, Rio de Janeiro 2003.

www.anp.gov.br. Acesso em 05 mai. 2004.

Notas:

[1] MARCONDES, Ricardo Kochinski et Darlan Rodrigues Bitterncourt. “Lineamentos da Responsabilidade Civil Ambiental” in Revista de Direito Ambiental, nº 03, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo 1996.

[2] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Ed. Malheiros, São Paulo 2003.

[3] CARNEIRO, Ricardo. Direito Ambiental: Uma Abordagem Econômica. Ed. Forense, Rio de Janeiro 2001.

[4] ANTUNES, Paulo de Bessa. Proteção Ambiental nas Atividades de Exploração e Produção de Petróleo: Aspectos Jurídicos. Ed. Lúmen Júris, Rio de Janeiro 2003.

[5] MARCONDES, op.cit.

[6] CARNEIRO, op.cit.

[7] CARNEIRO, op.cit.

[8] MACHADO, op.cit.

[9] MACHADO, op.cit.

[10] MACHADO, op.cit.

[11] MACHADO, op.cit.

[12] MACHADO, op.cit.

[13] MACHADO, op.cit.

[14] SAMPAIO, Francisco José Marques. Evolução da Responsabilidade Civil e Reparação de Danos Ambientais. Ed. Renovar, Rio de Janeiro 2003.

[15] SAMPAIO, op. cit.

[16] MARCONDES, op.cit.

[17] MARCONDES, op.cit

[18] MARCONDES, op.cit

[19] Disponível em  www.anp.gov.br. Acesso em 5 mai 2004.

[20] Disponível em  www.anp.gov.br. Acesso em 5 mai 2004.

[21] Disponível em  www.anp.gov.br. Acesso em 5 mai 2004.

Informações Sobre o Autor

Mágila Maria Agostinho

Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005) Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2011)


Equipe Âmbito Jurídico

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