O artigo representa a evolução do conceito de Nação e Estado na história mundial. Tenta realizar a transição entre o conceito absoluto de independência e o movimento internacional que permeou os primeiros séculos da vida moderna, através dos contatos entre nações dominadoras e dominadas.
1.1 Notas introdutórias
Para que se possa melhor visualizar a dicotomia existente entre a Soberania Nacional e as relações oriundas da economia globalizada, faz-se necessária uma interpretação dos aspectos que regem a relação entre países. Na realidade, são as diversas evoluções históricas que acabam por modificar o conceito de relacionamento existente entre as diferentes nações. Acordos comerciais e de proteção são apenas reflexos de necessidades históricas extremamente tênues. Povos como Itália, Rússia e EUA foram aliados e inimigos indiscriminadamente, no passar de poucas décadas.
O movimento histórico é extremamente cíclico: de diminutos grupos nômades evolui-se para cidades, estados, nações e, por fim, impérios. Da fragmentação destes impérios – causada pela dificuldade de operacionalizar tais gigantes – surgem os Estados modernos. Mas, novamente, estes grupos procuram coesão, desta vez não pela força, mas por acordo de vontades. Passaram-se milhões de anos desde que a natureza separou os continentes do imenso Pangea, isolando grupos diferentes em pontos extremos do planeta. Entretanto, o que a força natural separou, a vontade política e legal tenta novamente unir: o mundo globalizado.
Desde os primórdios, os povos desenvolvem dois modos diversos de comportamento: uma necessidade de afirmação interna de independência, nos planos militar, político e administrativo; e a extrema busca de inter-relação econômica como forma de sustentação da base monetária e da balança comercial.
Essa discussão dependência/Soberania surge ainda nos mais remotos vestígios históricos da humanidade. Se os analistas políticos dizem que o primeiro homem a cercar um pedaço de chão e defendê-lo como seu, deu origem à propriedade; da mesma forma a sua necessidade de gêneros alimentícios e de outros elementos gerou a busca pela interação com os demais “possuidores”, criando, num primeiro plano, a sociedade e, por conseqüência, as relações interpovos.
Nesse mesmo sentido, já na Renascença, Nicolau Maquiavel[1] pregava:
Quando aqueles Estados que se conquistam (…) estão habituados a viver com suas próprias leis e em liberdade, existem três modos de conservá-los: o primeiro, arruiná-los; o segundo, ir habitá-los pessoalmente; o terceiro, deixá-los viver com suas leis.
Dessa forma, para uma análise dos princípios que vêm a se implantar na coletividade, modificando a idéia individualista para uma mais globalizada, precisa-se atentar, primeiramente, para a formação do ente soberano, o Estado.
1.2 O surgimento do conceito de Estado
Embora extremamente antigo em sua formação, o conceito moderno de Estado só adquire esse corpo com a Renascença. É Nicolau Maquiavel, em sua obra Il Principe quem traz a concepção política da expressão latina status: todos os domínios que têm poder sobre o homem[2]. O Homem, por natureza, tende a se regrar e justificar às diversas instituições, de maior e menor porte. Num núcleo primário, existe a família como primeira expressão de socialização do indivíduo.
Essa idéia sofre uma expansão em sua abrangência a partir do instante em que o ser busca um convívio mais intenso com o próximo. É nesse momento que se criam entidades coletivas como religião, cidades e Estado, cada uma suprindo uma determinada necessidade. Este último é uma resposta à procura de organização e proteção política de uma sociedade, uma vez que o indivíduo, enquanto isolado, não tem a estrutura básica necessária à sua própria sobrevivência. [3]
Segundo a teoria de Aristóteles, que afirma “o homem é um animal político”, parece ser lógico e natural que haja uma coesão entre esses seres na formação de um ente maior que personifique a relação social de forma organizada. Vários autores defendem a idéia de que o Estado nasce junto com os homens, pois a integração é o destino único desde o surgimento da espécie[4].
Numa visão mais acurada, Dabin afirma[5]:
Chegou um momento em que os homens sentiram o desejo, vago e indeterminado, de um bem que ultrapassa o seu bem particular e imediato e que ao mesmo tempo fosse capaz de garanti-lo e promovê-lo. Este bem é o bem comum ou bem público, e consiste num regime de ordem, de coordenação de esforços e intercooperação organizada.
Também se pode citar, nesse sentido, a opinião de Chiarelli[6]:
É certo que o homem, pela versão bíblica, ou não, nasce individualizado. Sua predisposição ao grupo decorre de laços genéticos atávicos e, também, das dependências ligadas à sobrevivência. Durkheim, e tantos outros, explicam à luz da Sociologia, as variantes crescentes que vão da reunião, chegando à associação, determinadas por múltiplas motivações que se inserem na base da composição e funcionamento do grupo social. O parentesco, na família; a profissão, no sindicato; a fé, na religião etc.
A grande diferença entre o Estado e as demais comunidades é sua característica de imperiosidade, o que impede o indivíduo de excluir-se desta relação, ao contrário das outras. Tal ocorre tendo em vista a busca de um bem maior ou bem público, do qual o cidadão inserido não pode deliberadamente se eximir. Uma vez agregado ao contexto social, o foco deixa de ser o indivíduo e passa a situar-se na coletividade[7].
Essa busca pelo controle mais centralizado de alguns dos direitos e deveres individuais (uma vez que nascem independentes da coletividade) surge no chamado Estado Oriental, nas civilizações à beira do mar Mediterrâneo e dos rios Tigres e Eufrates. Nesse primeiro momento, o poder estatal se confunde com o divino, emanando um direito sagrado, que tinha sua obediência vinculada à fé e à própria essência da pessoa. O indivíduo, nesse meio, não questiona o posicionamento adotado e não tende a transgredir, por tal ato ser estranho à sua conduta.
Vale lembrar que o período ainda guarda muita herança do controle descentralizado, sendo sua relação de imposição de leis (costumes), ainda muito vinculada às aldeias e povoados, em detrimento do poder central. Este só vai se consolidar mais adiante no tempo, com a unificação das tribos do Egito antigo – através do poder absoluto e extremamente centralizado do Faraó, representante único dos deuses – e o surgimento dos estados Grego e Romano. Algumas correntes ressaltam ainda o povo hebreu como exemplo de unidade nacional, muito embora não tivessem um Estado soberano[8].
1.2.1 Soberania como elemento do Estado
Na definição clássica de Estado, este ente incorpóreo é composto de povo, território e poder de ingerência sobre os mesmos. A Soberania é, assim, um elemento não só integrante como de igual maneira indispensável à formação de um Estado. Tal previsão é parte da maioria das constituições, como se visualiza no artigo 1º de nossa Carta Magna[9]:
Art. 1º – A República federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a Soberania
(…)
Essa idéia se embasa na própria composição do Estado. Não há Estado sem Soberania e, de tal sorte, antes de solidificado o conceito próprio do que seja esse elemento, a própria definição de Soberania restava prejudicada. A título de exemplo, pode-se utilizar o conceito de Telma Berardo para melhor definir o que seja essa evolução histórica do conceito[10]:
Durante a Antiguidade, enquanto o conceito de Estado não foi desenvolvido, não tivemos o desenvolvimento da idéia de Soberania. Os gregos e os romanos desconheciam este poder, embora em Roma tenha ocorrido um pequeno avanço. Conforme Jellinek, no mundo antigo não houve o desenvolvimento da idéia de Soberania em razão da inexistência da oposição do poder do Estado a outros poderes.
O poder soberano – e sua aplicação frente aos indivíduos da sociedade – variam de absoluto a imperceptível, conforme a natureza de sua constituição (Absolutista, Democrático de Direito, Bem estar Social ou Neoliberal). Assim, não a própria Soberania, mas sua concentração nas mãos de um único indivíduo é o divisor que define a política de uma nação.
Visualizando essa separação, ensina Azambuja[11]:
Se em relação à origem da Soberania as diversas doutrinas podem ser divididas em teocráticas e democráticas, em relação ao exercício da Soberania poderíamos distingui-las em democráticas e não democráticas, conforme reservem à nação ou povo a faculdade de exercer, direta ou indiretamente, o poder político, ou considerem alienável a Soberania em favor dos governantes.
Da mesma forma escreve Carlezzo[12]:
A Soberania, que no passado esteve umbilicalmente jungida à figura do monarca, o qual por sua vez encarnava o caráter da divindade, hoje se apresenta de uma forma bastante diversa. Sob o prisma da democracia, ainda abordando questões históricas, podemos dividir a doutrina da Soberania em Soberania popular e Soberania nacional. A primeira, mais democrática, difundia a Soberania a todos os membros da comunidade, sendo, por conseqüência, cada um deles titular de uma parcela da mesma, de modo que todos fossem iguais politicamente. A Soberania nacional, de outro lado, ao invés de pulverizar a Soberania, absorve-a e delega a um único ente, qual seja, a Nação. A diferença básica entre ambas as doutrinas reside na legitimidade para o sufrágio popular: uma restringe tal legitimidade e a outra a concede a todos os cidadãos.
Entretanto, a acepção desse poder também é auferida em seu conceito mais amplo. Dessa maneira, é característica intrínseca do Estado sua Soberania frente a outros elementos. Deve – esse poder – ser exercido sobre seu povo sem influência exterior.
Assim é a teoria de transferência de poder existente no contratualismo de Rousseau. Em sua visão, a única forma de vencer alguns obstáculos é através da agregação de esforços, de uma coletividade[13].
Menezes resume a teoria de Rousseau[14]:
Imediatamente, em lugar da pessoa particular de cada contratante, este ato de associação produz um corpo moral e coletivo, composto de tantos membros quanto são os votos da assembléia, o qual recebe deste mesmo ato sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua unidade. (…) A respeito dos associados, eles tomam coletivamente o nome de povo, e se chamam em particular cidadãos, como participantes da autoridade soberana, e súditos, como submetidos às leis do Estado.
A cessão do direito de autotutela do indivíduo a um ser maior (Estado) deve ter uma delimitação funcional, ou seja, não pode se propagar indefinidamente. A perpetuação desta delegação no espaço torna ineficaz sua aplicação. Assim, se não é o cidadão o verdadeiro tutor de todos os seus direitos, exige ele uma prestação indelegável por parte de seu representante, não aceitando a intervenção externa em seus interesses.
A diferenciação entre Soberania interna e externa é abordada por diversos autores. Na corrente mais defendida, a Soberania interna é aquela em que o poder do Estado edita e faz cumprir, para todos os indivíduos que habitam em seu território, leis e ordens, que não podem ser limitadas ou restringidas por nenhum outro poder. Dessa forma, é a expressão do poder de imperium de um ente maior sobre seus protegidos. O Estado, em prol de uma coletividade, impõe-se sobre o indivíduo, utilizando-se do princípio da Supremacia do Interesse Público.
Na definição de Campagnolo[15]:
A Soberania não é um elemento da sociedade política considerada sob o ponto de vista científico; tal Soberania é o termo que designa a específica relação de autoridade que se estabelece entre o direito (ou o Estado) e o indivíduo enquanto seu súdito.
Já a Soberania externa relaciona-se com a autonomia nacional, ou seja, a relação de igualdade entre países pactuantes, sem que haja relação de hierarquia ou subordinação. [16]
Numa outra abordagem acerca do sistema soberano no âmbito internacional utiliza-se da conceituação proposta por Boson[17]:
(…) uma ordem jurídica universal, que delimitaria os domínios respectivos da ordem jurídica internacional e das ordens jurídicas internas dos Estados, à semelhança da estrutura particular do Estado federal, em que certos órgãos teriam por missão criar e executar as normas concernentes ao Estado federal stricto sensu, enquanto que os outros estabeleceriam as normas que regem as relações entre os Estados federados, bem como as relações entre o Estado federal stricto sensu e o conjunto de Estados federados.
Ao analisar-se o conceito de Soberania Internacional quanto à sua finalidade principal, faz-se uso da descrição do professor Mazzuoli[18]:
A verdadeira Soberania deveria consistir numa cooperação internacional dos Estados em prol de finalidades comuns. Um novo conceito de Soberania, afastada a sua noção tradicional, aponta para a existência de um Estado não isolado, mas incluso numa comunidade e num sistema internacional como um todo. A participação dos Estados na comunidade internacional, protegendo e amparando os direitos humanos, esta sim, seguindo-se essa nova trilha apontada pela nova tônica das relações internacionais, deveria ser considerada um ato de Soberania por excelência.
É dentro desses princípios que se forma o ideal de Soberania. Entretanto, a evolução das relações acaba por modificar a idéia de independência. É no surgimento do Direito Internacional Público que se enseja a retração da individualidade do Estado. São questões como as Cruzadas, a exploração marítima e o Império Romano que criam uma atmosfera mais favorável à interação nacional.
1.3 O surgimento do DIP
Na evolução histórica do Estado, o Direito internacional surge da necessidade de relacionamento entre entes relativamente soberanos, cujas necessidades econômicas e sociais exigiam um intercâmbio de mercadorias e ações. No primeiro momento da civilização, o relacionamento era extremamente belicoso, o que dificultava qualquer aproximação.
Nesse campo de visão, ensina Bóson[19]:
Os povos antigos estavam permanentemente em guerra pela imposição da verdade cósmica da sua fé religiosa. Aos próprios deuses, seus paradigmas, eram imputados os sentimentos dos homens, numa manifesta confusão de planos existenciais, em que valores negativos como o ódio e a vingança eram elevados ‘as instâncias positivas dos grandes atributos divinos.
Ainda sobre a impossibilidade de política, continua[20]:
Ora, se os deuses de um povo eram, naturalmente, inimigos e negadores de todos os deuses dos demais povos, como admitir-se que aquelas Nações pudessem ter uma comunidade axiológica, metafísica, que fundamentasse a construção pacífica de uma expressão cultural, da qual viesse surgir uma manifestação jurídica de sentido internacional?
A Soberania e a autonomia, nesse primeiro momento, têm uma interdependência conceitual, uma vez que só poderia se dizer totalmente isento de comando externo o país que da mesma forma fosse auto-suficiente no sustento de seu povo.
Na esteira da comercialização na antiguidade, outras ações contribuíram para o aperfeiçoamento das relações entre países. Movimentos como as Cruzadas e a Revolução Francesa trouxeram reflexos diretamente no meio social, criando institutos e alianças até então desconhecidos pela humanidade. Questões como a mútua proteção bélica e os direitos humanos surgem desses marcos históricos, originando órgãos de relações exteriores que se perpetuam até a atualidade, como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e o Tribunal de AIA ou a Corte Internacional de Justiça (CIJ), respectivamente.
1.3.1 Comércio na antiguidade
De origem essencialmente agrícola no momento posterior ao surgimento do sedentarismo, os povos primitivos fizeram do escambo a primeira expressão do relacionamento pacífico internacional. Não derivou de um costume ou de consenso gratuito, e sim da necessidade intrínseca a cada indivíduo de satisfazer suas necessidades. A troca de mercadorias necessárias à subsistência foi a exteriorização de um esboço de relacionamento de forças soberanas, em que pese as características altamente individualistas das tribos existentes, com regramentos e costumes próprios.
Vale salientar que o primeiro contato entre esses grupos não foi pacífico. As inúmeras guerras e batalhas de anexação territorial, entretanto, não representavam expressão de Direito Internacional, uma vez que faltava ordenamento jurídico ou relação entre tais grupos. Tratava-se, na realidade, de simples imposição de força, sem a característica do bilateralismo necessário ao relacionamento entre nações, que só veio a se verificar na abertura dos mercados.
Os primeiros Estados a adotarem práticas comerciais, a Mesopotâmia e o Egito, também criaram os primeiros esboços acerca do relacionamento entre unidades soberanas. O Código de Hamurabi é o pioneiro na implementação de um regramento acerca do domínio econômico.
Mais modernamente, as feiras da Europa medieval, principalmente Itália e França, são as responsáveis pela internacionalização das diretrizes comerciais. O jus mercatorum espalha-se das corporações de guilda[21] para os códigos Comerciais do mundo inteiro, refletindo-se nas relações de comércio exterior entre os países. É dessa evolução a origem de instituições como a letra de câmbio, nota promissória e demais títulos de crédito da atualidade.
Um exemplo do estreitamento das relações internacionais naquela época é a Ordenança do Rei da França, editada em 1439 acerca do comércio internacional[22]:
(…) Todas as companhias de mercadores e também os mercadores individuais, italianos, transalpinos, florentinos, milaneses, luqueses, genoveses, venezianos, alemães, provençais e os de outros países, que não pertencem ao nosso reino, se desejarem comerciar aqui e desfrutar os privilégios e os impostos vantajosos das mencionadas feiras (…) podem vir sem perigo, residir e partir – eles, suas mercadorias e seus guias (…) sem que estejam jamais sujeitos a apreensão, prisão ou obstáculos, por outros que não os guardas das ditas feiras (…).
De Amado[23], extrai-se a submissão da igreja católica às novas normas e procedimentos comerciais. É a primeira vez que a instituição derruba o combate ao lucro:
Á medida que o comércio se desenvolvia, apoiado pelos reis, a igreja católica ia modificando suas idéias a respeito da atividade comercial. A Igreja, que anteriormente fora tão ligada à sociedade feudal, condenando os lucros do comércio, a partir do século XIII começou lentamente a rever suas posições, abrindo espaço na sociedade para a atuação dos comerciantes. Nesse século um dos mais importantes pensadores da igreja católica escreveu:
(…) se se pratica o comércio com vistas à utilidade pública, se deseja que as coisas necessárias à existência não faltem ao país, o lucro (…) é apenas (…) remuneração do trabalho (…) Nada impede, portanto de praticá-lo para um fim necessário ou honesto. (…) (Santo Tomás de Aquino, Suma teológica, 1272).
Mais próximo à atualidade, o comércio exterior e a política internacional chegam a uma fronteira em seus entendimentos. De um lado estavam os mercantilistas buscando no lucro puro e simples a finalidade máxima do comércio; do outro, os economistas clássicos, tratando da satisfação das necessidades do nacional como máxime da relação entre Estados. Nessa discussão há de embasar-se a nova teoria de relacionamento exterior: uma prática extremamente exploratória e de exaustão; ou uma inter-relação sagaz em busca de um relacionamento paritário entre os mercados.
Na defesa deste último grupo, pode-se buscar a opinião emanada por Adam Smith[24] sobre a necessidade de comércio exterior:
Dar o monopólio do mercado interno ao produto da indústria nacional, em qualquer arte ou manufatura em particular, de certa forma é o mesmo que definir o que cada pessoa deve fazer com seu capital, sendo, em quase todos os casos, uma regra inútil ou prejudicial. (…) Se um outro país puder nos fornecer um bem por um preço mais baixo do que o necessário para que nós mesmos o produzamos, é mais sensato comprar dele com parte da produção da nossa própria indústria, empregada de modo a nos trazer uma certa vantagem.
Contrário a esse entendimento, consegue-se visualizar a idéia de Thomas Mun, acerca da teoria mercantilista: “A forma mais comum (…) de aumentar nossa riqueza e nosso tesouro é através do Comércio Exterior, por isso devemos observar sempre esta regra: todo ano, vender mais aos estrangeiros do que consumimos deles. [25]”
1.3.2 O Império Romano e a expansão territorial
Talvez a maior expressão da antiguidade acerca do controle das sociedades soberanas seja o Império Romano. A tática expansionista e conquistadora empregada pelos latinos nos séculos anteriores ao nascimento de Cristo, modifica o mapa mundial de forma contundente. Estava lançada a teoria vigente na época, na qual muitos se espelham até a atualidade: a Pax Romana.
O que sucede é que as autoridades romanas acharam a melhor maneira de efetivar as conquistas necessárias à consolidação do imperialismo proposto. Em nome de uma segurança de relacionamento sobre todos os povos, as incursões em terras estrangeiras se tornavam na realidade movimentos de integração nacional. Dessa maneira, o objetivo era reunir numa só cultura todas as línguas, todas as bandeiras, todos os interesses, civilizando e pacificando os homens[26].
Outro exemplo é a versão de Homo[27] sobre a mensagem de Petilio Cerialis aos gauleses, acerca das necessidades de expansão bélica no favorecimento e manutenção da paz:
Tantas veces provocados por vosotros, nosotros no os hemos impuesto, a título de vencedores, sino lãs cargas necesarias para el mantenimiento de la paz. Sin ejércitos, em efecto, no hay reposo para lãs naciones (…). Porque uma vez expulsados los Romanos (eviten los dioses esta desgracia), ¿qué veríamos sobre la Tierra sino uma guerra universal?
Vale lembrar que a política do império considerava os combatidos como bárbaros e, portanto, como não sendo portadores de direitos enquanto não integrantes do Império Romano. Pode-se averiguar essa condição no momento da definição do status civitatis, ou seja, o elemento que caracteriza a personalidade jurídica de um cidadão na época.
Observa-se a separação que se fazia em termos de indivíduo através do esquema utilizado por Moura[28] em seu trabalho: cidadãos romanos, latinos, peregrinos e bárbaros. Estava nessa ordem, inclusive, a titulação dos direitos de cada um, tendo o primeiro mais e o último, menos.
Quanto ao relacionamento do Estado romano com outros povos, pode-se encontrar a divisão de direitos de forma desigual: apenas os povos que pacificamente se uniam a Roma percebiam favores desta. Aos demais, não era dado o direito de reclamar tais benefícios. Nessa vertente, pode-se adotar o posicionamento de Giordani[29]:
A divisão dos povos vencidos, para melhor facilitar seu domínio, obedecia a um cuidadoso plano que visava fomentar rivalidades e invejas mútuas (…):
Civitates deditiiciae ou stipendiariae, que foram conquistadas à força e deviam pagar um tributo a Roma como sinal do direito de propriedade dos romanos.
Civitatees foederatae, cidades ligadas a Roma por tratados e consideradas umas como aliadas (socii), outras como submetidas.
Civitates sine suffragio, cidades que recebem de Roma um direito a cidadania incompleto. (…)
Os romanos, no período que antecede o jus gentium, tornaram-se defensores do entendimento de que os povos que não estivessem ligados estreitamente com o Império não tinham condição de cidadania ou direitos reconhecidos. Apenas os que agrupassem características positivas de titularidade de direito seriam capazes de exercê-los.
Nesse caminho, ensina Moura[30]:
Assim, quanto aos estados da pessoa o homem e a mulher eram livres, ou escravos; cidadãos romanos ou estrangeiros (peregrinos) e sui juris (independentes) ou alieni juris (dependentes).
Conclusão: Em Roma, portanto, para que a pessoa tivesse plena capacidade jurídica, era preciso que fosse homem livre, cidadão romano e sui juris, isto é, independente.
Peixoto diferencia as garantias do estrangeiro na atualidade e no tempo do Império[31]:
Segundo o direito moderno, todo homem é dotado de personalidade; mas, segundo o direito romano, isso não bastava: era preciso, primitivamente, para ter personalidade (caput em linguagem justiniânea, I, 1, 16, h.t, 4), e mais tarde, para ter personalidade completa, satisfazer três requisitos: ser livre, cidadão romano e chefe de família.
Destarte, denota-se claramente a necessidade do indivíduo – ao esperar que lhe fossem assegurados direitos – possuir plenamente o status civitatis, condição de cidadania que não era alcançada aos bárbaros, assim entendidos todos os que vivessem fora das cercanias romanas. A eles eram dados apenas os direitos restritos ao comércio, como forma de facilitar aos romanos a chegada de mercadorias.
Efetivamente, Cretella Jr. apresenta a situação desses peregrinos em relação aos direitos de que faziam gozo: “Não tinham os dediticios nenhum dos atributos do jus gentium, sendo-lhes, porém, facultado o jus commercii, em alguns casos estabelecidos por tratado” [32].
A efetivação do domínio romano surge com o cônsul Sila, mas alcança sua hegemonia numa figura famosa: Júlio César. É através deste conquistador que o Império se expande para todos os confins da Europa. Durante o seu reinado – inobstante à época ainda ser considerado cônsul, e não imperador, acontecem as anexações dos territórios da Espanha, África e terras do Oriente[33].
Atropelada por sua própria cobiça, Roma acaba por encontrar um problema nas mãos: devido às vastas conquistas ocorridas rotineiramente por suas milícias, ocorre um aumento incessante de povos que necessitam de sua jurisdição. Uma vez que nem todos adotam a cidadania romana, faz-se necessária a instituição de outros normativos para regrar tais relações.
É o nascimento do jus gentium, ou direito das gentes, que vem dar origem a todo o Direito Internacional da atualidade. Tal instituto, num primeiro momento mais extremamente benéfico aos romanos, acaba por se tornar mais justo com o aquecimento do comércio da época.
Nas palavras de Cretella Jr.[34], “o jus gentium (…) tem um âmbito mais amplo, aparecendo quando Roma estende suas conquistas e entra em contato com outros povos. É um direito comum a todos os povos – gentes – do vastíssimo mundo romano – orbis romanus”.
Também acrescenta, nesse sentido, Peixoto[35]:
Assim se formou, ao lado do rígido jus civilis primitivo, exclusivo do cidadão romano, um direito mais maleável e flexível, próprio do comércio e aplicável às relações entre estrangeiros e romanos ou entre estrangeiros. É o jus gentium positivo, de aplicação freqüente em Roma…
1.3.3 As Cruzadas
Os movimentos principiados pelos cristãos nos primórdios do segundo milênio da era cristã vieram fortalecer definitivamente as relações internacionais. Motivados pela retomada da Terra Santa, peregrinação obrigatória da fé professada pelos católicos, os países traçaram as linhas de apoio mútuo para a derrubada dos infiéis. No comando das operações, ou como sua mentora, a Igreja Católica, exteriorizada na pessoa do Papa Urbano II, congregou em 1905 forças para a resposta aos turcos otomanos, muçulmanos contrários aos cristãos que, há cerca de 25 anos, barraram o ingresso dos demais fiéis à cidade sagrada de Jerusalém.
Foi o princípio da instituição da assistência bélica existente até hoje em organizações como a Tríplice Aliança (2ª Guerra Mundial), a Otan e outros tratados modernos. Na época, Estados como o Império Bizantino, França e Alemanha, sob a coordenação de seus nobres, uniram esforços no intuito de derrubada do exército Turco. Como expressão do primeiro tratado internacional da época, figura o Concílio de Vermount, em 18/11/1095, através do qual a Igreja apoiou e exigiu uma Cruzada[36].
As Cruzadas, seja por seu caráter coletivo ou pela sua natureza de invasão e intervenção de um Estado em outro, criaram diversos institutos utilizados até os dias de hoje. Exemplo claro é a cooperação militar entre as nações, como a força conjunta Anglo-francesa entre Ricardo I e Filipe Augusto em 1191, que visava socorrer o exército cristão acossado no Estado de Jerusalém. Também o tratado de paz assinado entre esses países e o Sultão mulçumano Saladino, em 1192, que deveria (a princípio) ser seguido pelos demais povos da época[37].
Além disso, as seguidas incursões e os contatos entre mulçumanos e “infiéis” geraram outros reflexos além do domínio bélico. São estabelecidas relações de comércio e convívio por todas as províncias européias. Mais uma vez as fronteiras são rompidas, misturando povos, raças e culturas, favorecendo a integração regional de maneira indireta.
1.3.4 As Grandes Navegações
O fortalecimento do comércio no mundo conhecido na época (séculos XV e XVI), e a crescente demanda de produtos pelo florescente mercado europeu, obrigaram os países mais desenvolvidos a buscarem maneiras de aumentar suas fontes de extração natural. A origem de tal força, para muitos, se deu com as perturbações dos Estados soberanos da época, o que contribuiu para o êxodo do velho continente em busca de novas terras.
Realmente, ensina Damião Peres[38]:
Desmembramento do Império Romano do Ocidente pelas invasões dos povos germânicos, lutas entre si e com o poder militar do Império Romano Oriental, invasão árabe, depredadoras incursões normandas, campanhas de Carlos Magno e partilha de seu império, invasão eslava e sua contensão na Hungria – todas essas vicissitudes constituíram na vida européia dos séculos V a X elementos de perturbação política e também econômica (…).
Assim, ao domínio árabe do Mediterrâneo atribui uma moderna corrente da historiografia econômica o mérito de ter favorecido, logo nos primeiros tempos de sua expansão para Oeste, o movimento comercial europeu (…).
Dessa forma, o primeiro objetivo foi alcançar novas fontes de riquezas que viessem a financiar as cortes européias. Como forma de aquisição dessas fortunas, estava a busca por uma nova rota comercial que fugisse das altas tarifas do mar mediterrâneo e, da mesma forma, alcançasse as Índias. Como bônus encontrava-se também a possibilidade de encampação de terras e ilhas encontradas no trajeto[39].
As relações exteriores nessa época se intensificaram de forma abrupta. Não só conheceram os europeus novos mundos, como também povos totalmente inusitados, variando de selvagens a altamente desenvolvidos. Foram diversas as atitudes de relacionamento, variando do comércio e aproximação (China e Japão), ao aniquilamento total das raças (incas e astecas). Tratava-se, na realidade, de posturas diversas, como até a atualidade ocorre: num ponto, o visitante travava relações comerciais, sendo tido como um igual; de outra feita, a posição era de domínio, e o Estado passava a explorador, subjugando o povo vencido à sua vontade [40].
Amado descreve a relação do explorador com os povos do oriente[41]:
Na Ásia os europeus depararam-se com grupos inteiramente isolados, preocupados apenas em sobreviver. Mas encontraram também civilizações milenares, como a chinesa e a hindu, que já haviam alcançado alto grau de refinamento e sofisticação em todos os campos da expressão humana (…) Estas civilizações se consideravam superiores às outras, inclusive às européias…
Já no século XVII ocorre o aperfeiçoamento das teorias comerciais que dão origem a atual conjuntura econômica/globalizada. Uma vez que nem todos os Estados da Europa integravam o restrito grupo dos conquistadores do novo mundo, se buscava uma integração entre esses países exploradores e os demais, que mesmo não atuantes nos grandes descobrimentos, tentavam de formas derivadas um enriquecimento em função dos mesmos. Ocorrendo a modernização das relações comerciais, fazia-se necessário definir as bases do comércio internacional.
Nesse sentido, vale estudar o conceito de Kenen[42]:
Os mercantilistas do século XVII, os primeiros ensaístas sobre o comércio internacional, também se preocupavam com um problema prático: estabelecer e consolidar a autoridade real interna e externamente. (…) Para competir pelo império externamente, ela tinha que construir navios. (…) A Espanha extraía ouro e prata dos astecas e incas. A Inglaterra, a França e outros países, por sua vez, tinham que extrair ouro e prata da Espanha através do comércio exterior.
(…)
Os economistas clássicos preocupavam-se com o bem estar dos súditos da coroa, não com a própria coroa. Por isso, mediam os ganhos de forma diferente. A exportação era um meio de adquirir produtos importados, não ouro e prata, usando dos recursos do país com eficiência.
Na esteira dos movimentos históricos da antiguidade, surge o movimento que cria um divisor de águas no mundo moderno. Considerada como o início da época contemporânea, a Revolução Francesa, com seus institutos Iluministas, vem fomentar questões como, por exemplo, a universalidade da defesa dos Direitos Humanos.
1.4 O iluminismo e as revoluções do Século XVIII
As evoluções (e revoluções) ocorridas a partir do século XVIII trouxeram à luz da humanidade novos conceitos de Soberania e Estado. Dessa forma, nada mais natural que o reflexo das novas teorias nas relações internacionais, uma vez que a alteração no modus operanti de um governo acabava por influir diretamente no restante da comunidade Européia, elite dominante do cenário mundial.
Pode-se vasculhar fartamente nos princípios iluministas que embasaram essas mudanças os motivos de tal influência. A trípode que sustenta os pensadores da época – a Liberdade, o Progresso e o Homem[43] – veio colidir frontalmente com os princípios da Soberania interna, acarretaram efeitos no relacionamento internacional, uma vez que é elemento intrínseco do Estado o controle de seus cidadãos. Mais especificamente, pode-se citar Azambuja: “a Soberania é uma só e se resume em que, do ponto de vista jurídico unicamente, é um poder independente em relação aos demais Estados e supremo dentro do próprio Estado” [44].
O desenvolvimento humano nesse século separa o Homem do Sagrado. O jugo do Estado sobre o indivíduo inverte-se, e este passa de sujeito de obrigações a titular de direitos. Na visão de Pedro Calmon, “a nação, cuja essência é o povo, deve governar-se pela maioria” [45]. De certa forma, é a resposta ao anseio da igualdade. Se o Homem nasce bom, é a sociedade que o corrompe, necessitando então a sociedade, e não o Homem, ser mudada[46].
Rousseau defende que a desigualdade, inimiga do Iluminismo, nasce no momento em que a sociedade aceita o primeiro brado individual de domínio[47].
Na realidade, sobre o assunto, o jurista cita em sua obra[48]:
O primeiro que, tendo cercado um terreno, se lembrou de dizer: Isto é meu, e encontrou pessoas bastante simples para o acreditar, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não teria poupado ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou tapando os buracos, tivesse gritado aos seus semelhantes: ‘Livrai-vos de escutar esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos, e a terra de ninguém!’.
O período é marcado por intensas atribulações internacionais, como a chamada “segunda guerra dos Cem Anos”, entre Inglaterra e França. Na esteira do conflito, ocorre a divisão da Europa em potências distintas, feudos que se contrapesavam, evitando a supremacia de um deles, fruto dos tratados de Utrecht e Rastadt. No centro, a Inglaterra servia, segundo seu próprio entendimento, como mediadora desses relacionamentos[49].
Máxime do conturbado período final da idade moderna, a Revolução Francesa foi um verdadeiro exemplo no que se refere ao reflexo internacional de atitudes meramente internas, de tal forma que norteia atitudes liberais até a atualidade, transformando-se num ícone do seu tempo e num verdadeiro divisor de águas da história da humanidade. No entendimento de Verdross[50], a mudança política acontecida no país traz conseqüências mundiais, uma vez que transfere ao povo o exercício do poder do Estado. Destaca-se, da própria Constituinte, a proclamação de que seus efeitos não seriam meramente regionais, mas de âmbito universal[51].
Na caminho da própria Revolução surge um movimento que vem deflagrar de vez o relacionamento internacional de forma mais generalizada: os Direitos Humanos. A Declaração dos Direitos do Homem, de 1789, guarda repouso nas teorias jusnaturalistas vigente à época[52], e serve de berço para a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948. Este último movimento é o criador de instituições multilaterais como O Tribunal Penal Internacional, a Corte Européia e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA[53].
No afã de combater a exploração do indivíduo e zelar pela dignidade da pessoa, os Direitos Humanos tornam-se interesse mundial. O reflexo desse preceito no ordenamento jurídico interno brasileiro é a previsão na Constituição Federal da cooperação internacional para a defesa desses direitos, externado no art. 4º, II, da Carta Magna.
Fechando o ciclo do desenvolvimento global, um fenômeno criado no último século foi o golpe final naqueles doutrinadores que defendiam o Estado como ente unicamente individual, autônomo e exclusivista. Após as evoluções da fé (Cruzadas), da lógica (Iluminismo), da expansão (Roma e as Grandes Navegações), surge um movimento que visa tão somente à integração econômica: Globalização.
1.5 A Globalização – conceito inicial
A modernização dos mercados ocorrida no último século impulsionou os países rumo a uma atitude de rompimento das fronteiras físicas existentes. O crescimento das empresas de ponta, que se transformaram em multinacionais ou transnacionais, forçou a política global a se moldar aos novos tempos. A chamada Globalização atingiu o mundo de maneira violenta, obrigando os menos capacitados a apresentarem modernização e reengenharia administrativa de forma a poder competir num mercado internacional.
Exemplo disso é a afirmação de Kurtzman[54] sobre as atitudes tomadas pelos países com a chegada do conceito moderno de relacionamento global:
Os países deixaram de ser nações-estados isoladas e protegidas dos altos e baixos de seus vizinhos para se tornarem cada vez mais irrelevantes em termos econômicos. Bancos centrais, como o Federal Reserve Board, embora ainda poderosos, foram rebaixados. (…) Fronteiras foram eliminadas.
Entretanto, não apenas os movimentos empresariais são os autores únicos desta empreitada pela integração mundial. Nesse sentido, colhem-se lições apresentadas por Böhlke[55]:
O fenômeno da integração adquiriu proporções significativas em meados do século XX, mais precisamente após a segunda Guerra Mundial. (…)
A análise do fenômeno da integração pode compreender distintas áreas do conhecimento. O objetivo inicial da integração visa, geralmente, a aspectos econômicos, são as decisões políticas, no entanto, ao observar relações de poder entre os Estados, que possibilitam o surgimento e o avanço da integração. Questões sociais, contudo, jamais podem ser esquecidas e têm certamente influência fundamental no delineamento de processos de integração regional.
Antes de avaliar a influência histórica do movimento de integração na Soberania dos Estados, deve-se tentar uma dissecação de seus desmembramentos. Numa análise acerca do termo “globalização”, pode-se utilizar a divisão apresentada com base na relação causa/efeito, como a seguir.
Primeiramente, ocorre a homogeneização das estruturas de demanda e oferta por empresas que estabelecem contratos de terceirização com produtores locais, como a Nike (fundo comercial) ; um segundo momento, fenômeno da produção internacional de um bem para o qual concorrem diversas economias com diferentes insumos (fundo produtivo) ;
Na sequência, ocorre um aumento do fluxo de capitais, decorrente da automação bancária (fenômeno financeiro), seguido ainda por um fator sociocultural – os mesmos instrumentos que permitem o aumento do fluxo de capitais (redes eletrônicas, televisão, satélites) constituem o atual sistema de comunicação. Por último, ocorre o movimento tecnológico – incremento quantitativo e qualitativo das redes mundiais de comunicação e informação (Internet)[56].
O nascimento do conceito da moderna globalização reside nos conceitos a e b, sendo essas empresas responsáveis pela expansão das fronteiras nos primórdios dessa nova forma econômica. Na evolução da integração econômica resultante do movimento globalizador iniciado no último século, pode-se tomar como exemplo o Mercado Comum Europeu. Nasce primeiro uma zona de livre comércio, baseada na liberação dos direitos de aduana entre dois ou mais países. Na esteira deste relacionamento, criam-se relações como a união aduaneira, o mercado comum e, por último, a união econômica e monetária[57].
Por último, vale ainda manter o conceito ideológico de globalização, que define seu alinhamento com o capitalismo e o abandono da prática política do Welfare State.
Nas palavras de Miguel Barros[58]:
No sentido ideológico, assiste-se a um processo mundial de integração econômica sob a égide do neoliberalismo, este caracterizado pelo predomínio dos grandes interesse financeiros, pela desregulamentação dos mercados regionais (…) e pelo abandono do chamado “Estado do Bem Estar Social”…
Assim ensina Chiarelli[59]:
O mundo caminhou e continua a deslocar-se para facilitar, de forma crescente, uma política de trocas. As barreiras xenófobas, ditadas por pressentimentos autarquizantes ou de Soberanias absolutistas, foram cedendo lugar a uma disposição crescente de intercâmbio. Ninguém será capaz de ser feliz só.
O mundo moderno caminhou de maneira a fortalecer blocos econômicos, num movimento inverso ao utilizado nos séculos passados, quando os pequenos Estados dominados buscaram sua Soberania, fracionando impérios como a Inglaterra, Portugal e União Soviética. Interessante nesse aspecto é avaliar a afirmação feita por Renato Rugiero, então diretor geral da Organização Mundial do Comércio ao Estado de São Paulo[60], em 1996, sobre o comportamento mundial de agrupamento dos países em torno de um objetivo comercial específico:
O objetivo, tanto do sistema multilateral de comercio quanto o dos blocos regionais é a liberalização, a abertura do comércio e a eliminação das barreiras. (…) O que nós queremos daqui a 20 anos no mundo? Queremos um mundo dividido em três ou quatro grandes áreas intercontinentais, cada uma dessas regiões com uma abertura muito grande internamente, cada uma com suas próprias regras e disciplinas, mas cada uma separada das outras três ou quatro, ou será que nós queremos uma convergência cada vez maior desses grandes blocos regionais que vão caminhando em direção a um sistema global de áreas de livre comércio, com regras universais que incluiriam todos os países que hoje em dia são candidatos à organização mundial do Comércio, como a China e a Rússia?
A desmistificação do conceito de Soberania plena acaba por criar novas figuras no ordenamento jurídico vigente. Além disso, faz ressurgir antigos preceitos, numa nova roupagem. Se, por um lado, países soberanos criam figuras de inter-relação social e econômica, por outro, potências tentam, de maneiras oblíquas, gerar mecanismos que criem e mantenham controle sobre os Estados Soberanos. Dessa forma, nos próximos capítulos são analisados os dois principais meios de submissão: a intervenção armada e a econômica.
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