Resumo: O presente trabalho tem como objetivo tecer uma análise acerca da atividade ilegal de tráfico de pessoas, também denominada tráfico humano, diferenciando tal conduta do contrabando de imigrantes, na visão de Michelle Gueraldi e Joel Dias – autores que compõem a base teórica deste trabalho –, traçando, por meio de uma análise quantitativa à luz do Relatório Global sobre o Tráfico de Pessoas 2016, emitido pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), um paralelo entre a realidade mundial, o continente sul-americano e o Brasil. A realidade brasileira, por sua vez, em relação ao tráfico de pessoas, segue a tendência mundial, no que diz respeito ao gênero e condições de vida das vítimas. Resta ao Direito Penal brasileiro, em consonância com as normas de Direito Internacional Público, implementar medidas a fim de proporcionar maior efetividade à repressão e prevenção do tráfico de seres humanos. Além disso, é o referido diploma normativo o responsável por oferecer medidas de proteção e amparo às vítimas, de acordo com o que estabelecem os princípios constitucionais. [1]
Palavras-chave: Tráfico de pessoas. Contrabando de migrantes. Direitos humanos. Direito Penal. Direito Internacional Público.
Resumen: Este trabajo tiene como objetivo hacer un análisis acerca de la actividad ilegal del tráfico de personas, también denominada tráfico humano, diferenciando tal conducta del contrabando de migrantes, en la visión de Michelle Gueraldi y Joel Dias – autores que componen la base teórica deste trabajo –, trayendo, por medio de un análisis cuantitativo a la luz Del Informe Global sobre la Trata de Personas 2016, emitido por la Oficina de las Naciones Unidas sobre Drogas y delitos (UNODC), un paralelo entre la realidad mundial, el continente sudamericano y el Brasil. La realidad brasileña, por su parte, en relación al tráfico de personas, sigue la tendencia mundial, en lo que se refiere al género y condiciones de vida de las víctimas. El derecho penal brasileño, en consonancia con las normas de derecho internacional público, establece medidas para proporcionar mayor efectividad a la represión y prevención de la trata de seres humanos. Además, es el referido diploma normativo el responsable de ofrecer medidas de protección y amparo a las víctimas, de acuerdo con lo que establecen los principios constitucionales.
Palabras-clave: Tráfico de personas. Contrabando de migrantes. Derechos humanos. Derecho penal. Derecho Internacional Público.
Sumário: Resumo. Introdução. 1 – Tráfico de pessoas x contrabando de migrantes. 2 – os números do tráfico de pessoas no Brasil e no mundo conforme o relatório global. 3 – O tráfico de pessoas no Código Penal brasileiro: alteração legislativa – Lei nº 13.344/2016. Considerações finais. Referências.
INTRODUÇÃO
Não é novidade que, atraídas pelo discurso do dinheiro fácil, pessoas sejam tiradas das periferias do Brasil e levadas para a Europa e os EUA para lá serem submetidas à prostituição, trabalho escravo ou até mesmo transformadas em fornecedoras de órgãos para transplantes.
O que parece enredo de filme, ou até mesmo novela, fruto de um cenário fictício, é na verdade a realidade de milhares de brasileiros. Sem condições básicas de subsistência no país, muitos são atraídos por falsas promessas de dinheiro fácil e melhoria de vida e na esperança de uma vida melhor acabam vítimas de exploração, ou até mesmo morte.
Com base neste cenário, o presente artigo tem como escopo a realização de uma análise acerca do crime de tráfico de pessoas, principalmente em nível internacional, sob a ótica do Direito Penal brasileiro, sobretudo após sua alteração legislativa em 2016, e do Direito Internacional Público, discutindo-se, em âmbito internacional, os princípios e diretrizes a serem observados a fim de prevenir e reprimir tal crime bárbaro.
Como dito, embora o tema pareça pertencer a um cenário fictício, o tráfico de seres humanos é uma realidade que se mostra cada vez mais presente na atualidade, crescendo de forma obscura, longe dos olhos da sociedade, ofuscados por outros problemas sociais que estão enraizados na realidade social, como o tráfico de drogas e o tráfico de armas.
Assim, para que melhor se entenda a respeito deste tema complexo, neste artigo far-se-á uma análise acerca do tráfico humano, primeiramente diferenciando-o do contrabando de migrantes – crime que embora envolva o transporte de pessoas, em muito se difere – e posteriormente analisando os números mais recentes, com base no Relatório Global sobre o Tráfico de Pessoas 2016[2], emitido pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
Por fim, encerrar-se-á tal estudo por meio de uma análise acerca da Lei nº 13.344/2016, que atribuiu nova redação ao crime de tráfico de pessoas e possibilitou o enquadramento de tal tipo penal ao transporte ilegal de pessoas para longe de seu país de origem para outras finalidades além da exploração sexual, até então única possibilidade reconhecida pelo Código Penal até a promulgação da nova lei.
1 TRÁFICO DE PESSOAS X CONTRABANDO DE IMIGRANTES
Em primeiro lugar ressalta-se que é primordial para o entendimento acerca do tema é a distinção fundamental entre o tráfico de pessoas e o contrabando de imigrantes, que embora possam parecer condutas semelhantes, não se confundem, pois representam ações completamente diferentes.
A definição de tráfico de pessoas é apresentada no Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças/ONU, senão vejamos:
“A expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos;”[3]
Por meio desta definição fica evidente que o uso da ameaça, da força ou qualquer outra forma de coação é um elemento característico, sem o qual não seria possível se falar em tráfico de pessoas, podendo ser diversa a finalidade do tráfico – exploração sexual, trabalho forçado, retirada de órgãos, etc..
No Código Penal brasileiro, o tráfico de pessoas teve a redação incluída pela Lei nº 13.344, sancionada recentemente, em 2016. A criação do art. 149-A do referido diploma legal estabeleceu como tráfico de pessoas a conduta de “Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso (…)”[4] incluindo as finalidades específicas previstas no Protocolo Adicional supracitado, enumeradas em incisos de I a V.
O tipo penal deixa claro que essa temática não é somente internacional, sendo um problema real mesmo dentro do próprio território brasileiro, sendo o fato de a vítima ser levada para fora do território nacional uma causa de aumento de pena, em virtude da gravidade da situação.
Portanto, em breve síntese, pode-se dizer que o tráfico de pessoas ocorre quando temos a retirada de uma, ou de um determinado grupo de pessoas, de seu território habitual – cidade, estado ou até mesmo país – contra a sua vontade, sendo este o elemento principal, sem ter noção do que lhe espera no local de destino, sendo submetido a situações desumanas.
De outro lado, tem-se o contrabando de migrantes, que embora ainda seja um crime cruel e degradante como o tráfico de pessoas, em muito deste se difere, principalmente no que tange ao consentimento da vítima.
Assim, entende-se que é configurado o contrabando de migrantes quando a atividade envolve a obtenção de benefício financeiro ou material pela entrada ilegal de uma pessoa num Estado no qual essa pessoa não seja natural ou residente. O UNODC, como guardião da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (UNTOC) e seus Protocolos, assiste os Estados em seus esforços para implementar o Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por via Terrestre, Marítima e Aérea (Protocolo dos Migrantes).[5]
Desta forma, esclarece-se que a principal diferença entre o tráfico de pessoas e o contrabando de migrantes diz respeito ao consentimento da vítima, tendo em vista que no contrabando, mesmo que em condições degradantes e perigosas, existe o consentimento da vítima sobre o ato criminoso.
Por sua vez, no tráfico de pessoas o consentimento da vítima é irrelevante para que se reste configurado o delito, tendo em vista que esse consentimento, na maioria das vezes, é apresentado mediante coação, ameaça, ou até mesmo violência propriamente dita.
Ainda assim, não se pode restringir essa diferença entre crimes tão parecidos unicamente no quesito consentimento da vítima, pois embora mais evidente, não é o único ponto divergente. Outra característica primordial que deve ser levada em consideração é a exploração.
Isso porque no contrabando de migrantes a ação delituosa é encerrada com a chegada do migrante ao seu destino. No tráfico de pessoas a exploração é iniciada após a chegada ao destino, com a vítima sendo utilizada para remoção de órgãos, trabalho escravo, servidão, adoção ilegal ou exploração sexual.
Ademais se esclarece quanto ao requisito da transnacionalidade, tendo em vista que o contrabando de migrantes é sempre transnacional, pois envolve a entrada ilegal de migrantes em determinado país de destino. O tráfico de pessoas, por sua vez, pode ocorrer tanto internacionalmente quanto dentro do próprio território nacional.
No ano de 2006 chegou a ser realizado o Dialogo de Alto Nível das Nações Unidas sobre Populações e Desenvolvimento, na cidade de Nova York, onde houve a participação de 127 Estados da ONU. O tema contrabando de migrantes foi o assunto debatido na ocasião. Em conclusão, Gueraldi e Dias aduzem que “ninguém deverá migrar por obrigação, nem por necessidade como a de fugir da pobreza extrema, nem para evitar mortes. As pessoas devem ser livres para migrar”.[6]
Nesta conferência, muito se debateu em relação às causas do consentimento das vítimas em realizar migrações sabidamente ilegais. Concluiu-se, na ocasião, que as pessoas que aceitavam tais condições passavam por situação de pobreza extrema, ou até mesmo falta de oportunidades. Situação de conflito ou violação de direitos humanos ou governos ruins e falta de emprego no país de origem também aparecem como motivos.
Por fim, apresentadas as diferenças entre crimes tão semelhantes, mas que não se confundem, seguir-se-á neste estudo com foco no tráfico de pessoas e suas causas e impactos sociais.
2 OS NÚMEROS DO TRÁFICO DE PESSOAS NO BRASIL E NO MUNDO CONFORME O RELATÓRIO GLOBAL
Como já mencionado, o tráfico de pessoas está longe de ser um assunto fictício, presente apenas em filmes e telenovelas. No Brasil, o tema ainda perde espaço para o tráfico de drogas e o tráfico de armas, maiores atividades criminosas no país.
Ainda assim, apesar de pouco discutido, o tráfico de pessoas é um crime recorrente, que embora de baixa repercussão midiática revela a situação de miséria e calamidade enraizada nas áreas de menor desenvolvimento no país.
Os números mundiais a respeito do tráfico humano revelam uma realidade preocupante, na qual o Brasil está inserido. Em dezembro de 2016 foi lançado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) o Relatório Global sobre o Tráfico de Pessoas 2016[7] no qual foi constatado que quase um terço do total das vítimas de tráfico de pessoas no mundo são meninos e meninas. O relatório também afirma que mulheres e meninas correspondiam, naquele ano, a 71% das vítimas mundiais.
Durante a apresentação do Relatório, Yuri Fedotov, diretor executivo do UNODC, declarou que "o tráfico de pessoas com fins de exploração sexual e trabalho forçado continuam sendo as modalidades mais detectadas desse crime. No entanto, existem também vítimas de tráfico para mendigar, para casamento forçado ou fraudulento, ou pornografia".[8]
Destaca-se também que o Relatório apresenta informações a respeito do tráfico de migrantes revelando que os fluxos migratórios se assemelham entre si em alguns países de destino em diferentes partes do mundo. Ainda assim, embora sejam diferentes os países de destino, os motivos que levam à migração ilegal se assemelham. Dentre eles, esclarece-se que os fatores que aumentam a vulnerabilidade ao tráfico durante o processo de migração incluem a presença do crime organizado transnacional no país de origem e o perfil socioeconômico da pessoa. Sobre o tema Fedotov destacou:
“As pessoas que fogem da guerra e da perseguição são particularmente vulneráveis ao tráfico. (…) A urgência da situação pode levá-los a tomar decisões migratórias perigosas. O rápido aumento do número de vítimas de tráfico na Síria após o início do conflito naquele país, parece ser um exemplo do papel destas vulnerabilidades.”[9]
Além dos dados mundiais, para que melhor se faça um paralelo com a realidade brasileira, passemos aos dados referentes à América do Sul, continente cuja situação segue a tendência mundial, tendo em vista que a maior parte das vítimas do tráfico de pessoas são mulheres, normalmente destinadas à exploração sexual no país de destino.
Desta forma, esclarece-se que na América do Sul, entre os anos de 2012 e 2014 foi constatado que 45% das vítimas deste crime correspondiam a mulheres adultas, levando-se em consideração que no período foram registradas quase seis mil vítimas só no continente. O número de casos de tráfico de crianças no continente americano também é consideravelmente alto, de modo que representa cerca de 40% das vítimas identificadas durante o período supracitado.[10]
Como dito, a exploração sexual ainda é a finalidade mais registradas nos casos de tráfico de pessoas, inclusive na América do Sul, representando mais da metade das vítimas. O trabalho forçado também aparece os principais casos de exploração, representando pouco mais de um terço dos casos registrados e catalogados no Relatório. O Brasil, por sua vez, registrou, inclusive, um número alto de vítimas exploradas com trabalho análogo à escravidão e servidão forçada.[11]
Ademais as definições na legislação brasileira em relação ao tráfico de pessoas dificultaram a realização de uma análise regional compreensível, durante o período. Entretanto, a implementação de uma nova legislação – aprovada em outubro de 2016 – talvez traga mudanças quanto aos dados brasileiros, os quais, por sua vez, podem ter impacto nos números totais na região.[12]
Para amenizar o problema, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou este ano no país a Ação Global para Prevenir e Combater o Tráfico de Pessoas e o Contrabando de Migrantes (GLO.ACT). Treze países da África, Ásia, Leste europeu e América Latina, incluindo o Brasil, participam do projeto de combate a esse tipo de crime, seja tráfico para fins laborais ou sexuais. O objetivo é garantir a adoção de uma abordagem dupla de prevenção e proteção.
A iniciativa desta Ação Global é da União Europeia juntamente com o UNODC, em parceria com a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), funcionando como uma resposta coordenada ao tráfico de pessoas e ao contrabando de migrantes e visando reforçar a resposta da justiça penal nos países estrategicamente selecionados: Bielorrússia, Brasil, Colômbia, Egito, Quirguistão, Mali, Marrocos, Nepal, Nigéria, Paquistão, Laos e Ucrânia.[13]
Muito se discute sobre o que acontece com as vítimas de exploração. No Brasil, por exemplo, conforme notícias apresentadas neste ano de 2017, o país passou a se empenhar no apoio àqueles trazidos ao país para exploração. No entanto, já é especulado que possa ser oferecida residência permanente e até mesmo registro e expedição de carteira de identidade às vítimas.[14]
O direito a residência permanente no país, bem como o registro e a expedição da carteira de identidade foi determinado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, em portaria publicada no Diário Oficial da União, como uma forma de apoio às vítimas, de modo que possam reestruturar suas vidas.[15]
3 O TRÁFICO DE PESSOAS NO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO: ALTERAÇÃO LEGISTALIVA – LEI Nº 13.344/2016
Determinar o número de vítimas do crime de tráfico de pessoas sempre foi um desafio, por diversas razões. Uma delas é pelo baixo número de denúncias dos casos. Outra delas, que se pretendeu resolver com Lei nº 13.344/2016, diz respeito ao tipo penal da referida conduta.
Isso porque a antiga redação do Código Penal trazia como tráfico de pessoas somente deslocamento ilegal de pessoas, somente com a finalidade de exploração sexual, seja para fora do país ou internamente, tipificados respectivamente nos artigos 231 e 231-A do referido Diplomo Normativo.
Assim, quando se identifica uma pessoa em situações de trabalho escravo, não se leva em conta se ela foi traficada ou não. Os perpetradores não podem ser processados por tráfico, mas somente por trabalho análogo à escravidão ou crimes correlatos. Por isso, os números poderiam ser maiores.
No entanto, quando sancionada, a Lei nº 13.344/2016 revogou os artigos mencionados e instituiu um novo tipo penal para a conduta do tráfico de pessoas, englobando, além da exploração sexual, o transporte ilegal de seres humanos com as finalidades de remoção de órgãos, trabalho em condições análogas à de escravo, qualquer tipo de servidão ou adoção ilegal. Tudo isso presente em um único artigo, o 149-A, que engloba também o tráfico internacional em seu parágrafo 1º, tratando como uma causa de aumento de pena o fato de a pessoa ser retirada do território nacional.
A nova lei dispõe sobre a prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas, seja ela brasileira ou estrangeira, além de apoio à vítima brasileira no território estrangeiro.
Esse enfrentamento ao tráfico de drogas deve atender aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da garantia da cidadania de dos direitos humanos, universalidade, indivisibilidade e interdependência. Além disso, não deve haver discriminação por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, nacionalidade, atuação profissional, raça, religião, faixa etária, situação migratória ou outro status.
Um ponto interessante a se destacar é que em grande parte dos casos o tráfico de pessoas atinge crianças e adolescentes, representando um número significativo dentre as vítimas, de modo que o enfrentamento ao tráfico de pessoas também atende ao princípio da proteção integral da criança e do adolescente.
Além dos princípios, o enfrentamento ao tráfico de pessoas também deve ser realizado atendendo-se algumas diretrizes, como fortalecimento do pacto federativo, por meio da atuação conjunta e articulada das esferas de governo no âmbito das respectivas competências, articulação com organizações governamentais e não governamentais nacionais e estrangeiras, incentivo à participação da sociedade em instâncias de controle social e das entidades de classe ou profissionais na discussão das políticas sobre tráfico de pessoas, entre outras.
É importante destacar a necessidade de estímulo à cooperação internacional, pois de nada adiantaria o enfrentamento ao tráfico de seres humanos se os países de destino não possuírem o mesmo engajamento dos países dos quais as vítimas são retiradas.
Outra novidade importante trazida pela Lei nº 13.344/2016 diz respeito às medidas a serem adotadas como forma de prevenção ao tráfico de pessoas. São medidas simples, em áreas essenciais do desenvolvimento da boa qualidade de vida, como a implementação de medidas intersetoriais e integradas nas áreas de saúde, educação, trabalho, segurança pública, justiça, turismo, assistência social, desenvolvimento rural, esportes, comunicação, cultura e direitos humanos.
As demais medidas dizem respeito à participação popular em consonância com o ativismo estatal, representando pela implementação de campanhas socioeducativas e de conscientização, considerando as diferentes realidades e linguagens, incentivo à mobilização e à participação da sociedade civil e incentivo a projetos de prevenção ao tráfico de pessoas.
Além da prevenção ao tráfico de pessoas a nova lei apresenta medidas repressivas para combater tal crime. Desta forma, esclarece-se que tal repressão dar-se-á por meio da cooperação entre órgãos do sistema de justiça e segurança, nacionais e estrangeiros; da integração de políticas e ações de repressão aos crimes correlatos e da responsabilização dos seus autores; e da formação de equipes conjuntas de investigação.
Por fim, analisando as novidades normativas apresentadas pela implementação da Lei nº 13.344/2016, destaca-se neste diploma normativo a disposição de um capítulo inteiro destinado somente às medidas de proteção e às formas de assistência às vítimas. Desta forma, enaltece-se a preocupação do legislador, não só com a prevenção e a repressão ao tráfico de pessoas, mas também sua preocupação com o amparo àqueles que sofrem com as consequências de tal crime.
Neste ponto esclarece-se que o escopo desta nova lei é fornecer apoio às vítimas, seja pelo oferecimento de abrigo, assistência jurídica, social, de trabalho e emprego ou de saúde. Esse apoio se mostra de fundamental importância, sobretudo tendo em vista as condições das vítimas do tráfico de pessoas, que normalmente são indivíduos de baixo poder aquisitivo e até mesmo de condições miseráveis em seu país de origem.
Destaca-se também que esse amparo às vítimas regulado pela nova implementação legislativa segue os parâmetros estabelecidos pelo Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, que em seu artigo 6º dispõe acerca deste tema.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observando-se a definição de tráfico de pessoas apresentada pelo Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças foi possível diferenciar, de forma clara, tal conduta do contrabando de migrantes.
Enquanto o tráfico internacional de pessoas envolve o deslocamento ilegal de pessoas para outro país independentemente de sua manifestação de vontade, envolvendo, sobretudo ameaça e violência, o contrabando de migrantes é configurado quando há o aceite inicial de uma pessoa em ser transportada com a finalidade de entrar ilegalmente em outro país, normalmente motivada pela situação financeira ou falta de oportunidades em seu país de origem.
Ademais se elucidou que o tráfico de pessoas é caracterizado por, diferentemente do contrabando de migrantes, estender a ilicitude da conduta com a chegada ao país de destino, haja vista tal crime ser cometido com a finalidade de exploração sexual, retirada de órgãos, trabalho escravo ou servidão por parte das vítimas.
Feita a diferenciação, constatou-se que a realidade brasileira não se difere dos números mundiais, mas que a verificação do real número de casos de tráfico de pessoas no Brasil, até o final do ano de 2016, restou-se bastante prejudicada, tendo em vista que o Código Penal brasileiro, antes de atualização legislativa, previa como tráfico de pessoas somente o transporte ilegal de pessoas para outro país para fins de exploração sexual.
Ainda assim, verificou-se que o número de vítimas ainda é grande, sobretudo mulheres, e os casos de denúncia ainda se mostram reduzidos, em grande parte dos casos por medo ou falta de amparo e sigilo aos denunciantes, que temem sofrer as consequências nas mãos dos perpetradores.
Por fim, como dito, a alteração legislativa no Código Penal brasileiro, promovida pela Lei nº 13.344/2016, à luz do que rege o Direito Internacional Público, promoveu mudanças primordiais no combate e prevenção do crime de tráfico de pessoas, pautado em princípios e diretrizes constitucionais e de Direito Internacional, promovendo o amparo às vítimas e a devida punição aos traficantes.
Acadêmico de Direito pela Faculdade de Direito de Vitória – FDV
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