Um novo olhar para o testamento particular pelo Código Civil de 2002

Resumo: O artigo aborda a origem e a evolução do testamento a partir dos seus pressupostos gerais, requisitos essenciais de validade e eficácia. Embora o testamento particular seja uma das formas mais simples do instituto, ainda assim encontra resistência quanto à sua utilização no Brasil, principalmente em função das formalidades exigidas para a sua elaboração e validade. O Código Civil de 2002 trouxe algumas novidades que vêm ao encontro das modernidades tecnológicas e simplificam a elaboração do ato de testar, mas continuam garantindo a finalidade primordial do testamento que é a disposição de liberalidade do testador.

Palavras-chave: Testamento. Sucessão. Patrimônio. Herança. Código Civil de 2002.

Sumário: 1. Introdução. 2. Origem e evolução do testamento. 3. Pressupostos gerais do testamento. 4. Características gerais do testamento. 5. Do testamento particular. 5.1 requisitos essenciais de validade e de eficácia. 5.2 requisitos não essenciais. 6. Considerações finais. Referências.

1 INTRODUÇÃO

Zeno Veloso ensina que “sucessão”, em sentido restrito, que interessa ao direito hereditário, significa “a transmissão, a transferência do patrimônio de uma pessoa que morre, para uma ou mais pessoas, que substituem o defunto nos seus direitos e obrigações.”[1]

Nos moldes do art. 1.786 do Novo Código Civil de 2002, a sucessão causa mortis pode ser legítima (ab intestato), decorrente da própria lei, ou testamentária, decorrente de disposição de última vontade do falecido. Na conceituação de Miguel Maria de Serpa Lopes,

“a sucessão testamentária é aquela que procede de acordo com a vontade do sucedido, que se expressa por documento hábil e específico, designado de testamento. Respeita-se pois a última vontade do testador, que declara as pessoas que devem ser beneficiadas com o seu objeto.”[2]

O Código Civil de 1916 conceituava em seu art. 1.626 o testamento como “ato revogável pelo qual alguém, de conformidade com a lei dispõe, no todo ou em parte, do seu patrimônio, para depois da sua morte.”

Embora o objeto do testamento seja essencialmente patrimonial, a disposição de bens não se mostra indispensável para a existência de testamento que também pode conter disposições de caráter não patrimonial (de ordem pessoal ou moral), como o reconhecimento de filhos, a nomeação de tutores ou curadores (§2º do art. 1.857 do Código Civil de 2002), a deserção de herdeiros (art. 1.964 do Código Civil de 2002), as disposições sobre o próprio corpo (art. 14 do Código Civil de 2002) e até mesmo a revogação de outro testamento (art. 1.964 do Código Civil de 2002).

Por isso, a definição trazida pelo Código de 1916 foi muita criticada pela doutrina, justamente em função de não refletir todos os elementos do testamento, já que deixava de lado as disposições testamentárias de caráter não patrimonial, o que foi corrigido pelo Código Civil de 2002 que, em seu art. 1.857 não trouxe mais o conceito de testamento propriamente dito, mas elucidou suas características essenciais.

Define-se, assim, testamento como ato de última vontade[3], por meio do qual o testador, de acordo com a sua vontade e atendendo a certas exigências legais, institui os seus herdeiros ou legatários, realiza a distribuição da totalidade ou não dos seus bens para após a sua morte, ou faz outras declarações[4].

Nas palavras de Pontes de Miranda, “testamento (diz-se) é o ato pelo qual a vontade de um morto cria, transmite ou extingue direitos”[5].

Ao contrário da sucessão por lei, a interferência da vontade do falecido na sucessão testamentária revela claramente a presença do individualismo e do princípio da autonomia da vontade, os quais, contudo, no direito brasileiro, cedem frente às restrições de caráter público em benefício da família, de maneira que, embora a liberdade de testar seja a mais ampla possível, não é ilimitada[6].

O art. 1.789 do Código Civil de 2002 é um exemplo esclarecedor desse limite, na medida em que, havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade dos seus bens, já que a outra metade compreende a legítima dos herdeiros necessários. Igualmente, caso as disposições de última vontade excedam a parte disponível, serão reduzidas, conforme disposto no Código Civil de 2002, em seu art. 1.967. Miguel Maria de Serpa Lopes assim destaca:

“procurou-se uma fórmula moderada ou mitigadora, nem liberdade em demasia, nem tantas restrições atentatórias ao direito de livre disposição. Descobriu-se um meio termo que harmoniza o postulado da autonomia da vontade com os interesses públicos de preservação do instituto da família e da expansão da propriedade”.[7]

A sucessão testamentária é um dos institutos mais antigos do direito sucessório, porém, no Brasil, por conta de razões socioculturais, como a lembrança da própria morte no ato de testar, ou da regulamentação da sucessão legítima (por lei), que contempla a família, naturalmente beneficiada[8], e ainda, muitas vezes, por conta das próprias exigências formais a serem atendidas para assegurar a veracidade das disposições de última vontade, o uso do testamento é pouco difundido e a sucessão testamentária é considerada excepcional[9].

2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO TESTAMENTO

A sucessão testamentária é uma das instituições mais antigas do direito sucessório, porém, não há um consenso quanto à sua origem. Sabe-se que na Lei das XII Tábuas, cuja idade remonta 450-451 a.C., já existiam disposições acerca do instituto mas, ainda assim, muito se discute sobre o fato destas disposições compreenderem de fato a sua real natureza.

A ideia de última vontade era desconhecida no direito primitivo na medida em que não existia propriedade individual a qual estava ligada à família, ao grupo e, por meio da religião, deles não se podia afastar, de modo que impossível se mostrava a transmissão de patrimônio[10].

Zeno Veloso, ao citar Clóvis Bevilacqua, destaca que “não havendo patrimônio individual, não era possível o testamento, que pressupõe uma personalidade individual, autônoma, e um patrimônio transmissível, por ato de vontade, que vence o aniquilamento físico da morte.”[11] De acordo com Orozimbo Nonato,

“coube aos romanos a glória da invenção do testamento, instituição que, escreveu SUMNES MAINE, depois do contrato, exerceu a maior influência na transformação das sociedades humanas. A dificuldade de conceder tal eficácia à vontade de um morto, constituiu, nos costumes da Europa ocidental, obstáculo à propagação do uso do testamento romano […]”[12].

Contudo, originalmente, a sucessão testamentária de Roma não estava atrelada à ideia de transmissão de bens, mas à instituição do herdeiro (heredis institutio), em virtude da morte do pater famílias. O que importava era a perpetuidade da unidade da família; o herdeiro seria o soberano no poder da família (gens) e, consequentemente, o sucessor dos bens.

Aos poucos, a ideia de testamento tal como hoje a concebemos foi se desenvolvendo.

No direito pré-clássico romano destacam-se duas formas de testamento revestidas de um caráter político-religioso: a calatis comitiis (a forma mais antiga de todas) – usada em tempos de paz e celebrada perante o povo reunido nas Assembleias por Cúrias, sob a presidência do Sumo Pontífice, e que apresentava o ideal de assegurar a perpetuidade do culto larário – e o testamento in procinctu ou procinctum, usado em período de guerra e elaborado diante do Exército no momento da partida para o combate, de forma muito simples, já que se limitava a uma declaração perante o comandante e os demais integrantes do Exército.

Já no direito clássico (séc. II a.C.) surgiu o testamento per aes et libram que veio para resolver o problema daqueles que, fora da época de guerra, não tinha testado nas Assembleias Cúrias. Esse tipo de testamento representava a aplicação da mancipatio (o testador alienava ficticiamente o seu patrimônio a um terceiro de confiança chamado familia emptor, que por sua vez, comprometia-se a transferir os bens, após a morte do testador, para quem ele tivesse indicado).

Na mesma época, surgiu o testamento pretoriano, mais simples, escrito em tábuas de madeira e autenticadas por testemunhas. E, por meio da Constituição do ano de 439 d.C., criou-se o testamento tripertitum, representando a síntese de toda a evolução do instituto romano. Outros tipos de testamento existiram a partir daí, alguns utilizados de forma mais elaborada até os dias atuais, como por exemplo, o testamento militar.

O Código Civil de 2002 admite duas formas de testamentos, ou seja, um rol taxativo de possibilidades. Uma é a ordinária, da qual fazem parte o testamento público, o cerrado e o particular, que é objeto deste artigo; a outra modalidade é a especial, da qual fazem parte o testamento marítimo, o aeronáutico e o militar (art. 1.887).

3 PRESSUPOSTOS GERAIS DO TESTAMENTO

Antes de abordarmos especificamente o testamento particular, destacaremos os pressupostos gerais relativos à sucessão testamentária definidos pela doutrina brasileira e pela legislação aplicável ao tema: a) pessoa capaz para dispor dos seus bens no limite da lei; b) pessoa com aptidão para receber a herança e; c) declaração de vontade do testador na forma exigida pela lei.

Quanto ao requisito da capacidade, a considerar que o testamento, independente de sua forma, se trata de um negócio jurídico, a sua validade demanda agente capaz que tenha poder de dispor dos seus próprios bens para depois da sua morte, chamada de capacidade ativa ou capacidade para testar (testamenti factio activa).

Portanto, é necessário que, no ato de testar, o indivíduo esteja em seu perfeito juízo. Esse é o conteúdo dos arts. 1.857 e 1.860, ambos do Código Civil, que devem ser interpretados à luz dos arts. 3º, 4º e 166, todos do mesmo Código, relevando-se, portanto, que a capacidade é a regra. Assim, não se admite outras incapacidades além das expressamente previstas em lei[13].

No Código Civil de 1916, o art. 1.627[14], correspondente ao art. 1.860 do Código Civil de 2002, enunciava entre as incapacidades de testar, a dos “surdos-mudos que não puderem manifestar a sua vontade”.

Embora o art. 1.860 do Código Civil de 2002 não apresente expressamente esta incapacidade, não podemos olvidar que a surdo-mudez só será causa de incapacidade quando impossibilitar a manifestação de vontade do indivíduo. Tanto é assim que, aos surdos-mudos e aos cegos, que conseguem exprimir a sua vontade, é permitido o ato de testar, devendo apenas ser observada a forma de testamento prescrita em lei (“testamento público” ou “testamento cerrado”, nos moldes dos arts. 1.866, 1.867 e 1.873 da mesma legislação.

Além disso, embora no direito brasileiro a incapacidade absoluta cesse aos 18 anos, o art. 1.860, parágrafo único, do Código Civil admite a prática do ato de testar pelo relativamente incapaz (maior de 16 anos e menor de 18 anos – art. 4º, I), independentemente do auxílio de representante legal, sob o entendimento de que o menor, a essa idade, já tem discernimento acerca do ato de testar.

A capacidade do testador é regulada pela lei vigente ao momento da elaboração do testamento[15]. Nos moldes dos art. 169 do Código Civil, o testamento feito por incapaz é nulo. Todavia, a incapacidade superveniente não o invalida, nem o testamento feito por um incapaz será válido com a superveniência da sua capacidade (art. 1.861) (tempus regit actum).

Quanto ao segundo pressuposto genérico do testamento, diz-se que a pessoa com aptidão para receber a herança é aquela que detém capacidade passiva, auferível no momento da abertura do testamento (testamenti factio passiva).

De acordo com os arts. 1798 e 1.799, ambos do Código Civil, estão legitimados a receber do testador os (a) nascituros, desde que venham a nascer com vida, (b) a prole eventual das pessoas indicadas pelo testador, desde que existentes ao abrir-se a sucessão, ficando os bens da herança confiados a curador nomeado pelo juiz, até o nascimento com vida do herdeiro esperado[16] e ainda (c) as pessoas jurídicas, inclusive, permitindo a lei a sua criação por testamento, mediante dotação especial de bens livres, especificando ao fim a que se destina (fundação).

O art. 1.801 do Código Civil elenca pessoas que são absolutamente incapazes de suceder. Porém, de acordo com a doutrina brasileira, não se trata de uma regra de incapacidade propriamente dita, mas de algumas restrições de dispor em favor de certas pessoas que, naquelas circunstâncias, não têm legitimidade para ser nomeadas herdeiras ou legatárias pelo testador impedido, como é o caso das testemunhas do testamento[17].

Por fim, quanto à declaração de vontade do testador, deve ser livre, sem interferência de terceiros – o Código Civil brasileiro proíbe qualquer forma de coação ou outra espécie de vício do consentimento, conforme verificamos do art. 1.909 do Código Civil, cuja disposição não era prevista no Código Civil de 1916 (“São anuláveis as disposições testamentárias inquinadas de erro, dolo ou coação”[18]) – e na forma exigida pela lei, ou seja, por meio do testamento, ato de disposição de última vontade, cujas características gerais serão a seguir abordadas.

4 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO TESTAMENTO

Tratando-se o testamento de um negócio jurídico pelo qual uma pessoa dispõe sobre a sua própria sucessão, observam-se as seguintes características: (a) personalíssimo, (b) unilateral, (c) gratuito, (d) formal, (e) de última vontade, (f) revogável (g) se torna perfeito e acabado no momento em que o testador declara a sua vontade e, por fim, (h) tem eficácia causa mortis.

Considera-se ato personalíssimo (parte inicial do art. 1.858 do Código Civil) e unilateral, na medida em que não pode ser feito por meio de representante, proibindo-se, inclusive, testamentos conjuntivos de mão comum[19], cuja eficácia não depende da vontade de outra pessoa. A aceitação do herdeiro não afasta tal característica, na medida em que se trata de outro ato posterior, no momento da abertura da sucessão[20].

É um ato gratuito, uma vez que se trata de uma liberalidade, sem prever contrapartidas do herdeiro; relevante destacarmos que o fato do testamento prever certos encargos não implica em onerosidade.

Trata-se de um ato formal e solene (ad probationem e ad solemnitatem), uma vez que a forma escrita é essencial à sua validade, assim como o cumprimento das solenidades afeitas a cada tipo de testamento, sob pena de nulidade insanável[21].

Trata-se de ato de última vontade (“a derradeira deliberação sobre o assunto, qualquer que seja o momento em que reveste a forma própria”[22]) e que, justamente por se tratar de uma vontade do testador, pode ser alterado e revogado até o falecimento (de regra, considera-se revogado o testamento que precede o derradeiro). Nesse sentido é a parte final do art. 1.858 do Código Civil, “podendo ser mudado a qualquer tempo.”

Ainda que na redação do dispositivo apareça a palavra “mudado” ao invés da expressão “revogabilidade” – como constava no art. 1.626 do Código Civil de 1916 – a doutrina entende que esta alteração é um equívoco,

“porque o testamento é negócio mortis causa, exteriorizando a última vontade do testador, sendo obrigatório que se mantenha a chance de sua revogabilidade, já que, até a morte do declarante, é sempre possível que sua vontade testamentária seja revogada ou alterada.”[23]

À exceção da regra acima mencionada, não podemos olvidar que as disposições de caráter não patrimoniais são irrevogáveis, conforme inferimos dos arts. 1.609, III e 1.610, ambos do Código Civil, na medida em que não têm cunho causa mortis. Notamos, contudo, que a irrevogabilidade, em se tratando de um testamento particular, perde um pouco o seu sentido, já que a destruição ou a inutilização do testamento impedem o conhecimento das disposições testamentárias.

Por fim, o testamento se torna perfeito e acabado no momento em que o testador declara a sua vontade (validade); a eficácia do testamento apenas se verifica quando do falecimento do testador, por isso dizemos que é um negócio jurídico causa mortis (a morte é o que determina a eficácia do testamento). Não ocorrendo a revogação do testamento ou rompimento[24], o documento será válido e produzirá todos os efeitos a partir da morte do testador.

Destacadas as características gerais do testamento, ressaltamos a que mais gera discussão: a exigência das solenidades, muitas vezes excessivas, e cuja inobservância implicam nulidade do testamento.

Isto porque, se por um lado, as formalidades se justificam como uma garantia de segurança a uma declaração de vontade de uma pessoa falecida (proteção da autonomia da vontade do testador[25]), que vai produzir efeitos apenas após a sua morte, por outro lado, muitas vezes, são excessivas, apontadas como causa da destacada “excepcionalidade” da sucessão testamentária. O testamento é um ato que não depende de advogado para a sua validade, mas deve respeitar a observância dos requisitos legais para evitar nulidades e, assim, garantir a vontade do testador de partilhar o seu patrimônio da forma que entender mais justa.

Os arts.1.862 e 1.886, do Código Civil[26], observam as formas de testamento admitidas no ordenamento brasileiro, cada qual com suas solenidades indispensáveis. Em nosso artigo pretendemos abordar, sem a pretensão de esgotarmos o tema, o testamento particular, uma das formas de testamento ordinária, ao lado do testamento público e do cerrado. Mesmo sendo a modalidade mais simples, é também pouco utilizada em razão da necessidade do respeito às formalidades excessivas que acabam colocando em risco a própria vontade do testador.

Contudo, as formalidades no Código Civil de 2002 – assim como na jurisprudência, pautada numa interpretação mais atenta à finalidade do negócio jurídico (princípio favor testamenti) – vêm sendo aos poucos mitigadas para facilitar a elaboração do testamento, sem desrespeitar a observância fiel do ato do testador e o cumprimento da sua última vontade na sucessão. Garante-se, assim, o direito constitucional à herança, insculpido no art. 5º, XXX da Carta Magna[27].

5 DO TESTAMENTO PARTICULAR

O testamento particular é um ato de disposição de última vontade com a particularidade de ser escrito e assinado pelo testador, por isso, conhecido como testamento hológrafo[28], de próprio punho ou privado.

Segundo Pontes de Miranda, [29] a origem do testamento particular remonta a Valentiano III, no ano 446, e tal como no Breviarium Alaricianum, do ano de 506, apenas se referia a certos casos particulares; não era, portanto, uma forma ordinária de testar. O Código de Justiniano admitia essa espécie somente quando elaborada pelos pais em favor dos filhos. Foi pela atuação do Breviarium, em Portugal, e no sul da França, que ocorreu uma evolução do testamento até chegar ao modelo tal como hoje o conhecemos, transformando em ordinário o que era particular[30].

Embora o testamento particular seja considerado a forma mais simples de testamento e a “salvaguarda suprema da liberdade de testar”[31], inclusive, a maneira preponderante nos países que o regulam, não é a forma mais utilizada no Brasil. Isto, porque, para a sua validade e eficácia, exige-se o cumprimento de diversos requisitos que muitas vezes impedem-no de ser concretizado.[32] Na sequência, veremos alguns deles mais detalhadamente.

5.1 Requisitos essenciais de validade e eficácia

Inicialmente não podemos olvidar que em se tratando o testamento de um negócio jurídico, para a sua validade devem ser observadas as disposições dos arts. 166, 167 e 171, todos do Código Civil, além dos requisitos intrínsecos a todas as formas de testamento.

Em relação ao testamento particular, o Código Civil, no art. 1.876, aponta os requisitos essenciais à sua validade: a) escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico, b) lido na presença de pelo menos três testemunhas, além do testador e c) assinado pelo testador e pelas testemunhas.

Importante destacarmos que a característica principal do testamento hológrafo, que é a escrita inteiramente de próprio punho do testador, não pode ser entendida como afastada por conta de ser admitida a elaboração do testamento por processo mecânico[33].

Tal novidade, outrora muito debatida em nossa doutrina e jurisprudência – principalmente por conta da redação do art. 1.645 do Código Civil de 1916, que não previa o meio mecânico de elaboração do testamento – reflete a evolução no direito, ou melhor, a sua adaptação diante das modernidades tecnológicas.

Assim, a possibilidade de elaboração por meio mecânico não desqualificou o requisito essencial da holografia do testamento particular.

A men legis dessa regra, que exige um ato personalíssimo e exclusivo do testador – por isso não se admite a escrita a rogo – tem como fundamento garantir que as disposições de última vontade sejam fruto da atividade direta do testador e resultado da sua total liberdade de expressão ao mesmo tempo em que permite evitar falsificações posteriores. O fato do testamento ter sido elaborado por um processo mecânico não significa que não tenha decorrido de uma atividade direta e pessoal do testador; o que deve ser considerado é o grande avanço tecnológico e a realidade contemporânea diante do uso constante de computadores.

Acerca do tema, Zeno Veloso[34], já em 1993, defendia o testamento decorrente de um processo mecânico, sob o argumento de que nada impedia tal prática se ficasse provado que “o testador se serviu, ele próprio, de qualquer dessas formas de manifestação do pensamento”.

Destacamos, ademais, que embora o testamento deva ser ato de livre manifestação da vontade do testador, o fato deste utilizar uma minuta elaborada, por exemplo, por um advogado contratado para auxiliá-lo justamente para evitar nulidades futuras, não significa que não tenha sido um ato de sua vontade.

Logo, trata-se de uma inovação importante do Código Civil de 2002 que se coaduna com a modernidade; devem ainda ser observadas as formalidades do §2º do art. 1.876 que não autorizam rasuras ou espaços em branco no testamento com o objetivo de evitar qualquer falsificação que possa maculá-lo, o qual ainda deverá ser assinado pelo testador, depois da leitura na presença conjunta das testemunhas, que também deverão subscrevê-lo (unidade de contexto).

Quanto à assinatura do testador ou das testemunhas, o Código Civil de 2002 não exige o reconhecimento de firma, as quais serão confirmadas quando da publicação do testamento, mas poderão ser impugnadas pelos herdeiros legítimos; também não se exige a rubrica em todas as páginas do testamento, mas as assinaturas do testador e das testemunhas devem constar ao final das disposições testamentárias.

Uma questão interessante acerca da assinatura do testador e que tem provocado uma discussão frente às modernidades tecnológicas, principalmente diante do uso disseminado do computador pessoal, diz respeito à possibilidade da assinatura digital do testador[35]. Ora, se no passado a discussão era voltada para a possibilidade de elaboração do testamento por meio mecânico, atualmente o foco é a possibilidade do ato do testador ser assinado digitalmente somado aos debates sobre as formas possíveis de conferir a segurança necessária ao ato de livre vontade.

Outra inovação importante trazida pelo Código Civil de 2002 refere-se às testemunhas. Para a validade do testamento particular, escrito de próprio punho ou elaborado por processo mecânico, a presença de pelo menos três testemunhas é fundamental. O testamento deve ser lido pelo testador na presença de todas, que deverão assiná-lo diante dele.

Enquanto o Código de 1916 exigia ao menos cinco testemunhas, o Código Civil de 2002 passou a exigir apenas três; todas devem ouvir a leitura do testamento e assiná-lo, relevando, assim, claramente a tendência à mitigação dessa exigência formal do testamento particular[36].

Para a eficácia do testamento particular as testemunhas deverão confirmá-lo. O Código de 1916 exigia ao menos três testemunhas para esta finalidade. Já o novo Código Civil é mais flexível, uma vez que se eventualmente, quando da confirmação do testamento, apenas uma delas reconhecê-lo, este poderá ser confirmado pelo juiz, conforme o art. 1.878, parágrafo único: “Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade.”

Trata-se de uma simplificação bastante importante, na medida em que o número de testemunhas era excessivo, e o ato do testador, mesmo válido e representando a sua legítima disposição de última vontade, não era considerado eficaz quando faltavam três testemunhas. Desta forma, a sucessão ocorria na forma da lei, exatamente o que o testador não queria ao elaborar o seu testamento.

Em que pese se tratar de uma inovação importante, fato é que a confirmação do testamento, nessa hipótese, ficará a cargo da avaliação do julgador, que deverá perquirir, no caso concreto, a vontade do testador frente a outros elementos probatórios. No entanto, foi mantida a exigência da indispensável necessidade de, pelo menos, uma das testemunhas que o assinou, reconhecê-lo.

Por fim, destacamos que o testamento pode ser redigido em outro idioma desde que, tanto o testador quanto as testemunhas possam compreendê-lo, conforme o art. 1.880 do Código Civil (corresponde ao art. 1.649 do Código Civil de 1916). Da mesma forma, como não há controle da linguagem, o testamento pode ser escrito da forma como quiser o testador, inclusive, contendo erros de ortografia.

Além dos requisitos de validade, para que o testamento particular tenha eficácia, foi mantida no Código Civil de 2002 a necessidade de ser observada a solenidade da confirmação em juízo do testamento após a morte do testador, conforme inferimos dos seus arts.1.877 e 1.878.

Nos moldes do art. 1.130 do Código de Processo Civil, o herdeiro, legatário ou o testamenteiro podem requerer a publicação do testamento depois da morte do testador, quando, então serão ouvidas as testemunhas que subscreveram o documento, reconhecendo, assim, a sua autenticidade.

A principal crítica que persiste no ordenamento quanto ao testamento particular é a exigência dessa confirmação em juízo, justamente porque, muitas vezes, as testemunhas que assinaram o testamento, não mais sobrevivem ou têm paradeiro desconhecido; pode ainda ocorrer alguma contradição entre as testemunhas, que dado o transcurso do tempo, não mais se recordam dos fatos com clareza. Assim, o ato de última vontade, embora válido, não será eficaz, caso não exista ao menos uma testemunha a confirmá-lo, além da própria avaliação do julgador. Segundo Zeno Veloso,

“este procedimento, após o falecimento do testador, quando se convocam as testemunhas para confirmar, judicialmente, o testamento, é um dos maiores inconvenientes, um risco flagrante do testamento hológrafo, residindo, aí, a razão principal de sua quase nenhuma utilização, em nosso país”.[37]

De modo geral, os países que admitem o testamento particular não exigem testemunhas. Quanto a estas últimas, destacamos que não estão obrigadas a se lembrar do conteúdo das disposições de última vontade que lhes foram lidas em voz alta pelo testador, mas do fato da leitura propriamente dita, assim como reconhecerem as suas próprias assinaturas e a do testador.

Se as testemunhas contestarem o fato da disposição ou ao menos o da leitura do testamento ter sido feita diante delas, e ainda, se não reconhecerem as suas assinaturas e a do testador, o testamento inicialmente válido por ter observado os requisitos formais será ineficaz porque não confirmado, e os bens do testador vão para pessoa diversa da por ele pretendida[38].

Portanto, verificamos que as solenidades do testamento particular não devem apenas ser observadas quando da sua elaboração, mas também no momento da sua execução, após o falecimento do testador. O procedimento desestimula a sua utilização, dado que é indispensável a necessidade de ingressar em juízo e enfrentar os problemas daí decorrentes como a falta de celeridade, os custos processuais e os riscos relativos às próprias testemunhas[39].

Outra inovação bastante importante do Código Civil de 2002 é a possibilidade de se elaborar um testamento particular com a dispensa das testemunhas, quando situações excepcionais justificarem tal ato: “Art. 1.879. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, poderá ser confirmado, a critério do juiz.”

Trata-se de uma forma muito simplificada de testamento. Alguns doutrinadores, entre eles, Zeno Veloso, entendem que sequer seria uma forma particular, mas sim especial, que não requer testemunha alguma, só podendo ser elaborado em circunstâncias especiais que impedem ou dificultam que o testador atenda os requisitos essenciais aqui discorridos[40].

Notamos ainda que o Código Civil de 2002 não enunciou as circunstâncias excepcionais a autorizarem tal testamento, as quais devem ser declaradas no próprio testamento. Portanto, novamente ficará a critério do juízo de valor do julgador a confirmação do testamento, quando a ele apresentado.

A doutrina, contudo, já ressalva algumas circunstâncias excepcionais, como o fato do testador estar internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital e sentir a proximidade da sua morte, ou contaminado com uma doença contagiosa que o impeça de manter contato com terceiros[41].

Outro aspecto que gera discussão diz respeito à caducidade deste testamento “informal”. Isto porque, enquanto o Código Civil prevê que os testamentos especiais caducarão em 90 dias, caso não tenha falecido o testador e a ele seja possível testar de forma ordinária (arts. 1891 e 1895 do Código Civil de 2002), nada diz sobre o prazo de caducidade dessa nova forma de testamento na hipótese do testador sobreviver à circunstância excepcional declarada no testamento.

Logo, ainda que o testamento seja um ato de vontade e que fique a critério do testador revogá-lo, o fato de existir uma previsão quanto à caducidade dos testamentos especiais não pode ser deixado de lado quanto à modalidade prevista no art. 1.879 do Código Civil de 2002; deve ser mantida a coerência de interpretação do ordenamento. Uma vez superada a circunstância que levou o testador a testar, o testamento elaborado nestas circunstâncias excepcionais deixa de ter validade. Caso queira manter as disposições, o testador deverá se socorrer de uma das outras formas previstas no ordenamento.

5.2 Requisitos não essenciais

A legislação brasileira, ao contrário da maioria – dentre elas as legislações da França, da Itália e da Alemanha – não exigiu que no testamento particular fosse colocada a data da sua elaboração e o local no qual foi feito. No entanto, embora não sejam requisitos essenciais, podem ser úteis e se transformarem em essenciais em determinadas circunstâncias.

Um exemplo é o fato de que a menção de data no testamento permite, entre outras circunstâncias, verificar a capacidade do testador naquele momento, ou ainda, quando diante de dois testamentos da mesma pessoa, com disposições conflitantes e, que por não estarem datados, restarão prejudicados pela impossibilidade de se averiguar qual manifesta a última vontade do testador.[42]

Existindo diversos testamentos, é a data que comprova qual deles é o último e, portanto, revoga o anterior. A ausência de data pode exigir investigações que, na maioria das vezes, são muitos difíceis. Assim, um testamento datado e assinado fica completo e evita nulidades que colocariam em risco a vontade do testador.

Assim, estes requisitos, embora a legislação não os tenha classificados como essenciais, em casos de dúvidas, ajudam a evitar uma possível nulidade no caso concreto.

Por fim, destacamos o risco de perda, extravio ou ocultação do testamento particular. De acordo com a doutrina, a melhor forma para evitar estes problemas é o testador redigi-lo em vários exemplares, com o mesmo conteúdo e, em todos, atendendo aos requisitos descritos, podendo deixá-los com pessoas de sua confiança ou em um cofre bancário.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio da nossa exposição, observamos diversas facilidades e conveniências para a elaboração de um testamento particular. Porém, ainda que se trate da forma mais simples, rápida, econômica e represente “a salvaguarda suprema da liberdade testamentária”[43], suas formalidades excessivas são vistas como impeditivas da sua utilização, já que, uma vez não observadas, a vontade do testador não terá validade, prevalecendo a sucessão legítima.

Assim, pelo fato de se buscar preservar a última vontade é que muitas das limitações impostas pelo ordenamento estão, aos poucos, sendo mitigadas. Diante das questões essenciais para a validade do ato, passa-se a perquirir o verdadeiro desejo do testador, como forma de evitar a declaração de ineficácia do ato ou a sua nulidade, levando a transmissão do patrimônio a acontecer de forma diversa da pretendida pelo testador.

Nos dizeres de Pontes de Miranda, “só em último caso, deve o juiz sacrificar o interesse da vontade, que merece favor, à exigência formal, cujo intuito somente poderia ser o de garantir a boa expressão da vontade e o seu respeito”[44]. É o que verificamos não apenas do Código Civil de 2002, mas na jurisprudência, ambos antenados às modernidades da vida e ao caráter dinâmico de um dos mais antigos institutos do direito, que é o testamento.

Daí, portanto, o acerto da mitigação das formalidades exigidas para o testamento particular que, embora seja a forma mais simples de testar, ainda encontra muita resistência frente ao receio de que a sua validade venha a ser rechaçada quando da abertura da sucessão. Temos aqui uma situação que vem sendo claramente evitada para garantir a finalidade primordial do testamento que é a disposição de liberalidade do testador.

 

Referências
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3.ed. revista. atual. ampl. São Paulo: RT, 2013.
GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
LAWAND, Jorge José. O testamento digital e a questão da sua validade. (Tese de Doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2005. Disponível em: < http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivophp?cod.Arquivo=1587. Acesso em: 25 set.2013.
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001.
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012.
______. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LVI, Direito das Sucessões, Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação, atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 7.ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: RT, 2009.
NERY, Rosa Maria de Andrade. Introdução ao pensamento jurídico e à teoria geral do Direito Privado. São Paulo: RT, 2008.
NONATO, Orozimbo. Estudos sobre Sucessão Testamentária. v.1. Rio de Janeiro: Forense, 1957.
VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito das Sucessões. 13.ed. v.7. São Paulo: Atlas, 2013.
Notas
[1]VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.11. Acerca do sentido amplo da palavra sucessão, também destacamos os ensinamentos de Orozimbo Nonato: “apresenta-se, pois, em todas as partes do direito civil, na observação exata de LACERDA DE ALMEIDA, compreendida como a “continuação em outrem de uma relação jurídica que cessou para o respectivo sujeito”. Já o sentido estrito da palavra é de devolução do patrimônio do de cujus a uma ou mais pessoas pela morte daquele. (NONATO, Orozimbo. Estudos sobre Sucessão Testamentária. v.1. Rio de Janeiro: Forense, 1957, p.22)
[2] LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p.4.
[3] “Não se trata de um contrato, a toda evidência, pois faltam os elementos próprios desta figura, como a bilateralidade, a irredutibilidade da vontade e, especialmente, a comutatividade. Nem quase-contrato configura-se, justamente por faltar a obrigatoriedade de cumprir o testador aquilo que estipula, dada a possibilidade de revogação. (…) Pela unilateralidade, não obriga, pois a toda pessoa autoriza-se a mudar ou revogar aquilo que ela decidiu, e que tem valor somente para ela.” (LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p. 83-84)
[4] Vale ressaltar duas definições do direito antigo, a primeira de Modestino: “testamento é a manifestação de nossa vontade sobre aquilo que queremos que se faça depois da morte”; e a segunda, de Ulpiano: “testamento é a manifestação de última vontade, feita de forma solene, para valer depois da morte.” (VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.21)
[5] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. Atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.109.
[6] Ordenamentos da Inglaterra e dos EUA consagram a plena liberdade de testar, conforme destaca Zeno Veloso. (VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.13).
[7] LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p.88.
[8] BRASIL. Código Civil (2002). Art. 1.829 (Da Ordem da Vocação Hereditária).
[9] Sílvio Venosa, ao comentar o tema, destaca: “Apenas tecnicamente podemos dizer que a sucessão legítima, entre nós, é supletiva da sucessão testamentária. Já se tornou clássica entre nossos doutrinadores a afirmação consagrada de Washington de Barros Monteiro (1977, v. 6:95), de que “para dez sucessões legítimas que se abrem ocorre uma única sucessão testamentária” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito das Sucessões. 13.ed. v.7. São Paulo: Atlas, 2013, p.183).
[10] “O indivíduo se absorvia e se anulava na família – ao mesmo tempo associação religiosa e sociedade patrimonial de que o pater era o sacerdote e o administrador – e o testamento é a projeção da vontade individual em uma de suas manifestações mais características e extremadas” (NONATO, Orozimbo. Estudos sobre Sucessão Testamentária. v.1. Rio de Janeiro: Forense, 1957, p.64).
[11] VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed. ampl. Belém: CEJUP, 1993, p.16.
[12] NONATO, Orozimbo. Estudos sobre Sucessão Testamentária. v.1. Rio de Janeiro: Forense, 1957, p.63.
[13] Serpa Lopes, ao citar Itabaiana de Oliveira, destaca que as disposições denegatórias de direito comum devem ser interpretadas restritivamente, de modo que a regra geral é que todos aqueles que não estiverem impedidos legalmente podem testar (LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p.84). No mesmo sentido, Zeno Veloso destaca que vigora, quanto à capacidade de testar, a regra geral omnes testamentum facere possunt, qui non prohibentur, sendo que “o inverso, a incapacidade, deverá ser expressamente prevista e, se alegada, terá de ser provada de maneira cabal e inelutável, não bastando puros indícios, simples presunções ou meras declarações […]” (LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. Sucessão. 1.ed.Atualizado por José Serpa de Santa Maria, v.IX, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p. 47)
[14] “Art. 1.627 do Código Civil de 1916. “São incapazes de testar: I – os menores de 16 (dezesseis anos); II – os loucos de todo o gênero; III – os que, ao testar não estejam em seu perfeito juízo; IV – os surdos-mudos, que não puderem manifestar a sua vontade.”
[15] A capacidade plena do testador não implica liberdade plena visto que existem limites à liberdade de testar impostos pelo direito brasileiro.
[16] “Uma vez que não se admite a existência de direitos sem sujeito, o testador somente pode atingir esse propósito pelo mecanismo da substituição fideicomissária” (GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 98).
[17] GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.96.
[18] BRASIL. Código Civil (2002). Arts.166, 167 e 171.
[19] O Código Civil brasileiro de 2002 proíbe o testamento conjuntivo, que é aquele feito pelo marido e a mulher conjuntamente, no mesmo papel (art. 1.863).
[20] “A manifestação de vontade do testador é um ato unilateral, e a aceitação do beneficiário, que só pode ocorrer depois do passamento do disponente, é um outro ato unilateral. Estes atos não são, apenas, temporalmente distintos, mas independentes” (VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.32).
[21] A sucessão testamentária exige, do seu instrumento, a observância de formalidades numerosas, que desempenham tríplice função: preventiva, precatória e executiva. Os elementos formais do testamento têm por fim assegurar a livre e consciente manifestação da vontade do testador, atestar a veracidade das disposições de última vontade e fornecer aos interessados um título eficaz para obter o reconhecimento dos seus direitos” (GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.92).
[22] GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.102.
[23] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LVI, Direito das Sucessões, Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação, atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.110.
[24] BRASIL. Código Civil (2002). Arts. 1969 e 1973.
[25] A sucessão testamentária exige, do seu instrumento, a observância de formalidades numerosas, que desempenham tríplice função: preventiva, precatória e executiva. Os elementos formais do testamento têm por fim assegurar a livre e consciente manifestação da vontade do testador, atestar a veracidade das disposições de última vontade e fornecer aos interessados um título eficaz para obter o reconhecimento dos seus direitos” (GOMES, Orlando. Sucessões. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.92).
[26] “Art. 1.862. São testamentos ordinários: I – o público; II – o cerrado; III – o particular”; “Art. 1.886. São testamentos especiais: I – o marítimo; II – o aeronáutico; III – o militar.”
[27] BRASIL. Constituição Federal (1988). Art. 5º, XXX: é garantido o direito de herança.
[28] Ensina Zeno Veloso que etimologicamente a palavra hológrafo tem origem grega e significa “inteiramente escrito” (VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.262).
[29] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. Atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.190.
[30] O testamento hológrafo foi reconhecido na França pelas Ordenança de 1629.
[31] VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.263.
[32] Valiosas são as considerações de Pontes de Miranda, mencionadas por diversos doutrinadores: “A lei brasileira cercou de tais cautelas, ameaçou de vida tão precária o testamento particular, que em verdade quase o proibiu. Raro se vê. Exigiu-lhe holografia e assinatura autógrafa, exigiu-lhe cinco testemunhas, exigiu-lhe leitura perante elas e assinaturas por todas elas. Tudo isto era razoável e bastava. Mas o legislador, que tão liberal fora com o testamento cerrado, continuou em obstinado exigir, num como sonambulismo de perseguição: se morrerem três testemunhas, fica o dito por não dito, o testado pelo não testado (art. 1.648). Lei absurda, lei inconseqüente, lei má, lei que devolveria a herança a pessoa de quem o testador não cogitou, porque num desastre morreram ele e três testemunhas”. (MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.195).
[33] BRASIL. Código Civil (2002). Art. 1.876, §2º: “Se elaborado por processo mecânico […]”.
[34] VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl. Belém: CEJUP, 1993, p.277.
[35] Jorge José Lawand destaca: “A popularização dos personal computers levou a uma substituição lenta e gradual das formas manuscritas, ou até mesmo da datilografia, passando-se a uma crescente digitalização de todos os documentos relativos à vida humana e seu relacionamento com outrem” (LAWAND, Jorge José. O testamento digital e a questão da sua validade. (Tese de Doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2005. Disponível em: < http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivophp?cod.Arquivo=1587>. Acesso em: 25 set.2013).
[36] Questão importante surge quanto à eficácia retroativa da lei nova nos negócios jurídicos concluídos sob a vigência do Código Civil de 1916. Se um testamento foi celebrado sob sua égide, os requisitos formais a serem observados serão os dispostos no antigo Código Civil (tempus regit actum), nos moldes do art. 2.035. Contudo, como será cumprido sob a égide do Código Civil de 2002, para a sua eficácia basta observar os requisitos de eficácia da nova lei, por exemplo, que seja confirmado apenas por uma das cinco testemunhas que o assinaram e participaram do ato. Tal distinção poderá ajudar a evitar nulidades de testamentos por conta da ausência de pelo menos três testemunhas, conforme era exigido pelo Código Civil de 1916.
[37] VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.295
[38] Acerca das inovações destacamos a regra de transição estabelecida no art. 2.035 do Código Civil de 2002.
[39] “Os fatos jurídicos inclusive atos jurídicos, podem existir sem serem eficazes. O testamento, antes da morte do testador, nenhuma outra eficácia tem que a de negócio jurídico unilateral, que, perfeito, aguarda o momento da eficácia.” (Pontes de Miranda apud VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.44).
[40] Giselda Hironaka Paulo Lôbo, ao atualizar a obra de Pontes de Miranda, destacou que seria um “testamento particular informal” (MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.191).
[41] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito das Sucessões. 13.ed. v.7. São Paulo: Atlas, 2013, p.240.
[42] “A verdade está a gritar do todos os lados: trata-se de requisito formal, eventualmente essencial. Tanto é certo que, no Brasil, que não exige a data, se há dois testamentos inconciliáveis e não se sabe a data deles, a data constitui requisito essencial. As circunstâncias fizeram-no tal. Mas tais circunstâncias são raras, e o legislador não há de acorrentar a tais exigências ato que, por definição, é de última vontade” (MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.205).
[43] VELOSO, Zeno. Testamentos. 2.ed.ampl.Belém: CEJUP, 1993, p.263.
[44] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial, Tomo LIX, Direito das Sucessões. Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. atualizado por Giselda Hironaka Paulo Lôbo. São Paulo: RT, 2012, p.193.

Informações Sobre o Autor

Juliana Estevão Lima Dias

Advogada. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Direito Civil da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)


Equipe Âmbito Jurídico

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