Resumo: O presente artigo tem como objetivo a analise do direito de livre resolução e o direito de arrependimento aplicado aos contratos celebrados à distância, sobretudo aos contrato eletrônicos. Será feita uma análise comparada entre o Direito Brasileiro e Português, este último regulado pelo Decreto-Lei 143/01 que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 97/7/CE; esperando-se que tal regulamentação volte a ser alterada quando transposta para o direito interno a Diretiva 2011/83/EU. Quanto ao Brasil, analisar-se-á o Código de Defesa do Consumidor, sobretudo o art. 49 que trata do direito de arrependimento aplicável nos contratos à distância.
Palavras Chave: direito de retratação; contratos celebrados distância; direito do consumidor; efeitos e obrigações da retratação; prazo para exercício do direito de retratação; Diretivas 97/7/CE e 2011/83/EU. Art. 49 da Lei 8078/90.
Abstract: This article aims to analyze the right of free disclaimer applied to contracts celebrated at distance, specially e-contracts. A comparative analysis will be made between the Brazilian and Portuguese law, the latter regulated by Decree-Law 143/01 which transposed into national Law Directive 97/7/EC, it is expected that such rules will be changed again when implemented into national law the Directive 2011/83/EU. As for Brazil, it will examine the Code of Consumer Protection, especially art. 49 which deals with the right of cancellation applies in respect of distance contracts.
Keywords: Right of free disclaimer; distance contracts; consumer rights; purposes and obligations of the retraction; period for exercising the right of withdrawal; Directives 97/7/EC and 2011/83/EU. Art. 49 of Law 8078/90.
Sumário: Introdução; 1. Dos contatos à distância; 2. Breves considerações acerca do dever de informação; 3. O direito de arrependimento; 3.1. Terminologia; 3.2. Em Portugal; 3.3. No Brasil; 4. Efeitos; 5. Obrigações. Conclusão. Referências bibliográficas
A cada dia nota-se a crescente oferta em sítios eletrônicos de produtos e serviços. Observa-se, ainda, que no contexto globalizado e, sobretudo, em tempos de crise, cada vez mais as empresas optam por reduzir seus custos operacionais, diminuindo a oferta em lojas físicas e concentrando seu potencial de vendas em lojas virtuais ou vendas e oferta de serviços por qualquer outro meio telemático.
Tal forma de comercializar oferece vantagens múltiplas, tanto para quem oferta, quanto para quem contrata. Para aqueles, cita-se a diminuição dos custos e a obtenção de um modelo tendente a alcançar um público maior, tendo em vista a oferta de produtos e serviços disponível 24 horas por dia, sete dias por semana; cita-se ainda considerável redução de despesas com a manutenção de ou de funcionários a possibilidade de se manter um sistema apto a traçar um perfil aproximado de cada consumidor, utilizando-se, por conseguinte, de estratégias de marketing personalizadas.
Constate-se que no âmbito do direito privado europeu a Diretiva 2011/83/EU mostra-se coesa com crescimento do comércio a distância, reconhece a necessidade de se incentivá-lo. É o que se infere do considerando n. 5, segundo o qual o potencial das vendas à distância transfronteiriças deverá ser um dos principais resultados tangíveis do mercado interno. Por outro lado, não se pode furtar a proteção devida ao consumidor que se vale dos meios telemáticos para contratar.
Em Portugal as vendas a distância e o direito de livre resolução (este especificamente no art. 6º) estão regulados pelo Decreto-Lei 143/01 que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 97/7/CE, relativa à proteção dos consumidores em matéria de contratos celebrados à distância. Atualmente, o DL 143/01 está em sua 5ª versão (DL 317/09) e espera-se que essa versão também se altere quando feita a transposição da Diretiva 2011/83/EU
No Brasil, na seara consumeirista, o direito de arrependimento é resguardado desde 1990, com o advento da Lei 8.078/90 que criou o Código de Defesa do Consumidor. No que diz respeito à aplicação do arrependimento nos contratos a distância, tal prerrogativa está disciplinada no art. 49, objeto de maiores considerações no item 3.3.
Apenas a título de melhor delimitar-se o tema, achou-se oportuno traçar brevemente as noções de contrato à distância, segundo a dicção legal no Brasil e em Portugal.
Em Portugal, enuncia o DL 143/2001 em seu art. 2º que contrato celebrado a distância é qualquer contrato relativo a bens ou serviços celebrado entre um fornecedor e um consumidor, que se integre num sistema de venda ou prestação de serviços à distância organizada pelo fornecedor que, para esse contrato, utilize exclusivamente uma ou mais técnicas de comunicação à distância até à celebração do contrato, incluindo a própria celebração.
Ocorre que, conforme anota PUPO CORREIRA, a caracterização específica dos denominados contratos à distância deve resultar da definição do art. 2º nº 1, da Directiva 97/7/CE e do art. 2º, al. a), do DL nº 143/2001: uma relação contratual entre um fornecedor e um consumidor, tendo por objecto bens ou serviços, integrada num sistema de vendas ou prestações de serviços à distância organizada pelo fornecedor, que utilize elementos técnicos de apoio: a técnica de comunicação à distância e o operador de técnica de comunicação, entendendo-se a primeiro (técnica de comunicação à distância) como sendo um meio que torna dispensável a presença fisica e simultânea das partes para a formação do contrato, e, a segunda (operador de técnica de comunicação ) como sendo, qualquer pessoa singular ou colectiva que fornece aos fornecedores e consumidores, uma técnica de comunicação, desde à empresa fornecedora de acesso à internet ou serviço telefônico até mesmo à emissora de rádio ou televisão.[1]
Sem prejuízo, deve ser levado em consideração que estão excluídas da aplicação do presente decreto, as seguintes hipóteses, consoante se infere do art. 3º:
“a) No âmbito de serviços financeiros, nomeadamente os referentes a: serviços de investimento; operações de seguros e resseguros; serviços bancários; operações relativas a fundos de pensões; serviços relativos a operações a prazo ou sobre opções;
b) Através de distribuidores automáticos ou de estabelecimentos comerciais automatizados;
c) Com operadores de telecomunicações pela utilização de cabinas telefônicas públicas;
d) Para a construção e venda de bens imóveis ou relativos a outros direitos respeitantes a bens imóveis, exceto o arrendamento;
e) Em leilões.”
Por outro lado, no Brasil, determina o art. 49 do CDC que o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio, sem, contudo, que a lei dê a dicção legal de contratos celebrados fora do estebelecimento comercial [2].
Tal lacuna é, todavia, suprida pela doutrina e jurisprudência. Cita-se GRINOVER que explica que fora do estabelecimento comercial poderá ser, por exemplo, com a venda porta a porta, por telefone, por reembolso postal, por fax, por videotexto, por prospectos, etc. O Código protege o consumidor contra toda e qualquer contratação realizada fora do estabelecimento comercial, concedendo-lhe o prazo de sete dias para arrepender-se do negócio, sem nenhum ônus, sendo certo que o caso concreto é que vai determinar o que seja venda fora do estabelecimento comercial sujeita ao direito de arrependimento ou não [3].
Nesse sentido, cita-se a Apelação Cível n. 297217720058190014 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que com base no disposto no art. 49 do CDC, assegura o direito de arrependimento a compra formalizada por telefone, na medida acertada e indiscutivelmente esta se enquadra na espécie de contratação à distância.
“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPRA FORMALIZADA POR TELEFONE. DIREITO DE ARREPENDIMENTO EXERCIDO DENTRO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 49 DO CDC. CHEQUES DESCONTADOS PELO FORNECEDOR MESMO APÓS A DEVOLUÇÃO DO PRODUTO. RESTRIÇÃO AO CRÉDITO INDEVIDA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONFIGURADA. DANO MORAL. QUANTUM FIXADO EM R$ 7.000,00 QUE ATENDE AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO E AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO ART. 557, CAPUT DO CPC.49 CDC 557 CPC”. (297217720058190014 RJ 0029721-77.2005.8.19.0014, Relator: DES. CLAUDIA TELLES DE MENEZES, Data de Julgamento: 01/06/2011, QUINTA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 04/07/2011)
Vale destacar ainda, por oportuno, conforme abordado por SOUZA, que cita lições de Ronaldo Alves de Andrade, que a norma prevista no mencionado art. 49 do CDC é extremamente abrangente, o que, segundo este autor constitui mais uma norma de tipo aberto ou conceito jurídico indeterminado, quando caberá ao juiz o preenchimento para estabelecer em que casos e quais modalidades de contratação a venda deve ser considerada fora do estabelecimento.
Com efeito, este citado autor, posiciona-se ainda no sentido de que contrato à distância, de forma ampla e genérica, é aquele contrato realizado por catálogo; o contrato realizado em atendimento a oferta feita pela televisão; o celebrado eletronicamente (contratos eletrônicos), como ocorre nos contratos de consumo firmados pela internet; a compra realizada em máquinas automáticas.
Por fim, justifica que a inserção de um tipo aberto no aludido dispositivo foi extremamente feliz, pois as técnicas de negociação mudam freqüente e rapidamente e, da mesma forma, surgem novas técnicas de negociação à distância que, por certo, não poderiam estar previstas em uma lei que especificasse de forma taxativa todas as formas possíveis de contratação à distância.[4]
2. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DEVER DE INFORMAÇÃO
Inicialmente, antes que se concentrem esforços para discorrer sobre o direito de livre resolução/arrependimento aplicado aos contratos à distância, mostra-se de fundamental importância que algumas reflexões sobre o dever de informação e a condição de desvantagem em que o consumidor invariavelmente se encontra.
Muito bem aponta ULHOA COELHO que a igualdade das partes no âmbito das relações de direito privado, para a ordem jurídica correspondente às concepções neo liberais do capitalismo superior, traduz-se pela ideia de que a lei deve assegurar ao contratante débil (isto é, o menos privado de recursos) as condições jurídicas necessárias para entabular entendimentos com o mais forte (mais provido de recursos).[5]
Assim sendo, o tratamento isonômico das partes consiste, em síntese, na outorga de privilégios e no reconhecimento de preferência aos economicamente mais fracos, visando dotá-los de meios necessários para a negociação em condições equitativas[6]. Essa ideia guarda estreita relação com a de igualdade material, de influencia socialista, que prega tratar os desiguais na medida de suas desigualdades.
A ideia é que se pretende estabelecer um parâmetro inicial de consumidor racional e, para tanto, o legislador pressupõe que o amplo acesso dos consumidores a um conjunto de informações relativas ao fornecimento e ao contrato a ser celebrado é condição para o exercício consciente e racional das opções no mercado de consumo. É inegável, contudo, a crescente cultura consumista, mas para o direito do consumidor parte-se da presunção absoluta de que todos os consumidores movem-se por critérios de estrita racionalidade.[7]
Exemplificando, a situação de vulnerabilidade do consumidor ante o fornecedor de produtos ou serviços, também chamada de hipossuficiência, pode se manifestar como vulnerabilidade técnica, quando aquele não possui conhecimentos específicos a ponto de aferir a pertinência das informações dadas; vulnerabilidade jurídica, quando não tem conhecimentos sobre os contornos jurídicos que revestem o negócio, sobretudo quanto ao contrato; e vulnerabilidade socioeconômica.
No Brasil o acesso à informação é pressuposto inafastável para o consumidor realizar suas escolhas, correspondendo assim a um dever do fornecedor franqueá-las o mais largamente possível. Nesse sentido, dispõe o CDC em seu art. 6º, III, que são direitos básicos do consumidor o acesso à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. Decorre ainda do direito de informação a possibilidade estabelecida no inciso VIII do mesmo artigo, isto é, a inversão do ônus da prova, desde que haja verossimilhança, pois detém o fornecedor/prestador de serviços o monopólio da informação.
Ademais, determina o art. 31, também do CDC, que a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores. Por fim, no que compete ao tema em análise, determina o art. 33 do mesmo Diploma que em caso de oferta ou venda por telefone ou reembolso postal, deve constar o nome do fabricante e endereço na embalagem, publicidade e em todos os impressos utilizados na transação comercial.
Já em Portugal, no que tange ao Decreto Lei 143/01 que trata das vendas à distância elenca em seu art. 4º algumas informações que o consumidor deve contar antes de celebrar um contrato:
“a) Identidade do fornecedor e, no caso de contratos que exijam pagamento adiantado, o respectivo endereço;
b) Características essenciais do bem ou do serviço;
c) Preço do bem ou do serviço, incluindo taxas e impostos;
d) Despesas de entrega, caso existam;
e) Modalidades de pagamento, entrega ou execução;
f) Existência do direito de resolução do contrato, exceto nos casos referidos no artigo 7.º;
g) Custo de utilização da técnica de comunicação a distância, quando calculado com base numa tarifa que não seja a de base;
h) Prazo de validade da oferta ou proposta contratual;
i) Duração mínima do contrato, sempre que necessário, em caso de contratos de fornecimento de bens ou prestação de serviços de execução continuada ou periódica.
2 – As informações referidas no n.º 1, cujo objetivo comercial tem sempre de ser inequivocamente explicitado, devem ser fornecidas de forma clara e compreensível por qualquer meio adaptado à técnica de comunicação a distância utilizada, com respeito pelos princípios da boa fé, da lealdade nas transações comerciais e da proteção das pessoas com incapacidade de exercício dos seus direitos, especialmente os menores.
3 – Caso a comunicação seja operada por via telefônica, a identidade do fornecedor e o objetivo comercial da chamada devem ser explicitamente definidos no início de qualquer contacto com o consumidor.”
O dever de informação prévia ao consumidor relativo a um contrato à distância (art. 4º da Directiva 97/7/CE e o art. 4º do DL nº 143/2001), tem um contéudo taxativo: abrange indicações especificamente integrantes da oferta contratual, que devem ser todas e cabalmente fornecidas antecipadamente pelo fornecedor ao consumidor, em um contexto tal que permita a este aperceber-se de que a comunicação tem o objetivo de constituir uma oferta comercial, tudo de forma a deixar claro e compreensível ao consumidor as qualidades e condições do negócio, respeitando e preservando a boa fé e a lealdade de direitos[8]
Ademais, o descumprimento do dever de informação, em Portugal, implica a teor do que dispõe o artigo 6º, n. 2, al., c), em uma penalidade consubstanciada na prorrogação do prazo para o exercício do direito de resolução, bem como com coimas e perda dos objetos (vd. os artigos 4º, 5º, 32º, n. 1, als. a) e b), e 33º do DL nº 143/2001).[9]
No caso de o fornecedor não ter cumprido a obrigação de confirmação de informações por escrito, a que estava vinculado, nos termos do art. 5º, o prazo para exercer o direito de rescisão é dilatado para três meses, no caso dos bens, a contar do dia da sua recepção, e no caso dos serviços, a contar do momento de celebração do contrato. Sendo certo que, se as referidas informações forem fornecidas dentro do prazo de três meses, o consumidor terá, a partir desse momento, um prazo de 14 dias, para exercer o seu direito de arrependimento.[10]
Deve-se ter em mente que, em se tratando de contratos à distância, o consumidor acaba por se colocar numa situação de vulnerabilidade ainda maior do que a convencionalmente vista na contratação direta. Isto porque, sobretudo no comércio eletrônico, a oferta é feita ao consumidor 24 horas por dia, 7 dias por semana, diretamente em sua residência ou em qualquer lugar que ele esteja, bastando apenas que tenha acesso à internet. A oferta é ostensiva, direcionada a cada perfil, tendente a compelir o consumidor a contratar, muitas vezes sem a devida reflexão. É nesse cenário, principalmente dado ao crescimento do comércio eletrônico, que se insere o direito de arrependimento.
Por fim, impende ressaltar conforme a Política Nacional das Relações de Consumo [11] objeto do art. 4º do CDC, a vulnerabilidade é atribuída ao consumidor, insculpida a título de princípio no art. 4, I, e supletivamente no art. 927 do CPC, caracterizando-o como ente mais fraco da relação de consumo e alçado à condição de premissa básica e indispensável ao justo estabelecimento dessas relações. Ou, em outras palavras, através de regras de ordem eminentemente social, reconhece o Estado no consumidor brasileiro a vulnerabilidade, procurando não limitar sua liberdade contratual, mas garantindo-lhe a autonomia privada, com o objetivo de protegê-lo como parte mais fraca. [12]
3. O DIREITO DE ARREPENDIMENTO
Inicialmente, antes de se avançar ao tema central deste trabalho, cumpre realizar uma pequena digressão acerca das terminologias adotas. Observou-se, prima facie, a adoção de diferentes terminologias para abranger o mesmo tema, levando-se em conta o local de análise. No âmbito do direito internacional privado europeu, Diretiva 2011/83/EU, vale-se, em seu art. 9º, do termo retratação, enquanto a Diretiva 97/7/CE que a antecedia, usava o termo resolução.
Em Portugal a Diretiva 2011/83/EU ainda não foi transposta para o direito interno e Decreto-Lei nº 143/01 que trata do tema também utiliza-se do termo resolução, vez que nitidamente sua redação foi influenciada pela Diretiva 97/7/CE. Já no Brasil, o CDC, em seu art. 49, vale-se do termo arrependimento.
Tal questão foi objeto de ponderação por BRANDÃO PROENÇA, que para a questão terminológica ao direito de arrependimento do consumidor, concluiu que “ apesar do predomínio da expressão ‘direito de livre resolução’, os termos retratação, revogação e, mesmo, arrependimento, parecem mais consonantes, na sua expressão linguística e conceituação jurídica, com a motivação psicológica do consumidor ou a finalidade essencial do poder extintivo em causa. E não se trata aqui de uma questão de escolha de palavras, mas de tentar minorar a incerteza terminológica que grassa neste círculo da extinção contratual e de conservar os instrumentos jurídicos dentro de determinadas fronteiras, evitando “perdas de identidade.” [13]
Em Portugal o direito de livre resolução está originalmente previsto no art. 6º do DL 143/01, alterado pelo DL 317/2009 que revogou as alíneas “c” e “d” do decreto anterior. Como já visto, parece que o termo livre resolução não é o mais adequado, especialmente após a edição da Diretiva 2011/83/EU.
De toda sorte, o direito de livre resolução está assim regulado no DL 143/01:
“ARTIGO 6º: DIREITO DE LIVRE RESOLUÇÃO
1 – Nos contratos à distância o consumidor dispõe de um prazo mínimo de 14 dias para resolver o contrato sem pagamento de indenização e sem necessidade de indicar o motivo.
2 – Para o exercício desse direito, o prazo conta-se:
a) No que se refere ao fornecimento de bens, a partir do dia da sua recepção pelo consumidor sempre que tenham sido cumpridas as obrigações referidas no artigo 5.º;
b) No que se refere à prestação de serviços, a partir do dia da celebração do contrato ou a partir do dia em que tenha início a prestação ao consumidor, sempre que tenham sido cumpridas as obrigações referidas no artigo 5.º;
3 – Se o fornecedor não cumprir as obrigações referidas no artigo 5.º, o prazo referido no n.º 1 é de três meses a contar da data da recepção dos bens pelo consumidor ou, tratando-se de uma prestação de serviços, da data da celebração do contrato ou do início da prestação.
4 – Caso o fornecedor cumpra as obrigações referidas no artigo 5.º no decurso do prazo de resolução referido no n.º 1 e antes de o consumidor ter exercido esse direito, este dispõe de 14 dias para resolver o contrato a partir da data de recepção dessas informações.
5 – Sem prejuízo do estabelecido na alínea a) do n.º 3 do artigo anterior, considera-se exercido o direito de resolução pelo consumidor através da expedição, nos prazos aqui previstos, de carta registrada com aviso de recepção comunicando ao outro contraente ou à pessoa para tal designada a vontade de resolver o contrato.”
Conforme indica, FROTA, o direito de retratação consiste na faculdade atribuída ao consumidor de num determinado período, se desvincular de um contrato através de uma declaração unilateral.
“As características essenciais deste direito são:
1) Imotivabilidade: pelo fato de não se exigir ao consumidor que indique eventuais razões para se desvincular. O consumidor exerce-o imotivada e injustificadamente.
2) Inindenizabilidade: pelo fato de não se exigir ao consumidor qualquer contraprestação pela desvinculação do contrato
3) Irrenunciabilidade: pelo fato de, ainda que o profissional e o consumidor cheguem ao consenso, a lei porque injuntiva, não permite que o consumidor abdique ou renuncie este direito.”
Desta feita, em apertada síntese, o consumidor que celebre um contrato à distância, nos moldes do art. 2º, tem a possibilidade de rescindir o contrato sem o pagamento de indenização e sem a indicação do motivo, tendo apenas que custear as despesas de reenvio da mercadoria e de exercer o seu direito de rescisão no prazo de 14 dias. Todos os custos a ser suportados pelo consumidor limitam-se aos que estão diretamente relacionados com a devolução do bem.[14]
É que tal dispositivo não tem, nos dizeres de BRANDÃO PROENÇA, uma finalidade sancionatória, nem um escopo compensatório (de prejuízos), a resolução visa tutelar, na fase do cumprimento, a conexão, o equilíbrio recíproco entre a prestação e a contraprestação, tal como foi avaliada pelas partes no momento da celebração contratual. A resolução, a excepção de não cumprimento, e a chamada caducidade por impossibilidade não imputável (ou resolução automática) são remédios para a crise de uma necessária relação de proporcionalidade.[15]
Nota-se que o artigo em comento guarda estreita relação com o disposto no art. 6º da Diretiva 97/7/CE e assim mesmo deve ser tendo em vista que a norma de direito comunitário é anterior ao Decreto 143/01. A diferença entre ambos, neste aspecto, reside no fato de que a diretiva determina prazo não inferior à 7 dias, enquanto a legislação portuguesa optou por um prazo um pouco mais alargado, de 14 dias.
Neste ponto verifica-se, a feliz opção do legislador português de facultar maior proteção ao consumidor alargando o prazo mínimo de 7 dias previsto na Diretiva 97/7/CE.
No Brasil, conforme já aduzido em tópicos anteriores, o direito de arrependimento aplicado aos contratos fora do estabelecimento comercial tem previsão legal desde 1990 com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor e é regulado nos seguintes termos:
“Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.”
A primeira coisa que se deve considerar é que, nas palavras de GRINOVER, o Código consagra o direito de arrepender-se e voltar a atrás em declaração de vontade que haja manifestado celebrando uma relação jurídica de consumo. O direito de arrependimento existe per se, sem que seja necessária qualquer justificativa do porquê da atitude do consumidor, basta apenas que o contrato tenha sido concluído fora do estabelecimento comercial para que incida, plenamente, o direito de arrepender-se.[16]
Quanto a natureza jurídica do direito de arrependimento, pois com o advento do Código Civil de 2002 questionou-se se o arrependimento do CDC não guardaria semelhanças com a venda a contendo disciplinada pelos art. 509 a 512 do diploma cível. É que, neste caso, a trata-se de uma venda sob condição suspensiva, a qual, apenas se aperfeiçoa quando o comprador disser que está satisfeito com a aquisição e, portanto, trata-se de um contrato de comodato. Contudo, tal não ocorre no diploma consumeirista pois o direito de arrependimento está contido num contrato de compra e venda que é perfeito e acabado, produzindo-se todos os efeitos jurídicos, isto é, está consumado até o momento em que o consumidor dedica, dentro do prazo legal, exercer seu direito de arrependimento. De toda sorte, todas as responsabilidades pré-contratutais incidirão no contrato até mesmo durante o prazo de reflexão, já que se nesse período de sete dias o produto apresentar algum vício ou dano por fato do produto, o fornecedor terá que indenizá-lo. Por sua vez, o consumidor sofre os riscos normais do proprietário, dentre eles o res perit domino e neste caso, responderá por sua perda.[17]
O prazo para o exercício do direito de arrependimento é considerado um prazo de reflexão e é de 7 dias, considerado pelo legislador como sendo prazo suficiente para não incorrer eventuais abusos que possam ser praticados pelo consumidor, no exercício do seu direito, em prol da boa-fé, equidade e até mesmo da segurança jurídica nas relações de consumo.
Entretanto, tal prazo é considerado exiguo pela doutrina, conforme aponta GRINOVER, ao afirmar que em outros sistemas jurídicos esse prazo é mais dilatado. O legislador brasileiro optou por conceder o prazo de sete dias, de relativa exiguidade.[18]
À propósito da segurança jurídica, merece que se considere que o direito de arrependimento é próprio do consumidor, não sendo invocado pelo fornecedor de produtos e serviços. Isto porque, a vulnerabilidade é própria do consumidor e, por força do art. 35 do CDC, a oferta e a publicidade têm caráter vinculativo, podendo o consumidor, inclusive, exigir o cumprimento forçado da proposta.
Observou-se, oportunamente no tópico atinente à conceituação de contratos à distância (i.e., realizados fora do estabelecimento comercial) que tal análise é feita casuisticamente, não havendo definição legal própria. Observou-se após análise jurisprudencial que os julgados não entram muito em discussão quanto o que é ou não venda realizada fora do estabelecimento comercial.
Interessante é que GRINOVER, uma dar relatoras do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor aponta em seu Código Comentado que se for da essência do negócio a realização fora do estabelecimento comercial, não incidirá a norma do art. 49, citando como exemplo a compra e venda de imóveis que é, em regra, celebrada no cartório de notas[19].
Contudo, observou-se alguns casos curiosos em que se percebe a extensão do presente artigo para que seja aplicável a contratos celebrados no estabelecimento comercial ou que sejam tipicamente celebrados fora deste.
Na primeira hipótese, cita-se a Apelação Civil n. 134966320108260223 do TJSP que reconheceu a aplicação do art. 49 em tela para contratos de compra e venda com financiamento realizado na própria loja, reconhecendo-se, ainda, a existência de contratos coligados em virtude de arrendamento mercantil.
No caso de contratos realizados tipicamente fora do estabelecimento comercial, pondera-se que a venda de fotos e filmagens de formatura que é, costumeiramente, feita à domicílio pelos representantes das empresas de filmagem. Cita-se a Apelação Cível n. 1405344920058070001 do TJDF, que reconheceu a aplicação do direito de arrependimento a esses contratos nos termos do art. 49 do CDC.
Finalmente, a última observação que merece ser feita diz respeito aos contratos bancários, especialmente se levado em consideração que o art. 6º do DL 143/01 ( 317/09) de Portugal exclui o direito de arrependimento aos contratos bancários, em virtude de lei especial. Contudo no Brasil, não é mais possível negar a aplicação do CDC a estas espécies de contrato, em virtude do julgamento da ADIn 2591-1.
Sucintamente, em 2002 a Confederação do Sistema Financeiro Nacional (COSIF) ajuizou a referida ADI para que fosse declarada a inconstitucionalidade da Lei 8.078/90 (CDC) em relação à sua aplicação às atividades de natureza bancária e financeira. Contudo, extrai-se da ementa desse julgado que[20]:
“1. as instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor;
2. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO.”
No que se refere aos efeitos do exercício do direito de livre resolução ou arrependimento, em linhas gerais pode-se destacar que este impõe a extinção do contrato e consequentemente, também a da obrigação de sua execução.
Deste modo, uma vez que o consumidor exerça o direito de arrependimento ou livre resolução, este é extinto, com seus efeitos retroagindo de forma ex tunc.
Segundo JUNQUEIRA GOMIDE, o Decreto Lei nº 143/2001, que regula o direito de livre resolução nos Contratos à Distância em Portugal, sugere que a celebração da avença já produz eficácia imediata ao contrato[21], razão pela qual nota-se a opção pela figura da eficácia resolúvel (artigo 270 do Código Civil Portugues[22]).
Neste sentido, conforme aponta o mesmo autor[23] endossado por BRANDÃO PROENÇA[24], é o entendimento de Pedro Romano Martinez e de Américo Fernando Gravato Morais, respectivamente.
No modelo de eficácia resolúvel, que parece ser indiscutivelmente o mais adequado para a questão, o contrato ficará sem efeito se, durante o período de reflexão, o direito de arrependimento for exercido. O acordo contratual é, portanto, eficaz, tornando-se ineficaz mediante a verificação de uma ação (fato positivo)[25].
De igual modo é o que se observa do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, que regula no Direito Brasileiro a presente questão em debate. Conforme se infere da sua leitura, percebe-se a condição de um contrato já concluído, considerando que este dispositivo, dispõe no seguinte sentido: “O consumidor pode desistir do contrato (…)”
A figura do contrato com efeitos resolúvel no Direito Brasileiro está contemplada, nos termos do artigo 127 do Novo Código Civil Brasileiro[26].
Ainda, conforme aponta Alexandre Junqueira Gomide, tal entendimento é o compartilhado no Direito Brasileiro, por LIMA MARQUES que afirma que o contrato firmado ao domicílio seria um contrato, por lei, resolúvel, como se a antiga figura do direito romano, a cláusula resolutiva tácita, incorporada ao direito alemão, passasse a existir no direito brasileiro. Além disso, esta jurista expõe que o contrato nasceu e o consumidor não é mero possuidor do bem ou depositário como no sistema francês, mas sim o “novo proprietário” do produto, pois a tradição transferiu o domínio. Fica claro, portanto, que LIMA MARQUES pressupõe um contrato válido e eficaz que perderia sua eficácia por meio de “simples manifestação de vontade do consumidor em desistir do contrato”[27].
Destaque-se, que o “modelo da “eficácia suspensa” e o “modelo da eficácia resolúvel” (defendido a partir da inserção no BGB do § 361 a), separa, conforme FERREIRA DE ALMEIDA, o primeiro modelo, “mais simples”, do chamado “período de reflexão” (pré-contratual) e ambos da opção (lato sensu)[28].
Em outras palavras, para FERREIRA DE ALMEIDA, a doutrina alemã diferenciou dois tipos de modelos. O primeiro modelo, que foi designado por modelo da eficácia suspensa, afirma que o contrato só terá efeito se, durante o período de reflexão, o direito de arrependimento não for exercido. O acordo contratual começa assim por ser ineficaz, podendo tornar-se eficaz mediante a verificação de uma omissão (fato negativo – o não exercício do arrependimento), já no segundo modelo – denominado de modelo da eficácia resolúvel – defende que o contrato ficará sem efeito se, durante o período de reflexão, o direito de arrependimento for exercido. O acordo contratual é, portanto, eficaz, tornando-se ineficaz mediante a verificação de uma ação (fato positivo)[29].
Ademais, vale consignar no que toca aos contratos acessórios, uma vez exercido o direito de livre resolução ou arrependimento, temos por certo que este segue toda a sorte do contrato principal e portanto para estes também se aplicam os meus efeitos aqui retratados.
Sem prejuízo, destaque-se que a resolução/arrependimento, uma vez exercido, temos em ambas as Legislações também a obrigação do fornecedor de reembolsar o montante pago pelo consumidor, bem como a do consumidor de restituir o bem ao fornecedor.
Por fim, não ocorrendo a resolução ou arrependimento, efetuado o pagamento do preço pelo consumidor e a entrega da coisa pelo Produtor, tem-se um contrato plenamente concluído.
Segundo PUPO CORREIA, os efeitos, da resolução do contrato reconduzem-se à regra geral da restituição do que tiver sido prestado por e a cada uma das partes.[30]
Desta feita, surgem obrigações recíprocas das partes no que diz respeito a concretização do exercício do direito de livre resolução ou arrependimento.
Neste passo, ao fornecedor caberá a restituição do preço pago pelo consumidor, que será feito sem quaisquer despesas ou encargos para este. As únicas despesas que ele poderá ter serão as despesas diretas de restituição do bem objeto do contrato resolvido.[31]
Em complemento, GRINOVER, indica que o consumidor tem direito à devolução imediata das quantias pagas monetariamente atualizadas pelos índices oficiais, além de destacar que eventuais encargos suportados pelo fornecedor para fazer chegar as mãos do consumidor o produto ou serviço contratado fora do estabelecimento comercial, seu ressarcimento fica por conta do risco negocial da empresa.[32]
Por seu turno, considerando o princípio da boa-fé, o consumidor deve ao exercer o direito de arrependimento, zelar para que o bem mantenha suas qualidades e condições iniciais,[33]devolvendo o bem imediatamente ao comerciante.
Diante disso, não é dado ao consumidor tirar o máximo de proveito do produto adquirido, sendo certo que o exercício do arrependimento, consagra a faculdade do consumidor poder avaliar o produto e suas características dentro de limites, tais como o de uma avaliação na própria loja.
Constado eventual abuso, poderá o consumidor ser responsabilizado e indenizar o comerciante por eventual depreciação do produto.
Considerando os elementos abordados e discutidos no presente trabalho podemos constatar o crescimento da modalidade de contratos celebrados fora do estabelecimento comercial, sobretudo o e-commerce, diante das reduções de custos operacionais, o potencial e abrangência das vendas realizadas fora do estabelecimento comercial.
Neste contexto, ganham maior relevância e destaques os meios de proteção do consumidor, aplicáveis a tais casos, ensejando eventualmente a revisão de normas aplicáveis conforme ocorreu com a Directiva 97/7/CE, revogada pela Diretiva 2011/83/EU, que busca prestigiar e melhor regulamentar as questões que envolvem contratação à distância e fora do estabelecimento comercial e que refletirá no direito interno de Portugal quando transposta.
Neste aspecto, no que toca ao caso brasileiro, considerando que a norma aplicável a tais casos é, conforme apontado, de tipo aberto ou conceito jurídico indeterminado, tem-se em sua estrutura uma menor necessidade de revisão, restando facilidado o acompanhamento da lei protetiva as novas tendencia e caracteristicas dos contratos celebrados à distância.
Com efeito, esta crescente forma de contratação, conduz necessariamente a uma maior vulnerabilidade do consumidor na medida em que nos contratos celebrados à distância, o consumidor esta sujeito a uma maior oferta de produtos e serviços e com maior facilidade para a sua realização, as ofertas são ostensivas, direcionada a cada perfil, tendente a compelir o consumidor a contratar, muitas vezes sem a devida reflexão.
Desta forma é indiscutível a necessidade de se assegurar um prazo de reflexão consubstanciado no direito de arrependimento ou livre à resolução.
A resolução ou arrependimento, visa tutelar o equilíbrio recíproco entre a prestação e a contraprestação, tal como foi avaliada pelas partes no momento da celebração contratual, sendo certo que o direito de voltar atrás independe de qualquer justificativa do porquê da atitude do consumidor, bastando apenas que o contrato tenha sido firmado fora do estabelecimento comercial, guardadas as devidas restrições de aplicabilidade de cada legislação em análise, para que incida, plenamente os seus efeitos.
É de notar a existência, atualmente de certas diferenças entre Brasil e Portugal, no que se refere à presente matéria, em especial quanto à conceituação de "contratos a distância" e quanto ao prazo para o exercício do direito de arrependimento
No que toca ao conceito de contratos à distância em Portugal, encontramos este bem definido no direito português por força da definição existente no art. 2º nº 1, da Directiva 97/7/CE e no art. 2º, al. a), do DL nº 143/2001, sendo que este em linhas gerais diz que contrato celebrado a distância é qualquer contrato relativo a bens ou serviços celebrado entre um fornecedor e um consumidor, que se integre num sistema de venda ou prestação de serviços à distância organizada pelo fornecedor que, para esse contrato, utilize exclusivamente uma ou mais técnicas de comunicação à distância até à celebração do contrato, incluindo a própria celebração.
Por outro lado, no Brasil, face ao que dispõem o art. 49 do CDC, tem-se uma norma extremamente abrangente no que se refere ao conceito de contratos celebrados à distância, configurando-se esse como aquele realizado fora do estabelecimento comercial indistintamente, podendo por exemplo, ser caracterizado como contrato à distância aquele firmado com a venda porta a porta, por telefone, por reembolso postal, por fax, por videotexto, por prospectos, etc.
Entretanto, será as particularidades do caso concreto que irá determinar o que seja venda fora do estabelecimento comercial sujeita ao direito de arrependimento ou não
Relativamente ao prazo para o exercício do direito de arrependimento, constata-se que a legislação portuguesa conferiu maior prazo, 14 dias, frente aos 7 dias assegurados na legislação brasileira, que conforme indicado por GRINOVER, trata-se de um prazo de relativa exiguidade.
Cabe destacar que diferentemente do que acontece no Brasil onde os contratos bancários, por força do decidido na ADI-2591-1 se estende a aplicação do CDC e consequentemente as mesmas regras para os contratos celebrados à distância, em Portugal tal questão é tratada separadamente dos contratos celebrados à distância, em Lei específica, mais precisamente no DL 133/2009 que transpôs a Directiva 2008/48/CE.
Por fim, os efeitos do exercício do direito de livre resolução ou arrependimento, implica na extinção do contrato, com seus efeitos retroagindo de forma ex tunc, nos moldes da figura da eficácia resolúvel.
Deste modo, as obrigações decorrente de tal resolução reconduzem a obrigações recíprocas das partes, no sentido de que deverá haver restituição do que tiver sido prestado por e a cada uma das partes.
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Referências jurisprudenciais
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BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Distrito Federal. Apelação Civel n. 1405344920058070001 DF 0140534-49.2005.807.0001, Rel. João Mariosa. Data de Julgamento: 19/02/2010. 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 18/03/2010.
Notas:
Advogado. Mestrando em Direito dos Contratos e da Empresa pela Escola de Direito da Universidade do Minho Portugal
Advogada. Mestranda em Direito dos Contratos e da Empresa pela Escola de Direito da Universidade do Minho (Portugal). Pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Trainee em 2010 na CBMM Europe BV – Amsterdã, Holanda.
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