Quinze
segundos é um período de tempo muito curto. Basta contar até 15 e pronto: já se
passaram 15 segundos. Parece ser um lapso de tempo tão insignificante, durante
o qual nada acontece, tanto que o período de 24 horas contém 5.760 vezes a fração 15 segundos. Talvez só fazendo essa singela
operação aritmética é que se possa visualizar o quanto
chocante é o dado que consta do Relatório Nacional Brasileiro, que retrata o
perfil da mulher brasileira: a cada 15 segundos uma mulher é agredida, isto é,
a cada dia 5.760 mulheres são espancadas no Brasil.
Mas há
outros números que também assustam: segundo a OMS, 30% das primeiras
experiências sexuais das mulheres foram forçadas; 52% das mulheres são alvo de assédio sexual; 69% das mulheres já foram
agredidas ou violadas. Isso tudo, sem contar o número de homicídios praticados
pelo marido ou companheiro sob a alegação de legítima defesa da honra.
Ainda
que tais dados sejam surpreendentes, é preciso atentar em que esses números são
subdimensionados, pois somente 10% das agressões
sofridas por mulheres são denunciadas. Quer por medo, quer por vergonha, é
difícil denunciar alguém que reside sob o mesmo teto, uma pessoa com quem se
tem um vínculo afetivo e filhos em comum e que, não raro, é o responsável pela
subsistência da família.
A
conclusão só pode ser uma: as mulheres nunca param de apanhar, sendo seu lar o
lugar mais perigoso para elas próprias e seus filhos.
Cabe
indagar, afinal, quem é responsável por essa triste realidade. É certo que a
violência física, sexual e emocional sofrida pelas mulheres não é
responsabilidade exclusiva de seus agressores. O fundamento é cultural e
decorre da desigualdade de poder, havendo uma verdadeira relação de dominante e
dominado. A sociedade ainda cultiva valores que incentivam a violência, o que
impõe tomar consciência de que a culpa é de todos. Até agora, sempre o poder
esteve em mãos masculinas. As leis são elaboradas por homens e a justiça é, na
grande maioria dos casos, aplicada por juízes.
Não
poderia ter sido mais catastrófico condicionar o delito de lesão corporal à
representação, transferindo para leigos a competência para fazer acordos. As
mulheres aceitam por medo, e cresce entre os homens a certeza da impunidade.
Há um
descaso em abrigar as vítimas que, por não terem para onde ir, se submetem a situações que colocam sua integridade corporal em
constante risco. Afora isso, a Justiça, achando que está protegendo a família,
não pune o agressor, e o corpo da mulher responde pela preservação da entidade
familiar, tornando invisível a violência doméstica.
Assim,
todos os Poderes são cúmplices da violência contra as mulheres, merecendo ser
responsabilizados na condição de co-autores, tanto o Legislativo, como o
Executivo e o próprio Judiciário.
Essa
perversa dinâmica precisa cessar.
Ao ser conclamada toda a sociedade para fazer um pacto social
com o objetivo de reverter a insustentável situação que está vivendo o povo
brasileiro, é imperioso que se atente na realidade das mulheres.
Afinal,
não se pode falar em liberdade sem igualdade; e não há igualdade quando mais da
metade da população está submetida à força, à vontade e ao desejo da outra
metade.
Advogada, Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM
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