A Atividade de Fornecimento de Mão de Obra por Parte das Empresas de Trabalho Temporário e a Sua Inviabilidade Frente à Tributação do ISS

Marina Garcia Faleiros – Advogada, graduada em Direito pela Faculdade de Direito de Franca, Especialista em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – Faculdade de Direito de Ribeirão Preto.

 

Resumo: O STJ no julgamento do REsp n° 1.138.205/PR, em Recurso Repetitivo, fixou a adoção da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços composta pela taxa de administração, remuneração dos trabalhadores temporários e encargos sociais, refletindo em um aumento expressivo da tributação dessas empresas, sendo necessário analisar se a atividade ainda é viável no cenário nacional. Abordando o conceito e regramento legal das empresas de trabalho temporário, além de sua diferenciação com as agências de recrutamento, seleção e colocação de mão de obra, pode-se compreender os regimes para tributação do ISS em cada uma delas, implicando diretamente na definição correta de sua base de cálculo. Importante ponderar as possíveis soluções para manter as empresas de trabalho temporário em atividade.

Palavras-chave: Empresas de trabalho temporário. Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. Base de cálculo.

 

Abstract: The STJ in the judgment of REsp n. 1,138,205 / PR, in Repetitive Appeal, established the adoption of the basis of calculation of the Tax on Services composed of the administration fee, remuneration of temporary workers and social charges, reflecting in a significant increase in taxation of these companies, and it is necessary to analyze whether the activity is still viable in the national scenario. By approaching the concept and legal regulation of temporary employment agencies, in addition to their differentiation with labor recruitment, selection and placement agencies, one can understand the regimes for taxing the ISS in each of them, directly implying the correct definition of its calculation basis. It is important to consider the possible solutions to keep temporary work companies active.

Keywords: Temporary work companies. Tax On Services Of Any Nature. Calculation basis.

 

Sumário: Introdução. 1. Empresas de trabalho temporário: definição e regulamentação legal. 2. O regime tributário aplicável às empresas de trabalho temporário no que tange ao ISS. 3. A inviabilidade da atividade exercida pelas empresas de trabalho temporário frente à tributação do ISS. Conclusão. Referências.

 

Introdução

Uma legislação complexa refletida pela Lei n° 6.019 de 1974 e pelo Decreto n° 73.841 de 1974, causou e ainda causa grande confusão quanto a atividade exercida pelas empresas de trabalho temporário. Atividade essa pouco compreendida pelos cidadãos e até mesmo pelos membros do Poder Judiciário, tudo isso devido às inúmeras exigências que compõem os requisitos de funcionamento dessas empresas de acordo com as diretrizes do Ministério do Trabalho.

Por muito tempo reinou a insegurança jurídica quanto ao que seria considerado como base de cálculo para fins de tributação dos impostos retidos na fonte, como Imposto Sobre Serviços, Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, entre outros. Nessa baila, a questão chegou ao Judiciário a fim de dirimir definitivamente toda e qualquer controvérsia sobre o tema.

Ocorre que, em sede de julgamento do Recurso Especial n° 1.138.205/PR, por meio de Recurso Repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça acabou por fixar a base de cálculo com base no valor da comissão recebida pelas empresas de trabalho temporário, na remuneração devida ao trabalhador temporário e nas contribuições sociais. Tal entendimento reflete o total despreparo quanto ao cerne da questão visto que, apesar da obrigação acessória dessas empresas, devendo emitir a nota fiscal de serviço com a discriminação de todos esses itens supra citados, não compõem eles o preço do serviço prestado.

O Imposto Sobre Serviço, tema central deste estudo, tem como base de cálculo o valor do serviço prestado. Assim, o entendimento do E. STJ restou totalmente equivocado, não podendo ser levado adiante sob pena de tornar inviável a atividade de fornecimento de mão de obra temporária face à excessiva carga tributária.

 

1 EMPRESAS DE TRABALHO TEMPORÁRIO: DEFINIÇÃO E REGULAMENTAÇÃO LEGAL

A empresa de trabalho temporário é aquela que fornece mão de obra temporária a outras empresas, sendo estas últimas as responsáveis pela remuneração e supervisão, tendo a Lei nº 6.019 de 1974, definido a empresa de trabalho temporário em seu artigo 4º, como aquela que coloca “à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos”.

O trabalho temporário vem definido no artigo 2º da Lei nº 6.019 de 1974 como “aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços”.

Assim, o contrato de trabalho temporário tem prazo determinado de 90 dias e é celebrado com o intuito de suprir uma necessidade transitória da empresa tomadora do serviço. Tal modalidade de contrato deve ser celebrada por meio de uma empresa intermediária, que é a chamada empresa de trabalho temporário, não se confundido com o contrato de trabalho por tempo determinado, modalidade outra de contrato de trabalho realizada diretamente entre o empregado e o empregador, sendo regida pela CLT.

A remuneração dos empregados contratados fica a cargo da empresa tomadora do serviço, bem como os encargos sociais que devem devidamente recolhidos. Todavia, fica a cargo da empresa de trabalho temporário repassar esses valores aos empregados, ou seja, a atividade de intermediação ocorre inclusive nesse sentido, no que tange à remuneração e recolhimento dos encargos sociais. Importante frisar que os empregados não são contratados da empresa de trabalho temporário, eles apenas firmam com a referida empresa um contrato que lhe assegura os direitos trabalhistas em caso de serem contratados por uma empresa tomadora de serviço, que será a responsável pela remuneração desses empregados que lhe prestarem serviço.

O preço pago pelo serviço prestado pelo empregado sai diretamente dos cofres da empresa tomadora. Já a empresa de trabalho temporário presta um serviço de intermediação entre o empregado e a empresa tomadora, recebendo por isso uma remuneração denominada Taxa de Administração. A mencionada taxa é o preço do serviço prestado pela empresa de trabalho temporário.

Nessa baila, é indispensável delimitar as diferenças entre o fornecimento de mão de obra realizado pela empresa de trabalho temporário e a atividade de recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão de obra, sendo esta última atua como um “caça talentos”, buscando por pessoas que tenham o perfil desejado para o preenchimento de vagas das empresas que a contrata para tanto. Nesse sentido, a empresa responsável pelo recrutamento e seleção não estabelece qualquer vínculo com o empregado, apenas atua como um agente que presta o serviço de recrutar e selecionar candidatos às vagas de emprego disponibilizadas pela empresa interessada em contratar mão de obra. O contrato de trabalho, neste caso, será celebrado diretamente entre o empregado e a empresa que contratou o serviço de recrutamento e seleção, sendo, inclusive, um contrato de trabalho por prazo determinado ou indeterminado nos moldes da CLT, não se confundindo com o contrato de trabalho temporário que tem características próprias (LONGEN, 2016).

 

2 O REGIME TRIBUTÁRIO APLICÁVEL ÀS EMPRESAS DE TRABALHO TEMPORÁRIO NO QUE TANGE AO ISS

O regime tributário aplicável às empresas de trabalho temporário é diverso daquele que é aplicado às agências de recrutamento, seleção e colocação de mão de obra no que se refere ao ISSQN.

As notas fiscais emitidas pelas empresas de trabalho temporário apresentam como itens de serviço, além da taxa de administração, que é o valor da efetiva prestação de serviço, os salários dos empregados e os encargos sociais. Já as notas ficais emitidas pelas empresas que realizam o recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão de obra, apresentam um único item de serviço na descriminação dos serviços prestados, que é a taxa de agenciamento.

Importante enfatizar que, apesar de o serviço prestado pela empresa de trabalho temporário ser o de intermediar a relação de trabalho temporário, recebendo por isto uma remuneração a cargo da Taxa de Administração, deve ela cumprir com as obrigações acessórias de emitir nota fiscal de serviços fazendo constar os valores das receitas de salários a serem pagos aos empregados e os encargos sociais. Isto ocorre porque a empresa tem o dever de informar as referidas receitas que, na realidade, não são receitas tributáveis porque são o faturamento receita bruta já que entram no caixa da empresa, ainda que temporariamente, devendo ser discriminadas.

É notório que, o que recebe a empresa por colocar os empregados à disposição da empresas tomadoras corresponde à sua receita tributável, ou seja, só pode ser levada em conta, para fins tributários, a Taxa de Administração. Isso se dá, até mesmo em razão de ser a empresa de trabalho temporário uma depositária dos valores relativos à remuneração dos empregados, que sai diretamente dos cofres da empresa tomadora para serem repassados aos empregados por intermédio da empresa de fornecimento de mão de obra temporária.

A obrigação da empresa de trabalho temporário de emitir as notas fiscais segundo esses critérios decorre da lei, já que os direitos trabalhistas assegurados aos empregados ficam a cargo da empresa que fornece a mão de obra temporária, entretanto, os valores a eles relativos são pagos pela empresa tomadora do serviço. Nesse sentido deixa clara a Lei nº 6.019 de 1974 em seus artigos 11 e 12.

Os trabalhadores temporários não são empregados da empresa de fornecimento de mão de obra temporária, o que deixa claro, mais uma vez, a natureza do serviço prestado pela mesma, que é o de intermediação da contratação temporária entre tomadora de serviço e trabalhador temporário. Corrobora esse entendimento, Modesto (2013) afirma que: “Ao fim do contrato temporário os trabalhadores perdem seu vínculo com a empresa de trabalho temporário. Por derradeiro, a empresa de trabalho temporário é proibida de ter trabalhadores temporários em seu quadro de empregados”. (MODESTO, 2013).

Assevera-se que, tanto na empresa de trabalho temporário quanto nas agências de recrutamento, seleção e colocação de mão de obra, o valor pago pela prestação do serviço é o relativo à Taxa de Administração e Taxa de Agenciamento, respectivamente. Sendo, a única diferença aquela relativa à discriminação dos itens de serviço quando da obrigação acessória de emissão da nota fiscal.

Para fins de tributação do ISS e dos demais tributos retidos na fonte (IRPF, CSLL, PIS, COFINS e INSS), há grande controvérsia acerca do preço do serviço prestado pela empresa que fornece a mão de obra temporária, pois, a taxa de administração é, efetivamente, o preço do serviço, que corresponde à sua respectiva remuneração. Assim, a base de cálculo só pode ser composta pelo valor da Taxa visto que o restante dos itens de serviço que compõem a receita bruta da empresa nada mais representam do que valores que serão repassados aos trabalhadores e aquelas relativos aos encargos sociais que devem ser recolhidos.

Por receita bruta entende-se tudo aquilo que constitui receita da empresa, mas, imperioso ressaltar que, a receita bruta não é tributável por completo, pois, com relação aos salários e às contribuições sociais, atua a empresa como mera depositária até realizar o repasse e recolhimento respectivos. Portanto, só pode ser tributado o preço do serviço efetivamente prestado, que é a remuneração por meio da comissão recebida pela empresa de trabalho temporário.

De forma inteligível fica evidente que a base de cálculo do ISS é composta somente pela Taxa de Administração, sendo correto o entendimento posto que baseado no artigo 7° da Lei Complementar 116/2003, que dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza: “A base de cálculo do imposto é o preço do serviço”.

De forma inovadora, proferiu o Superior Tribunal de Justiça, por meio de Recurso Repetitivo, decisão no RESP n° 1.138.205/PR, julgado em dezembro de 2009 e transitado em julgado em março de 2013, a saber, firmando entendimento acerca do qual a base de cálculo do ISS para a atividade de fornecimento de mão de obra temporária deve ser composta por três itens: valor da remuneração do trabalhador temporário, encargos sociais e trabalhistas a eles inerentes e o valor da comissão devida pela intermediação da contratação. Tal entendimento, todavia, não merece prosperar.

O acórdão do referido Recurso Especial cometeu alguns equívocos que acabam por imprimir interpretação errônea da atividade de fornecimento de mão de obra temporária, acarretando-lhe tributação excessiva e abusiva.

Na primeira parte do acórdão o julgamento se manteve correto quanto à base de cálculo do ISS das empresas de trabalho temporário com base apenas na taxa de agenciamento que o valor verdadeiro do serviço. Todavia, em segundo momento, de forma incorreta entendeu que a empresa fornecedora de mão de obra temporária pode ser considerada como prestadora do próprio serviço, utilizando-se de empregados a ela vinculados por contrato de trabalho, devendo, a partir disto, compor a base e cálculo do ISS tanto a taxa de agenciamento, como a remuneração dos empregados e encargos sociais. Tal hipótese levantada pelo E. STJ é inconcebível frente à ausência de previsão legal desta última modalidade de prestação de serviço temporário, não podendo a fornecedora de mão de obra temporária, nos termos do artigo 12, inciso II, do Decreto nº 73.841/74, regulamentador da Lei nº 6.019/74, ter ou utilizar em seus serviços trabalhador temporário. Nesse norte, discorda do posicionamento adotado o Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, José Augusto Delgado (2014):

“O acórdão em referência reafirmou, primeiramente, de forma correta, o entendimento já pacificado pelo STJ no sentido de que as empresas de trabalho temporário, segundo o regime da Lei n. 6.019, de 3 de janeiro de 1974, devem pagar o ISS aos Municípios competentes para a sua exigência, tendo como base de cálculo o valor recebido como taxa de agenciamento que é o verdadeiro preço do serviço.

Em segundo plano, de forma incorreta, entendeu que a empresa de agenciamento de mão de obra temporária pode ser considerada como prestadora do próprio serviço, utilizando-se de empregados a ela vinculados por contrato de trabalho, hipótese em que a base de cálculo do ISS deve ser a soma do valor cobrado pela mediação, dos valores pagos aos empregados pela remuneração ajustada e dos encargos sociais.

A segunda situação construída pelo acórdão não contém previsão legal. O equivocado entendimento do STJ desrespeitou a proibição legal prevista no artigo 12, inciso II, do Decreto n. 73.841/74 (“ter ou utilizar em seus serviços trabalhador temporário […]”). O que tornou ilegal a segunda parte do recurso repetitivo”. (DELGADO, 2014).

Para melhor explanação, cumpre ressaltar que só existe uma modalidade de empresa de trabalho temporário, que é regulamentada pela Lei nº 6.019/74, como visto anteriormente. Essa empresa atua como intermediadora entre o trabalhador temporário e a empresa tomadora do serviço, mediante uma taxa de remuneração. Esse tipo de empresa não pode ter ou utilizar em seus serviços, trabalhador temporário, ou seja, não pode contratar diretamente, razão pela qual os trabalhadores temporários que a ela se vinculam, o fazem por meio de contrato que prevê que sejam assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários do trabalhador quando contratado por uma tomadora de serviços por intermédio da empresa de trabalho temporário.

Assim, a determinação da base de cálculo do ISS com inclusão da remuneração do trabalhador temporário e as contribuições sociais em razão de ter a empresa de trabalho temporário um contrato firmado com o trabalhador temporário, conforme os citados artigos 4º, 11, 15, 16,19, é consequência de uma interpretação totalmente incorreta da Lei nº 6.019/74. Esse contrato firmado entre o trabalhador temporário e a empresa de trabalho temporário é apenas para assegurar os direitos trabalhistas do trabalhador, mas, não se trata de um contrato de trabalho firmado entre as partes. Até mesmo porque, tal atividade é vedada pelo Decreto nº 73.841/74, que regulamenta a Lei nº 6.019/74. Esse contrato é requisito essencial para a atividade de fornecimento de mão de obra temporária ser exercida conforme os padrões exigidos pelo Ministério do Trabalho, todavia, isso não desqualifica a natureza da empresa de trabalho temporário que continua sendo aquela responsável por colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos.

Assim, a decisão proferida no REsp, citou como primeira hipótese de empresa de fornecimento de mão de obra temporária aquela que exerce atividade de recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão de obra, o que nada tem a ver com empresa de trabalho temporário. Essa atividade está descrita no item 17.04 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que determina as atividades sobre as quais incide o ISS. Mas, a atividade descrita no item 17.05 é a que verdadeiramente representa a atividade exercida pelas empresas de trabalho temporário. Veja-se:

“Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003

17.04 – Recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão-de-obra.

17.05 – Fornecimento de mão-de-obra, mesmo em caráter temporário, inclusive de empregados ou trabalhadores, avulsos ou temporários, contratados pelo prestador de serviço”.

 

É com acerto que o E. STJ reconhece a incidência do ISS sobre a base de cálculo composta apenas pela Taxa de Agenciamento no que tange às empresas de recrutamento, pois, esse é o preço do serviço prestado, além de ser o único item descrito na nota fiscal emitida por essa modalidade de empresas.  Mas, essas empresas são, verdadeiramente, agências, em nada se confundindo com as empresas de trabalho temporário, assim, a referência a essas empresas no r. acórdão resultou totalmente inadequada.

Já a atividade do item 17.05 da Lista de Serviços trata da empresa de trabalho temporário, que fornece mão de obra para a contratação temporária, sendo, portanto, o objeto do presente estudo. Essas empresas recebem sua comissão pela intermediação da contratação do trabalhador temporário, mas, para tanto deve seguir os padrões exigidos pela Lei 6.019 e seu Decreto regulamentar. Dentre esses padrões está a exigência da celebração de um contrato entre o trabalhador temporário e a empresa de trabalho temporário, contrato este que é celebrado quando o trabalhador é contratado pela tomadora de serviços e que tem vigência até o fim do período máximo de trabalho temporário, mas que nada tem a ver com um contrato de trabalho o que é proibido a essas empresas. Ainda, a missão de notas fiscais de serviço por essas empresas deve ter como itens de serviço além da taxa de administração, a remuneração do trabalhador e os encargos sociais, entretanto, essa é apenas uma obrigação acessória exigida dessas empresas, pois, tanto os salários quanto as contribuições sociais correm a cargo da empresa tomadora do serviço que faz da fornecedora de mão de obra sua depositária, a qual, por sua vez, realiza o repasse e recolhimento desses valores.

Nesse norte, o valor do serviço prestado pelas empresas fornecedoras de mão de obra temporária, que é a intermediação entre tomadora e trabalhador temporário, é o relativo à taxa de administração. Essa comissão é o que corresponde à receita tributável das empresas de trabalho temporário, e, por ser o preço do serviço, deve ser a base de cálculo do ISS sobre a referida prestação de serviço.

Diante do exposto, fica clara a base de cálculo a ser levada em conta para fins de tributação de ISS das empresas fornecedoras de mão de obra temporária, resultando em estapafúrdio equívoco a tributação do valor total da nota fiscal de serviço emitido por essas empresas.

 

3  A INVIABILIDADE DA ATIVIDADE EXERCIDA PELAS EMPRESAS DE TRABALHO TEMPORÁRIO FRENTE À TRIBUTAÇÃO DO ISS

As empresas de trabalho temporário têm grande importância no cenário nacional para a redução da taxa de desemprego, atuando no crescimento e desenvolvimento do País. Essa importante atividade é uma forma de flexibilização do direito do trabalho, não podendo ser jogada a escanteio sob a alegação de ser uma ameaça aos diretos dos trabalhadores, o que sequer é verdade, pois, por meio dessa facilidade de contratação muitas pessoas desempregadas conseguem se manter financeiramente, ainda que por curto prazo, em épocas de crises quando a dificuldade de as empresas manterem um quadro fixo de funcionários é grande.

A doutrinadora Alice Monteiro de Barros cita ainda outras vantagens do trabalho temporário, o qual só pode ser exercido por meio das empresas de fornecimento de mão de obra temporária:

“O trabalho temporário poderá constituir uma forma de trabalho flexível para as pessoas que, com responsabilidades familiares ou escolares, não querem ou não podem se dedicar a um trabalho permanente. Faculta-se a elas trabalharem nos períodos que mais lhes convier.

O sistema difundiu-se pelos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Sua regulamentação traduz uma exigência para evitar abusos e assegurar aos trabalhadores temporários as garantias sociais mínimas conferidas aos trabalhadores permanentes. (BARROS, 2016)”.

As empresas de fornecimento de mão de obra temporária encontram na atualidade grandes dificuldades para se manterem ativas no Brasil, isso porque a falta de segurança jurídica e as interpretações descabidas da legislação trabalhista e tributária acabam atravancando a atividade. Resta solarmente aclarada a dificuldade enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça em interpretar de forma correta a legislação pertinente às empresas de trabalho temporário, refletindo, consequentemente, na errônea aplicação da legislação tributária aplicável, o que não pode ser tolerado. O contribuinte sofre duras penas em razão de situações como essas evidenciadas pelo julgamento do Recurso Especial n° 1.138.205/PR, de relatoria do Ministro Luiz Fux.

A confusão entre o que comporia o preço do serviço prestado pelas empresas de trabalho temporário acaba por tornar a atividade inviável, pois, o recolhimento do ISS sobre o valor total da nota fiscal resulta em um valor consideralmente maior do que se o tributo fosse calculado somente sobre o valor da taxa de administração. Esse aumento considerável da base de cálculo da tributação faz com que o lucro auferido pelas empresas de fornecimento de mão de obra caia expressivamente, desestimulando o setor da atividade. Isso sem contar com a avassaladora tributação de Imposto de Renda, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, PIS e COFINS, todos com inclusão na base de cálculo do valor total da nota fiscal de prestação de serviço.

Os reflexos da tributação do ISS sobre uma base de cálculo incorreta, provocando um recolhimento de imposto que impede o próprio desenvolvimento da atividade acarretará o fim do referido setor de empresas de trabalho temporário, ferindo diretamente milhares de brasileiros que se valem dessa atividade para conseguir trabalho.

A proposta é de que seja feita uma reformulação na legislação que rege as empresas de trabalho temporário a fim de deixar claro o exercício da atividade, bem como todos os requisitos necessários para o cumprimento de seus fins, dirimindo as inúmeras controvérsias que daí surgem, deixando claro que a comissão recebida pela intermediação entre trabalhador temporário e tomadora de serviço é o valor do serviço prestado. Paliativamente, vislumbra-se necessária uma iniciativa do Estado criando incentivos tributários para tais empresas, como, por exemplo, a redução da alíquota do ISS para a referida atividade.

 

Conclusão

Ante uma profunda análise da legislação que rege a atividade das empresas de trabalho temporário no Brasil, pode-se concluir que o serviço prestado por essas empresas, adstritas a específicas exigências para seu funcionamento, é de intermediação, colocando à disposição das empresas tomadoras de serviços, trabalhadores temporários. A Lei n° 6.019/74 e o Decreto n° 73.841/74 deixam claro que não há qualquer possibilidade de a empresa de fornecimento de Mao de obra temporária ter ou utilizar em seus serviços trabalhador temporário, evidenciando a ausência de vínculo trabalhistas com o trabalhador temporário, confirmando o efetivo serviço prestado por elas, que, nada mais é do que o de intermediar a contratação do trabalhador temporário pela tomadora de serviços.

Dito isto, parte-se para a análise da decisão do RESP n° 1.138.205/PR, o qual, erroneamente, firma entendimento sobre o qual estariam inclusos na base de cálculo do ISS os valores referentes à remuneração dos empregados e os encargos sociais. Tal entendimento é totalmente descabido, pois, a remuneração e os encargos sociais não compõem o preço do serviço prestado pela empresa de trabalho temporário, são eles apenas itens constantes da nota fiscal de serviço por força de determinação legal que regulamenta a atividade já que a empresa de trabalho temporário atua como depositária desses valores pagos pela tomadora de serviço a serem repassados aos trabalhadores e recolhidos para fins de contribuição, respectivamente. O valor total da nota fiscal de serviço não pode ser utilizado como base de cálculo do ISS, mas somente o valor da taxa de administração.

Esse entendimento do Superior Tribunal de Justiça ocasiona o aumento substancial da tributação suportada pelas empresas de fornecimento de mão de obra temporária, o que refletirá diretamente em um colapso da atividade posto que esta se torna inviável face à excessiva tributação. É indubitável que um colapso nesse setor de empresas acabará por retirar os benefícios que milhares de brasileiros recebem em virtude da contratação temporária, elevando-se, assim, o número de brasileiros desempregados e sem meios de prover suas necessidades financeiras.

Tal composição da base de cálculo do ISS sobre a atividade das empresas de trabalho temporário não pode prosperar, devendo a legislação regente da mesma ser alterada, facilitando o entendimento acerca do funcionamento dessas empresas e de suas atividades, fixando como serviço prestado a simples intermediação por colocar à disposição das empresas tomadoras de serviços, os trabalhadores temporários. Visando imediatamente a manutenção dessas empresas em atividade, seria extremamente eficaz a concessão de incentivos fiscais a elas, como a redução da alíquota do ISS para o setor.

 

Referências

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10ª Ed., São Paulo: LTr, 2016.

BRASIL. Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974.

BRASIL, Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

DELGADO, José Augusto. É inconstitucional o ISS prejudicar a geração de emprego temporário. Publicado em 29/09/2014. Disponível em: <https://salariobr.com/Artigos/E-inconstitucional-o-ISS-prejudicar-a-geracao-de-emprego-temporario-diz-Ministro/2636>. Visto em: 20/12/2016.

DELGADO, Maurício Coutinho. Curso de Direito do Trabalho. 15ª Ed., São Paulo: LTr, 2016.

MODESTO, Vagner Cristiano. Tributos da mão de obra temporária. Publicado em 18/01/2013. Disponível em: <http://www.salariobr.com.br/Artigos/Tributos-da-mao-de-obra-temporaria/198>. Acesso em 20/12/2016.

Âmbito Jurídico

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