Com a edição da Lei Complementar no 105, de 10 de janeiro de 2001, o debate acerca do sigilo bancário assumiu proporções não experimentadas anteriormente. Pelo menos três ações diretas de inconstitucionalidade foram propostas perante o Supremo Tribunal Federal perseguindo o afastamento da ordem jurídica nacional de vários dispositivos do citado diploma legal 1.
De um lado, a Secretaria da Receita Federal divulga dados estarrecedores2, tais como:
(a) 62 pessoas físicas que declararam perante a Receita Federal suas condições de isentas de imposto de renda tiveram movimentação financeira anual acima de R$ 10 milhões, totalizando R$ 11,03 bilhões;
(b) 139 pessoas físicas omissas perante a Receita Federal tiveram movimentação financeira anual acima de R$ 10 milhões, totalizando R$ 28,92 bilhões;
(c) 45 pessoas jurídicas incluídas no SIMPLES (pressupõe receita bruta anual inferior a R$ 120 mil) tiveram movimentação financeira anual acima de R$ 100 milhões, totalizando R$ 53,21 bilhões;
(d) 46 pessoas jurídicas que declararam perante a Receita Federal suas condições de isentas de imposto de renda tiveram movimentação financeira anual acima de R$ 100 milhões, totalizando R$ 18,39 bilhões;
(e) 139 pessoas jurídicas omissas perante a Receita Federal tiveram movimentação financeira anual acima de R$ 100 milhões, totalizando R$ 70,96 bilhões.
Ainda nesta linha, existe um nítido movimento internacional no sentido da flexibilização do sigilo bancário sem intermediação do Poder Judiciário. As razões justificadoras desta tendência, envolvendo países como os Estados Unidos3, a Espanha4, a França5, a Bélgica6, a Holanda7, entre outros, repousam na necessidade de combate à lavagem de dinheiro oriundo de práticas criminosas8 e de viabilização, em novos patamares, da fiscalização e arrecadação tributárias.
Por outro lado, importantes vozes do empresariado e dos meios jurídicos manifestam veemente irresignação contra o que seria a “quebra” do sigilo bancário em afronta aos direitos de intimidade, vida privada e sigilo de dados, todos consagrados na Constituição (art. 5o, incisos X e XII) 9.
Uma das objeções levantadas, justamente aquela construída a partir do sigilo de dados (art. 5o, inciso XII da Constituição), perde força e consistência continuamente com o avanço das discussões. Afirma-se, com acerto, que a Carta Magna inviabiliza a interceptação da comunicação de dados, mas não proíbe o acesso aos dados em si, mediante o emprego dos procedimentos adequados10. Prevalecendo uma interpretação literal do dispositivo em questão, não seria possível acessar qualquer tipo de informação (não só fiscal), mesmo com intervenção judicial, somente necessária e possível para afastar a inviolabilidade nos casos de comunicação telefônica. Nesta despropositada linha de raciocínio, todo e qualquer dado, em qualquer meio ou veículo, estaria imune ao conhecimento alheio (do Fisco ou de quem quer que seja). Trata-se de uma conclusão absurda, que deve ser afastada do palco dos debates. Uma das mais insólitas conseqüências desta definição seria a impossibilidade do Fisco conhecer de livros e documentos fiscais nos estabelecimentos dos contribuintes por estar transgredindo a suposta inviolabilidade dos dados, referidos genericamente pela norma, sem qualquer restrição quanto à natureza, qualidade ou local de armazenamento.
O âmago da polêmica estabelecida, no entanto, gira em torno dos direitos à incolumidade da intimidade e da vida privada (art. 5o, inciso X da Constituição). Curiosamente, as manifestações contrárias à dita “quebra” do sigilo bancário não se detêm na análise e demonstração de como o conhecimento de operações bancárias ou financeiras efetivamente afronta os direitos ou garantias antes referidos.
Entendemos que em algumas operações ou situações de natureza financeira seria possível identificar traços ou elementos reveladores da forma de vida, costumes, preferências ou planos das pessoas (esfera de sua conduta e modo de ser não realizada perante a comunidade). Os destinatários de pagamentos, por exemplo, podem indicar o estilo de vida de determinado cidadão. Entretanto, na maior parte das operações bancárias ou financeiras não existe nenhuma, por menor que seja, possibilidade de conhecimento da esfera da vida privada e intimidade de alguém. Vejamos alguns exemplos: depósito à vista realizado pelo próprio titular da conta, resgate em conta de depósito realizado pelo próprio titular da conta, aplicação em fundo de investimento e aquisições de moeda estrangeira. Temos, nestes casos, eventos isolados, objetivos, padrões comerciais impessoais onde emerge, só e somente só, um dado contábil ou quantitativo.
Assim, não assiste razão aos que sustentam não ser o tema constitucional11. De outra banda, também não é possível afirmar ser o tema completamente ou integralmente constitucional. É correto consignar, isto sim, que certas e determinadas operações podem, em função de sua conformação, revelar ou indicar aspectos do modo de vida de alguém. Entretanto, mesmo estas operações somente viabilizam este conhecimento quando vistas além do mero dado quantitativo. Neste círculo limitado, do dado meramente contábil, não há espaço para invasão da intimidade ou privacidade. Um débito em conta corrente, a título de ilustração, tanto pode ter sido realizado para viabilizar uma doação a um moribundo quanto para remunerar o autor material de um crime. O dado numérico em si nada revela em relação ao detentor da conta bancária.
Verificamos, portanto, a inafastável necessidade de confrontar cada tipo de operação bancária ou financeira com os direitos à intimidade e vida privada. Somente o aspecto qualitativo de cada uma delas, até porque o dado numérico ou contábil em si não revela costumes ou preferências pessoais, poderá ter relação com os direitos inscritos na Constituição. A conclusão irrecusável, a partir da análise proposta, aponta para:
(a) ausência de invasão da intimidade ou vida privada nas operações isoladas, objetivas e impessoais;
(b) ausência de violação da intimidade ou vida privada nas operações que envolvem terceiros quando conhecido tão-somente o dado numérico ou contábil nela presente;
(c) possibilidade de ingresso em indicadores da intimidade e vida privada de alguém nas operações que envolvem terceiros quando conhecido o “lado” qualitativo nelas presentes.
Nesta linha de raciocínio, a regra do art. 5o da Lei Complementar no 105/2001 não pode ser inquinada de inconstitucional12. Como as operações bancárias são comunicadas ao Fisco em “… montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados“, conforme cláusula explícita naquele comando legal, não subsiste a menor possibilidade de invasão da intimidade ou vida privada das pessoas com o conhecimento tão-somente de valores, de dados numéricos, frias quantidades.
Toda discussão envolvendo a intimidade e vida privada de pessoas não pode fugir da análise cuidadosa da existência e extensão, se for o caso, destes direitos para as empresas. Observe-se que a Constituição exige autorização judicial para a busca domiciliar (art. 5o, inciso XI) 13. Por outro lado, não subsiste dúvida quanto à possibilidade do Fisco realizar, por sua iniciativa exclusiva e independentemente de autorização, diligências e verificações no ambiente físico dos estabelecimentos empresariais. Portanto, a diferença é flagrante. Admitindo, como admitimos, a manifestação de vida privada nas pessoas jurídicas, consistindo em práticas comerciais específicas, padrões organizatórios, e outros neste rumo, não podemos dar a estas o mesmo status e proteção jurídica da vida privada das pessoas físicas. No sentido destas considerações, o Tribunal Constitucional espanhol distingue a intimidade pessoal da intimidade econômica.
Importa ainda ressaltar que o conhecimento das operações bancárias pelo Fisco não significa quebra do sigilo bancário. A idéia de quebra está relacionada com a comunicação ou informação prestada a terceiros, de forma ampla, dos dados protegidos. Não há quebra quando as informações são transferidas, por razões juridicamente aceitáveis, com a manutenção do traço sigiloso por parte do novo conhecedor. Assim, quando o Fisco toma conhecimento de informações financeiras dos contribuintes não o faz com o intuito ou com o fim de divulgá-las para terceiros. Pelo contrário, todos os agentes fiscais estão obrigados a resguardar as informações manuseadas sob pena responsabilidade penal e administrativa.
Neste ponto é preciso tratar da chamada reserva constitucional de jurisdição. Este seria um postulado no sentido da submissão de determinadas decisões ao âmbito exclusivo de ação dos magistrados. Vários juristas inserem o conhecimento de informações bancárias ou financeiras na referida reserva constitucional. Tal inserção, no entanto, não se sustenta, sequer resistindo ao crivo da análise a partir do próprio texto constitucional e do sistema jurídico por ele inaugurado.
Com efeito, a ordem jurídica pátria estabelece que o Poder Judiciário será competente para apreciar ameaças e lesões a direitos. Assim, em regra, o juiz será chamado para apreciar atos já praticados (mesmo no caso de ameaça, atos indicadores de uma provável lesão de direitos). Não subsiste como atividade normal do magistrado autorizar a prática de atos. Entretanto, para algumas matérias o constituinte entendeu necessária a autorização judicial, dada a relevância dos bens jurídicos envolvidos. Assim, identificamos a necessidade de prévia manifestação judicial para: busca domiciliar (art. 5o, inciso XI), interceptação de comunicações telefônicas (art. 5o, inciso XII) e prisão, fora do flagrante (art. 5o, inciso LXI). Nestes casos, a Constituição expressamente exige a intervenção judicial preliminar. Este aspecto, devemos sublinhar, é fundamental. A reserva constitucional de jurisdição reclama explícita menção, na medida em que foge aos parâmetros normais da atuação judicial14. Em assim sendo, não definiu o constituinte a necessidade de autorização judicial, e somente judicial, para acesso às informações bancárias e financeiras do contribuinte. Ao contrário, a Constituição foi explícita em viabilizar o acesso do Fisco ao patrimônio, aos rendimentos e às atividades econômicas do contribuinte (art. 145, §1o).
A cláusula final do art. 145, §1o da Constituição não reforça a inacessibilidade aos dados bancários ou financeiros, como querem alguns. As expressões “… respeitados os direitos individuais e nos termos da lei,…” procuram resguardar o contribuinte em dois sentidos: (a) para as informações relacionadas com sua vida privada, em relação à não divulgação ou conhecimento amplo das mesmas e (b) na fixação de regras de organização e procedimento das ações fiscais quando voltadas para identificação de manifestações econômicas tributáveis.
Mas as vozes irresignadas insistem em que o Fisco não pode conhecer estas informações. Afirmam, reafirmam, teimam que o acesso às informações financeiras pela Administração Tributária seria o mais claro e nítido caso de “quebra” do sigilo bancário. Vamos admitir esta premissa como verdade, embora não o seja, para efeito de argumentação. Mesmo assim o Fisco teria o poder, e o dever, de pesquisar a vida financeira dos contribuintes. Tal possibilidade está consagrada, como destacamos, explicitamente no art. 145, §1o da Constituição. O dispositivo em foco autoriza a conclusão de que a presença do interesse público relativiza as restrições ao acesso aos fatos de natureza ou conteúdo financeiro reveladores da intimidade ou vida privada.
Se de um lado temos a necessidade de sigilo daquelas informações bancárias reveladoras de intimidade e vida privada, de outro lado temos a necessidade de fiscalização, de apuração da ocorrência de fatos geradores tributários anunciados na própria Constituição. Ademais, somente o amplo e total conhecimento da vida econômica dos contribuintes, hoje majoritariamente financeira, dadas as características da economia moderna, permitirá a efetividade, aqui o discurso é constitucional, de ditames, também constitucionais, como a pessoalidade dos impostos, a capacidade contributiva, a isonomia e livre iniciativa, mediante combate à concorrência desleal daquele que não recolhe a carga tributária devida. Afirme-se, ainda, como absolutamente incompatível com a idéia de Estado Democrático de Direito a possibilidade de tornar inacessíveis atividades econômicas tributáveis, cujos recursos arrecadados via tributação constituem a principal, quiçá, única forma de realização da justiça social.
Assim, diante de um confronto de interesses, bens ou valores constitucionais é preciso realizar o chamado sopesamento ou avaliação ponderada dos fins, conforme construção da doutrina constitucional alemã. Ao buscar a convivência de vetores constitucionais em sentidos contrários, o jurista terá de afastar ou diminuir a força de um deles, sem aniquilá-lo, para viabilizar a realização do outro15. O exemplo mais eloqüente deste expediente na prática constitucional brasileira foi efetivado pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade no 1.790-DF16. Neste precedente, importantíssimo para os rumos do debate acerca da extensão do sigilo bancário, o Excelso Pretório firmou a premissa de que é juridicamente possível a convivência da privacidade com os “arquivos de consumo” amplamente utilizados no mercado. Portanto, diante desta decisão do Supremo, subsiste, sem resposta, a seguinte pergunta: por que a formação e utilização dos chamados “arquivos de consumo” pode conviver com os direitos à intimidade e vida privada e a transferência criteriosa e sigilosa de informações financeiras para o Fisco não pode? Qualificamos propositalmente de criteriosa e sigilosa a transferência das informações financeiras para o Fisco porque no âmbito da constituição e manuseio dos tais “arquivos de consumo” não verificamos estes rigores. Em regra, qualquer caixa ou atendente de uma loja comercial tem acesso imediato, “on-line”, instantâneo, em tempo real a uma multidão de dados financeiros do cliente (ou possível cliente). Entre estes dados podemos encontrar: endereços, telefones, contas bancárias, saldos médios, patrimônio mobiliário e imobiliário, níveis de crédito na praça, os últimos contratos de compra e venda realizados no mercado, cartões de créditos, etc, etc, etc.
Como argumento definitivo em favor do acesso pelo Fisco às informações em comento, temos que estas simplesmente atestam ou confirmam as declarações já apresentadas pelo contribuinte. Afinal, existe a obrigação deste de comunicar ao Fisco uma série considerável de dados relevantes, inclusive saldos bancários ao final do exercício. Ademais, parece completamente despropositado que a fiscalização possa levantar, in loco, todos as informações fundamentais de uma empresa, vistoriando livros, documentos, estoques, entre outros, e não possa fazer o mesmo no âmbito dos eventos financeiros.
Resta fora de dúvida, portanto, a constitucionalidade do art. 6o da Lei Complementar no 105/2001 ao permitir o acesso das autoridades e dos agentes fiscais aos documentos, livros e registros de instituições financeiras quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Embora a jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal não tenha uma posição definitiva sobre o acesso direto pelo Fisco às informações bancárias, vislumbramos, no conjunto de decisões já proferidas, com relação direta e indireta ao assunto, uma nítida tendência no sentido de chancelar a constitucionalidade da Lei Complementar no 105/2001. Notadamente, as decisões no sentido da previsão explícita das reservas constitucionais de jurisdição e da convivência entre a proteção da privacidade e os chamados arquivos de consumo (bancos de dados fundamentais para a economia da sociedade de massas).
Concluímos, lembrando Sérgio Carlos Covello e sintetizando a argumentação realizada, “banco não é esconderijo”.
NOTAS
1 Ações Diretas de Inconstitucionalidade nos 2386, 2390 e 2397.
2 Informação para a imprensa no 123, de 2000. Secretaria da Receita Federal. Análise estatística do cruzamento de informações da CPMF e do Imposto de Renda.
3 “Os Estados Unidos são o protótipo do Estado Liberal, entretanto, por questões fiscais, toda a operação bancária que envolva quantia superior a US$ 10.000,00 (dez mil dólares) deve ser imediatamente comunicada ao Tesouro.” (ROQUE, Maria José Oliveira Lima. Sigilo Bancário e Direito à Intimidade. Curitiba: Juruá Editora, 2001, p. 99)
4 “Na Espanha os Bancos são obrigados a encaminhar ao Ministério da Fazenda, no início do ano, a relação de suas contas correntes e valores mobiliários, além de prestar outras informações necessárias para fins de tributação.” (ROQUE, Maria José Oliveira Lima. Sigilo Bancário e Direito à Intimidade. Curitiba: Juruá Editora, 2001, p. 105)
5 “Na França, o Código Geral de Impostos e outras leis permitem que os agentes fiscais franceses tenham acesso a documentos confidenciais em poder das empresas privadas, como Bancos e estabelecimentos congêneres, sendo vedado, nos termos do art. 2.006, revelar a terceiros as informações obtidas a respeito da situação patrimonial do contribuinte.” (ROQUE, Maria José Oliveira Lima. Sigilo Bancário e Direito à Intimidade. Curitiba: Juruá Editora, 2001, p. 104)
6 “Na Bélgica, a Lei de 20.11.62, que procedeu a reforma tributária, outorgou à administração a faculdade de requisitar informações às instituições financeiras sobre a situação econômica, operações realizadas e saldo das contas dos contribuintes. Existe também a Lei de 06.10.44 que obriga os Bancos a comunicarem, por lista nominal, ao Banco Nacional e à Comissão Bancária todos os créditos e empréstimos no valor igual ou superior a um milhão de francos. Também na Alemanha o sigilo bancário desaparece ante as autoridades fiscais.” (ROQUE, Maria José Oliveira Lima. Sigilo Bancário e Direito à Intimidade. Curitiba: Juruá Editora, 2001, p. 104)
7 “Na Holanda, a situação é semelhante. A Lei Geral de Contribuições ao Estado, de 02.07.59, dispõe expressamente que os Bancos não podem opor-se ao fornecimento de informações ao fisco.” (ROQUE, Maria José Oliveira Lima. Sigilo Bancário e Direito à Intimidade. Curitiba: Juruá Editora, 2001, p. 104)
8 Segundo estimativas das Nações Unidas, o comércio mundial de drogas ilegais atinge US$ 500 bilhões anuais gerando um gigantesco movimento de lavagem financeira de dinheiro que envolve mais de 1 milhão de empresas-laranja. Já segundo o FMI, cerca de 8% das transações financeiras internacionais são realizadas com dinheiro proveniente da economia ilegal.
9 “Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(…)
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(…)
XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”
10 “Não entendo que se cuide de garantia com status constitucional. Não se trata da ‘intimidade’ protegida no inciso X do art. 5o da Constituição Federal. Da minha leitura, no inciso XII da Lei Fundamental, o que se protege, e de modo absoluto, até em relação ao Poder Judiciário, é a comunicação ‘de dados’ e não os ‘dados’, o que tornaria impossível qualquer investigação administrativa, fosse qual fosse”. Trecho do voto do Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE no Mandado de Segurança no 21.429-4-DF.
“Passa-se, aqui, que o inciso XII não está tornando inviolável o dado da correspondência, da comunicação, do telegrama. Ele está proibindo a interceptação da comunicação dos dados, não dos resultados. Essa é a razão pela qual a única interceptação que se permite é a telefônica, pois é a única a não deixar vestígios, ao passo que nas comunicações por correspondência telegráfica e de dados é proibida a interceptação porque os dados remanescem; eles não são rigorosamente sigilosos, dependem da interpretação infraconstitucional para poderem ser abertos. O que é vedado de forma absoluta é a interceptação da comunicação da correspondência, do telegrama. Por que a Constituição permitiu a interceptação da Comunicação telefônica? Para manter os dados, já que é a única em que, esgotando-se a comunicação, desaparecem os dados. Nas demais, não se permite porque os dados remanescem, ficam no computador, nas correspondências etc”. Trecho do voto do Ministro NELSON JOBIM no Recurso Extraordinário no 219.780-PE.
11 “A quebra do sigilo bancário não afronta o artigo 5.-X e XII da Constituição Federal (Precedente: PET. 577)”. STF. Pleno. Agravo Regimental em Inquérito no 897-DF. Relator Ministro FRANCISCO REZEK.
“Parece-me, antes de qualquer coisa que a questão jurídica trazida à Corte neste mandado de segurança não tem estrutura constitucional. Tudo quanto se estampa na própria Carta de 1988 são normas que abrem espaço ao tratamento de determinados temas pela legislação complementar. É neste terreno, pois, e não daquele da Constituição da República, que se consagra o instituto do sigilo bancário – do qual se repetiu ad nauseam, neste país e noutros, que não tem caráter absoluto”. Trecho do voto do Ministro FRANCISCO REZEK no Mandado de Segurança no 21.429-4-DF.
12 “Art. 5o O Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços.
§ 1o Consideram-se operações financeiras, para os efeitos deste artigo:
I – depósitos à vista e a prazo, inclusive em conta de poupança;
II – pagamentos efetuados em moeda corrente ou em cheques;
III – emissão de ordens de crédito ou documentos assemelhados;
IV – resgates em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de poupança;
V – contratos de mútuo;
VI – descontos de duplicatas, notas promissórias e outros títulos de crédito;
VII – aquisições e vendas de títulos de renda fixa ou variável;
VIII – aplicações em fundos de investimentos;
IX – aquisições de moeda estrangeira;
X – conversões de moeda estrangeira em moeda nacional;
XI – transferências de moeda e outros valores para o exterior;
XII – operações com ouro, ativo financeiro;
XIII – operações com cartão de crédito;
XIV – operações de arrendamento mercantil; e
XV – quaisquer outras operações de natureza semelhante que venham a ser autorizadas pelo Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliários ou outro órgão competente.
§ 2o As informações transferidas na forma do caput deste artigo restringir-se-ão a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados.
§ 3o Não se incluem entre as informações de que trata este artigo as operações financeiras efetuadas pelas administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
§ 4o Recebidas as informações de que trata este artigo, se detectados indícios de falhas, incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, a autoridade interessada poderá requisitar as informações e os documentos de que necessitar, bem como realizar fiscalização ou auditoria para a adequada apuração dos fatos.
§ 5o As informações a que refere este artigo serão conservadas sob sigilo fiscal, na forma da legislação em vigor.”
13 “XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;”
14 “O postulado da reserva constitucional de jurisdição importa em submeter, à esfera única de decisão dos magistrados, a prática de determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação constante do próprio texto da Carta Política, somente pode emanar do juiz, e não de terceiros, inclusive daqueles a quem se haja eventualmente atribuído o exercício de ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais´. A cláusula constitucional da reserva de jurisdição – que incide sobre determinadas matérias, como a busca domiciliar (CF, art. 5o, XI), a interceptação telefônica (CF, art. 5o, XII) e a flagrância (CF, art. 5o, LXI) – traduz a noção de que, nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo-se, desse modo, por força e autoridade do que dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado.” Destacamos. STF. Pleno. Mandado de Segurança no 23.452-RJ. Relator Ministro CELSO DE MELLO.
15 “Se é certo que o sigilo bancário, que é espécie de direito à privacidade, que a Constituição protege no art. 5o, X não é um direito absoluto, que deve ceder diante do interesse público, do interesse social e do interesse da Justiça, certo é, também, que ele há de ceder na forma e com observância de procedimento estabelecido em lei e com respeito ao princípio da razoabilidade”. STF. 2a. Turma. Recurso Extraordinário no 219.780-PE. Relator Ministro CARLOS VELLOSO.
16 “3. A convivência entre a proteção da privacidade e os chamados arquivos de consumo, mantidos pelo próprio fornecedor de crédito ou integrados em bancos de dados, tornou-se um imperativo da economia da sociedade de massas: de viabilizá-la cuidou o CDC, segundo o molde das legislações mais avançadas: ao sistema instituído pelo Código de Defesa do Consumidor para prevenir ou reprimir abusos dos arquivos de consumo, hão de submeter-se as informações sobre os protestos lavrados, uma vez obtidas na forma prevista no edito impugnado e integradas aos bancos de dados das entidades credenciadas à certidão diária de que se cuida: é o bastante a tornar duvidosa a densidade jurídica do apelo da argüição à garantia da privacidade, que há de harmonizar-se à existência de bancos de dados pessoais, cuja realidade a própria Constituição reconhece (art. 5o, LXXII, in fine) e entre os quais os arquivos de consumo são um dado inextirpável da economia fundada nas relações massificadas de crédito”. STF. Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade no 1.790-DF. Relator Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE.
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