Resumo: Este trabalho trata da questão da utilização do instituto da exceção de pré-executividade, construção doutrinária existente no direito pátrio que tem por objeto atacar a validade do processo de execução quando da falta de um de seus pressupostos para sua propositura, e mais propriamente da utilização de tal instituto na execução fiscal, ou seja, na ação executória que o Estado move em face do suposto contribuinte devedor, visando constranger seu patrimônio. Neste sentido, observadas as peculiaridades concedidas ao Estado na qualidade de pólo ativo da ação de execução, bem como as características inerentes a ele quanto ao tratamento de seus bens e ao ressarcimento aos particulares quando verifica-se que a constrição patrimonial foi indevida ou irregular, nota-se claramente a necessidade da utilização da exceção de pré-executividade a fim de evitar-se tanto a execução infundada, e o conseqüente prejuízo havido pelo réu da ação, quanto a utilização posterior do Judiciário a fim de restaurar a situação de fato havida antes da ação executória.
Palavras chave: exceção de pré-executividade, processo de execução.
Abstract: This thesis deals with the matter of the use of the institute of exceção de pré-executividade, doctrinal construction existent in local right whose goal is to attack the validity of the execution process when not present one or more of its rights of action, specifically the use of such institute in fiscal execution, that is, in the executive action that the State sue the supposed debtor in order to constraint his patrimony. For that matter, observed the peculiarities given to the State in its plaintiffs attribute of the execution process, as well the characteristics inherent to it about the treatment of its assets and the indemnification to private persons when verified that the improper or irregular patrimony constraint, clearly observed the necessary use of the exceção de pré-executividade, in order to avoid the footless execution and the consequent loss supported by the actions defendant, as well the use of court in order to restore the facts previous to the fiscal execution.
Key words: exceção de pré-executividade, execution process
Sumário: 1.A Exceção de Pré-Executividade. 2. Efeitos da Decisão e Recursos. 3. A Exceção de Pré-Executividade e os Embargos. 4. A Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal 5. Conclusão. Bibliografia
1. A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE
O presente artigo traz um enfoque direto a respeito de um instrumento processual bastante utilizado nos dias de hoje, qual seja, a exceção de pré-executividade. Em tese, na execução, o devedor não pode defender-se diretamente da tentativa de constrição de seu patrimônio sem antes garantir o juízo. Não pode, portanto, evitar o pagamento provando que já pagou a dívida, ou que esta está prescrita, por exemplo, pois, nos termos da legislação processual, tais matérias somente poderão ser argüidas após a penhora.
Todavia, as diretrizes emanadas do Código de Processo Civil vêm sendo paulatinamente mitigadas, em virtude de diversas manifestações doutrinárias e jurisprudenciais, advindas neste último caso principalmente dos Tribunais Superiores, no sentido da aceitação da oposição do instituto em apreço.
Desta forma, forçoso perceber que a regra emanada do diploma legal comporta exceções. O pagamento da dívida ou a prescrição, por exemplo, devem retirar do título sua certeza e exigibilidade, por serem pressupostos indispensáveis para propositura do procedimento de execução. Nestas hipóteses, não há que se conceber a invasão da esfera patrimonial de pessoa que já cumpriu obrigação ou que não mais esta obrigada a cumpri-la, via procedimento judicial.
Assim sendo, deve-se entender possível, ou mesmo necessária, a argüição de tais matérias em sede de “exceção de pré-executividade”, ou “oposição pré-processual”, conceituado como o incidente processual que tem por objeto requerer a nulidade da execução por falta de um de seus pressupostos processuais, ou seja, deduzindo matérias de ordem pública, que devem ser apresentadas através de prova pré-constituída prima facie, suspendendo, portanto, a execução e evitando a constrição patrimonial do devedor. Cabe frisar, neste particular, que a palavra “exceção” possui, no contexto analisado, o sentido de “defesa”.
Iniciada a execução que não preencha os requisitos legais, a intromissão do Estado no patrimônio do devedor passa a ser ato ilegal, pois priva o particular de seus bens sem observância do devido processo legal, assegurado pelo artigo 5º, LIV, da Constituição Federal. Portanto, através de simples petição, pode-se declarar a ausência dos requisitos que geram a nulidade da execução, nos próprios autos, via de regra a qualquer momento.
Observado o preceituado no artigo 616 do Código de Processo Civil, havendo vícios ou irregularidades sanáveis na petição inicial da execução, há possibilidade do juiz determinar a sua correção ou emenda, sob pena de indeferimento da peça caso tais vícios ou irregularidades não tenham sido sanados no prazo de dez dias. Frise-se que, indeferida a exordial, o juiz determinará a extinção do processo. O mesmo procedimento e prazo deverão ser observados na apreciação de argüição de nulidade no processo.
Em consonância, Marcos Valls Feu Rosa destaca que:
“Ao ser argüida a ausência dos requisitos da execução, em função da falha do juiz, que não conheceu o que deveria ter conhecido de ofício, deve o juiz aplicar o art. 616 do Código de Processo Civil. Posiciona-se no sentido de que deve ser concedida a oportunidade ao autor da execução de emendar a inicial, inclusive com juntada de documentos, sem que seja preciso anular o processo a partir do despacho de deferimento da inicial. Tal anulação, não é exigível, porque a emenda da inicial não permite alteração do pedido ou da causa de pedir, hipóteses em que, aí sim, haveria necessidade de nova citação, ou, em outras palavras, de nova decisão de deferimento.”[1]
Após a manifestação do exeqüente, deverá o juiz acolher ou rejeitar o incidente. Assim, o juiz, ao decidir, ou acolhe o incidente e, conseqüentemente extingue a execução, ou rejeita o incidente e determina o normal prosseguimento desta.
Quanto à legitimidade da medida, para a autora Rita Dias Nolasco, poderão lançar mão da exceção de pré-executividade os mesmos sujeitos que podem figurar no pólo passivo do processo executivo, os quais estão dispostos no artigo 568 do Código de Processo Civil[2], in verbis:
“São sujeitos passivos na execução:
I – o devedor, reconhecido como tal no título executivo;
II – o espólio, os herdeiros ou os sucessores do devedor;
III – o novo devedor, que assumiu, com o consentimento do credor, a obrigação resultante do título executivo;
IV – o fiador judicial;
V – o responsável tributário, assim definido na legislação própria.”
A referida autora também admite a possibilidade de que terceiros, desde que juridicamente interessados no resultado do processo, possam oferecer o incidente processual.
Admite-se, ainda, a oposição de exceção de pré-executividade por pessoa que tenha sido equivocadamente citada, ou seja, que foi erroneamente indicada pelo autor na petição inicial como devedora. Tal hipótese, até mesmo por questões lógicas e jurisprudenciais, dispensa maiores comentários, uma vez que este terceiro teria seu patrimônio turbado sem qualquer razão, por mero equívoco.
Quanto ao conteúdo probatório, razoável o entendimento de que deve ser admissível apenas prova pré-constituída, documental. Portanto, caso tal prova seja suficiente para embasar a questão suscitada através da exceção de pré-executividade, não há razão para o juiz postergar a decisão, pois neste caso estaria arriscando o executado a ser privado de seus bens, sem observância dos requisitos legais necessários.
Contudo, se as matérias alegadas através da exceção de pré-executividade dependerem de um exame mais aprofundado pelo juiz, ensejando a produção de provas, a oposição deverá ser feita através da via normal dos embargos, interponíveis após regular penhora. A fórmula de admissibilidade pode, de forma singela, ser assim colocada: exigindo a exceção de pré-executividade dilação probatória, torna-se imperiosa a oposição de embargos.
A argüição da ausência dos requisitos da execução suspende o seu curso[3]. Não entendida a questão desta forma, todo o asseverado quanto à proteção ao executado da posse mansa de seus bens sem observância, em todos os seus termos, do princípio do devido processo legal, seria inútil.[4]
O direito brasileiro tem por concepção consagrar a idéia de que a suspensão do processo deva decorrer de disposição legal ou mediante ato vinculado do juiz, que de ofício determina a suspensão. Neste sentido, não existe qualquer previsão legal quanto à suspensão da execução diante da proposição de exceção de pré-executividade. Contudo, deve-se entender a justificativa de que a exceção de pré-executividade não suspende o procedimento por falta de amparo legal, como frágil e inconsistente.
Em diversos casos, ainda que não haja previsão legal expressa a respeito do efeito suspensivo, quando for argüida matéria de ordem pública, é perfeitamente admissível o entendimento de que a argüição da ausência dos requisitos da execução suspende o seu curso. Deve, de tal forma, o magistrado conceder a suspensão do procedimento, analisadas as particularidades do caso concreto, quando verificar que o andamento do processo possa resultar lesão grave ou de difícil reparação e sendo relevante o fundamento da exceção de pré-executividade. Assim, a suspensão deriva diretamente de decisão do juiz, quando do recebimento da exceção.
Uma vez que a argüição suspende o próprio processo de execução, parece lógico que o prazo para embargos também é suspenso. Decidida que seja argüição, recomeçará a correr o prazo para os embargos, a partir da intimação da decisão. Isto ocorrerá, vale dizer, todas as vezes que estiver em curso qualquer prazo na execução, não só para os embargos.[5]
Imperioso e absolutamente necessário reconhecer que se deve usar o bom senso no emprego do instituto, evitando sua utilização abusiva, principalmente em razão deste tratar-se de construção doutrinária e não possuir sequer previsão legal. Entretanto, não se concebe entender a intenção do legislador como sendo a de que o executado somente pode se opor à execução, uma vez que seu patrimônio já tenha sido constrito em virtude de determinação judicial, quando desde logo se pode verificar a falta dos pressupostos processuais e das condições da ação, requisitos de admissibilidade que o juiz deveria apreciar de ofício, ao receber a petição inicial.
A doutrina divide-se quanto ao cabimento da exceção de pré-executividade, se apenas nos casos em que se tratar de matéria de ordem pública em que o juiz deve apreciar de ofício, ou se abrange também hipóteses de matérias relativas ao mérito. Tais divergências doutrinárias refletem-se na jurisprudência existente.
Neste diapasão, há acórdãos restringindo o cabimento da exceção de pré-executividade, e há acórdãos que admitem o cabimento da exceção de pré-executividade, por exemplo, quando há prescrição ou decadência, ou quando o executado pagou a dívida, possuindo recibo de tal ato jurídico.
Não obstante ainda não ser consolidada a posição da jurisprudência, entende-se que é admissível o cabimento da exceção de pré-executividade, sem a garantia do juízo, nos casos em que a execução não deva prosperar, por ser nula ou mesmo inexistente; assim, a matéria veiculada pode dizer respeito tanto ao juízo de admissibilidade quanto ao juízo de mérito da execução, desde que não haja necessidade de dilação probatória. Nesse sentido:
“TRIBUTÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – ARGÜIÇÃO DE PRESCRIÇÃO – POSSIBILIDADE – A possibilidade de verificação de plano, sem necessidade de dilação probatória, delimita as matérias passíveis de serem deduzidas na exceção de pré-executividade, independentemente da garantia do juízo. 2 É possível a argüição de prescrição por meio de exceção de pré-executividade, sempre que demonstrada por prova documental pré-constituída. 3. Recurso Especial improvido”. (STJ – RESP 537617 – PR – 1ª T. – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – DJU 08.03.2004 – p. 00175)
Havendo acolhimento da exceção de pré-executividade, a execução é extinta e o exeqüente deve ser responsabilizado pelo pagamento das custas do processo e dos honorários advocatícios. Esta é uma conseqüência inexorável do artigo 20, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, que na sua atual redação prevê honorários nas execuções, embargadas ou não.
No caso da argüição formulada na exceção de pré-executividade ser rejeitada, havendo acréscimo nas custas do processo, estas caberão ao argüente.
2.EFEITOS DA DECISÃO E RECURSOS
Pacífico o entendimento de que, sendo acolhida a exceção de pré-executividade, o recurso cabível é o de apelação; e, sendo rejeitada, por tratar-se de decisão interlocutória que não extingue o processo de execução, deve ser interposto o recurso de agravo de instrumento.
Com efeito, Araken de Assis ensina que “deduzindo exceção de pré-executividade, o devedor cria incidente, cuja rejeição enseja agravo; do acolhimento, porque ato extintivo da execução, cabe apelação”.[6]
Nesse sentido:
“Acórdão: Apelação Cível 2003.024076-4 Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros. Data da Decisão: 30/03/2004 EMENTA: PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – DECISÃO INTERLOCUTÓRIA – RECURSO CABÍVEL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE – INAPLICABILIDADE A interposição de apelação para atacar decisão interlocutória que desacolhe exceção de pré-executividade se traduz em equívoco inadmissível, o que obsta a aplicação do princípio da fungibilidade e o recebimento do reclamo como se fosse agravo de instrumento.”
Rita Dias Nolasco ressalta que o agravante poderá requerer que o relator conceda o efeito suspensivo ao agravo. O relator analisará o caso concreto, podendo conceder ou não tal efeito suspensivo. Verificando que a execução da decisão agravada poderá trazer lesão grave e de difícil reparação, e sendo relevantes os fundamentos do recurso, ou seja, presentes o periculum in mora e o fummus boni juris, suspenderá o cumprimento da decisão executiva até o julgamento definitivo do agravo. De forma inversa, o agravo interposto pelo recorrente sem atribuição do efeito suspensivo redundará no reflexo concreto e imediato prosseguimento da execução, com a respectiva realização da penhora e a fluência do prazo legal endereçado aos embargos.
Com a interposição do recurso de agravo de instrumento ou havendo recurso de apelação, do acórdão que julgar esses recursos poderá caber recurso extraordinário e/ou especial, e assim por diante, posto que, as regras gerais relativas aos recursos, seus princípios, juízo de admissibilidade e de mérito, são totalmente aplicáveis ao processo de execução. [7]
Rejeitada a exceção de pré-executividade que versava sobre matérias de ordem pública, não sujeitas a preclusão, mesmo havendo decisão proferida em segunda instância sobre a questão, não existe qualquer obstáculo a nova argüição da matéria em sede de embargos à execução, pois da decisão que versa sobre matéria de ordem pública ou de direito indisponível, não há preclusão pro judicato, conforme se depreende dos artigos 267, parágrafo 3º, e 471, II, in fine, ambos do Código de Processo Civil.
Nelson Nery Júnior sustenta até a possibilidade de pedido de reconsideração:
“No caso de não haver preclusão pelo fato de a matéria objeto da decisão ser de ordem pública ou de direito indisponível, a decisão poderá ser revista pelo mesmo Juiz ou Tribunal superior, ex officio ou a requerimento da parte. Esse requerimento poderá ser feito por petição simples ou por intermédio do recurso de agravo, se apresentado no primeiro grau de jurisdição.”
Araken de Assis esclarece que:
“Tornar alguma questão indiferente à preclusão implica, além da natural possibilidade de o juiz decidi-la a qualquer tempo, ex officio ou atendendo postulação da parte, sobretudo a faculdade de reexaminar anterior pronunciamento, seja qual for seu teor, a respeito dessa questão.”[8]
Também a respeito da possibilidade de matérias de ordem pública, argüidas através da exceção de pré-executividade, serem discutidas novamente em sede de embargos, afirma Araken de Assis que “o assunto, nada obstante, poderá ser ventilado nos embargos, inadmitido o uso simultâneo das duas vias”.[9] E, como bem observa Feu Rosa, da mesma forma e, em ordem inversa, discutida matéria de ordem pública em sede de embargos, poderá ser argüida novamente, através da exceção de pré-executividade.[10]
Porém, quando se decide no processo executivo, através da exceção de pré-executividade, matérias relacionadas ao mérito, como, por exemplo, a respeito da prescrição ou pagamento, há verdadeiramente um julgamento de mérito, que atinge a própria relação jurídica substancial, fazendo coisa julgada (art. 467). Portanto, a decisão a respeito de matéria de mérito não poderá ser rediscutida.
Por fim, quando a exceção de pré-executividade que versava sobre matérias de ordem pública é acolhida, o efeito gerado pela sentença será só o de terminar o processo, extinguindo-se a execução, não havendo julgamento de mérito, e, por conseguinte, não fazendo coisa julgada. Portanto, não existe qualquer impedimento ao ajuizamento de nova ação visando à execução baseada no mesmo título executivo, observado o disposto no artigo 268 caput do Código de Processo Civil.
3.A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE E OS EMBARGOS
Difere do asseverado supra os embargos à execução, sendo esta ação cognitiva de caráter incidental posta à disposição do executado para que possa responder às pretensões do autor. Devem ser respeitados os requisitos previstos no artigo 282 do Código de Processo Civil, e recolhida taxa judiciária. Necessário também ser interposto no prazo preclusivo de 15 (quinze) dias, conforme aduz o artigo 738 do Código de Processo Civil.
Assim, pode-se concluir, comparativamente, que: (i) os embargos têm natureza de ação incidente no processo de execução, e a exceção processual de incidente processual; (ii) os embargos têm forma a ser obedecida, qual seja, os requisitos exigidos no artigo 282 do Código de Processo Civil, de sorte que a inobservância às exigências legais leva à inépcia da inicial, enquanto a exceção não tem forma nem figura de juízo, podendo ser apresentada por simples petição; (iii) os embargos obedecem a prazo preclusivo para o seu ajuizamento, enquanto a exceção pode ser oposta em qualquer prazo; (iv) a exceção não enseja a produção de prova testemunhal nem prova pericial, enquanto os embargos não estão limitados a qualquer espécie de prova; e, finalmente (v) os embargos são instrumento de defesa e de contra-ataque, enquanto a exceção é instrumento de mera defesa[11].
Importante frisar que, mesmo diversos, os institutos possuem algumas semelhanças: (i) ambos podem, eventualmente, extinguir a execução; (ii) em nenhum deles está o executado obrigado a efetuar o pagamento da custas processuais; (iii) os instrumentos não possuem efeito suspensivo, ficando, nos embargos, tal efeito condicionado a comprovação de que o prosseguimento da execução possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes[12]; (iv) ambos podem ensejar a condenação do exeqüente em honorários, sendo que, em quaisquer das hipóteses, o executado deve estar representado por advogado.[13]
Adicionalmente, uma vez que as matérias de ordem pública podem ser apresentadas tanto na exceção como nos embargos, resta claro que a opção fica a cargo do opositor, valendo analisar as provas que serão alegadas no momento da interposição da medida que melhor se adequar ao caso.
Absolutamente necessário ressaltar que, uma vez que tratam de matérias diversas, é possível oferecer a exceção concomitantemente com os embargos. Obviamente, impossível ofertar as medidas utilizando-se argumento idêntico, sob pena de haver duplicidade de instrumentos processuais para um mesmo fim, o que é claramente contrário à sistemática processual vigente[14]. Ressalta-se ainda que além de contrário à sistemática processual, é desinteressante o oferecimento simultâneo das duas vias, uma vez que, oferecidos os embargos, estes absorvem a discussão em torno da execução de forma integral, abarcando, portanto, a cognição percebida na exceção de pré-executividade.
Salienta-se que pode ser admitido o recebimento dos embargos à execução como exceção de pré-executividade, aplicando-se o princípio da fungibilidade, justamente em virtude de a exceção ser mais restrita que os embargos. Todavia, nesta situação cumpre reforçar a idéia de que, nos termos das alterações havidas no Código de Processo Civil em virtude da edição da Lei n.º 11.382, de 06 de dezembro de 2006, se faz mais interessante lançar mão da exceção de pré-executividade, uma vez que o artigo 739-A, § 1°, incluído no Código de Processo Civil pela referida Lei, assevera que os embargos do executado, via de regra, não terão efeito suspensivo, ficando a cargo do juiz, a requerimento do embargante, atribuir tal efeito aos embargos, quando verificadas as condições especificadas em Lei.
Sendo assim, o uso da exceção de pré-executividade se torna de maior relevância já que o suposto devedor não possui qualquer garantia, ao embargar a execução, quanto à manutenção de seu patrimônio. Observando principalmente querelas que envolvam entes públicos (União, Estados e Municípios), em que a forma de devolução pelo exeqüente de bens executados em processo julgado posteriormente inexistente ou improcedente dificilmente se dá de forma simples, resta patente a relevância do instituto. Deverá, por exemplo, na situação em apreço, o embargante esperar o ano seguinte, por ser indispensável a previsão no orçamento?
Ressalta-se, finalmente, que, nos termos do artigo 739-A, § 6°, do Código de Processo Civil, ainda que concedido o efeito suspensivo aos embargos, aquele não impedirá a efetivação dos atos de penhora e de avaliação dos bens do executado.
4. A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE NA EXECUÇÃO FISCAL
O Estado, a fim de realizar as atividades pelas quais existe, prescinde de uma complexa estrutura organizacional que visa, sobre todas as coisas, o bem da coletividade e a satisfação do interesse público. Neste diapasão, para custear a máquina estatal necessária à consolidação dos objetivos traçados na Carta Constitucional, o Estado institui e cobra tributos de seu povo, com o escopo de gerar receitas necessárias ao Erário.
Neste sentido, a cobrança do crédito tributário segue um procedimento especial, regulado pela Lei n° 6.830 de 22 de setembro de 1980 – a Lei das Execuções Fiscais. Em decorrência de sua especificidade, a execução fiscal possui diversas peculiaridades frente à execução forçada comum de quantia certa prevista no Código de Processo Civil.
Frente da inadimplência do contribuinte, o Fisco deverá seguir um procedimento que se inicia com a instauração de um processo na instância administrativa, através do qual exercerá o controle da legalidade do crédito tributário a ser constituído. Chegando a decisão administrativa final, sendo respeitadas e observadas as garantias fundamentais e os direitos do contribuinte, e tendo restado comprovada a tese do ente arrecadador quanto à existência do crédito tributário, o mesmo será inscrito no Livro da Dívida Ativa, emanando de tal Livro a Certidão de Inscrição na Dívida Ativa, título executivo extrajudicial hábil a embasar a ação executiva fiscal.
Nos termos do §6º do artigo 2º da Lei da Execuções Fiscais, a Certidão da Dívida Ativa, sob pena de nulidade, deverá conter: (i) o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros; (ii) o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato; (iii) a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida; (iv) a indicação (se for o caso) de estar à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo; (v) a data e o número da inscrição no Registro de Dívida Ativa; e, por fim, (vi) o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida[15]. Observe-se que caso não haja a inscrição, deverá ser adotado o procedimento executivo comum do estatuto processual civil.
Portanto, a Lei 6.830/80 tem por objetivo regulamentar a execução judicial da dívida ativa da Fazenda Pública, regularmente inscrita, abrangendo na locução tanto os créditos tributários como os não-tributários.
Vale dizer que, a dívida ativa regularmente inscrita goza de presunção de certeza e liquidez, segundo dispõem os artigos 3º da Lei 6.830/80 e 204 do Código Tributário Nacional. Porém, esta presunção é relativa, pois poderá ser afastada por prova inequívoca, conforme preceitua o parágrafo único do supracitado artigo 204 do diploma legal tributário.
Nesses termos, embora a execução fiscal seja um processo especial, pouco difere da execução comum. Na execução fiscal, o executado é citado para pagar a dívida, com os juros, multa de mora e encargos, ou garantir o juízo, mediante a constrição de depósito em dinheiro, de fiança bancária ou por nomeação de bens à penhora, no prazo de cinco dias.
Efetivada a garantia da execução, o executado, nos termos do art. 16, incisos I, II e III, da Lei de Execuções Fiscais, poderá opor embargos no prazo de 30 dias.
Cumpre salientar que, com a entrada em vigor da Lei que inova o processo de execução (Lei 11.232/2005), o prazo para embargos no Processo Civil é de 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação, no entanto, por força do Princípio da Especialidade, o Código de Processo Civil só se aplica subsidiariamente a Lei das Execuções Fiscais.
Assim, nem o Código de Processo Civil nem a Lei de Execução Fiscal criaram um sistema de defesa direta do executado no bojo do processo executivo. No entanto, conforme já explicitado acima, aos poucos a doutrina e os tribunais foram sugerindo e acolhendo, dentro do processo executivo, uma forma de defesa excepcional, qual seja, a exceção de pré-executividade.
Como já visto, essa forma de defesa do executado tem por objeto obstar a execução injusta, abusiva ou flagrantemente ilegal, e, por cabível em qualquer espécie de execução, surte efeito na execução fiscal, que, como espécie de execução por quantia certa contra devedor solvente, prevê garantia do juízo pela penhora, o depósito em dinheiro ou a fiança bancária (artigos 7º, inciso II; e 9º, incisos I, II e III da Lei de Execuções Fiscais), como condições para a propositura de embargos.
A exceção de pré-executividade, argüida por meio de um simples requerimento do devedor que se rebele contra a pretensão executiva da Fazenda Pública e pode ser utilizada antes ou após a penhora, após a arrematação ou após a adjudicação, desde que configurados os pressupostos de uma execução fiscal flagrantemente ilegal ou infundada, que possa ser reconhecida de plano pelo juiz, é remédio processual competente para cessar o processo executivo quando indevido. Desnecessário prescrever que, na incidência da hipótese em análise, prejuízo não recai somente sobre o executado, mas sobre a sociedade em geral, uma vez que transmite grande insegurança jurídica ao constranger o patrimônio de contribuinte sem qualquer razão legal.
Desta forma, o acatamento da matéria em exceção de pré-executividade abrevia em muito o curso do procedimento da execução, quando injusta, abusiva ou ilegal, já que evita a prática de atos que se revelarão inúteis ao final, com dispêndio para o Poder Judiciário e desgaste para as partes do processo.
“Assim, caso o título ou a ação executiva sejam nulos, melhor que sejam corrigidos seus vícios e, eventualmente, que se intente nova ação de maneira correta, se for possível, ou que sejam remanejados os esforços do Estado para outra direção, mais eficaz e benéfica ao ente público, o qual não pode se configurar como inimigo do contribuinte, mas antes um cumpridor de seus deveres e perseguidor dos seus direitos, na medida em que estes representem os interesses da coletividade”[16].
Inconcebível, portanto, que o Estado execute alguém lastreado em título executivo que não observe os requisitos do parágrafo 5º, do artigo 2º, da Lei 6.830/80, e ao mesmo tempo não permita que o contribuinte demandado suscite os vícios que impossibilitam a pretensão Estatal antes de garantida a execução e oferecidos os embargos.
É assegurada, assim, ao executado, a possibilidade de submeter ao conhecimento do juiz da execução a exceção de pré-executividade, inclusive na execução fiscal, limitada, porém, sua abrangência temática, que somente poderá dizer respeito à matéria suscetível de conhecimento de ofício ou à nulidade do título, que seja evidente e flagrante, isto é, nulidade cujo conhecimento independa de contraditório ou dilação probatória.
Revela-se descabida a hipótese de o executado ser compelido a garantir o juízo, dando bens à penhora, para somente em sede de embargos poder alegar falta de condição da ação ou de exigibilidade do título, quando tal matéria pode ser conhecida de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, nos termos do artigo 267, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil. Logo, vícios pré-processuais e processuais que fulminam de nulidade o título executivo devem ser suscitadas através da ação de pré-executividade, antes ou após a citação do devedor, conforme se depreende dos julgados abaixo:
“EMENTA: TRIBUTÁRIO – PROCESSUAL – EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – PRESCRIÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO 1. A pretensão da Fazenda Pública em haver o crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data em que se tornou exigível (CTN, art. 174). 2. Julgada procedente a exceção de pré-executividade e extinta a execução, responde o excepto pelo pagamento de honorários advocatícios, porquanto são “devidos quando a atuação do litigante exigir, para a parte adversa, providência em defesa de seus interesses” (REsp n.º 137.285/PB, Min. Barros Monteiro).
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. Nos termos do artigo 6º, §1º, da Lei nº 6.830/80, mera cópia de CDA não é documento apto a fazer às vezes de título executivo em execução fiscal. Precedentes. É devida verba honorária quando, acolhida a exceção de pré-executividade, resta extinta a execução. Precedente. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO”. (Apelação Cível Nº 70017958505, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 27/12/2006)
“EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CABIMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. REQUISITOS. NULIDADE. CONFIGURAÇÃO. Cabível o ajuizamento da exceção de pré-executividade quando a matéria é daquelas que o juízo deva conhecer de ofício, atinente a questões de ordem pública, como as condições da ação e os requisitos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, ou se versa sobre tema que traga prova pré-constituída, não dependendo de cognição e dilação probatória, próprias do incidente processual dos embargos. Assim o é a questão dos requisitos da CDA. A inscrição como dívida ativa e a certidão são nulas se não atendem aos requisitos previstos nos arts. 202 do CTN e 2º da Lei nº 6.830/80. A referência ao livro e à folha da inscrição são requisitos indispensáveis à validade da CDA. Exegese do parágrafo único do art. 202 do CTN. Ausência de especificação, na CDA, natureza e do fundamento legal da cobrança do crédito, com a especificação da lei em que esteja fundada, que deve ser observada pela Fazenda Pública, a fim de possibilitar ao sujeito passivo o exercício de seu direito constitucional à ampla defesa e ao contraditório. AGRAVO PROVIDO. EXECUÇÃO FISCAL EXTINTA.” (Agravo de Instrumento Nº 70016672016, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 27/12/2006)
5.CONCLUSÃO
Diante do asseverado acima, verifica-se que a exceção de pré-executividade, construção doutrinário-pretoriana, é instrumento plenamente admissível na sistemática processual pátria e representa meio autônomo de defesa, à disposição do executado.
Absolutamente necessária, depois de referida constatação, apreciar o reconhecimento da eficácia de medida processual criada pela doutrina, dentro de um modelo normativo voltado ao direito positivado. A jurisprudência, ao perceber que a norma, por silente, acabava por prejudicar a aplicação do justo, do correto, reconhece a efetividade da medida que visa dar oportunidade àquele executado injustificadamente de defender o que lhe pertence, respaldando, portanto, o direito assegurado pela Constituição Federal.
Justamente por tal motivo gere o tema debates apaixonados, acerca de sua legitimidade. Não buscou este breve trabalho tomar partido entre os defensores ou os detratores do instituto, mas sim arrolar os efeitos que, por reconhecida como medida de defesa do executado, a exceção de pré-executividade gera no âmbito do processo de execução e eventualmente além dele, em sede de apelação.
Importantíssimo ressaltar ser extremamente danoso ao processo e repudiada a utilização do instrumento como medida protelatória da execução, tendo a exceção o exclusivo objeto de dar ao exeqüente tempo para, de forma fraudulenta, dilapidar ou sonegar seu patrimônio, em prejuízo ao autor do processo executivo e a sociedade, em analogia com a afirmação feita anteriormente quanto ao prejuízo sofrido pela coletividade ao ver turbado sem razão o patrimônio alheio.
A validade da construção doutrinária surge do absurdo de negar ao executado a possibilidade de alertar o juiz quanto à inadmissibilidade da execução. Tal situação seria o mesmo que impossibilitar o executado de defender-se, caso ele não tivesse bens para garantir o juízo.
Observando a questão fora do universo processual, deve-se considerar a hipótese, não rara, de o devedor ter suas atividades econômicas prejudicadas e eventualmente paralisadas, em função de um ato de constrição, profunda e evidentemente injurídico, o que não prejudica somente o executado, mas sim toda a gama de atores sociais que gravitam em torno das relações surgidas de suas interações.
Isto posto, chega-se a conclusão de que a exceção de pré-executividade é instrumento processual absolutamente válido e deve ser utilizado pelos profissionais do Direito, sempre observada a oportunidade de sua oposição, tendo como finalidade evitar execuções injustas ou infundadas, contribuindo de tal forma com a lisura do caso concreto analisado, com a redução da pauta do Judiciário e, em última análise, com a sociedade em geral, ou permitir que os direitos garantidos pela Constituição sejam defendidos de turbação indevida.
Acadêmico da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie – São Paulo (SP)
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