Resumo: Ao elencar a competência tributária de cada ente político, a Constituição Federal também previu um rol de impostos nos quais podem ser instituídos pelos respectivos sujeitos ativos da relação jurídico tributária. Cada imposto possui a sua regra matriz de incidência tributária, contendo os aspectos materiais, pessoais, temporais, quantitativos e espaciais. Tais aspectos não podem ser comuns entre impostos, devendo cada um ter a sua especificidade. No Estado de São Paulo, quando do advento do Decreto n. 55.002/09, a base de cálculo que sempre fora compatível com as normas gerais do Código Tributário Nacional, sendo o valor venal constante no IPTU, fora modificada para o valor venal de referência, o mesmo utilizado no ITBI. Primeiramente, a ilegalidade é nítida ao modificar a base de cálculo através de um Decreto, quando a matéria exige lei em sentido estrito. Desta forma, resta aos contribuintes buscar o judiciário para a concessão da segurança preventiva com o fito de recolher o imposto com a base de cálculo sobre o valor constante no IPTU ou pleitear a repetição de indébito para a devolução dos valores pagos a maior.
Palavras chave: Direito Tributário. Contribuinte. ITCMD. Base de Cálculo
Abstract: To list the tax jurisdiction of each political entity, the Federal Constitution also provides for a list of tax on which may be imposed by the respective active subjects of tax legal relationship. Each tax has its rule array of tax incidence containing material respects, personal, temporal, quantitative and spatial. These aspects can not be shared between taxes and should each have their specificity. In São Paulo, when the advent of Decree No. 55,002 / 09, the basis of calculation which had always been compatible with the general rules of the National Tax Code, and the constant market value in the property tax, was adjusted to the market value of reference, the same used in ITBI. First, the illegality is clear to modify the calculation basis through a Decree, when the matter requires law strictly. Thus, it remains to taxpayers seeking justice for the granting of preventive security with the aim to collect the tax on the basis on the constant value in property taxes or claim the overpayment of repetition for the refund of amounts paid in excess.
Keywords: Tax Law. Taxpayer. ITCMD. Calculation basis
1. O ITCMD
Preconiza o artigo 155, inciso I, da Constituição Federal que compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir o Imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos (ITCMD). Pois bem, o Código Tributário Nacional, materialmente com status de Lei Complementar, em seu artigo 38, determina que a base de cálculo é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos.
Dessa forma, cabe ao ente tributante regulamentar a instituição do imposto, desde que não conflita com a Constituição Federal e com o Código Tributário Nacional.
2. O ITCMD no Estado de São Paulo
No Estado de São Paulo, atualmente, a instituição do ITCMD está regulamentada na Lei n. 10.705/00 e determina o seu artigo 9º, que a base de cálculo é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo), sendo que o § 1º do referido artigo prevé que se considera o valor venal, o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.
Ainda, reza o artigo 13 da Lei:
“Artigo 13 – No caso de imóvel, o valor da base de cálculo não será inferior:
I – em se tratando de imóvel urbano ou direito a ele relativo, ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU;”
Todavia, no ano de 2009, através do Decreto n. 55.002/09, fora modificada a base de cálculo do imposto nos seguintes termos:
“Artigo 1º – Passa a vigorar com a redação que se segue o parágrafo único do artigo 16 do Regulamento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – RITCMD, aprovado pelo Decreto 46.655, de 1º de abril de 2002:
“Parágrafo único – Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel: (…)
2 – urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea “a” do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso.”
Destarte, todo o disposto no Código Tributário Nacional e até mesmo na Lei n. 10.705/00 de São Paulo, fora abatido pelo decreto anteriormente mencionado, passando a ser exigido o recolhimento do ITCMD pela base de cálculo constante no valor de referência utilizado no ITBI, sendo que o Decreto é liegal, ferindo bruscamente o disposto no artigo 97 do Código Tributário Nacional:
“Somente a lei pode estabelecer: (…)
IV – a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;”
Não pode um decreto, fixar a base de cálculo do imposto, e ainda, além de ferir o Código Tributário Nacional. ferir a Lei Estadual que regulamenta o imposto, que está de acordo com o que determina o Código Tributário Nacional, posto que estabelece como base de cálculo o valor venal constante no IPTU.
Diante de tal exação, alguns contribuintes impetraram Mandado de Segurança, visando obter a liminar com o fim de suspender a exigibilidade do crédito tributário, e a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo é, na maior parte, concessiva da segurança aos contribuintes.
Vejamos:
“MANDADO DE SEGURANÇA ITCMD Pretensão mandamental ao reconhecimento do direito de recolher o imposto de acordo com o valor venal lançado pela Municipalidade para a cobrança de IPTU Possibilidade Posicionamento fiscal em prol da atribuição para os bens imóveis transmitidos gratuitamente (causa mortis e doação) do valor venal de referência adotado para fins de transmissões imobiliárias onerosas inter vivos (ITBI) Inadmissibilidade Decreto 55.002/09 que, sob o auspício de regulamentar a Lei Estadual 10.705/00, acaba majorando, por via inadequada, o tributo Ofensa ao artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, e aos artigos 97 e 99 do CTN Precedentes – R. Sentença concessória da segurança mantida. “
“MANDADO DE SEGURANÇA ITCMD BASE DE CÁLCULO VALOR VENAL IPTU POSSIBILIDADE. Base de cálculo do Imposto de Transmissão causa mortis e doação é o valor venal do imóvel, na data da transferência dos bens ou direitos, devidamente atualizados. Impossível a utilização de atual valor de mercado. Afronta ao princípio da legalidade. Sentença mantida. Recursos desprovidos.”
“MANDADO DE SEGURANÇA. ITCMD. Base de cálculo. Imóvel urbano e rural. Tributo que deve ser recolhido com base no valor venal do bem, constante do IPTU e do ITR. Notificação para recolhimento de valor complementar, com base no Decreto no 55.002/2009. Inadmissibilidade. Base de cálculo do ITCMD que deve ser calculada pelo valor venal do bem, nos termos da Lei Estadual no 10.705/2000. Decreto no 55.002/2009 que excede seu poder regulamentar, ao alterar a base de cálculo do tributo, majorando o valor devido. Inteligência do art. 97, II e IV c.c. § 1o, do CTN. Precedentes. Direito do Fisco (art. 11 da lei no 10.705/2000), no entanto, de instaurar procedimento administrativo para verificar o imposto recolhido, observando que o valor venal é o valor de mercado do bem, como prevê a lei, independente do valor venal do IPTU e do ITR. Recurso voluntário e reexame necessário parcialmente providos.”
“APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO – Mandado de segurança – ITCMD – Base de cálculo – Lei Estadual nº 10.705/00 – Valor venal apontado no IPTU – Decreto nº 55.002/09 – ITBI – Valor venal de referência -Majoração da base de cálculo – Ilegalidade – Sentença mantida. RECURSO VOLUNTÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDOS. A base de cálculo do ITCMD é aquela apontada na legislação paulista (IPTU), não podendo ser adotado critério diverso daquele utilizado pela própria Administração Pública para propriedade do bem, observada que a criação de base de cálculo pelo Decreto nº 55.002/09 em referência ao ITBI consiste em ofensa ao princípio da legalidade.”
E quanto àqueles contribuintes que recolheram o imposto com a base de cálculo do Decreto, apenas lhes resta ingressar com Ação de Repetição de Indébito, com base no artigo 165, do Código Tributário Nacional, observado o prazo de 5 anos para pleitear a restituição, conforme disposto no artigo 168 do mesmo diploma legal.
Advogada especialista em direito tributário. Proprietária do escritório Lorena Proprentner – Consultoria e Advocacia Tributária
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