Resumo: O presente trabalho objetiva abordar a incidência da Compensação Financeira pela Exploração de Produtos Minerais (CFEM), na comercialização de água mineral. Serão debatidos aspectos, como o conceito, a natureza jurídica, a previsão legal, a constitucionalidade e a cobrança. Sendo esta o foco deste trabalho. A base de cálculo para a cobrança da CFEM é o faturamento líquido obtido mensalmente pela empresa com a venda do produto. Por faturamento líquido, a legislação infraconstitucional conceituou como o valor bruto obtido com a venda do produto deduzidos os custos com impostos sobre a comercialização, seguro e transporte. Todavia, há que ressaltar que a água mineral, por ser comercializada em seu estado físico líquido, depende de embalagem, sendo esta um custo indissociável da produção. Assim, no custo final de produção está embutido no valor do produto, ensejando a incidência da CFEM o valor da embalagem não retornável, o que configura ilegalidade da cobrança uma vez que produto diverso do previsto em lei está sendo objeto de cobrança. Para evitar a ilegalidade ora apresentada, propõe-se nova fórmula para o cálculo da CFEM, de forma que se utiliza a mesma base de cálculo, o faturamento líquido, expandindo para o campo das deduções ao cálculo, os custos obtidos com as embalagens não retornável utilizadas na comercialização de águas minerais.
Palavras-chaves: legalidade.cobrança.cfem.valor.água.
Abstract: This paper aims to address the impact of the Financial Compensation for Exploiting Mineral Products (CFEM), the marketing of mineral water. Aspects will be discussed, as the concept, legal, legal provision, the constitutionality and recovery. This being the focus of this work. The calculation basis for the recovery of CFEM is the monthly net revenues obtained by the company from selling the product. Net sales for the constitutional legislation conceptualized as the gross value from the sale of the product minus the cost of sales taxes, insurance and freight. However, it is noteworthy that the mineral water to be sold in its liquid physical state depends on packaging, this being an indivisible cost of production. Thus, at the end cost of production is embedded in the value of the product, allowing for the impact of the value of CFEM not returnable packaging, which is illegal charging once diverse product provided by law is the subject of recovery. To avoid the illegality presented herein, we propose a new formula for calculating the CFEM, so that you use the same calculation basis, net sales, expanding into the field of deductions for calculation, the costs obtained with the non-returnable packaging used in the marketing of mineral waters.
Keywords: legal.charge.cfem.value.water.
Sumário: 1. Introdução. 2. Breve Histórico das Prestações Pecuniárias. 3. Compensação financeira pela exploração de recursos minerais. 3.1. Conceito 3.2 Natureza jurídica da CFEM. 3.3. Previsão legal. 3.4. Constitucionalidade. 3.5. Cobrança. 3.5.1.Órgão responsável.3.5.2. Sujeito ativo. 3.5.3. Fato Gerador. 3.5.4. Base de Cálculo. 3.5.5. Cálculo das deduções. 3.5.6. Alíquotas 3.5.7. Pagamento. 3.5.8. Distribuição do valor arrecadado. 4. A ilegalidade da cobrança. 5. Princípio da Legalidade x cobrança da CFEM. 6. Proposta de novo cálculo para a cobrança da CFEM. 7. Conclusão. 8. Bibliografia.
O homem ao desenvolver-se primou pela vida em sociedade, descobriu que através desta teria melhor satisfeitas as suas necessidades e em grupo cada indivíduo poderia auxiliar o outro e todos juntos defenderem pelos interesses comuns.
Porém, para que a vida em sociedade seja organizada é necessário haver um organismo que coordene a atividade de todos, para que cada um cumpra o seu papel e estejam todos harmoniosamente satisfeitos.
No mundo moderno tal papel fora assumido pelo Estado que é hoje o garantidor das necessidades fundamentais, que exigem grande manejo político para funcionar.
O Estado para garantir uma estrutura básica aos seus cidadãos necessita arrecadar receitas e é isso que justifica a cobrança de tributos aos particulares. Quanto melhor munido financeiramente estiver o Estado, teoricamente melhor será o amparo que este oferecerá aos seus contribuintes.
O Estado também possui bens, bens que são públicos, porém que podem ser utilizados pelos cidadãos, porém a exploração de alguns desses bens deve ser compensada ao Estado pelos danos que gera a este.
A pecúnia a ser estudada neste trabalho está inserida no segundo grupo de prestações devidas ao Estado acima citadas. A Compensação Financeira pela Exploração de Produtos Minerais é devida aos Estados e Municípios que sofrerem a exploração mineral realizada pela empresa mineradora.
Será abordado especificadamente cada ponto da CFEM, tal como conceito, natureza jurídica, constitucionalidade da cobrança da pecúnia, forma de cobrança, etc.
O estudo da CFEM no presente trabalho refere-se à exploração do minério, água mineral e a forma de sua cobrança. Defende-se, pelos motivos que serão desenvolvidos a seguir, que a cobrança de tal pecúnia que é prevista tão somente para os produtos minerais, incide também sobre a embalagem da água mineral, gerando flagrante ilegalidade da cobrança.
2. Breve Histórico das Prestações Pecuniárias
A história e o desenvolvimento do homem levaram-no a associar-se em agrupamentos sociais de forma a melhor defender os seus interesses e necessidades que podem ser Individuais, Coletivas ou Públicas.
As necessidades Individuais que surgem na vida em sociedade são aquelas indispensáveis à sobrevivência do homem, como roupas, transporte, remédios, alimentos, habitação e é o próprio homem isolado que atenderá as suas necessidades. Já as necessidades Coletivas consideram os desejos do agrupamento como um todo através de meios que atendam ao interesse comum, como escolas, hospitais, transporte coletivo, rádios. Consiste no uso pelo grupo de um bem ou serviço. Enquanto que as necessidades Públicas estão voltadas para o atendimento de um número indeterminado de pessoas em decorrência de interesses mais elevado, como justiça, segurança, previdência social, estradas, aeroportos, cadeias, cemitérios, saúde pública.
Para que a vida em sociedade seja viável é necessário haver uma estrutura organizada que se responsabilize por estas atividades de forma segura e garantidora, caso contrário a sociedade não vingaria sucesso e se estabeleceria um caos social.
No modelo de sociedade atual, a responsabilidade pela garantia de tais necessidades fica a cargo do Estado que atende genericamente a todos e tem a potestade de impor o seu interesse e de impor a exigibilidade das importâncias indispensáveis para a manutenção de todo este império e são os membros de toda a sociedade quem indiretamente satisfaz o atendimento destas necessidades, ao carrear aos cofres do Estado uma soma de dinheiro suficiente para que esta entidade possa executar, manter, melhorar, planejar, construir e custear toda a estrutura desta crescente responsabilidade estatal.
É o Estado que se obriga com todos na criação ou manutenção dos bens ou serviços de interesse dele e da sociedade, envolvendo desde logo, a idéia de dispêndio, de gasto, para manter a gama crescente de Necessidades Públicas, ao mesmo tempo em que ele detém meios para, coercitivamente, fazer com que o fardo das despesas com a criação, melhoramento ou criação daquelas Necessidades sejam suportadas, direta ou indiretamente, por todos os componentes da sociedade.
Saúde e higiene, Segurança Interna e Externa, Educação e cultura, Previdência Social, Assistência Social, Justiça, Água Encanada, Energia Elétrica, Telecomunicações, Portos, Bancos, Aeroportos, Redes de Esgoto, Construção de edifícios públicos, Estádios, Pontes, Praças, abertura de ruas, avenidas, estradas são serviços que toda a sociedade reclama para proporcionar maior conforto e comodidade, para os quais, uma pessoa ou apenas um grupo de indivíduos não poderia suportar o ônus da criação e manutenção dos mesmos.
Ademais, tais serviços não poderiam ser entregues a atividade privada devido aos motivos que passo a relatar:
a. As entidades privadas não possuem aparato adequado para a captação financeira, de forma coercitiva, que tais atividades exigem;
b. Seguramente para as entidades privadas somente seria vantajoso o desenvolvimento dessas atividades se obtivessem margem significativa de lucro o que oneraria demasiadamente o bolso dos contribuintes usufrutuários dos serviços, em contrapartida ao Estado que tão-somente visa equilibrar sua balança financeira de modo a captar recursos nas proporções de suas despesas;
c. Alguns desses serviços são mantidos para a preservação e consecução dos próprios fins do Estado que não gera nenhum interesse a qualquer iniciativa privada.
Dessa forma, somente ao Estado cabe atender às Necessidades Públicas é ele que suporta as aspirações da sociedade para o “bem-estar comum”, objetivando proporcionar maior conforto e comodidade para a sociedade, além de externar dentro de suas realizações as próprias finalidades do Estado.
No passado, para a realização de suas atividades, o Estado requisitava bens e serviços de seus súditos de colaboração gratuita e honorífica destes no desempenho de funções públicas e do apossamento de bens de inimigos derrotados na guerra. O Estado moderno substituiu esses processos pelo regime da despesa pública, que consiste no pagamento em dinheiro dos bens e serviços necessários a realização do bem comum. E atualmente, para atingir essa finalidade o Estado desenvolve inúmeras atividades, cada qual objetivando tutelar determinada necessidade pública, sendo a atividade financeira a procura de meios para o Estado atingir os seus fins de forma a obter o capital indispensável às necessidades, cuja satisfação o Estado assumiu.
Como preleciona Sebastião de Sant`Anna e Silva em Introdução Ao Estudo dos Orçamentos Públicos ( páginas 30/31, Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, 1959)
“Motivos políticos determinaram a instituição do preceito de que o Governo deveria solicitar, periodicamente, ao Parlamento, a aprovação das receitas necessárias para fazer face às despesas com a manutenção e o funcionamento dos serviços do Estado. Viram logo os governantes que essa oportunidade era propícia para a elaboração de um programa administrativo de governo e para o balanceamento de recursos financeiros disponíveis para a sua execução. Em outras palavras, verificou-se a importância do Orçamento como um instrumento poderoso da Administração Pública para a consecução de suas finalidades. A crescente ampliação das funções do Estado e dos serviços públicos tornou imprescindível o planejamento da ação governamental em seus diversos níveis, quer em cada unidade administrativa por menor que seja, quer no conjunto para obtenção da indispensável harmonia de ação(…) Ainda mais, o orçamento constitui precioso instrumento para obter a indispensável coordenação dos serviços públicos e órgãos da administração, a fim de se conjugar os recursos e os esforços de todos eles para a consecução do objetivo final do Estado: a promoção do bem comum e da prosperidade social ”.
No mesmo sentido Walter Paldes Valério (Programa de Direito Financeiro e Finanças, 6ª Edição, Editora Sulina, 1996, página 107):
“O Estado tem o poder de estabelecer livremente sua organização política e de utilizar a força coercitiva de que é dotado, para compelir os seus cidadãos a observarem as normas jurídicas que edita. No conjunto dessas normas, se incluem, aquelas que dão ao ente público o direito de exigir que os seus jurisdicionados concorram com uma parte de seu patrimônio privado, a fim de possibilitar o cumprimento das finalidades de interesse geral que lhe cabe precipuamente desempenhar. É o chamado direito de autoridade (jus imperii)ou potestade tributária, imanente à figura do Estado. As prestações dessa natureza, não são mais do que um técnica que o Estado utiliza para repartir pela população o custo dos serviços públicos que realiza.”
Portanto, a cobrança de prestações pecuniárias pelo Estado aos cidadãos justifica-se pelo objetivo de promover o bem comum, de forma que o custo das atividades desempenhadas pelo Estado são repassadas e distribuídas entre os cidadãos que dele façam parte.
Veremos adiante que toda prestação cobrada pelo Estado deve obedecer a determinados princípios constitucionais e todo o valor pago pelos contribuintes deve decorrer de dispositivo legal, contendo a obrigação, o fator gerador e o sujeito ativo.
A extração mineral é um dos setores básicos da economia do país, que contribui de forma decisiva para o bem estar e a melhoria da qualidade de vida das presentes e futuras gerações, sendo fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade equânime, desde que seja operada com responsabilidade social e ambiental, estando sempre presentes os preceitos do desenvolvimento sustentável.
A contribuição financeira pela extração mineral a ser discutida no presente trabalho não decorre desse exercício de soberania do Estado para a arrecadação de receitas como custeio das despesas públicas, mas do fato de ser a exploração de recursos minerais de um bem da união sem qualquer outro pagamento pelo direito de extração ao país, ao estado e ao município, bem com os danos causados ao meio ambiente, justificando a cobrança da prestação pecuniária.
3. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PELA EXPLORAÇÃO DE RECURSOS MINERAIS
O instituto da Compensação Financeira é anterior à Constituição Federal de 1988, eis que já era previsto várias formas de compensação pela legislação infraconstitucional devidas pela PETROBRÁS e suas subsidiárias aos entes estaduais pela lavra de petróleo e xisto betuminoso e pela extração de gás.
A CFEM, Compensação Financeira pela Exploração de Produtos Minerais, consiste na prestação pecuniária que ganhou foro constitucional com a Constituição Federal de 1988, devida em razão da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais, paga pelos respectivos exploradores aos Estados, Distrito Federal e Municípios pela exploração do bem público que causa redução patrimonial ao ente federado e, indiretamente, por ser a atividade de mineração potencialmente poluidora e, consequentemente, causadora de prejuízos. O sujeito ativo do débito será toda pessoa física ou jurídica que esteja habilitada a exercer atividade de mineração em decorrência da exploração ou extração de recursos minerais que consiste na retirada de substâncias minerais da jazida, mina, salina ou outro depósito mineral, para fins de aproveitamento econômico.
No entanto, apesar dos rejeitos poluentes que gera, tal atividade possui papel importante para o desenvolvimento municipal e regional e, por isso, o legislador constitucional permitiu sua realização, de forma a apaziguar os danos causados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios através de uma prestação pecuniária por tal exploração em seus respectivos territórios.
Não seria correto afirmar que a Compensação Financeira tem o objetivo de compensar efetivamente o Ente Federado pela perda dos recursos minerais em favor do explorador, pois nesse caso, a pecúnia devida pelo explorador equivaleria à totalidade dos recursos explorados, o que inviabilizaria a atividade econômica privada. Além de que o destino da arrecadação pertence aos Estados e Municípios, enquanto que os bens à União.
Logo, a interpretação mais correta é de que a Compensação vincula-se aos problemas que dela advirem e não a exploração em si. De uma lista significante de distúrbios causados pela exploração, destacam-se os problemas ambientais, como a poluição, remoção da cobertura vegetal do solo, a inundação de extensas áreas, o comprometimento da paisagem, além dos fatores sociais e econômicos advindos com o crescimento da população e da demanda por serviços públicos. Além de que a concessão de lavra ou a implantação de represa inviabilizam o desenvolvimento de atividades produtivas na superfície, privando os Estados e Municípios das vantagens delas correntes.
3.2. NATUREZA JURÍDICA DA CFEM
A Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais enquadra-se no conceito das receitas originárias do Estado, vez que decorre do patrimônio da União, já que os recursos minerais lhe pertencem por expressa disposição constitucional.
Por receitas originárias entende-se que são aquelas auferidas pelo Estado em decorrência da exploração do seu próprio patrimônio, tratando-se de receitas voluntárias e contratuais. Em contrapartida às receitas derivadas ou tributárias que são as provenientes de bens pertencentes ao patrimônio dos particulares, pela arrecadação dos tributos em razão do jus imperii do Estado, que detém o poder de constranger o patrimônio do particular ao impôr coercitivamente aos cidadãos as receitas obrigatórias de direito público.
A receita decorrente do pagamento de obrigação tratada neste trabalho não tem origem no patrimônio particular, e sim no do próprio Poder Público, vez que os recursos minerais pertencem à União. Por isso, citada obrigação repele a natureza jurídica tributária, dado que esta é somente identificável nas obrigações que têm origem no patrimônio de terceiros, os quais sofrem uma expropriação incontornável, por força da lei.
Conforme os ensinamentos de Celso Ribeiro Bastos:
“Receitas patrimoniais são aquelas geradas pela exploração do patrimônio do Estado (ou mesmo pela sua disposição), feitas segundo regras de direito privado, consequentemente sem caráter tributário. Com efeito, os Poderes Públicos desfrutam de um patrimônio formado por terras, casas, empresas, direitos, que são passíveis de serem administrados à moda do que faria um particular, isto é, dando em locação, vendendo a produção de bens ou mesmo cedendo o imóvel ou direito.” (Curso de Direito Financeiro e Tributário, 4ª Ed., atual, São Paulo, Saraiva, 1995, p.38).
E no mesmo sentido, Ricardo Lobo Torres:
“Os ingressos patrimoniais são obtidos através da exploração dos bens dominiais do Estado, como seja, florestas, as ilhas, as estradas, os imóveis residenciais ou comerciais, etc. As suas principais formas são o preço público e as compensações financeiras.” (Curso de Direito Financeiro e Tributário, Rio de Janeiro, Renovar, 1997, p. 160).
Portanto a Compensação Financeira pela Exploração de Produtos Minerais caracteriza-se pelo uso privativo do bem público que deve ser remunerado através de uma receita originária, de natureza não tributária, resultante da exploração econômica do patrimônio público.
A Constituição Federal da República de 1988 em seu Título III – Da Organização do Estado, no Capítulo II – Da União, enumera, no Art. 20, os bens pertencentes à União:
“Art. 20. São bens da União:
IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo;”
E em seu parágrafo primeiro, assegura aos Entes Públicos a Compensação Financeira pela exploração mineral que ocorrer em seu território, veja-se:
“§ 1º. É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.”
A norma constitucional em apreço estabelece uma prestação pecuniária devida a certos entes federados pela exploração de recursos naturais, entre eles os minerais, em seus respectivos territórios. A partir desse dispositivo, é possível fazer uma diferenciação imediata entre duas subespécies de prestações: a primeira, a que proporciona àquelas pessoas jurídicas de direito público uma participação no resultado da exploração representada pelas importâncias calculadas sobre o resultado da exploração do petróleo, xisto betuminoso, gás natural e outros minérios. Matéria esta ainda não regulamentada por lei ordinária; E a segunda, a que garante a tais entes uma compensação pela exploração que tem a natureza de indenização pela perda de recursos naturais situados em seus territórios ou de contraprestação pelas despesas que as empresas exploradoras de recursos naturais causam aos poderes públicos, que devem garantir a infra-estrutura de bens e serviços e a assistência às populações envolvidas em atividades econômicas de grande porte.
Em comentário ao artigo supra transcrito, assevera Ives Gandra Martins:
“O artigo tem nítido objetivo desconcentrador. Pretende fortalecer a Federação na medida em que a exploração de um bem que o constituinte outorgou à União, embora situado em Estados e Municípios, inclusive no Distrito Federal, representa perda de patrimônio destes a favor da entidade maior do Estado Federativo. Por essa razão, de forma mais explícita, o constituinte houve por bem centralizar a propriedade do bem e descentralizar o resultado da sua exploração.” (Comentários à Constituição do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988 – São Paulo, Saraiva, 1992, p.96).
O artigo ao referir-se a “outros recursos minerais” engloba uma extensa lista de minérios e dentre eles a água mineral.Partidária da mesma opinião preleciona a Desembargadora Federal Margarida Cantarelli:
“Quando prevê a possibilidade da cobrança de CFEM na exploração de “outros recursos minerais” a norma acima disposta pretende abranger também, porque minério, a água mineral. Não está, assim, a água mineral incluída no conceito de recurso hídrico, já que este é relativo às águas comuns, do qual difere a água mineral. (…) Ora, como ocorre com os demais minérios, o Estado também deve ser ressarcido, através da cobrança da CFEM, pela extração da água mineral, como recurso mineral que é” (Mandado de Segurança nº 75677-PE.)
É fundamental que se faça a distinção entres as águas minerais e os recursos hídricos. A água mineral possui natureza jurídica de minério, com disciplina legal própria pelo que legal a cobrança da CFEM, enquanto os recursos hídricos referem-se às águas de superfície e às águas comuns. Dúvida não há quanto à caracterização da água mineral como minério. O próprio Código de Águas Minerais, nos Capítulos referentes à autorização de pesquisa e lavra da água mineral remete a sua regulamentação ao Código de Minas e submete a fiscalização ao Departamento Nacional de Produção Mineral. Veja-se Art. 1º do Código de Águas Minerais:
“Art. 1º Águas minerais são aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico-químicas distintas das águas comuns, com características que lhe confiram uma ação medicamentosa.”
Ressalta-se que são, sobretudo, as propriedades acima descritas que levaram a uma difusão do consumo desse minério.
O texto constitucional, Art. 20 § 1º, ao determinar que a obrigação ali instituída seja assegurada "nos termos da lei", evidenciou a necessidade de disciplinar a norma por lei infraconstitucional cuja competência para a elaboração, conforme dispõe o Art. 22, inciso XII, da Constituição, é privativamente da União:
“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;”
Portanto, em 1989, com o intuito de promover tal disciplina e viabilizar a cobrança da obrigação pecuniária ali prevista, foi editada a Lei Federal nº 7.990, que tratou da compensação financeira pela exploração de petróleo, gás natural, recursos hídricos e minerais. Dispõe em seu Art. 1º:
“Art. 1º – O aproveitamento de recursos hídricos, para fins de geração de energia elétrica e dos recursos minerais, por qualquer dos regimes previstos em lei, ensejará compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Município, a ser calculada, distribuída e aprovada na forma estabelecida nesta Lei.”
O Art. 6º, do mesmo dispositivo legal, define o percentual máximo da compensação financeira pela exploração de recursos minerais e a base de cálculo de tal obrigação:
“Art. 6º – A compensação financeira pela exploração de recursos minerais, para fins de aproveitamento econômico, será de até 3% (três por cento) sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda do produto mineral, obtido após a última etapa do processo de beneficiamento adotado e antes de sua transformação industrial”
No tocante aos recursos minerais, a Lei nº 7.990/89 foi complementada e alterada pelas Leis nº 8.001, de 1990, e nº 9.993, de 2000, e regulamentada pelo Decreto nº 1, de 1991. Ocasionou também a expedição da Portaria nº 06, de 1992, e da Instrução Normativa nº 06, de 2000, ambas do Diretor do Departamento Nacional da Produção Mineral – DNPM.
3.4. CONSTITUCIONALIDADE DA CFEM
A discussão acerca da constitucionalidade da cobrança da CFEM gerou inúmeros posicionamentos doutrinários ensejando diversas demandas administrativas e judiciais abordando a questão.
As divergências geraram em torno de que a cobrança da CFEM, instituída pelas leis ordinárias 7990/89 e 8001/90, não se amolda a figura da “compensação financeira”, mas tão somente possui a natureza de imposto, uma vez que se adequa aos termos do Art. 3º do CTN por possuir os elementos definidores de uma obrigação tributária, sejam: prestação pecuniária compulsória em virtude de lei que não seja sanção de ato ilícito, cobrada administrativamente.
E como tal, seria inconstitucional uma vez que o Art. 154 da Constituição Federal é claro em afirmar que impostos somente poderão ser instituídos mediante lei complementar e desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios de outros impostos e vimos que, ao caso em questão, fora, a pecúnia instituída por lei ordinária.
Além disso, a discussão pairou ainda sob o Art. 155 § 3º da Lei Maior:
“§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País.”
Como disposto acima, a Constituição veda a incidência de outros impostos sobre minerais, dispositivo que não teria sido observado com a criação da CFEM.
Todavia, o Ilmo. Juiz Omar Tognolo do TRF, 1ª Região em apreciação ao assunto pronunciou-se de forma distinta, ao afirmar que a CFEM não tem natureza tributária e, portanto, não há que se falar em observância a princípios tributários, defendendo pela constitucionalidade da Compensação, veja-se:
“A compensação financeira (…) não tem natureza tributária, constituindo, sim, receita patrimonial do Estado, cuja origem se encontra na exploração do patrimônio público, já que os recursos minerais pertencem à União, por expressa disposição constitucional. Não sendo tributo, impertinente às alegações de ofensa, na sua criação, a princípios constitucionais tributários, tais como a vedação à incidência de tributos sobre as operações sobre minerais, salvo as exceções constitucionalmente previstas, exigência de lei complementar e proibição quanto à criação de impostos cumulativos. Tais princípios são próprios dos tributos, e não de toda e qualquer receita obtida pelo Poder Público, como a compensação de que cuidam os autos, que se situa nas órbitas das receitas patrimoniais e não tributárias.“ ( RE nº. 148.754/RJ)
Além disso, o STF, em voto do Exmo. Sr. Ministro Francisco Rezek, afirmou que somente o fato de o Estado recolher das pessoas determinada soma em dinheiro, e de o fazer compulsivamente por lei, não é o bastante para conferir natureza tributária ao valor arrecadado.
Por fim, a questão foi apreciada pelo Pretório Excelso no Recurso Extraordinário nº. 228800-5 – Distrito Federal, o qual julgou pela constitucionalidade do instituto, por seu relator o Ministro Sepúlveda Pertence que afirmou não ver inconstitucionalidade nas Leis 7990/89 e 8001/90 em relação ao Art. 20 § 1º da Constituição, uma vez que a opção do legislador em adotar o critério da base de cálculo incidir sobre o faturamento líquido resultante da venda do produto mineral encontra-se amparada no fato de que a CFEM está vinculada à exploração dos minerais. Além do mais, a Carta Magna não definiu os elementos da compensação financeira, deixando tal abordagem a cargo da legislação ordinária e o legislador, no exercício de sua competência, optou pela incidência da referida alíquota sobre o faturamento com a venda obtida pelo mineral extraído. Claro está que não configura imposto ou qualquer cobrança assemelhada a tributo, portanto, inaplicáveis são os institutos a eles referentes, sejam os Arts. 154, I e 155 § 3º da Constituição Federal do Brasil.
A autarquia responsável por baixar normas, exercer a fiscalização, dirimir sobre questões controversas sobre a arrecadação da CFEM, conforme dispõe a Lei Nº 8.876/94 em seu Art. 3º, inciso IX, é o DNPM, Departamento Nacional de Produção Mineral, cuja representatividade é nacional e há uma autarquia em cada uma das capitais dos Estados federados brasileiros.
Será devida a pecúnia por toda pessoa física ou jurídica que obtenha a habilitação para exercer atividade de mineração em decorrência da exploração ou extração de recursos minerais que consiste na retirada de substâncias minerais da jazida, mina, salina ou outro depósito mineral. Para a incidência da CFEM, a atividade de mineração pode visar o aproveitamento econômico ou mesmo ser utilizada para o consumo do minerador.
O fato gerador da Compensação Financeira ocorre por três maneiras:
– Pela venda do produto mineral das áreas da jazida, mina, salina ou outros depósitos minerais;
– pela utilização, transformação industrial do produto mineral;
– ou mesmo pelo seu consumo por parte do minerador.
O cálculo da Compensação Financeira em caso de venda do produto é realizado sobre o valor do faturamento líquido, ou seja, o valor da venda do produto mineral escriturado nos livros fiscais das mineradoras. Desse valor, há previsão legal para a dedução com os seguintes gastos: os tributos (ICMS, PIS, COFINS) que incidem na comercialização e as despesas com transporte e seguro. Porém, quando o produto mineral é consumido, transformado ou utilizado pelo próprio minerador, então se considera como valor, para efeito do cálculo da CFEM, a soma das despesas diretas e indiretas ocorridas até o momento da utilização do produto mineral.
– ICMS: primeiro constata-se a existência de saldo de imposto ICMS a recolher no período fiscalizado. Em seguida constata-se o total de lançamentos a débito de ICMS, nesse mesmo período, por fim calcula-se o total de lançamento a débito referente ao produto considerado, água mineral. As fontes utilizadas para a realização de tais cálculos são os livros de Apuração de ICMS de cada estabelecimento, conforme o Art. 1º, II, da Instrução Normativa nº 6 do DNPM.
– PIS e COFINS: em primeiro momento é feita a constatação se houve saldo de PIS e COFINS no período fiscalizado, efetivamente recolhido através da apresentação do respectivo DARF – Documento de Arrecadação Federal. Logo após, constata-se o total do faturamento obtido no período fiscalizado, qual seja a base de cálculo do PIS/COFINS. Por último constata-se o total das receitas obtidas no período fiscalizado referentes à venda do produto mineral, água, de acordo com o Art. 1º, III, da Instrução Normativa nº 6 do DNPM.
– IOF: Imposto sobre operações financeiras, incidente nas operações de venda de ouro como ativo financeiro, efetivamente apurado, conforme constar de escrituração fiscal federal referente ao mês de ocorrência do fato gerador da CFEM, não incidente ao caso em questão.
– Transporte: O valor do transporte somente poderá ser deduzido do valor a ser pago a título de CFEM quando escriturado como despesa e não como custo de produção e desde que destacado na nota fiscal de saída por venda final, segundo dispõe o Art. 2º da Lei 8001/90 c/c o Art. 1º, IV, da Instrução Normativa nº 6 do DNPM.
– Seguros: A despesa com seguro somente poderá ser deduzida se destacada e adicionada ao valor da nota fiscal de saída por venda final, segundo o disposto no Art. 2º da Lei 8001/90 c/c o Art. 1º, IV, da Instrução Normativa nº 6 do DNPM. Assegura-se que quando o frete do produto mineral for de responsabilidade do comprador a despesa com o transporte não poderá ser deduzida em face da CFEM.
Observa-se que em caso de o titular do direito minerário ser optante e inscrito no Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte – SIMPLES (Lei nº 9.317, de 05/12/96; e alterações), o valor a ser deduzido da base de cálculo da CFEM será extraído do percentual identificado das exações fiscais (PIS/PASEP; COFINS; e ou ICMS) compreendidas na composição do montante recolhido.
As alíquotas aplicadas para obtenção do valor da CFEM, variam de acordo com a substância mineral, de tal forma que:
– aplica-se a alíquota de 3% para: minério de alumínio, manganês, sal-gema e potássio;
– a alíquota de 2% para: ferro, fertilizante, carvão, água mineral e demais substâncias;
– a alíquota de 0,2% para: pedras preciosas, pedras coradas lapidáveis, carbonados e metais nobres;
– a alíquota de 1% para: ouro.
Quanto ao pagamento da Compensação Financeira este deverá ser realizado mensalmente, até o último dia útil do segundo mês subseqüente ao fato gerador, devidamente corrigido. Assim assevera o Art. 16 do Decreto-Lei 001/91 do DNPM:
“Art. 16. A compensação financeira pela exploração de substâncias minerais será lançada mensalmente pelo devedor.
Parágrafo único. O lançamento será efetuado em documento próprio, que conterá a descrição da operação que lhe deu origem, o produto a que se referir o respectivo cálculo, em parcelas destacadas, e a descriminação dos tributos incidentes, das despesas de transporte e de seguro, de forma a tornar possível suas corretas identificações”.
3.5.8. Distribuição do valor arrecadado
A distribuição dos recursos da CFEM ocorre da seguinte forma:
– 12% para a União (DNPM, IBAMA e MCT).
– 23% para o Estado onde for extraída a substância mineral.
– 65% para o município produtor. Entende-se como município produtor aquele onde ocorre à extração da substância mineral e em caso de a extração abranger mais de um município, deverá ser preenchida uma GUIA/CFEM para cada município, observada a proporcionalidade da produção efetivamente ocorrida em cada um deles.
Os recursos originados da CFEM deverão ser aplicados em projetos, que direta ou indiretamente revertam em prol da comunidade local, na forma de melhoria da infra-estrutura, da qualidade ambiental, da saúde e educação, portanto não poderão ser aplicados em pagamento de dívida ou no quadro permanente de pessoal da União, dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios.
O esboço acerca da cobrança da CFEM acima descritos permitem ao DNPM que potencializar a fiscalização, arrecadação e cobrança dos valores concernentes à Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais – CFEM e suas penalidades aplicadas.
A cobrança da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais abrange ainda:
– A cobrança administrativa de débitos relativo à CFEM;
– A inscrição dos créditos em Dívida Ativa do DNPM;
– A inscrição do devedor no Cadastro Informativo dos Débitos não Quitados de Órgãos Federais – CADIN;
– A cobrança judicial do débito, mediante ação executiva fiscal.
Conforme abordado no capítulo anterior, a Compensação Financeira é calculada sobre o valor do faturamento líquido da empresa, obtido, mensalmente, por ocasião da venda da água mineral.
Tal abordagem está amparada pelos seguintes dispositivos: Art. 6º da Lei 7990/89 e Art.13 do Decreto 01/91 do DNPM, respectivamente:
“Art.6º – A compensação financeira pela exploração de recursos minerais, para fins de aproveitamento econômico, será de até 3% (três por cento) sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda do produto mineral, obtido após a última etapa do processo de beneficiamento adotado e antes de sua transformação industrial.” (Grifo meu)
“Art. 13 – A compensação financeira devida pelos detentores de direitos minerários a qualquer título, em decorrência da exploração de recursos minerais para fins de aproveitamento econômico, será de até 3% (três por cento) sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda do produto mineral, obtido após a última etapa do processo de beneficiamento adotado e antes de sua transformação industrial.”
O cálculo do faturamento líquido é realizado da seguinte forma: deduzem-se do valor bruto da venda de água mineral realizada pela empresa os impostos nele incidentes e os gastos com transporte e seguro do produto.
De acordo com o Art. 14, II do Decreto-Lei 001/91 do DNPM e Art. 2 º da Lei 8001/90:
“II – faturamento líquido, o total das receitas de vendas excluídos os tributos incidentes sobre a comercialização do produto mineral, as despesas de transporte e as de seguro;”
“Art. 2º – Para efeito do cálculo de compensação financeira de que trata o art. 6º da Lei Nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989, entende-se por faturamento líquido o total das receitas de vendas, excluídos os tributos incidentes sobre a comercialização do produto mineral, as despesas de transporte e as de seguros.”
Para a contabilidade da cobrança da CFEM o faturamento líquido da empresa deve ser aquele obtido com a venda do produto antes dele ser transformado industrialmente e após o seu processo de beneficiamento.
De acordo com o Art. 14, III do Decreto-Lei 001/91 do DNPM, caracteriza-se o processo de beneficiamento aquele realizado por fragmentação, pulverização, classificação, concentração, separação magnética, flotação, homogeneização, aglomeração ou aglutinação, briquetagem, nodulação, sinterização, pelotização, ativação, coqueificação, calcinação, desaguamento, inclusive secagem, desidratação, filtragem, levigação, bem como qualquer outro processo de beneficiamento, ainda que exija adição ou retirada de outras substâncias, desde que não resulte na descaracterização mineralógica das substâncias minerais processadas ou que não impliquem na sua inclusão no campo de incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Inclui-se ao termo “bem como qualquer outro processo de beneficiamento” o processo de embalagem da água mineral, vez que a viabilidade da comercialização da água é obtida com o engarrafamento da mesma.
Conforme os dispositivos legais supra transcritos, o cálculo da CFEM obedecerá a mesma sistemática: do total das vendas efetuadas no mês, deduz-se os tributos e as despesas relativas a transporte e seguro que incidam sobre a comercialização do produto mineral, obtendo-se o faturamento líquido, sobre o qual é aplicada a porcentagem de 2%. As deduções previstas para o valor obtido com esse cálculo correspondem tão somente àquelas obtidas em decorrência de impostos, transporte e seguro. Todas as outras despesas e custos decorrentes da atividade de exploração, necessárias à própria produção mineral, não são levados em conta para o cálculo de que resultará o faturamento líquido.
Destaca-se que diferente dos outros produtos minerais, a água necessita de embalagem para ser comercializada, visto que não há viabilidade nenhuma de comercialização da água mineral, se esta não estiver embalada, pela sua própria natureza. No entanto, não há previsão para o desconto do valor da embalagem de água ao realizar o cálculo do valor líquido do produto sobre o qual incide CFEM, ainda que, os custos com o envasamento do produto sejam facilmente calculados e discriminados pelas empresas.
Já que é o envasamento (beneficiamento) que possibilita a venda do produto ao consumidor, não é possível retira-lo do processo, é este de suma importância às fases anteriores a comercialização da água mineral, como o transporte e a distribuição.
Tal como entende os juristas brasileiros: "o processo de exploração mineral da água mineral é apenas, e tão somente, um beneficiamento industrial e não uma industrialização” o que lhes justifica a incidência de CFEM sobre o custo das embalagens, vez que o envasamento situa-se no lapso industrial previsto pela lei, antes da industrialização e após o beneficiamento.
Dessa forma, a cobrança de CFEM que é aplicada ao valor total da água, engloba o valor da embalagem da água mineral que integra seu valor total. Tem-se, portanto, uma ilegalidade flagrada na aplicação do dispositivo legal, vez que o dispositivo constitucional que aborda a CFEM, tal como as leis ordinárias que o regulamentam são claros em definir que a cobrança incide sobre o produto mineral, e por produto mineral entende-se a água mineral pura e não seus valores agregados.
Em relação à venda do galão de 20L de água mineral, entende-se não haver problema da cobrança da CFEM sem descontar o seu valor da embalagem, haja vista ser esta retornável à fábrica embaladora e o preço de venda é o próprio valor do produto mineral “de per si”.
Entretanto, prejudicada é a venda de água mineral em garrafas, copos ou galões de 5,0 L, uma vez que essas embalagens são descartáveis e, portanto, não retornam ao produtor que as embala, cujos custos são superiores ao próprio valor da água envasada, entretanto não se prevê o descontos do valor dessas embalagens na composição do calculo da alíquota do CFEM.
Logo, a ausência de dedução do valor da embalagem ao caso em questão configura que a embalagem também está sendo utilizada como fato gerador da CFEM o que caracteriza tributação a produto diverso daquele previsto em lei, produto mineral, o que fere o Princípio constitucional da Legalidade a ser discutido no capítulo seguinte.
Além disso, a Instrução Normativa nº 6 do DNPM em seu Art.1º diz que:
“Art.1º. Para os efeitos previstos no inciso II e no § 2º, do art. 14, do Decreto nº 1/91, somente são consideradas parcelas dedutíveis para obtenção do faturamento líquido sobre as operações de venda do produto mineral, mesmo que este esteja submetido a qualquer forma de acondicionamento ou embalagem:”
A Instrução Normativa delimitou as deduções previstas em lei para a CFEM. As leis que abordam a questão afirmam somente quais são as deduções previstas, não elencam qualquer rol de deduções não prevista, o que faz a citada Instrução.
A competência da Instrução Normativa, tal como qualquer ato normativo é meramente explicativo ou regulamentador, mas não restritivo de obrigações inexistentes no texto que explicita, em detrimento do cidadão.
O Art. 5º, II, da Lei Maior, que declara que ninguém poderá ser obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei, é o principal fundamento não só do Estado de Direito, mas de todo o ordenamento jurídico que o conforma.
Tem-se, portanto, de ilegalidade material da Instrução Normativa nº 6 de regência da CFEM, frontalmente contrária à Lei 7001/90 do Art. 2º, inciso II. O referido dispositivo, porque prevê uma limitação, ou seja, norma que impõe uma restrição à pessoa que pratica a atividade mineradora, não pode sofrer ampliação por atos normativos secundários, de modo a se tornar mais gravoso.
No caso de normas restritivas de domínio, como é o caso da regra legal que impõe a perda de uma fração do patrimônio do explorador de recurso minerais em favor de diversos entes públicos, a interpretação do dispositivo há de ser feita estritamente, sem que dela resultem resultados mais amplos, que impliquem em perda maior que aquela ordenada pela Legislação e também pela Constituição.
A proteção constitucional ao direito de propriedade requer que as demais disposições da Carta Política restritivas desse mesmo direito sejam interpretadas e reguladas, pelo legislador ordinário e quaisquer outros emitentes de atos normativos, com moderação, sem impor ao proprietário, minerador ao caso, ônus superiores aos constitucionalmente previstos.
Portando, prima-se pela ilegalidade da cobrança da CFEM, vez que o dispositivo constitucional prevê a incidência de tal pecúnia na atividade de exploração de produtos minerais, e tão somente tais produtos.
De acordo com o Art. 14, I do Decreto 01/91 do DNPM, tem-se o conceito de atividade de exploração de produtos minerais:
“Art. 14. Para efeito do disposto no artigo anterior, considera-se:
I – atividade de exploração de recursos minerais, a retirada de substâncias minerais da jazida, mina, salina ou outro depósito mineral para fins de aproveitamento econômico“
A cobrança deve incidir sobre o produto mineral de per si e não deve o executivo ao editar normas ampliar tal incidência.
5. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE x COBRANÇA DA CFEM
“O princípio de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei surge como uma das vigas mestras do nosso ordenamento jurídico. A sua significação é dúplice. De um lado representa o marco avançado do Estado de Direito que procura jugular os comportamentos, quer individuais, quer dos órgãos estatais, sob as normas jurídicas, das quais as leis são a suprema expressão. Nesse sentido o principio da Legalidade é de transcendental importância para vincar as distinções entre o Estado constitucional e o absolutista, este último de antes da Revolução Francesa. Aqui havia lugar para o arbítrio. Com o primado da lei cessa o privilégio da vontade caprichosa do detentor do poder em benefício da lei, que se presume ser a expressão da vontade coletiva”, preleciona Celso Bastos (Comentários à Constituição do Brasil , 2º vol., São Paulo, Ed. Saraiva, 2004, p.25).
Conceitua-se a lei como um comando genérico e abstrato, de obrigação, proibição ou permissão que inova o ordenamento jurídico disciplinando relações entre particulares e atividades públicas. Através das leis é possível que uma sociedade seja organizada e disciplinada de forma que todos tenham os seus direitos e respeitem os direitos alheios, além de cumprir com seus deveres a fim de se obter a justiça.
Nesse sentido posicionou-se Rousseau:
“o nome de República somente pode ser conferido ao Estado que é governado por leis, seja qualquer que seja sua forma de administração, pois somente em tal caso prevalece o interesse público, e a res pública se qualifica como realidade” (o Contrato Social).
Todavia, para atingir tal objetivo é necessário que as leis cumpram com seu papel de realizar a justiça social, para tanto, o processo legislativo do Estado deve ser bem elaborado e conter regras rígidas de discussão e aprovação.
O Princípio da Legalidade preleciona que obrigações aos indivíduos somente podem ser criadas por meio das espécies normativas devidamente elaboradas, conforme as regras do processo legislativo constitucional, visto que a elaboração destas é resultado de expressão da vontade geral da sociedade, sendo assegurado ao particular recusar as imposições estatais que não respeitarem a esse princípio.
A observância da lei e do princípio da legalidade assegura a segurança jurídica do ordenamento, visto que as leis sustentam de modo duradouro os pilares do Estado de Direito e as bases jurídicas em que se assentam as relações sociais.
O Princípio da Legalidade está previsto em dois momentos da Constituição Federal de 1988, primeiro no Art. 5º, II:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
Em seguida o Art. 37 caput da Lei Maior dispõe que:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”
Tais dispositivos podem ser considerados uma das bases de nosso ordenamento jurídico, com duas finalidades: a do Art. 5º de regular o comportamento dos cidadãos e dos órgãos do governo, visando à manutenção da paz social e da segurança jurídica, o que é considerado como fundamental para o Estado de Direito moderno. E em relação ao Art. 37, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma ser o fruto da submissão do Estado à lei. É em suma: a consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que a atividade administrativa consiste na expedição de comandos complementares à lei. Por esse dispositivo, há a garantia ao cidadão de que não é qualquer ato administrativo que ele deverá submeter-se, mas tão-somente àqueles de decorram exclusivamente de lei.
Da mesma forma em que o Estado está vinculado a exercer sua função em decorrência de lei, também o cidadão deverá cumprir os dispositivos legais, de forma que somente o que decorre de lei lhe é obrigatório o cumprimento.
No mesmo sentido: “trata-se do princípio da juridicidade, uma vez que das previsões constitucionais da legalidade, temos o Princípio da Juridicidade, muito mais abrangente que a legalidade. No Art. 5º, inciso II, consubstancia-se em um direito, com base na liberdade dos indivíduos. No caput do Art. 37, temos um dever, com fundamento na ausência de liberdade da Administração Pública.” posiciona-se a ministra do STF Carmem Lúcia Antunes Rocha.
O Professor Luís Roberto Barroso ressalta que o princípio da legalidade, na prática, apresenta-se de duas maneiras, as quais acabam por serem dois princípios autônomos:
– princípio da preeminência da lei, significando que todo e qualquer ato infra-legal que não esteja de acordo com a lei será considerado inválido, por ser a lei a fonte suprema do direito;
– princípio da reserva da lei: significa que determinadas matérias somente podem ser reguladas por lei, afastando-se quaisquer regulamentações por outras espécies de atos normativos.
A observância do Princípio da Legalidade promove a segurança jurídica do Estado de Direito, e estas correspondem aos pilares do Estado Moderno.
A norma constitucional prevê a Compensação Financeira pela exploração de produtos minerais que deve ser regulamentada por lei ordinária. A Lei ordinária nº 7990/89 por sua vez veio a regulamentar o dispositivo da Lei Maior, dispondo em seu Art. 1º que:
“Art. 1º – O aproveitamento de recursos hídricos, para fins de geração de energia elétrica e dos recursos minerais, por qualquer dos regimes previstos em lei, ensejará compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Município, a ser calculada, distribuída e aprovada na forma estabelecida nesta Lei.”
A pecúnia prevista tanto pela Constituição, quanto pela referida lei incide na exploração de recursos minerais.
Para o cálculo da referida pecúnia é utilizado o faturamento líquido da empresa, sejam as vendas obtidas com o produto dentro de determinado mês, deduzindo-se os impostos incidentes sobre a comercialização do produto e os gastos com transporte e seguro.
No entanto, devido a própria natureza da água mineral, está somente poderá ser vendida se for embalada. Logo, o custo com a embalagem da água mineral é indispensável, porém não dedutível da incidência de CFEM.
Dessa forma, tem-se que por ausência de previsão legal, outros custos com a produção do produto mineral acabam por incidir no cálculo da CFEM, ocorrendo a incidência da Compensação Financeira em produto diverso daquele previsto em lei.
Flagrante é aqui a ilegalidade da Cobrança da CFEM em relação ao custo da empresa obtido com a embalagem, vez que o dispositivo constitucional, tal como a lei que o regulamenta, são claros em afirmar que a cobrança incide sobre o PRODUTO MINERAL, e a qualquer desconhecedor de técnicas de produção é sabido que embalagens de água mineral não caracterizam produtos minerais.
Se a lei é clara em afirmar qual é a base de cálculo de determinada cobrança e o aplicador da lei expande tal conceito, causando lesão ao cidadão, este feriu ao Princípio da Legalidade situado dentre o rol dos Direitos Fundamentais previsto pela Carta Maior.
A função dos Direitos Fundamentais é a defesa da pessoa humana e da sua dignidade perante os poderes do Estado. Afirma J.J. Gomes Canotilho que os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: primeiro, constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências deste na esfera jurídica individual. Segundo, implicam num plano jurídico subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa). (Direito Constitucional, 7ª Ed., Ed. Almedina, 2003, p. 407).
Para evitar o descumprimento ao Princípio da Legalidade propostas serão apresentadas no próximo capítulo deste trabalho.
6. PROPOSTA DE NOVO CÁLCULO PARA A COBRANÇA DA CFEM
Tendo em vista a ilegalidade da cobrança da CFEM demonstrada no capítulo pertinente ao tema proponho sanar tal defeito do ordenamento jurídico brasileiro através da elaboração de uma nova forma para o cálculo da compensação financeira devida pela exploração de água mineral.
Ao cálculo da CFEM sobre a exploração de água mineral, somente são deduzidos os tributos e as despesas de transporte (frete) e de seguro que incidam sobre a comercialização do produto, aplicando sobre o faturamento líquido auferido o percentual de 2% (dois por cento), nos termos do Art. 2º, § 1º, II, da Lei nº 8.001/90.
Para a nova base de cálculo da CFEM levar-se-ia em conta o faturamento líquido, nos mesmo moldes do cálculo que atualmente é feito. A mudança proposta reflete-se no campo das deduções prevista para o cálculo da incidência da CFEM.
A legislação atual somente prevê, como dedutíveis, os impostos incidentes em comercialização e os gastos com seguro e transporte do produto. Ocorrendo, portanto, a incidência da pecúnia em outros gastos que a empresa, por ventura, obtenha com o produto.
Defende-se, porém, que, por a embalagem ser estritamente necessária à comercialização do produto, haja vista ser a embalagem o que viabiliza a comercialização deste, os custos adquiridos com esta deveriam ser deduzidos da base de cálculo da CFEM.
Para que a legislação seja adequada à realidade e cumpra os ditames constitucionais, o cálculo da CFEM deveria ser realizado sobre o faturamento líquido da empresa, porém dentro desse cálculo, deve haver a previsão de dedução dos valores relativos às embalagens, tampas e rótulos gastos para embalar o produto a ser comercializado.
Após tal modificação ao ordenamento, restaria preservada a coerência do ordenamento jurídico e a autoridade da Constituição, que é a fonte da qual emanam os princípios fundamentais do sistema normativo. Cabe ao legislador comum, assim como ao aplicador da lei, observar tais princípios, sob pena de violação à ordem constitucional.
A previsão constitucional para a cobrança da CFEM é clara em referir-se que haverá a incidência de CFEM, conforme as alíquotas previstas em lei, pela exploração de produtos minerais.
A cobrança deverá incidir sobre o produto que saiu da lavra e será comercializado. Para efeito desses cálculos o legislador ordinário optou em determinar que a base de cálculo seja feita sobre o faturamento líquido da empresa. Ou seja, retira-se do valor da venda bruta adquirida com a água os gastos com ela obtidos.
Porém tais gastos foram previstos pelo legislador e inclui os impostos gastos com a comercialização e os gastos com seguro e transporte do produto. Olvidou-se o Legislador de que a água mineral, por sua natureza, é vendida em seu estado físico líquido e, portanto, para ser comercializada necessita, sem embargos, de estar devidamente embalada.
Logo, o gasto obtido com a embalagem do produto não é possível de ser dissociado da produção e tal como transporte, seguro e impostos também deve ser deduzido do cálculo final do faturamento líquido da empresa. Uma vez que sem que ocorra tal dedução os gastos obtidos com tal etapa da produção são incluídos no cálculo da CFEM, gerando cobrança ilegal em produto diverso daquele previsto em lei.
Para evitar tal ilegalidade proponho que seja adotada nova forma de cálculo para o pagamento da CFEM incidente sobre a água mineral. A base de cálculo será o faturamento líquido, tal como dispõe a lei, porém além das deduções já previstas há que adicionar a estas os gastos que a empresa obtiver com a embalagem do produto a fim de torná-lo viável a comercialização.
Advogada na cidade de Porto Velho. Graduada pela Universidade Federal de Ouro Preto e pós-graduada pela UNICOC na disciplina de Direito Processual Penal
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